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Claro que não foi apenas a terra fértil, mas dois milênios de História que deram a Londres a sua grandeza. Não vimos – eu e Ione – nenhum m...

waldemar solha ambiente de leitura carlos romero viagem londres london turismo inglaterra reino unido

Claro que não foi apenas a terra fértil, mas dois milênios de História que deram a Londres a sua grandeza. Não vimos – eu e Ione – nenhum monumento ao apóstolo das epístolas no adro da Saint Paul’s Cathedral. Em lugar dele, deparamo-nos com uma estátua da Rainha Anne, a primeira soberana do chamado Reino da Grã-Bretanha, quando Irlanda e Escócia foram anexadas à Inglaterra.

National Gallery! Para que se tenha ideia aproximada do espaço ocupado pelas 2.300 obras da Galeria Nacional, que se impõe ante a Praça Tra...

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National Gallery! Para que se tenha ideia aproximada do espaço ocupado pelas 2.300 obras da Galeria Nacional, que se impõe ante a Praça Trafalgar, parei no centro dele e, ao me voltar para a série de salões a oeste, portas afora, depois para outro tanto delas a leste, eu disse:

Mal chegamos a Londres, saímos à rua. Devidamente encasacados, cruzamos uma praça – a Russell Square - e entramos numa rua estreita, a Mont...

waldemar solha ambiente de leitura carlos romero

Mal chegamos a Londres, saímos à rua. Devidamente encasacados, cruzamos uma praça – a Russell Square - e entramos numa rua estreita, a Montague Street, onde nos iluminamos com o que vimos: todos os postes – de ferro – ostentavam, cada um, dois cestões suspensos, cheios de flores miúdas e de um colorido muito vivo, as mesmas que enchiam todas as jardineiras e grades dos hotéis e bistrôs de terracinhos georgeanos (do século XIX), como num cenário de conto de fadas. Londres é quase toda um jardim. A guia do City Tour, no dia seguinte, disse-nos: - "A Prefeitura cuida de florir os lamp-posts da cidade".

...
E há uma infinidade de empresas que mantêm as fachadas de casas, lojas, bancos e bares floridas o ano todo, inclusive no inverno, quando as espécies são substituídas por outras, resistentes ao frio.

Em outro deslumbramento, um professor universitário voltou todo um quarteirão para mostrar-nos como cortar caminho para o endereço que procurávamos. Uma jovem – típica inglesa pele de porcelana, olhos intensamente azuis – aproximou-se quando viu que um senhor não sabia dizer-nos onde ficava a catedral de São Paulo.

...
Globe Theatre
E uma senhora e sua filha ofereceram-se, sorridentes, para fotografar-me com Ione diante do teatro Globe, onde Shakespeare apresentava suas obras-primas no século XVII. Doutra feita, perdendo-nos apesar do mapa, eu - desculpando-me pelo péssimo inglês - perguntei a um gentleman - que estava para cruzar a rua com duas crianças, onde ficava o British Museum. Ele não me entendeu e caprichei:

- De Brítiche Miuseum. Não me compreendeu. Mostrei-lhe o nome impresso.

- Ôh – ele disse – The British Museum! – mas isso numa pronúncia tão arrevesada e incompreensível que eu disse “Uau” e pedi que me repetisse a dose. Ele fez isso, sentiu a própria extravagância e deu uma grande gargalhada. Do mesmo modo, aquecidos por tantas caminhadas, vimos, nos maravilhosos jardins posteriores do palácio de Buckingham, a vendedora de sorvetes mostrar-nos várias opções do produto que vendia, culminando por ler uma versão tão irreconhecível, para mim, de strawberry, morango, que a imitei, sorrindo. Poucas vezes fiz alguém rir tanto...


W. J. Solha é dramaturgo, artista plástico e poeta

Há sempre uma multidão em fila para conhecer os interiores do Palácio de Buckingham, que é – ele próprio – um reduzido mas seleto museu. Ne...

Waldemar Jose solha ambiente de leitura Carlos romero

Há sempre uma multidão em fila para conhecer os interiores do Palácio de Buckingham, que é – ele próprio – um reduzido mas seleto museu. Nele vimos uma coleção de mármores do frio, porém perfeito, Canova, e uma bela pinacoteca em que se destacava o notável retrato de Agatha Bas, de Rembrandt.

Anos atrás, ao dar uma palestra pra psicanalistas, no “Espaço do Ser”, João Pessoa, pareceu-me que os surpreendi quando lhes assegurei que ...


Anos atrás, ao dar uma palestra pra psicanalistas, no “Espaço do Ser”, João Pessoa, pareceu-me que os surpreendi quando lhes assegurei que com o ator ocorre o mesmo que a um médium num centro espírita, ou pai de santo num terreiro: ele recebe “o espírito” do personagem.

- O fenômeno é tão fantástico - garanti - que o CORPO do intérprete ACREDITA na cena que interpreta. Claro, pois não há como enrubescer, chorar ou empalidecer, se não for assim.

Marcus vilar
Marcus Vilar
Quando revejo “A Canga” do Marcus Vilar, parece-me surreal não ver na tela os quarenta técnicos que se esfalfavam em torno de Zezita Matos, do Everaldo Pontes, de Servílio de Holanda, da Verônica Cavalcante e de mim, durante as filmagens. Nós – entre cada grito de “Ação!” e “Corta!”- estávamos absolutamente sós com nossa tragédia, no meio da caatinga. O mesmo se deu quando eu e Hermila fazíamos pai e filha em “Era uma vez eu, Verônica”, do Marcelo Gomes, num apartamento modesto da Conselheiro Aguiar, Boa Viagem. Lá fora, a zoada do trânsito intenso. Ao nosso redor, a equipe técnica em torno da câmera, dos refletores, da parafernália dos sons existia até que a assistente de direção ligava pro guarda de trânsito e a avenida parava, nós ouvíamos “Ação!” – e ficávamos sozinhos, eu ouvindo a filha cantar o melancólico “Frevo da Saudade”, do velho Nelson Ferreira. E chovia na quinta-feira santa, acho que 2003, quando, no “Auto de Deus”, apresentado ao ar livre diante do Santa Roza, na mesma João Pessoa, vi Horiébir – no papel de Cristo – ser atirado ao chão por dois legionários romanos. Desci os dezesseis degraus da escadaria sobre o tapete vermelho encharcado, gritando ao prisioneiro, sob o aguaceiro: “Vós sois o rei dos judeus?”, e me impressionei com o nazareno que se levantava com dificuldade, de costas para mim, pois as carnes de suas espáduas (que o público não via!) ... tremiam, ele em estado de choque pelo flagelo de que “acabara de ser vítima”!”

"eu quase ia morrendo
com o velho personagem"
Quando ensaiávamos meu texto “O Vermelho e o Branco”, em Pombal, sertão paraibano, 1968, Ariosvaldo Coqueijo – que, além de dirigir o espetáculo contracenava comigo – jamais conseguia dizer seu monólogo inicial por inteiro, nos ensaios, pois chorava desesperadamente antes do parágrafo final. Na leitura de mesa de “Antígona”, uma adaptação minha do clássico de Sófocles, Emilson Formiga, que iria fazer o papel de um arcebispo, não “entrava” em seu personagem até que o fiz repetir o texto umas quinze vezes, sempre corrigindo o rumo de sua emoção. Aí, de repente, arrepiei-me sentindo que o “espírito” do sacerdote “baixara nele” e, extasiado, vi Emilson escalando a enorme montanha de sua dor, até que... deu um berro levantando-se, saiu correndo, chorando, e trancou-se no banheiro, insultando-me com palavrões.

Marcus Vilar
Liv Ullmann
Posso imaginar a força do fenômeno em figuras de grande peso, como Liv Ullman num “Gritos e Sussurros” ou “Sonata de Outono”. Mas... sim: tivemos Servílio de Holanda (meu filho doido em “A Canga”) fazendo um cachorro, no “Vau da Sarapalha”, aplaudido de pé no Barbican Pit Theatre, de Londres! Disse-me o Luiz Carlos Vasconcelos que os dois tinham ido várias vezes ao mercado municipal pra ver o comportamento de um vira-lata que havia lá.

Quando terminamos – em “A Canga” - o take em que percebo que meu filho pode me matar e rezo a oração do corpo fechado, fui amparado pelo diretor Marcus Vilar e por Walter Carvalho, encarregado da fotografia, pois ia desmaiando. Fui socorrido por Dira Paes e Rosemberg Cariry, atriz e diretor de “Lua Cambará”, numa sequência em que, mesmo num desempenho horrível, quase ia morrendo com o velho personagem agonizante. Quando fui fuzilado (numa cena que sequer foi aproveitada) em “Eu sou o Servo”, de Eliézer Rolim, tive uma crise de choro na frente de todo mundo, logo eu, que jamais fui disso, o que, infelizmente, não acontecia com meu personagem.

Foi incrível, por isso tudo, compartilhar o aquecimento com Irandhir Santos em "O Som ao Redor”: ele age exatamente como um pai de santo, todo fungados e gritos, perdendo de tal modo o controle que tem de ouvir várias vezes “Atenção, silêncio: vamos rodar!”, o que evidencia o fato de que – mesmo com técnicas diferentes – todos nós, atores, vivemos como que em terreiros de umbanda.


W. J. Solha é dramaturgo, artista plástico e poeta

A obra mais pontuada – “As bênçãos de Nossa Senhora das Neves” – foi a que, paradoxalmente, mais sofreu revezes com a comissão. Endeusad...


A obra mais pontuada – “As bênçãos de Nossa Senhora das Neves” – foi a que, paradoxalmente, mais sofreu revezes com a comissão. Endeusada de início, alijada em seguida, recuperada depois, essa flutuação de opiniões se deveu à ousadia da proposta. Com sete metros de altura, toda branca, uma face elegantemente recortada, outra praticamente lisa, pareceu, a princípio, pecar contra a exigência de que toda escultura em rotatória tivesse informação e beleza em todos os 360º que sua visão oferecerá aos que transitam de automóvel na cidade. Aos poucos, no entanto, saltou à vista a elegância cônica da imagem vista de costas, que culmina com uma minúscula cruz vazada no alto da “cabeça da Virgem”, repassando sua mensagem a todo o “obelisco” a que parecia se limitar, como se fosse uma capela concebida por Le Corbusier. A comissão discutiu, então, o que se passaria em quem desse uma volta completa ao redor da estátua e descobriu algo mágico: a gradativa revelação que essa “viagem” proporcionará, até que a magnífica Nossa Senhora – criada apenas com recortes no metal – surja em toda a sua singeleza, com a cabeça inclinada, compassiva, o manto com suas dobras criadas apenas com cortes no aço. Outro fator: a idéia, do autor – Marco Aurélio Alcântara Damaceno (Orcan) – de fazer, com a luz, à noite, com que sua obra se metamorfoseie noutra, ainda mais esplêndida, com a cruzinha, na parte de trás, luzindo lá em cima, num requinte impressionante que empresta sentido a todo o resto de seu corpo.

Erickson Campos Brito – pseudônimo Augusto dos Anjos – apresentou o tema “Saudação ao Sol” – de motivos óbvios, já que em João Pessoa o sol nasce primeiro em todo continente americano. Esse escultor teve o mérito de ser o primeiro artista a ter apoio unânime da comissão. Sua obra, compacta, vistosa, majestosa, densa de sentido, bem desenvolvida, cativou imediatamente todos os julgadores, sem exceção. Sua “Saudação ao Sol” impressionou a todos pela beleza de seus seis volumes de ferro em vermelho vivo, o conjunto lembrando, imediatamente, as famosas estátuas que “montam guarda” na costa litorânea da Ilha de Páscoa. Nossa sugestão é a de que o grupo fique voltado para o nascer do sol em Tambaú. Achou-se por bem, ainda, que se negocie com o artista que aumente a altura da obra, de três para cinco ou seis metros, para que sua monumentalidade marque presença em nosso litoral. Ele, evidentemente, também sairá ganhando com isso.

“Guardiã da Cidade” – de Evanice dos Santos Silva (Tanice), que consiste num pássaro que levanta vôo, é de uma elegância tal que fez a comissão, a princípio, duvidar da competência da escultora para realizá-la. Depois de muito debate, concluiu-se que não tínhamos como avaliar os meios do/a artista para tal proeza, pois o pseudônimo nos impedia saber de quem se tratava. “In dubio, pro reo”, diz a Justiça. Resolvemos, portanto, dar-lhe um voto de confiança a ser confirmado – como, aliás, deve acontecer com todos os selecionados – no contato que, fatalmente, acontecerá entre eles e a comissão, com a divulgação do resultado do concurso.

“Revoar” - de Luiz de Farias Barroso (Ícaro), tem os mesmos méritos e problemas da anterior. Sua qualidade principal é a criação de uma arribação de aves que é, ao mesmo tempo, a de um só pássaro, dividida pelos vários fotogramas de seu movimento. A questão levantada é a das possibilidades técnicas do concorrente e a do realismo de seu orçamento para realizar a obra prometida. Cabe, também, ao contato comissão-e-artista, tornar isso bem claro.

Wilson Figueiredo da Silva (Plácido Rivera) submeteu-nos “O Cavaleiro Alado” à apreciação, sendo sua proposta a que mais evoca a arte de Jackson Ribeiro, homenageado pelo certame. O trabalho se impôs ante nós pela presença maciça, teoricamente monumental, mas as dimensões propostas são decepcionantes e perigosas. Dois metros de altura, para um trabalho colocado em meio a uma avenida, é muito pouco. E tem o inconveniente de ser facilmente escalado por crianças, que sofreriam sério risco de ferimentos nas orelhas pontudas do animal representado. Parece-nos que quatro ou cinco metros seria o ideal para a obra, que correu o risco de ser ridicularizada pela comissão ao se constatar que o “cavalo” parecia mais um boi, com o que se pensou em sugerir ao seu criador que mude o nome dela para “Touro Alado”, como os dos assírios, ficando, assim, a evocação paralela com os cavalos-marinhos, feita pelo autor, transferida para o bumba-meu-boi.
Por último temos “Sinergia II”, de “Leonardo da Vinci” (pseudônimo), que mereceu de Flávio Tavares a observação pertinente de que ela trabalha com quadrados mas está em cima de um pedestal triangular, o que lhe confere certo desequilíbrio. Cabe negociar isso com o artista, e também um aumento nas dimensões de sua obra, para que adquira um mínimo da monumentalidade que se exige de uma obra escultórica destinada a lugar público.

Todos os trabalhos não selecionados comoveram a comissão pelo seu número, pela disposição e empenho de seus autores, mas deixaram a desejar pelo aspecto estético e, também pelo temático, sempre sem grandes vôos. A comissão discutiu detidamente a validade de cada proposta A obra “Velas do Cabo Branco”, do autor com pseudônimo de “Tenho Dito”, por exemplo, gerou uma discussão sem fim, por apresentar alguma beleza se vista de dois pontos de vista contrários, mas presença absolutamente nula, se vista dos outros dois, limitada, literalmente, a um mastro. Isso foi considerado, por parte da comissão, como um motivo para torná-la inadequada, desclassificando-a. Foi apresentada ao grupo, inclusive, uma escultura de Roy Lichtenstein – maravilhosa – com o que seria o mesmo problema, no caso resolvido pela colocação da obra ante uma passagem, num jardim, de modo que a visão dela seria exclusiva, de acordo com ela mesma, para quem se aproximasse de um lado ou de outro. No caso, o local seria semelhante: o canteiro no final da Epitácio Pessoa. A escultura de Lichtenstein tem, no entanto, mais espessura e é – infelizmente – de uma beleza tal, que sua falta de “presença redonda” lhe redime a falha, excepcionalidade que a obra concorrente, infelizmente, não tem.

Examinou-se uma segunda “Velas do Cabo Branco”, em granito, majestosa, do concorrente “Granato”, mas com uma falha na apresentação do projeto – pois nele há somente uma foto, um só ponto de vista da escultura – o que é vedado pelo regulamento. Além do mais, sua formulação – bem como a de outras obras suas, apresentadas na sua pasta - está muito vinculada ao cubismo ainda de Picasso e Braque nos inícios desse movimento artístico.

Surgiu, ainda, um “Monumento à Paz”, do candidato “Creso”, em que uma mulher ergue um enorme girassol. Foi unanimemente descartada pela comissão por sua também defasagem, considerada ainda muito dentro do “realismo soviético” e de suas já muito estudadas limitações.

Duas outras obras também mostraram grande coerência com os locais escolhidos para sua entronização: uma bailarina diante do Teatro Santa Roza, e um índio – nesta terra de cariris e tabajaras - na mesma posição do famoso bronze grego representando Poseidon/ Netuno. Mas as intenções dos autores/as tropeçaram na concepção pouco estética dos trabalhos.

Outra peça, “Infância Paraibana”, de “Libra”, pareceu-nos pecar pela pesada composição – dois enormes cubos – buscando leveza com aplicação de pinturas cheias de meninos brincando, o que deveria ter sido feito com altos e baixos relevos, não com a assimilação de outra arte.

considerações do autor sobre as esculturas paraibanas candidatas a figurar no cenário urbano da nossa capital, como então presidente da comissão avaliadora.


W. J. Solha é escritor, dramaturgo, artista plástico e escritor (João Pessoa-PB). waldemarsolha@gmail.com

Aconteça o que lhe acontecer, disse Auden, a vida ... prossegue. Se você se espernear, alguém vai resmungar “Ao diabo que o carregue”. E, co...


Aconteça o que lhe acontecer,
disse Auden,
a vida ... prossegue.
Se você se espernear,
alguém vai resmungar “Ao diabo que o
carregue”.
E,
como exemplo disso,
... pícaro,
deu o quadro de Brueghel sobre a indiferença ... geral ... ante a queda de um distante,
por isso minúsculo
Ícaro,
que de um lavrador trabalhando na plantação
sequer desvia a atenção.



A mulher aguarda
presa à grade de seus ciclos.
O radar
atento
vasculha.
As telhas
calhas e
bueiros
permanecem na expectativa.
O dia
adia.

(A espera é o espírito
desta esfera).



Tudo – na verdade ( redescubro agora ) - tem seu tempo certo.
Pode-se até caminhar sobre as águas
se congeladas.
Nada
portanto
de Luis XIV com sapatos Luis XV.
Existirá – porém - coisa mais deslocada do que imaginar Demócrito falando em átomo há vinte e cinco séculos
enquanto Anaxágoras discorria sobre a tese de que o homem descende de animais inferiores?
Ah
o retrato de Gala Placídia
feito em vidro por Bounneri Kerami
em Bréscia
Itália
século V
um milênio antes da hora!

Por outro lado
“Nascimento de Uma Nação”
o filme de Griffith
de 1914 ou 15
me parece muitíssimo mais antigo que as naturezas mortas de Eckhout
do século XVII.
A Ponte de Alcântara
construída em Portugal pelo Império Romano
me parece bem anterior ao sempre jovem Tejo
que passa debaixo dela
e é claro que houve um equívoco
quando se produziu science-fiction
no Egito de Tutankâmon!

(os dois últimos poemas são do livro Trigal com Corvos. O primeiro, excertos da Web)


Terás, algum dia, aristocrata, borboleta de verdade de gravata? Aí quem sabe se cancele, na tua sala, a cabeça do antílope morto à bala, e s...


Terás,
algum dia,
aristocrata,
borboleta de verdade de
gravata?


quem sabe se cancele,
na tua sala,
a cabeça do antílope morto à bala,
e surja,
ali,
um Botticelli!



como o hino
em que,
paulatino,
na semana santa,
tramita o arremedo
de um samba-enredo

... e,
na Paixão - prévia da … Ressurreição - vê que o Momo,
ninguém sabe como,
passa a ter,
na coroa,
espinhos,

em lugar das vedetes - nuas - e atléticos parceiros
fazendo das suas,
bem brasileiros,
em eufóricos carros alegóricos ( até gongóricos ),
inzoneiros,
o Cristo... praticamente nu,
crucifixão a cru,
ele sempre em lentos andores,
cheios de fiores,
o povo a entender o aviso,
com medo:
de que a vida não é brinquedo.



Sei que não há,
por exemplo,
na Natureza,
Justiça como a entendemos
e
( se previna ),
nem — como você aprendeu num templo — a... Divina.

A mim me fascina... não ser de Tupã o trovão,
e que a ira tenha outro nome:
fome,
na onça, lobo
e leão.

(excertos de Vida Aberta - Tratado Poético-Filosófico)

Hamurabi, fundador do Império Babilônico, criou o mais antigo código de leis escritas e o divulgou afirmando que o recebera do deus-sol Sham...


Hamurabi, fundador do Império Babilônico, criou o mais antigo código de leis escritas e o divulgou afirmando que o recebera do deus-sol Shamash, como pode ser visto no relevo que há no topo da estela, no Louvre. Os hebreus gostaram dessa justiça à base do olho por olho, dente por dente, da ideia de se manter a ordem pública transformando-se o superego de todo cidadão num agente secreto onisciente – Deus -, e criaram a história similar de que Moisés teria recebido o Decálogo diretamente das mãos de Jeová, no Sinai.



Explique-me a existência de ricos que se dizem cristãos, mesmo sabendo que no Evangelho está dito que é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um deles entrar no reino dos céus. Alguns alegam justamente que houve confusão dos tradutores de Mateus 19.24, entre kámelos – camelo – e kámilos – corda, mais ainda assim a coisa é impossível. Já outros dizem que agulha era uma passagem estreita, nas muralhas, pelas quais passavam os cameleiros... com muuuita dificuldade, mas passavam…



Um dos monólogos mais famosos do mundo é o Ser ou Não Ser. Ao rever uma cena de filme mudo com a "mocinha" desmaiada numa das duas variantes de uma estrada de ferro, em que o trem vem vindo, "vi" o que Hamlet realmente sentiu, quando disse que se não temesse o inferno, cometeria o suicídio.



Digo e redigo que a lição do Calvário é precisa. Cristo morre entre o bom e o mau, todos dois...ladrões. "Quero ficar mais rico" - diz o da Direita. "Quero sair do miserè" - diz o da Esquerda. E o meio é um só: roubar o dinheiro sem dono, que é o do povo. Qual o problema? Falta de um sistema.



FREQUENTEMENTE ME SINTO EXILADO, AQUI EM JOÃO PESSOA, ONDE o Ariano Suassuna dizia que NÃO SE TROCA O OXENTE PELO OK DE NINGUÉM. Liga-se o rádio do carro, música americana, vai-se ao cinema,filme americano. anda-se nas ruas e só o que se vê é house, car, fashion, fit, hair, como se 99 % da população falasse fluentemente o inglês. Todo gringo, aqui, deve se sentir em casa.

(pensamentos avulsos)

Defina-se “perfeição”: é o resultado da capacidade, do artista, de se sair genialmente bem do problema estético que lhe foi proposto ou qu...



Defina-se “perfeição”: é o resultado da capacidade, do artista, de se sair genialmente bem do problema estético que lhe foi proposto ou que ele mesmo se impôs.

Há o momento pro estrondo da escola de samba de Vila Isabel e o do precioso sole do Jacó do Bandolim. Há o momento da majestosa “Tocata e Fuga em Ré”, de Bach, para gigantesco órgão, como há os instantes mágicos das pequenas peças para piano, de Satie, como suas Gymnopédies e Gnossiennes.

Ante o outdoor com vários emes da logomarca do Mcdonald´s fazendo Mmmmm, só pude dizer “Putz!” Mas a interjeição foi a mesma quando vi a logomarca de uma revista que jamais foi publicada – Mother & Child -, em que o & está inserido no “o” de Mother – feito um feto.

Quando perguntaram a Borges por que não se dedicara ao romance, mas ao conto, disse que, neste, “uno puede verlo como un todo”. Trabalhava com isso.

Sérgio de Castro Pinto pertence à classe dos joalheiros. Sua profissão de fé é a mesma de Bilac, pois também “No verso de ouro engasta a rima,/como um rubim”.

Decidiu-se a ocupar o menor espaço e tempo que lhe foi possível pra compor pequenas maravilhas como quando diz sobre a girafa que ela “é top model / é audrey hepburn”. Nesse mister, pinça associações ainda mais precisas, em que vê as cigarras como “guitarras trágicas” que “gargarejam/ vidros/ moídos.” E o que posso dizer quando leio “dou duas voltas/ na chave/ e trancafio/ a paisagem/ lá fora”?

Como disse Câmara Cascudo, os poemas dele são “claros, ágeis, nítidos,... suficientes.” Porque ele tem a chave do tamanho.

- Deus escreve certo com linhas tortas - diz a visão da Compadecida ao Trancoso, num de meus livros. E ele responde: - A senhora deveria ...



- Deus escreve certo com linhas tortas - diz a visão da Compadecida ao Trancoso, num de meus livros. E ele responde:
- A senhora deveria ter dado um caderno de caligrafia pro menino.

Penso no Aleijadinho tendo de esculpir de joelhos, com o martelo e o cinzel amarrados nos cotos dos braços. Em Tolouse-Lautrec, vítima de uma distrofia poli-hipofisiária que – de queda em queda – o deformaria e o reduziria a um metro e cinquenta e dois de altura.

Penso em Miró, com tal falta de controle motor, que seria incapaz de dar o laço nos sapatos, pelo que acabaria bolando aquele estilo taquigráfico dele, na ânsia de pintar por cima de pau e pedra!

Penso em Demóstenes, com tão sérios problemas de dicção, que se exercitaria em longos discursos com a boca cheia de seixos, ante o mar, até dominar o fragor das ondas e ser ouvido com clareza.

Penso no furioso Beethoven, com sua estúpida surdez. Penso em Borges e Joyce, caminhando pra cegueira, Sartre cada vez mais estrábico exofórico; Hermeto Paschoal e Sivuca albinos, Guignard cada vez mais tímido por causa dos lábios leporinos, Stephen Hawking desmantelado pela esclerose lateral amiotrófica!

Talvez a radicalização, salvo melhor juízo, seja indispensável para que não se fique na timidez formal de uma arte ou na mediocridade de uma ciência que nada inova. Veja o Apocalipse 3.15:

- Conheço as tuas obras, sei que nem és frio nem quente. Assim, porque és morno, vomitar-te-ei. Uau!

Penso em Pelé, Garrincha, Ednanci Silva, Ednalva Laureano da Silva (Pretinha), Daiane dos Santos, Acelino Popó Freitas – todos provenientes da pobreza. O mesmo se pode dizer de gênios da música popular brasileira, de Noel Rosa a Milton Nascimento, de Luiz Gonzaga a Jackson do Pandeiro. Na nossa literatura, temos Machado de Assis, mulato pobre e gago que acabou se tornando aquele que é tido por muitos como nosso maior romancista.

Ao terminar de ver o filme de Olivier Dahan, com a Marion Cottilard no papel da Piaf, me convenci de vez de que a genialidade é um dom que não é dado pra donos de biografia sensata. Claro que ter um corpo frágil e passar a primeira parte da vida com a avó paterna – que trabalhava num bordel – marcou sua personalidade e sua visão do mundo. Aí vejo um documentário sobre o tão magistral quão turbulento Michelangelo Merisi da Caravaggio, lembro-me da impressão que me deixou o romance “A Corrida Para o Abismo - O Gênio Caravaggio”, de Dominique Fernandez, e concluo que o estado de tensão permanente – causada ou não pelo berço – é que determina a hipersensibilidade geradora da percepção particular da maioria dos indivíduos excepcionais.

A pequenina mexicana Frida Kahlo não teria pintado o que pintou, penso eu, sem a poliomielite que quase a matara quando menina, as sequelas do violento desastre entre o ônibus de Coyoacan e o trenzinho de Xochimilco, quando ela seria traspassada por enorme pedaço de ferro que lhe entraria pelo quadril e lhe sairia pela vagina, provocando-lhe dores excruciantes o resto da vida. O desespero constante dessa mulher, sempre me lembrou o de Van Gogh, o holandês que, constantemente irritado – com a rejeição do pai, da Igreja Reformista Holandesa, das mulheres e do mercado de Arte, cortou a própria orelha com uma navalha e acabou se matando com um tiro.

Que fazer, se se nasce e cresce numa boa? Conhecer os shoppings de Paris e Nova Iorque. Ou ser uma exceção, como Chico Buarque e Bertrand Russell.


Olha o afã de Rodin de pôr desespero... eterno... na Porta do Inferno, - sem atinar, ainda, ( até ver a sua luta finda ), que em tod...



Olha o afã de Rodin de pôr desespero... eterno... na Porta do
Inferno,
-
sem atinar,
ainda,
( até ver a sua luta finda ),
que em toda obra de Arte
o todo é sempre menor
do que a sua melhor
... parte,
-
no caso,
o dominante,
impactante Dante,
pelo que o refaz... separado,
ampliado,
criando,
jamais poderia supor,
a sua grande obra-prima:
O Pensador!

Basta... a gola ...num Rembrandt,
pra se ver quão ricas – quase lendas – eram as rendas
de Amsterdam.

... estratos,
cirros,
cúmulos e nimbos,
em que pese às toneladas d´água,
milagrosamente levitam,
e,
nesses limbos,
transitam,
-
até que... tudo... deságua... em frágua de raios,
furacões,
trovões,
-
e desce ... aos grandes,
sombrios
rios,
que vão,
de novo,
pros mares – como se eles fossem seus lares – e, clandestinos,
pros céus,
de onde vêm,
de novo,
em... véus,
...pras minas,
nascentes
e fontes,
passando debaixo das pontes,
... pra foz,
...a dar,
nos seus tantos e muitos trajetos – e insondáveis projetos – a vida ... atrevida... a esses rebanhos de ... estranhos,
que fomos e somos,
e sempre seremos:
nós.

e é quase certo
que
se estamos numa vasta necrópole,
temos metrópole por
perto,
-
assim a escultura,
na sepultura,
na qual um menino... franzino ( em que a vida... fez várias podas ) salta... da cadeira de rodas
pro céu,
explica que... sua gente,
apesar de cristã
é rica.

Nenhum Miller,
mais,
é moleiro;
Charpentier,
... carpinteiro;
o velho Ferrari,
ferreiro.
-
Nada tem,
mais,
a ver com guerra, ... o Guerreiro.
-
Fato extraordinário:
não há,
mais,
armas,
no... armário.

há obras grandiosas em nome da fé,
como a catedral de Colônia.
Mas ela nada mais é
(como o Affonso Romano escreveu )
que o Himalaia do Eu.

Sigo... a água... que a sede pede e que me desce pela garganta... até que a sede cede. Sei que não há, por exemplo, na Natureza, Ju...


Sigo... a água... que a sede pede
e que me desce pela garganta...
até que a sede
cede.

Sei que não há,
por exemplo,
na Natureza,
Justiça como a entendemos
e

( se previna ),
nem - como você aprendeu num templo - a... Divina.

A mim me fascina... não ser de Tupã o trovão,
e que a ira tenha outro nome:
fome, na onça, lobo
e leão.



Mas o mundo... é curioso:
mesmo... misterioso,
nele existe o afeto... por coisas como um conto infantil
em que flor
é um heliporto de inseto.

Tire-se o joio do trigo,
de Troia,
dos Desastres de la Guerra de Goya,
e,
do trio teremos... a
joia.



E a Grécia — clássica,
fantástica,
do Partenão,
ainda deu...
Sófocles e Platão,
Aristóteles... com Zenão!
Deu,
ainda,
o Demócrito,
fera que viu o átomo
em Abdera,
enquanto — com brilhantismo — o heliocentrismo foi detectado por
Aristarco,
em Samos!
Além do que — convenhamos:
Arte por toda parte!




... e a conclusão
triste,
mas linda,
de que o ontem... já não existe...
o amanhã... inexiste ainda,

... o que torna o relógio - bússola do Tempo - o absurdo com
que mais me aturdo,
pois quem,
salvo engano,
navega sem oceano?

Pergunto,
mergulhando no assunto:
Como
se espera - nesse inexistente futuro - um dia comum,
de dois mil... e sessenta e um,
( sem ficção de apocalipse em cósmica revolta )
em que o que se destaca é o cometa Halley
de volta?

Será isso um sinal... do juízo,
afinal?

(excertos de "Vida Aberta - Tratado Poético-Fiosófico")