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No tempo das marmotas circulando pelo Ponto Cem Réis nas manhãs de domingo de Carnaval, havia a espontaneidade marcando o ponto e o pas...

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No tempo das marmotas circulando pelo Ponto Cem Réis nas manhãs de domingo de Carnaval, havia a espontaneidade marcando o ponto e o passo. E o aguaceiro sacudido mesmo em quem era alérgico à folia. Saíam impropérios e as risadas ecoavam na matinal da irreverência. Faziam mingau de farinha de trigo e sacudiam nas cabeças bem penteadas; papa nos festejos momescos: um mingau improvisado na brincadeira que durava até o meio do dia com entrada na tarde.

Chegou com algumas ferramentas. Em roupas desgastadas, se aproximou de um canteiro da praça: iniciou a labuta. As flores sorridentes pe...

jardim viagem flores
Chegou com algumas ferramentas. Em roupas desgastadas, se aproximou de um canteiro da praça: iniciou a labuta. As flores sorridentes pelo trato. As plantas dançando na chuva dos respingos do aguador. Manhã de sol, gente observando a atitude do jardineiro. Seria algum funcionário da prefeitura local?

Poema para a mulher Às muheres de minha vida: Emília Guerra (minha esposa), Josemília de Fátima, Terezanísia e Hebe (m...

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Poema para a mulher
Às muheres de minha vida: Emília Guerra (minha esposa), Josemília de Fátima, Terezanísia e Hebe (minhas filhas) e Maria Emília (neta) com um beijo carinhoso de marido, pai e avô
Para que se escreva Um poema à mulher Necessário se faz Saber a feminilidade Preciso é decifrar A alma feminina Fechada a sete chaves Aberta em sua fina Meiguice sem entraves

Quem poderia supor que página de jornal amassada formasse assunto para se utilizar numa crônica? Você afirmaria? Um coletor de papel, ...

Quem poderia supor que página de jornal amassada formasse assunto para se utilizar numa crônica? Você afirmaria? Um coletor de papel, suado em suas dificuldades, roupa por lavar, barba grande; achou de mexer em uma lixeira quando se deparou com um saco plástico inchado de papelório. Para ele, como se fora ouro: assegurava seu sustento.

Pôs-se a retirar as folhas impressas. Antes de levar os papéis para vender na reciclagem, em casa, lia as notícias, crônicas, artigos, até uma vista pelos chamados “pequenos anúncios”.

Tinha um cacoete. Sacudia a cabeça, fungava, e dava um berro de cabra. Muitos o consideravam louco, outros catimbozeiro. Servidor púb...

janio quadros atrapalhado
Tinha um cacoete. Sacudia a cabeça, fungava, e dava um berro de cabra. Muitos o consideravam louco, outros catimbozeiro.

Servidor público aposentado, vivia pelas ruas centrais, Ponto Cem Réis. Dizia ter sido chefe da casa civil do presidente Jânio Quadros. Puxava a miniatura de uma vassoura, símbolo marcante da campanha do folclórico Chefe da Nação Brasileira de mandato meteórico. Forças ocultas, como disse no discurso de despedida, não o deixaram continuar.

Escutei o soar do triângulo e corri a ver. Carregando ao lado do ombro um tambor, avisando a passagem pela rua dominical de uma saudad...

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Escutei o soar do triângulo e corri a ver. Carregando ao lado do ombro um tambor, avisando a passagem pela rua dominical de uma saudade da infância. Aquela sonoridade que acabou, pensava eu, volta resistente pelo corredor despido de pessoas, naquela tarde fagueira sem laranjais.

Não tive a honra e o prazer de ser aluno do Prof. Flóscolo da Nóbrega. Cheguei a conhecê-lo abatido, magérrimo, mumificado em vida. Logo d...

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Não tive a honra e o prazer de ser aluno do Prof. Flóscolo da Nóbrega. Cheguei a conhecê-lo abatido, magérrimo, mumificado em vida. Logo depois, partiu e deixou um vácuo no ensino da “Introdução ao Direito”.

Saída da calourada, nossa turma foi recebida pelo inesquecível Prof. Edigardo Soares que andava ereto, postura elegante. Conforme ele mesmo dizia, era por conta de um desvio na coluna. Foi o próprio saudoso Prof. Edigardo Soares que nos contou, num desses saborosos amenos, no recreio, duas passagens antológicas do velho e respeitado Flóscolo da Nóbrega. Este sisudo, reservado, ateu e admirador de Santo Agostinho.

Um vendaval soprou na vida dele. Começou a rever, no reflexo e reflexão da sua maior intimidade dentro da qual somente Deus tinha acesso, ...

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Um vendaval soprou na vida dele. Começou a rever, no reflexo e reflexão da sua maior intimidade dentro da qual somente Deus tinha acesso, que tudo se desata. Ficava observando as perdas e ganhos. Os meninos soltavam pipas (ainda sem o uso do cerol assassino), os papagaios devassando em cores variadas no céu claro. Ele contava histórias de lobisomem e o dinheiro guardado na carteira. Tudo se desata: antes, ainda criança, jovem, moço, despedia os aconselhamentos da avó.

A casa na Almirante Barroso, abrigo do médico, humanista, culto, simples. Cheguei por lá, em verde juventude, o abraço largo. Nas prazer...

oscar de castro
A casa na Almirante Barroso, abrigo do médico, humanista, culto, simples.

Cheguei por lá, em verde juventude, o abraço largo. Nas prazerosas cadeiras de balanço, começamos a conversa. Havia nele uma dimensão de transcendência e de acolhimento naturais encarnados em seu ser de agradável cosmopolitismo que se espraiava pelos problemas gerais. A noite esplêndida, enxuta: no céu o fruto branco da lua madura.

Os sinos mudos e a rabeca de Elísio soltando notas gaguejadas. A igreja pequena onde fora batizado e recebera outros sacramentos, incluind...

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Os sinos mudos e a rabeca de Elísio soltando notas gaguejadas. A igreja pequena onde fora batizado e recebera outros sacramentos, incluindo o matrimônio celebrado quando o noivo havia dobrado o cabo das tormentas com a noiva paciente. O templo antigo, em ruínas, o mato subindo pelas paredes rasgadas por estragos do tempo. O casal estava cansado, morando na mesma casa, herança do pai de Zizinha, sem atropelos de inventário mastigado, pois ela, a herdeira era filha única.

O que mais me inquietava (talvez mais do que a ele) era a postura na cadeira de rodas. Em pleno passeio e caminhadas na praça. Cooper, o c...

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O que mais me inquietava (talvez mais do que a ele) era a postura na cadeira de rodas. Em pleno passeio e caminhadas na praça. Cooper, o cientista idealizador do exercício em bater pernas sem destino certo, marcando o passo na passarela do relógio ou cronômetro, duas, três voltas circulantes ou dispersas por becos e ruas, não pensou nos imobilizados.

Quando somos crianças, as horas são preguiçosas. O tempo é imperceptível. Armamos nossos presentes com arcos e pedaços de invisíveis faze...

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Quando somos crianças, as horas são preguiçosas. O tempo é imperceptível. Armamos nossos presentes com arcos e pedaços de invisíveis fazeres. Não temos a constante preocupação que embaraça os adultos, os maduros, que se vergam à cronometragem de afazeres. Nossos espaços são longos. Em quaisquer classes sociais, a infância é um brinquedo; a vida parece não correr e o sono noturno traz a tranquilidade deitada em sonhos.

Quanta coisa boba pode gerar um texto! A lembrança de meu gato de infância. É raro quem, durante os rápidos verdes anos, não tenha pos...

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Quanta coisa boba pode gerar um texto! A lembrança de meu gato de infância. É raro quem, durante os rápidos verdes anos, não tenha possuído um talismã vivo: gato, cachorro, papagaio.

Meu gato ou o bichano da casa era negrinho, retinto como se pintado de piche. Os olhos amarelos, flutuantes, invasivos. Um miado estranho. Certamente era poliglota, pois a tonalidade variava, e, não sei se por fantasia infantil ou besteira de criança, conversava comigo.

Nunca mais vi Nadege. Nome pouco comum, não? Pois a conheci, há tempo; morava no final da Rua da República. Foi ela a responsável pela ave...

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Nunca mais vi Nadege. Nome pouco comum, não? Pois a conheci, há tempo; morava no final da Rua da República. Foi ela a responsável pela aventura, digamos oficial ou oficiosa, da erupção de meu primeiro poema.

Erupção mesmo, posto haver um vácuo profundo, uma cratera de criatividade que nunca explorara. Somente lia os augustos anjos versejadores, dentro do paraíso ou parnaso literário dos livros didáticos.

Nem todos entendem florinês. Dialogar com as flores viventes em plurais recantos onde elas habitam, pequeninos jarros, entre rachões de mu...

Nem todos entendem florinês. Dialogar com as flores viventes em plurais recantos onde elas habitam, pequeninos jarros, entre rachões de muros e pedras do assoalho das ruas. O jardineiro sabe segredos em plantá-las, apalpa o solo e sente quando bronco, petrificado, com calombos repelentes a raízes.

Minha tia Nininha sublimava a solteira, fazendo brotar o instinto materno nas florinhas e plantas que sua mão tocava. Parecia fada com vara de condão: plantou, pegou. Enchia ela de multicolores variações áridas áreas esturricadas: terras despidas, virginais, onde um sapo ou invasoras formigas se estabeleciam. Sobre elas despejava os fios d’água saídas pelos orifícios miúdos dos regadores. As flores sorriam alegres, criavam alma nova. Ou existe alguém duvidando da alma de flores? A fragrância delas é transcendente. As flores são vivas saídas de um suspiro de Deus sobre a Criação infinitamente derramada. Quem olhar com o espírito aberto à harmonia, certamente confundirá estrelas com flores prateadas pisca-piscantes.

Fácil capturar uma borboleta ou apanhar uma flor. Marisa vivia naquele mundo. Nunca se interessara por estudar: as irmãs, fazendo pós-grad...

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Fácil capturar uma borboleta ou apanhar uma flor. Marisa vivia naquele mundo. Nunca se interessara por estudar: as irmãs, fazendo pós-graduação, levavam grossos volumes, consultavam internet, passavam noites acordadas para subirem na vida.

Elogiadas pela família, o pai vendera uma fazenda, a fim de vê-las no cume. Marisa era o patinho feio, considerada uma medíocre, dada a receitas culinárias anotadas num caderno, preparando o bolo do fim de semana. No dia em que as estudiosas alcançaram o diploma, foi festa até o clarear do dia. Muita gente compareceu para cumprimentos, elogios, exaltações.

Um colega se refugiou num sítio. Deixou o asfalto para viver em contato mais próximo com a natureza. Ou seja, ser fiel à vocação ecológic...

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Um colega se refugiou num sítio. Deixou o asfalto para viver em contato mais próximo com a natureza. Ou seja, ser fiel à vocação ecológica. Ali, penso, convivendo com aves e bichos mansos, sacudindo ao ar milho e deitando rações para eles, se afilia à ala do franciscanismo. Sem hábito, sem regras, sem votos. O ar puro deverá exercer sobre o amigo e ex-colega de bancos colegiais um fascínio e bem-estar jamais encontradiço nos páramos assaltados pelos cruéis trânsitos de autos e parentes de motor, malabarismo de motos, ar poluído, envenenado pelo metanol e companhia ilimitada.

Conta a lenda que Narciso viu seu rosto nas águas e ficou deslumbrado consigo mesmo. Desapareceram, pelo que eu saiba, os espelhinhos redo...

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Conta a lenda que Narciso viu seu rosto nas águas e ficou deslumbrado consigo mesmo. Desapareceram, pelo que eu saiba, os espelhinhos redondos, geralmente ilustrados com figuras de mulheres nuas. Conduzidos ao lado do pente, serviam para cuidar do alinho ou assanhamento de quem o levava no bolso.

No parque de diversões, havia o chamado “espelho mágico”, que retorcia, desfigurava, caricaturava no reflexo quem o olhasse. Era atração paga e bem consumida. O ser humano gosta de se olhar; espelhos e fotos,
dizia um de meus professores, é antessala do desejo de imortalizar-se. Tinha lá suas razões. E, sempre, a espelharia se espalha pelos recônditos diversos das habitações, ainda hoje.

Qual a mulher (salvo exceções) que não se mira na planície espelhada, antes de sair para uma festa ou, na menor das hipóteses, qualquer saída à rua para simples compra de um remédio? Homens, também, não os excluo.

Há uma música, sucesso regional nordestino, cujo enredo é um enamorado se enfeitando o dia inteiro para ver a querida e que ficou inteiramente frustrado pelo fato de ela não o haver notado, quando se encontraram: “Ela não olhou para mim/ passei horas no espelho/ me arrumando o dia inteiro/ ela nem olhou pra mim”.

Conheço um advogado que, antes de seguir à audiência, além de conferir o bom ajuste da roupa, verificava o nó da gravata. Era um nó; ajeita, desfaz, refaz, até que fique bem com o colarinho. O próprio Novo Testamento alude ao fato, numa das cartas do Apóstolo Paulo:

“Hoje vejo por um espelho embaçado” – alude à impossibilidade de conhecermos a totalidade real de Deus, aqui no tempo. Muitos literatos utilizam o espelho como metáfora. Pintores, também.

O espelho, depois a foto de álbuns dos desaparecidos fotógrafos dos antes, vieram as fotos virtualmente concebidas, as selfies são moda, enfim. Ambos, espelho e foto, são denunciadores do tempo: de verde a amarelecido. Demarcam e documentam a cara lisa ou apinhada de rugas. Natural.

Espelho meu/ espelho meu/ existe no mundo/ alguém mais bela (o) do que eu? Cada idade tem sua juventude (ou cada imagem refletida ou captada) – se não me engano foi Jorge Luis Borges, poeta argentino, cego e genial quem proferiu essa máxima. Não sendo ele, me desculpem, mas as fases da vida jamais serão vistas, porque se dissolvem na totalidade da alma.

E alma (pessoa) jamais será fotografada, nem refletida. Mesmo que Jesus assegure que o olho é o espelho da alma. Sem nenhuma intenção de heresia, há olhos que não traduzem a interioridade recatada em seu misterioso quarto. Existe quem se veja no espelho ou fotografia com estranheza.

Explico: acha que não é ele. Ou se vê vivo, jovem, ou morto, velho. Até como outra pessoa. Não se conforma com a naturalidade impressa na foto, nem espelhada. Enfim, faz sua própria imagem. Será que Narciso se viu assim nas águas paradas?

Não participava de festas. Maria se ofuscava mesmo, encolhendo-se qual caramujo, enrolada em suas hesitações. Todos saíam de casa, ela fi...

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Não participava de festas. Maria se ofuscava mesmo, encolhendo-se qual caramujo, enrolada em suas hesitações. Todos saíam de casa, ela ficava solitária sem encontrar um brilho no horizonte. Criava um gatinho de pelos lisos, manhoso, gordo, preguiçoso que alisava com suas mãos esquálidas e unhas por fazer. Nunca passara batom no rosto ou procurara se atualizar com a moda. Achava uma afronta à sua maneira conventual de viver.

Maquiada a capricho, os cabelos vastos arrumados, soltos, em ondas bem acentuadas, livres. O olhar voltado para o verde aguardado. Um verd...

Maquiada a capricho, os cabelos vastos arrumados, soltos, em ondas bem acentuadas, livres. O olhar voltado para o verde aguardado. Um verde que poderia tomar outra tonalidade, dependendo da coloração do diálogo previsto, da confirmação do enlace previsto.