casa dos 70 (ao amigo e compadre Luciano morais e outros companheiros que se foram na casa dos 70 anos de idade). a casa dos...
Trouxe o Tejo nas veias
Ao virar a última página do livro “1/6 de laranjas mecânicas, bananas de dinamite” de W.J. Solha , uma frase do bruxo do Cosme Velho, co...
1/6 de Laranjas Mecânicas, Bananas de Dinamite
Vi na internet e juro como vou fazer. É assim: ponha gelo no liquidificador e o triture o quanto possa. Despeje-o, assim pulverizado, num ...
Vou fazer
A noite cai como uma lâmina fria para os tipos esquecidos. A máquina de produzir sonhos agora tem a função decorativa, não é mais ser viv...
Tipos esquecidos
Escrevo de olho numa foto de Antônio David, uma cavalgada de vaqueiros encourados sertão a dentro, preludiando a intrépida batalha do ro...
A pretexto de foto de David
Clic... e surge como um óleo de cores fortes sobre tela que lembra Frans Post, tão exuberante de luz e de força quanto muitas que os pintores holandeses deixaram, nos meados do 1600, para fazer o que David faz neste século exageradamente fotográfico.
Dizem que o pincel de Post não era bom de closes. Nisto, era superado pelo seu parceiro Albert Eckhout, que carrega de rubro os rostos, se excede nos gestos, no detalhe do comportamento ou no tumulto de músculos e de força dilatados num lance extraordinário de dança canibal.
A Astier Basílio, enfrentando com denodo o frio e os escritores russos Raskólnikov procura uma taberna, experimentando a novidade de ...
Pureza, limpeza ou asseio? – A tradução como um processo
Hitler imaginou um Terceiro Reich de Mil Anos. Durou doze. Francisco, il Poverello d´Assisi : O Pobrezinho de Assis - , ao voltar da...
A caixa preta
Hitler imaginou um Terceiro Reich de Mil Anos. Durou doze.
O Pobrezinho de Assis - , ao voltar da peregrinação à Terra Santa, deu com sua ordem religiosa burocratizada, dotada de cofres-fortes e arquivos. Perdera-se o fundamental voto de pobreza e o despojamento absolutos que pretendera estabelecer.
'Vô' Genésio! Lembro que passei várias vezes debaixo do caixão dele. Literalmente um rito de passagem, ou apenas o melhor caminho...
História de família
Lembro que passei várias vezes debaixo do caixão dele. Literalmente um rito de passagem, ou apenas o melhor caminho que encontrei para transitar na sala lotada. E numa dessas idas e vindas alguém me ergueu para vê-lo pela última vez. Acho que era uma tentativa de explicar para um menino de 7 anos o que estava acontecendo.
Lembro bem do seu rosto sereno, pletórico e com um discreto sorriso, ele estava seguro de encontrar um bom lugar do "outro lado".
Minha rua não tem o esboço da tradição, mas é minha rua. Sou estrangeira de cinco anos para cá no lugar onde moro. Desde às cinco da manhã...
O cotidiano da minha rua
Como seria bom se pudéssemos apagar da História a noite do dia 09 de novembro de 1938. Nessa data se iniciou a onda de agressões contra ju...
A noite dos cristais quebrados
Os pabulosos dirão que a melhor maneira de começar o dia é fazendo sexo. Isso é coisa de cinema. O casal acorda e sem escovar os dentes, s...
A melhor maneira de começar o dia
Uma visita às raízes sempre alegra a alma, porque a identificação com as características dos antepassados, justifica a vida, na contínua t...
Raízes soltas
Todo homem público, gente de todos os poderes, deveria passar pelo menos uma temporada andando a pé e de ônibus — inclusive em dia de agua...
Revolução pelo voto
Faz bom tempo, um confrade andou perguntando “quem é esse Castro Pinto?”. Nessa mesma quadra, o prefeito de Bayeux cogitava de mudar a de...
Voltando a Castro Pinto
Mas gravei seu nome desde que li a “Epítome de História da Paraíba”, escrita por um dos filhos ilustres de Alagoa Nova, Manuel Tavares Cavalcanti, “mandada escrever na Administração do Exmo. Snr. Dr. João Pereira de Castro Pinto”. Nisto fui precoce, li nas férias de 1946 na biblioteca local, sem ninguém que me afirmasse onde caía a tônica da tal epitome
No dia 10 de novembro de 1891, o mundo da poesia ficou mais triste. Aos trinta e sete anos, Arthur Rimbaud encerrou sua temporada de poe...
Rimbaud, 130 anos depois
Triste sina de poetas que nem na morte como tal são identificados. As vezes na lápide se faz constar com esse nome. Nem sempre! Mas de Rimbaud ficou a imagem de um poeta genial, construtor de uma poesia irrefutável. Poesia que sempre será reconhecida, e novas gerações vão lembrar dele pela sua dimensão de qualidade inquestionável.
Quando Giovanni Boccaccio escreveu “O Decamerão”, a história dos jovens cercados, sitiados, pela desolação provocada pela peste que matara...
Tavares: um flaneur sobre uma cidade sitiada
Quando Flavio Tavares, em sua casa sitiada pelo vírus, se isola ele conta, para si mesmo (e para o possível futuro espectador), muitas das nossas histórias também. Do nosso momento. E utiliza as mídias para mostrar seu processo artístico. E regista suas narrativas para que hoje possamos também olhar a cidade, o país, o mundo em um momento de pandemia, em uma época de nossa história, que só com muito humor e ironia podemos suportar no isolamento do claustro de cada um, no contexto de uma peste agora global.
A partir de seu olhar de artista ele ilustra nosso momento político desesperador, obscurantista, em contraposição à cenas de sua memória de infância. Ele nos fala de sua mitologia pessoal baseada no inconsciente de uma cidade onde seu olhar se habituou a mergulhar como flaneur de seus próprios mitos , sonhos e pesadelos. Ele nos aponta o caminho desse espaço/ cidade/mundo que ele elegeu como fonte de pesquisa e vivência. Gabriel Garcia Marques criou sua Macondo, Tavares sua Parahyba (com y). Os dois a viam fantástica em suas situações mais banais tornadas ora sublimes, ora surreais.
Como nos diz Saramago: “Se podes ver, repara!” Porque pode ser grande a diferença para um artista entre ver (associado ao sentido físico, biológico da visão) e olhar que implica em uma apreciação demorada, profunda, interrogativa, poética e política.
O ato de vasculhar memórias e sensações é o produto de uma luta constante contra a anestesia do próximo minuto, do próximo ano... Em um contexto de apatia política e existencial onde a clausura de cada um de nós interrompeu bruscamente a velocidade das imagens própria de nossa sociedade de consumo, de nosso cotidiano pleno da superficialidade das percepções Flavio se torna o seu cronista que, sitiado, analisa o mundo distante e a si mesmo.
Flaneur de almas, Flavio Tavares passa horas dirigindo seu tempo a registrar os nossos e os seus fantasmas com uma imaginação que atravessa telhados, paredes ou muros que venham a deter o seu olhar sobre ladeiras, becos , ruas, praças, quartos e quintais da cidade de Nossa Senhora das Neves. Nasce uma cidade surreal sobre a qual podia nos falar Aragon: “Nossas cidades são assim, povoadas por esfinges desconhecidas que não detêm o passante sonhador” A cidade de Flavio é território da memória, da fantasia e da história mesmo que ora esta seja contada por cegos ou surdos. Assim, ele atua como demiurgo aproximando deuses e homens, anjos e gente... no seu universo fantástico onde cria humanos híbridos, personagens trágicos ou satíricos que provocam dor ou riso pelo conhecimento ou pela tristeza. Nunca a indiferença.
Esses registros do inconsciente da cidade (e do mundo pois que uma cidade é um mundo, um pequeno povoado é um universo) se espalham em telas, papeis, pedras, madeiras, enfim, em todos os suportes que o artista possa tomar emprestado para contar suas histórias, as nossas histórias. Elas estão também espalhadas pelas paredes criadas por Flavio em seu claustro, na instalação que ele nos apresenta hoje presencialmente para que com ela possamos interagir.
A pandemia o isolou, mas não deteve o seu olhar. Do claustro pessoal ele continuou a fazer o retrato cultural de uma sociedade que migra de uma democracia doente para uma possível teocracia iconoclasta onde não há lugar para as imagens do artista, mas para todas as inquisições que vêm a reboque. Boccacio saía do medievo... nós, parecemos entrar.
Talvez por isso, para nos tornar cumplices de suas visões ele seduz o espectador que também é personagem de suas histórias. Aos poucos ele nos faz abandonar a posição de simples observador e a mergulhar no realismo fantástico de suas cenas. E sentimos então (ou não) o quanto a arte (como nos lembra Frederico Morais) além de armar o braço é, ao mesmo tempo, o mais confessional dos meios, diário intimo, eletrocardiograma, rebeldia travada no meio da noite: solitariamente. Obrigada Flavio pelo espelho que você coloca em frente ao nosso rosto.
Obrigada Flavio, por esse espelho.