Alexandra caminhou sentindo os pés descalços tocarem a água espumosa que morria mansamente na praia. Antes, e isso não fazia muito tempo, ...

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Alexandra caminhou sentindo os pés descalços tocarem a água espumosa que morria mansamente na praia. Antes, e isso não fazia muito tempo, essa sensação lhe dava muito prazer. Adorava ver as ondas espocando contra as pedras, o sol caindo no horizonte e as palhoças dos pescadores.

Parte 1: Barcelona No final de 1989 o Brasil vivia a expectativa da posse do novo presidente, Fernando Collor de Melo, recentemente eleit...

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Parte 1: Barcelona


No final de 1989 o Brasil vivia a expectativa da posse do novo presidente, Fernando Collor de Melo, recentemente eleito sob o signo da mudança.

Ao longo de sua campanha ele vendeu a sua imagem resumida a “Caçador de Marajás.” Não tendo programa de governo, Collor prometia combater a corrupção e acabar com privilégios.

Eu tinha 8 anos, mal sabia ler, e já conhecia de cor a primeira parte de “O Canto do Piaga”, de Gonçalves Dias. Ainda que essa primeira pa...

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Eu tinha 8 anos, mal sabia ler, e já conhecia de cor a primeira parte de “O Canto do Piaga”, de Gonçalves Dias. Ainda que essa primeira parte tenha 24 versos, distribuídos por 6 quadras, confesso que não sou nenhum prodígio. Um prodígio saberia Gonçalves Dias de cor. O fato é que três das minhas irmãs mais velhas do que eu — eu sou o sétimo de uma família de 10 — estudaram em colégio de freiras, em Bananeiras, e uma delas mais afeita às artes cantava no coro. Foi através de minha irmã e da música, que a já citada primeira parte de “O Canto do Piaga” se alojou na minha memória.

Meus amigos, minhas amigas. Pensem numa dupla desigual! Está aqui uma: Tião Malvadeza e Cicinho. O primeiro, o Sebastião, era um homão f...

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Meus amigos, minhas amigas. Pensem numa dupla desigual! Está aqui uma: Tião Malvadeza e Cicinho.

O primeiro, o Sebastião, era um homão faltando pouco para chegar aos dois metros de altura e quase que a metade disso em largura. O que tinha de forte tinha de bravo e de ruim. Puxou uns quinze anos atrás das grades, em regime fechado, pelas malvadezas que praticou nesses buracos do mundo. Era ruim que só o diabo.
Quando esteve vendo o sol nascer quadrado, mandou pelo menos meia dúzia de desafetos falar com Deus. Aqui fora, ninguém sabe quantos despachou desta para uma melhor. Por essas “jabuticabas” de nossa justiça, ganhou liberdade e está solto esparramando terror nesse mundão de Deus.

Já Cícero, um hominho de pouca estatura, magrinho, com os bracinhos e as pernas que mais pareciam canudinhos de tomar refrigerante, era uma criatura com a índole de um passarinho. Uma bondade em pessoa. Temente a Deus e, pelo jeito, a muita gente. Fugia de encrencas, pois sabia que desavença não era sua praia. Não tinha músculos para encarar essas paradas. O jeito era ficar na dele, em paz com esse mundo e outros, se outros houvesse.

Malvadeza era grosso como papel de embrulhar prego, Cicinho era uma seda no trato com toda gente. Tião não levava desaforo para casa e cobria de sopapos o infeliz que tivesse essa ousadia. Cicinho não era assim. Pedia perdão por eventual ofensa que dele tivesse partido, assim, como perdoava a quem o tivesse ofendido; do jeitinho que pede a oração. Tião, dizem, nem batizado foi. Igreja? Só entrou uma vez para assaltar a sacristia.

Passava ao largo de qualquer templo fosse católico ou evangélico. O outro, o pequenino de quem falávamos, era casado com Claudete, mirradinha e mansa como ele. Tiveram três bacurizinos.

Mas o destino aprontou mais umas das suas e fez que essas duas criaturas de quem estamos falando, tão desiguais, viajassem juntas no mesmo trem da Mogiana. Isso, estou dizendo, aconteceu lá de priscas eras, quando viajar de trem era sinônimo de conforto e segurança.

Cicinho embarcou em Rifaina. Vivia ali, naquela cidadezinha acanhada à beira da represa. Antes de embarcar, numa birosca daquela gare, reforçou o estômago com pastel, quibe e empada de palmito. Esse reforço iria segurar o apetite até Campinas, seu destino final. Foi de segunda classe, grudado na janela apreciando a paisagem. Era pé de café e de cana a não poder mais. Lá ia ele embalado pelo balanço gostoso do trem pensando em Claudete e nos bacuris. Quase adormeceu. Ia pegar no sono não fosse o trem parar na estação de Franca. E trem quando para faz barulho. Quem entra no trem? Quem? Adivinhem! Isso mesmo, Tião Malvadeza.

Entrou cheio das vontades. Viu lugar vazio ao lado do nosso hominho e se encheu de banca. – Chega mais pra lá, criatura. Só vou descer em Ribeirão. – nem deu bom dia e já foi chamando o pobre de “criatura”.

Pois não, senhor – respondeu a criatura resignada e obediente.

Malvadeza não disse mais uma só palavra, foi se esparramando no assento, prensando Cicinho junto da janela. Este ficou quietinho conforme mandavam sua índole e sua coragem.

Passado um tempinho, o trem partiu. Próxima parada? Ribeirão Preto. Ia ter que suportar o incômodo até lá. Cicinho ainda conseguiu dar uma viradinha de lado e deu uma medida no tamanho do homão, quando viu o cabo de uma garrucha no cinto do valentão. Cicartiz no rosto, garrucha no cinto, só podia ser o tal de Malvadeza que vivia aterrorizando a região. Sim era ele, conjecturou nosso amiguinho.

Malvadeza adormeceu ligeiro, foi então que Cicinho notou que na redondeza os olhares se dirigiam para onde esta sentado. Olhares ansiosos, medrosos. Também pudera, tinham identificado Malvadeza que já puxava seu ronco em sono pesado.

Cicinho teve todo o medo do mundo. Começou a passar mal. Lá em suas entranhas o quibe começou a arengar com a empada, essa por sua vez brigou com o pastel. Não se entendiam. Foi então que o estômago resolveu botar essa trinca para fora e fez Cicinho devolver aquela gororoba justamente no colo de Malvadeza. Só teve tempo de ouvir o passageiro do banco da frente dizer:

– Malvadeza, quando acordar, vai espetar o magrinho! – mas o ogro nem ouviu, nem acordou E lá ia o trem. O pessoal do entorno na expectativa, vira e mexe olhavam para o coitadinho, antevendo a desgraça. Mas ninguém sabia de uma coisa: Cicinho era um danado de esperto.

O trem foi chegando em Ribeirão Preto e Malvadeza despertou. Viu aquela massa nojenta no seu colo e olhou com sua cara de bravo para Cicinho. Este tirou um lencinho do bolso, ofereceu o paninho para Malvadeza e perguntou com a voz mais meiga do mundo:

– O senhor melhorou?

De repente me vejo passando pela calçada de chão batido do pequeno chalé do antigo Centro Espírita, em Jaguaribe, o vermelho das papoulas ...

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De repente me vejo passando pela calçada de chão batido do pequeno chalé do antigo Centro Espírita, em Jaguaribe, o vermelho das papoulas cheias rivalizando seu brilho com os ramos amarelos das rainhas do prado derramadas no muro vizinho de Hermano José. E Hermano José sentado de través no vão da sua janela.

O momento nacional nos impõe uma reflexão sobre a postura ética na administração pública. É preocupante a crise de credibilidade por que ...

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O momento nacional nos impõe uma reflexão sobre a postura ética na administração pública. É preocupante a crise de credibilidade por que passam as instituições responsáveis pela gestão da coisa pública. Há de se recuperar o interesse público como propósito maior da existência do Estado, sob pena de se verificar o fenômeno da ingovernabilidade.

Nascimento e morte. Natal e Paixão. As principais datas que marcam a história de Jesus. O nascer de uma era, que consolida a mais elevada ...

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Nascimento e morte. Natal e Paixão. As principais datas que marcam a história de Jesus. O nascer de uma era, que consolida a mais elevada mensagem outorgada à humanidade, e o fim de sua passagem, que revela no abominável plebiscito o maior equívoco cometido na história do planeta.

Não alcancei Heitor Villa-Lobos; já os irmãos José e João Baptista Siqueira, quando faleceram, ainda era criança vivendo nos arredores ca...

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Não alcancei Heitor Villa-Lobos; já os irmãos José e João Baptista Siqueira, quando faleceram, ainda era criança vivendo nos arredores campinenses, sem instrução musical formal. Mas, já adulto, conheci e me aproximei de um baluarte da música, uma pedra fundamental na composição brasileira, e é desta coluna artística que brota, por exemplo, a primeira Sonata para piano cheia de encantos rítmicos,
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simplicidade, marca registrada no uso dos ornamentos, e dos vetores intervalares como a quarta justa. Tão idiomático é o estilo de Edino Krieger que, seguindo coerência composicional, as quartas, e sua inversão em quintas, estruturam-se em temas de pura sonoridade, timbre e nostalgia na segunda Sonata para piano , concebida em abril de 1956, na capital britânica.

Temos a sorte de tê-lo longevo, e, ao longo de suas mais de nove décadas de existência, podemos sorver de sua mente criadora, atuando não só por meio da própria obra, quanto como pelos cargos que exerceu na promoção das artes e dos artistas nacionais. Ele mesmo, dentre muitas homenagens que recebera pela passagem de seu nonagésimo aniversário, relembrou no programa Harmonia da Rede Minas, muito de sua trajetória.

O álbum Edino Krieger entre amigos é produção caseira dedicada com amor à sua esposa Nenem, e aos frutos dessa longa relação de parceria e apoio mútuo. Tem, na apresentação do encarte, palavras de Tim Rescala, notável humorista-compositor que disponibilizou seu estúdio onde se deram parte das gravações:

O músico, como todo artista, sempre tem alguma referência, alguém que admira, seja pelo talento, pela obra ou mesmo pela personalidade. É difícil lembrar de um outro músico por quem a classe musical nutra tanta admiração [...] da mesma forma que criou obras fundamentais para a música brasileira, deu condições para que seus colegas também criassem. Da mesma forma que abriu caminhos, deu condições para que outros abrissem. Há, não só no Brasil mas no mundo, poucas pessoas assim [...] em tempos difíceis, confusos e difusos, como este em que vivemos, este registro de Trio Aquarius e Duo Santoro de algumas obras de Edino é um alento. Resume uma trajetória, mostra um caminho, dá um norte. Que privilégio é ouvir de perto as obras do mestre e ser espectador, de alguma forma, de seu processo criativo. Que privilégio é tomar um vinho com o mestre, jogar conversa fora, na companhia de sua cara-metade, que é pra ele fundamental, assim como, para ela, fundamental ele também é. E para nós também, os privilegiados.

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O próprio Edino refere-se a este álbum como fruto de uma autêntica amizade; os intérpretes são muito próximos da família Krieger, e por vezes, já tocaram, inclusive como estreia, suas obras. O disco vai desde uma Sonata para violino solo (opus 1) feita na adolescência, sob as primeiras orientações de Hans-Joachim Koellreutter, aos seus dezesseis anos; até obras estreadas em Bienais de Música mais recentes, como o ciclo dos Estudos Intervalares. O álbum abre com uma singela peça, Chôro Manhoso, concebido aos vinte e quatro de agosto de 1956, e dedicado a Dinorah Krieger, sua irmã. A versão original é para piano solo e podemos ouvi-la pelas mãos de um intérprete muito conhecido e velho amigo dos Krieger, Miguel Proença .

Na Europa é comum que grandes mestres tenham versões e versões do original de suas peças, transcritas em novas instrumentações; é uma forma de ampliar a percepção, e de que as obras sejam mais conhecidas e compartilhadas por diferentes grupos e intérpretes: quando a música transcende a própria concepção originária. É do pianista mineiro Flávio Augusto, membro do Trio Aquarius, essa e as demais versões em trio (Sonatina e a valsa Nina, também na concepção primeira para piano).

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A Sonatina para piano solo, – que aqui trago na sutil e sensível interpretação do pianista gaúcho Alexandre Dossin – é, no amistoso álbum, incrementada com notas pedais de um tênue vibrato ao violoncelo, no primeiro tema que é suportado com compartilhamento da melodia entre o violino, ora só, ora dobrado pelo violoncelo no segundo tema do primeiro movimento. Noutros momentos, o grave do piano é dobrado com o violoncelo, dando um reforço timbrístico, num som composto. Já no segundo movimento, o sério e desafiador Allegro, a dosagem é bem equilibrada entre os três instrumentos, revelando uma transcrição bem elaborada tecnicamente: Flávio Augusto foi feliz ao traduzir para trio essa peça. Aliás, o Trio Aquarius é maduro em concepção camerística, extremamente entrosado e convence nessa versão que bem poderia ter sido concebida pelo próprio Edino. É inspirador ver quando intérpretes se dedicam nesse nível à obra de algum artista criador de nosso solo pátrio; e Edino merece!

Na valsa Nina, estruturada numa harmonia saudosa, rememorando o espírito seresteiro, cancioneiro, o Trio AquariUs brinda-nos com a leveza que a obra merece: audição despretensiosa e leve, deixando-se levar por onde a memória e o espírito nos conduzirem. Mas, é na obra Trio Tocata que a interação criativa entre os instrumentos, revela uma originalidade da concepção e uma maturidade de uma criação robusta.
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A peça já começa com um uníssono longo e arrebatador que desemboca numa dissonância provocante: um autêntico Edino. Essa sonoridade sinuosa, com quartas aumentadas, mais ásperas, e articuladas por ritmo insistente, marcante, é característica de muitas de suas obras mais elaboradas. Dessa abertura mais séria e árida, surge um arrasta-pé modal, um baião cheio de molejo no qual violoncelo e violino vão se desafiando, sem perder os ataques reiterados de uma agressividade latente, como é agressiva a seca nordestina. A rítmica mais rude retorna, com a repetição de baixos ao piano, ou acordes insistentes no agudo, e dessa harmonia, brota desmembramentos em conversações timbrísticas. Um implícito rememorar de contornos melódicos villa-lobianos, e uma vez mais a emulação do baião: como se fora um baião telúrico, de uma terra rachada, num fundo de cacimba, e, em cada rachadura, uma lembrança espirituosa. A obra termina como começa, não sem antes um ponto final, também ao estilo de Villa-Lobos: uma tônica exclamativa.

O ciclo de seus Estudos Intervalares já em si merece um ensaio analítico exclusivo. Destaco a mimetização do mecânico, do maquinal presente nos estudos Das segundas e Das terças, com ritmo frenético em cachos de notas que mais parecem sintetizadas: idéias que se contrapõem e se ratificam a partir de trinados ou arpejos vagos e ressonantes. Já harmonizações comuns no jazz se ouvem no estudo Das quartas, sem que se perca um coerente motorizado canto indígena, relembrando novamente Villa-Lobos. Ou o pulsar de uma citação em ritmo de maracatu no Das quintas. E também o baião sem baixo fixo, no Das sextas, repleto de referências. De cantadores, como numa moda ou toada de viola do Centro-oeste, ou do ritmo bem nordestino com contorno modal, à valsa opus 64 nº. 2 de Chopin, em dó sustenido menor, numa intertextualidade bem humorada, misturada a partir desse que foi o intervalo eleito no século XIX como o mais romântico no repertório, sobretudo pianístico.

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O Nordeste de sua amada Nenem também se faz presente no Das sétimas, e o baião, dessa vez, bem autêntico quanto à marcação, é pulsado numa melodia simples e gingada, e com o incremento das sétimas arpejadas. Edino é mais Edino no Das oitavas, quando elabora um ritmo de mãos alternadas que progride cromaticamente e se encerra vibrante e viril: traço presente em diversas de suas obras. O Das nonas resume os anteriores no que de simbólico ou arquetípico o ciclo contém.

Instrumento primeiro de seu Edino é o violino. Não por outro motivo decidiu escrever uma Sonata solo em seu opus inaugural. É peça dedicada ao seu pai, músico que o conduziu nos primeiros passos da vida e da lida musical. A simplicidade de seu Edino o impede de reconhecer o valor para além da aprendizagem das formas barrocas. A interpretação é do mineiro Ricardo Amado que satisfaz o compositor, tendo sido o próprio violinista a sugerir a inclusão dessa obra histórica sobre a qual se pode traçar toda a trajetória criativa de seu Edino, até a mais recente, de que tive o privilégio de colaborar, honrosamente, na edição.

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A última obra do álbum é feita para os gêmeos Santoro. É uma emulação entre os violoncelistas, alçando uma independência de peça com forma e caráter próprios, numa das partes que constitui o destaque máximo dos solistas de um concerto. Cadência, num sentido de encaminhamento, de concatenação de idéias, também explora a tessitura do instrumento e desafia o instrumentista a explorar os recursos expressivos que o particularizam. Aliás, falando em particularidades, Edino, quando ouvido em diversas obras, salta-nos aos ouvidos, em estilo e jeito pessoais de tratar os sons, sua música é sinal indelével.


Por isso, diante de sua produção rica e diversa, mas de uma coesão admirável, além desse álbum, permito-me ainda falar de uma obra cuja vivacidade composicional é de um orgulho nacional como poucos feitos na atualidade: o Concerto Duplo para violões e cordas com arco [Edino Krieger: Concerto for two guitars & string orchestra]. Edino se congraça numa tradição perpetrada por grandes nomes nacionais como Camargo Guarnieri, Francisco Mignone, os irmãos Siqueira; além de Osvaldo Lacerda, Marlos Nobre e o próprio Villa-Lobos e Guerra-Peixe. Ou ainda estrangeiros radicados no Brasil, como Ernst Widmer que foram felizes no uso sistemático dos contornos modais eclesiásticos, já com seus jargões nossos, dessas referências da rica região nordestina, muitas vezes, tutelada pelo sudeste. É como se Edino vestisse a couraça de vaqueiro e o chapéu que o caracterize como um sertanejo-catarinense, numa caatinga imaginária em seu coração e mente criadora. Mesmo assim, Edino se mantém simples, como um velho amigo do Brasil, em suas idéias (perdoem-me o saudosismo no acento...) que são tão ricas a ponto da obra poder-se estender por mais tempo, e Edino, no entanto, decide encerrar com simplicidade e sinceridade: marcas de personalidade inconfundível.

É lamentável que programas icónicos da televisão brasileira, como o Roda-Viva, por exemplo, nunca tenham pautado entrevistas com nomes da música como Mozart Camargo Guarnieri, José Siqueira, Francisco Mignone, Jamary Oliveira ou Edino Krieger. Ouçam Edino, ouçam o Brasil que há em seu Edino, ouçam-no em inteligência e perspicácia musical! Ouçamo-nos através de suas obras: é esse nosso dever enquanto diletantes, amantes das Artes, e percebamo-nos como apreciadores sinceros dessa nossa Arte própria, por meio desses nossos grandes referenciais.


Sob a marquise, espalhados em trajes maltratados, o homem, a mulher e os filhos. Um pano estirado sobre a calçada. Havia respingos a chora...

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Sob a marquise, espalhados em trajes maltratados, o homem, a mulher e os filhos. Um pano estirado sobre a calçada. Havia respingos a chorar a diminuição do temporal que se abatera sobre a cidade. Comeram um pão dividido entre todos, canecas de alumínio de café frio. As crianças sujas, chorando de fome, não se satisfizeram com o desjejum.

Não tive coragem de me aproximar, mas o dono da pequena loja protegida pela aba da marquise me contou que os deixara ali porque os outros comerciantes os rejeitaram. Muitos protestavam pela falta de higiene, pelas mãos estendidas a pedirem um adjutório a fim de comprarem comida. O dono de um restaurante de beco os servia o almoço (restos de refeições deixadas pelos fregueses).

Fui apenas observador do quadro da miséria real. Eram pessoas humanas, cujas feições externas e internas revelavam uma tristeza, um sinal causticante de escanteados da sociedade, num jogo desolador entre os que possuíam demais e eles que nada possuíam.

No estabelecimento comercial do proprietário que lhes prodigalizara o abrigo sob a marquise pendiam ofertas palpitantes; desde vestuários a bijuterias; um cartaz chamativo na vitrine: o Dia das Mães seria no próximo domingo.

Durante o dia, os ocupantes do território apanhavam os trapos e saíam, a fim de deixar o campo livre para transeuntes e fregueses. Divagavam pelos recantos da cidade, almoçavam os sobejos, perambulavam entre a multidão indiferente. “Domingo é o Dia das Mães” – comentou o pai. Ficou sem eco. A mulher (mãe dos dois pirralhos) perdera, quem sabe, a sensibilidade ou o sentido da data. Sabia que a patroa, quando trabalhava como doméstica, ganhava um mundo de presentes dos filhos ricos. Porém, passado algum tempo, fugira com o atual marido, hoje desempregado; recebera alguns presentes dos filhos, enquanto ele podia. Coisas minúsculas. Mas, com o desemprego, na atual vida que carregavam como fardo, pouco significava a data dedicada às mães.

No segundo domingo de maio, o comércio fechado, dormiram até mais tarde. Ao acordar, deu por falta do marido. Levantou-se rápida, acordou as crianças. (Soube eu, pelo dono da loja, que ele estava preso. Um ladrão: furtara pequena bijuteria. Uma pulseira ordinária para que os filhos dessem à mulher no Dia das Mães). Triste relato para uma festa tão bonita. Ela invocou a Mãe dos Pobres com o braço magro e sem enfeite. Não era o que queria relatar.

Lembrar professor Juarez é uma necessidade da Paraíba, por tudo que ele significa na edificação da história de instituições como a Univer...

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Lembrar professor Juarez é uma necessidade da Paraíba, por tudo que ele significa na edificação da história de instituições como a Universidade Federal da Paraíba, A União, a Fundação Casa de José Américo, o Conselho Estadual de Cultura e a Academia Paraibana de Letras.

Juarez da Gama Batista iniciou sua vida pública como Diretor do Jornal A União, no período de 1951 a 1956. Muito jovem, já não era um desconhecido. Publicara um livro de crônicas, 31 Histórias do Arco-da-velha, reunindo sua colaboração diária em O Norte e na Folha da Manhã, do Recife. Também já era autor do ensaio sociológico Caminhos, Sombras e Ladeiras, de nítida influência gilbertiana.
Sobre este início promissor, vale relembrar o depoimento de José Américo de Almeida: "Eu o achei e foi um achado. (...) Fiz de um menino, quase menino, um chefe de serviço e ele deu conta do recado”.

Em 1961, assume, como fundador, a cadeira de Literatura Brasileira na UFPB. Não tinha formação acadêmica nesta área. Professor Juarez era um bacharel autodidata, de notório saber que, durante vinte anos, até sua morte em 1981, encantou os alunos com seu estilo e sua erudição. Deixou uma produção acadêmica vasta e vária, dificilmente superada, mesmo com os incentivos de pesquisa e pós-graduação que passaram a vigorar na Universidade.

O ensaio foi o seu instrumento de apreciação da literatura. Instrumento eleito, conscientemente, em função das três idéias básicas que caracterizam este gênero, na conceituação moderna: o auto-exercício das faculdades, a liberdade pessoal e o esforço constante pelo pensar original - Ensaio para ele era descoberta. Crítica com letra maiúscula. Criação. Assim, imprimiu ao gênero sua marca pessoal inconfundível: a construção do estilo e a erudição. A ordem valorativa, que a preferência por tal gênero implicava, transparece em sua constante reafirmação "não sou um crítico, no sentido convencional da palavra. Sou um ensaísta".

Ao bem escrever, que se apóia em vasto e vário conhecimento, gostaria de acrescentar, ainda, a ousadia. Essa característica comum a todo criador - atitude sem a qual deixariam de existir o novo e o original foi a marca dominante no seu trato com o texto literário. Possivelmente a que carreia para seus ensaios o maior nível de resistência. Pois neles o mestre Juarez: não tinha medo de ousar.
Descobrindo roteiros impressentidos. Desenvolvendo aspectos, os mais inesperados. Estabelecendo ligações entre pólos infinitamente distanciados.

A erudição propiciava-lhe as condições da ousadia, fazendo-se a autenticidade do estilo sua vigorosa expressão. Forma de uma percepção aguda e original.

Conhecia a força da palavra. Sabia o peso de um período barroco, cheio de travessões, transbordante de elementos. De um período que ocupasse quase uma página inteira. Com igual habilidade explorava os efeitos da pontuação impressionista. Da frase curta e incisiva, do período fragmentário. Por isso é que escrevia e reescrevia seus textos inúmeras vezes. Perseguindo a forma que fosse a expressão do conteúdo. Ou o conteúdo que fosse a expressão da forma. Escrevia como um poeta. Lutando com as palavras.

Deixou mais de 40 títulos publicados, entre crônicas, ensaios, discursos, conferências e prefácios. Com seus ensaios literários, conquistou sete importantes prêmios de 1966 a 1976. Destacando-se, entre eles, o prêmio "José Américo - 1967", da UFPB; o "Olívio Montenegro - 1968", da UFPE; O "Geraldo de Andrade 1973", da Academia Pernambucana de Letras e o "José Veríssimo", da Academia Brasileira de Letras, também em 1973.

Desde que ele se foi para sempre, há quase 40 anos, não se pode afirmar que tenha havido apenas silêncio e descaso em relação a sua memória. Podemos registrar iniciativas que simbolizam outra forma de presença do professor Juarez entre nós.
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Muitas vezes iniciativas individuais, mas também apoiadas por órgãos de cultura.

A FUNESC tomou possível a publicação do esboço bibliográfico Juarez da Gama Batista, (sua vida, seus mistérios, sua obra) de autoria da ex-aluna, Mariana Soares, e deu o nome de Juarez da Gama Batista à Biblioteca do Espaço Cultural José Lins do Rego.

O historiador Wellington Aguiar, através da FUNCEP e buscando o apoio do grupo Klabin, reeditou Caminhos, Sombras e Ladeiras.

O Conselho Estadual de Cultura, por iniciativa de Gonzaga Rodrigues, o incluiu na coleção Biblioteca Paraibana e editou As Fontes da Solidão, ensaios que tive a honra de escolher, organizar e prefaciar.

Em 1995, realizamos (UFPB, API, CEC) um painel em sua memória. Dele participaram os professores Neroaldo Pontes, Chico Viana, Milton Marques, ao lado dos jornalistas Gonzaga Rodrigues e Juarez Macedo, este último apresentando uma bela e emocionada evocação de sua convivivência e aprendizagem com o homenageado.

Na Coletânea de Autores Paraibanos, professor Juarez está presente com o texto antológico O Retrato, selecionado de José Américo: Retratos e Perfis. Fiz constar na Fortuna Crítica de José Lins do Rego, publicada pela Civilização Brasileira, o texto O Mistério, também retirado de José Américo: Retratos e Perfis.

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Outra contribuição que vale ressaltar, nesta avaliação histórica, é a publicação de crônicas e artigos de jornal, alguns destes bem amplos e consistentes, firmando a dimensão do jornalista e do ensaísta em nosso cenário cultural.

O saldo é positivo. O mestre permanece na voz de seus amigos e ex-alunos do jornal e da Universidade.

Os textos que compõem As Fontes da Solidão, nove ensaios escolhidos, revelam, em seu conjunto, a dimensão exata do escritor Juarez da Gama Batista: suas preferências temáticas; a extraordinária erudição; a ampla informação teórica, suporte de seus conceitos criticos; a ousadia de suas interpretações personalíssimas e a construção do estilo, traço maior de sua autenticidade.

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O critério foi dar prioridade ao que estivesse inédito. Era o caso do ensaio Quem Tem Medo De Gilberto Freyre? que, embora vencedor do prêmio Geraldo de Andrade 1973, da Academia Pernambucana de Letras, foi divulgado apenas entre alguns alunos e amigos, em cópias mimeografadas.

Depois, incluímos o que estava disperso em "plaquettes", a forma comumente usada pelo autor para imprimir e distribuir seus estudos. Assim, acrescentaram-se os textos sobre José Lins do Rêgo, de onde foi retirado o título geral para o volume. Não apenas em razão dos grandes laços entre o romancista e o ensaísta, mas por representar esse título uma escolha pessoal de professor Juarez para um conjunto de ensaios que ele não teve tempo de concluir.

Deixamos de lado o que estivesse publicado em livro, presumivelmente, com divulgação e preservação bem mais garantidas. No entanto, fugimos a esse critério para agrupar os quatro ensaios sobre Jorge Amado, dois deles já inseridos na Fortuna Crítica
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comemorativa dos 40 Anos de Literatura, do romancista. É que se encontram interligados pelo desenvolvimento de um mesmo núcleo temático, embora enfocando romances diferentes. E se complementam de tal modo que na sequência em que se dispõem parecem constituir um só ensaio, escrito em quatro tempos. Um grande estudo sobre a segunda fase do romance de Jorge Amado. Não apenas pelas antecipações verdadeiramente proféticas sobre Gabriela e Dona Flor, ou pelas ligações entre arquiteturas infinitamente distanciadas, de cidade e de mulher", nem mesmo pelo processo comparativo onde se exercita a excepcional erudição do mestre Juarez. Mas por divisar o que constitui para essas narrativas sua dimensão verdadeiramente literária.

E para que o conteúdo de As Fontes da Solidão no se restringisse ao âmbito da Literatura Brasileira, o que limitaria a área de interesse do autor, encerramos esse trabalho seletivo com O Protagonismo do Fausto e Matéria e Nunca Ouvido Canto. Este, premiado nacionalmente. Escolhido há muito tempo pela Academia Brasileira de Letras. E o primeiro, por representar a preferência do Mestre entre tudo quanto escreveu.

Um dia lhe fiz essa pergunta. E ele não pensou muito para satisfazer-me a curiosidade. Ainda insisti: E O Real como Ficção em Euclides da Cunha? E A Sinfonia Pastoral do Nordeste?

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A respeito do ensaio sobre Os Sertões, achava excessivo o número de notas. Gostava da Sinfonia. Mas era O Protagonismo do Fausto que continha suas convicções, as coisas em que acreditava. O que mais parecia com ele. Foi o que me disse.

Quer tratasse de Camões, de Goethe, de Eça de Queiroz, de Gilberto Freyre, de José Lins do Rego, de Euclides da Cunha, de Jorge Amado ou de José Américo de Almeida, a perspectiva e o processo sempre o conduziram a uma extrema liberdade criadora.

Desse modo é que, em Matéria e Nunca Ouvido Canto, vai descobrir no tema dos olhos um dos elementos que possibilitam a identificação do "espírito sobrevivente e persistente da Idade Média", no ilustre renascentista português.

"A festa dos sentidos - sobretudo um dos sentidos, o da visão - em que se tomou o cotidiano da Idade Média". Com igual ousadia desenvolveu em O Protagonismo do Fausto a inquieta e inquietante indagação - "Fausto, tragédia ou comédia?" Bem como em Gabriela, seu Cravo e sua Canela estabelece a aproximação ou equivalência entre a personagem romanesca e Brasília. "Arquitetura de cidade e de mulher. Terrível e metafísica solidão". Que, segundo ele, "se explica e se completa em tantas outras expressões do psiquismo traumático da pequena burguesia nacional, comprimida pelas depressões salariais".

Sobre a moça de Ilhéus o ensaísta dirá, de forma antecipada, em 1961: é fácil prever o êxito de Gabriela no cinema e na TV, no "ballet" e até nas histórias em quadrinhos. Um dia, talvez, apareça nos anúncios das revistas ilustradas". Acrescentando que o mesmo se aplicava às personagens que viessem depois. Veio Dona Flor, e a profecia se cumpriu duplamente.

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Uma sólida concepção de arte se vai reiterando a cada novo ensaio. Todos eles sustentados por segura informação teórica. Por uma teoria sedimentada, sintetizada e que, por isso, não transparece ostensivamente, sendo absorvida pela linguagem, pelo estilo do escritor.

Mesmo quando define ou conceitua, a adequação da forma ao conceito preocupa-o tanto quanto a qualidade do enunciado. De modo que escreverá poeticamente - "A obra de Arte é o lapso, o instante que se reteve e se fez inquestionável. Um alto no que se esvai. A instantaneidade. A surpresa. A verdade repentina das suas estruturas. Uma recuperação". Por igual processo, chega em O Barroco e o Maravilhoso no Romance de Jorge Amado à densa e múltipla conceituação do herói picaresco, onde se identificam, a um só tempo, a ousadia, a erudição e a originalidade do ensaísta:

"O anti-herói heroico - não tem em vista nenhuma glória, nenhuma grandeza, nenhuma ambição que não seja a imediata garantia do próximo instante de sua pobre vida deserdada, um caco de vida. Sua perspectiva limita-se, reduz-se, é estreita e minguada, e sua altivez não tem recriminações, nem ostenta esse heroísmo desconhecido de todos: uma obscura, mas palpitante integridade pessoal, somente sua, ninguém a enxerga. Tem alguma coisa, tem tudo de um filósofo estoico. É tudo isso que o qualifica como alta figura humana, pondo-o de pé no meio da assuada, da risada, da esbórnia, dos excessos, das tantas incoincidências das coisas, como um monumento se eleva de dentro do nevoeiro. Sua única reserva de milagre é o tino rápido, ligado, a inteligencia vivissima, ágil, e a verve, o bom humor permanente, além de uma incrível, porém modesta e convicta consciência de superioridade, estímulo para a defesa do seu atual, da sua hora e deste momento (um tanto a Unamuno), e os movimentos de dançarino ou de acrobata, de mágico ou domador de velhas feras, a risada final".

Sempre agiu assim em relação aos temas ou aos assuntos de sua predileção: não transcrevia, não repetia. Buscava sínteses conclusivas que eram somente suas. Muitas vezes em contraste violento com tudo quanto existia. E, assim, fazia da atividade critica uma forma de ser.

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Entre tudo quanto escreveu, quero destacar A Sinfonia Pastoral do Nordeste. Ensaio que, segundo o romancista estudado, "como que foi escrito num canto iluminado, dentro de uma biblioteca lendo todos os livros, ou dentro de um museu olhando para todos os quadros”.

Um caso único em que a leitura suplanta o texto objeto. O seu reconhecimento dos mitos é mais que a descoberta do romance. É uma recriação. O Boqueirão renasce no ensaio, "sem história alguma", com "a natureza de ritual, de celebração de mitos". "O Boqueirão: um corpo de mitos lançados sobre um afresco de inocente e esplêndida fatura renascentista, saudável, irradiante, vencedora. E, por isso, de repente grave e profundo, como quem sabe que passará".

Os ensaios reunidos sob o título de As Fontes da Solidão transcendem a história pessoal de Juarez da Gama Batista. Deixam de constituir apenas a produção particular do indivíduo, para representar a síntese de uma forma de pensamento e expressão configuradora de uma época. Elevando-se, dessa maneira, à condição de memória cultural da sociedade a que pertencem.

Na Academia Paraibana de Letras, professor Juarez ingressou em 1968, ocupando a cadeira que tem como patrono José Lins do Rego. Foi recebido por José Américo que firmou sobre o jovem acadêmico de então esta sentença definitiva:

"Poderão as injustiças negar-lhe todas as qualidades menos que seja um intelectual. Nasceu para as letras, vive para as letras, sonha com as letras. Tanto se espiritualizou, tanto se intelectualizou, que guarda uma aparência de quem levanta voo".

Texto constante do livro Paraíba na Literatura II, publicado pela Editora A União, em 30 de março de 2021

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Recordar: Do latim re-cordis, voltar a passar pelo coração.
(Eduardo Galeano)

Nunca que se imaginou em viver sem abraços! Em tempos de Pandemia, a distância de dois metros é o que dita a regra da saúde e da sobrevivência. Como se não bastasse o medo, a aflição, a tristeza, o tédio, a ansiedade, não temos o abraço. Principalmente aquele que acolhe e que acalma.

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Aprendemos mais com a leitura dos autores do que lendo o que se escreve sobre eles. Antes que alguém me crucifique pela afirmação, eu me explicarei. Há um vício corrente nos cursos de Letras de começar o estudo de um autor pela sua fortuna crítica. Seria compreensível essa atitude na pós-graduação, quando se espera que os mestrandos e doutorandos já tenham uma sólida base de leitura. Não é o caso. Na graduação, então, nem se fala, tendo em vista que, como sabemos, Letras não é o curso dos sonhos nem de muitos que ali se encontram.

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O pescador tem dois amor, um bem na terra, um bem no mar
Dorival Caymmi

Acordava todo dia bem cedinho, ainda escuro. Acendia a lenha do fogão e logo ia fazer o café. Dos dois candeeiros acesos, um deles pendurava n’um punho de rede defronte ao quarto, o claro da chama azeitada e o cheiro de café fervendo eram os chamados de bom dia a seu marido; hora de levantar. Arrastando uma chinela, ainda a calçar, vestia uma surrada camisa de botão que um dia já foi xadrez, hoje é da mesma cor dos farrapos da bermuda; o sol e o sal a queimaram. Sai do quarto, o chacoalhar da cortina feita inteirinha de conchas é o sinal; ele levantara.