Um dos mais longevos, em escala planetária. É o que se pode dizer do noticioso que começou, em 1935, com o título de “Programa Nacional”, ganhou, três anos depois, o nome de “Hora do Brasil” para hoje se manter no ar como “A Voz do Brasil”. Desde Getúlio Vargas até agora, as transmissões somam 90 anos e dão-se, ininterruptamente, das segundas às sextas-feiras. Minto, houve uma breve interrupção: aquela ocasionada pela tomada das nossas ruas
Que bom! Johnny Mathis está vivo. E ainda canta “Misty”. Consegue fazer isso no mesmo tom e com a voz suave dos inícios de 1960. Eu o reencontrei por acaso durante o mais recente dos meus costumeiros passeios pela Internet. Estava lá, à frente de um fundo escuro, o homem agora calvo e enrugado, o ser alquebrado e irreconhecível, não fora pelo talento espantoso, pela canção que eternizou
e pela maciez do timbre imaculado, espantosamente, no transcurso das décadas.
Johnny vai para os 90 anos, a serem completados em setembro. Acreditem: aquela garganta de menino ainda sustenta os agudos de outrora com a naturalidade do primeiro choro, aquele dos recém-nascidos incomodados com a aspereza da existência fora do ventre materno. O bom e velho Johnny canta sem esforço e sem que as veias engrossem no pescoço, ao que observei da interpretação a mim chegada por acaso, via YouTube, sem que eu a buscasse. Anotei a postagem: 18 de janeiro de 2025. Eu soube que ele anunciou a aposentadoria em março passado. Mas está vivo e ainda consegue cantar, maravilhosamente, ao menos no banheiro.
Como eu estava precisado de “Misty”. Não em suas diversificadas versões, algumas com o carimbo de monstros sagrados do cancioneiro internacional, mas com a voz de veludo de Johnny, a voz da minha juventude, a das minhas aspirações, a dos meus sonhos.
Minha precisão tinha e tem as dores do tempo. Por um momento, ouvindo aquilo, escapei das aflições dos povos e das que, somente minhas, hoje carrego. Fui às nuvens naqueles acordes. Ali, não me alcançavam os males que a idade me trouxe nem as desavenças e confusões do planeta à beira, mais uma vez, da catástrofe em larga escala.
A nuvem em que me dependurei me levou ao passado e me fez pousar numa estradinha emoldurada por coqueiros. Ao sabor do vento, segurei a mão daquela que me daria três filhos. Estávamos jovens. Ela mais segura de si.
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Eu, desamparado e confuso feito filhote de gato numa árvore, tal como descrito no primeiro verso da bela canção.
Mergulhos no passado dão nisso: na confusão de imagens, na mistura de memórias. “Misty” também põe diante de mim amores adolescentes, alguns com vozes de violinos, novamente, como nos versos compostos por Johnny Burke para a melodia do pianista Erroll Garner, criada em 1954. Eu estava, então, longe da idade para as mãos dadas com aquelas que por mim iriam passar e com a que me reteria, por um golpe de sorte, para a satisfação e a quietude da alma. Nosso Johnny gravou essa música em 1959 e dela se fez o melhor intérprete, ao que entende meu coração bobo.
O octogenário de agora ainda alimenta dúvidas juvenis. Uma delas diz respeito aos que se dedicam a agravar a agonia da raça humana, a fazer deste mundão de Deus um lugar de padecimento e expiação, como o fazem os promotores das discórdias e das guerras. Os tiranos ouvem música? Sabem cantar? É o que ainda me pergunto.
Quero crer em que divido com muitos dos meus semelhantes esses mesmos incômodos. Ora têm dimensão planetária ora decorrem dos aperreios cotidianos feitos de desesperanças, enfermidades, desconfortos. Se assim for, recomendo-lhes um cantinho numa nuvem para o sossego do espírito. Escolha cada um o meio de transporte para a fuga momentânea e indispensável dos problemas individuais,
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ou coletivos. Nem precisa ser “Misty”. Basta a música de cada agrado desde que contenha poema e notas suficientes para o deleite e a elevação.
Não custa insistir na necessidade dos voos para recantos onde more a paz, ou a saudade. Dorothy Gale queria voos de passarinho. Desejava pairar bem acima das chaminés, além do arco-íris. Por falar nisso, a canção “Over the Rainbow” somente não foi excluída da trilha de “O Mágico de Oz”, porque Arthur Freed, o produtor associado, fincou pé no studio da MGM, nos idos de 1939: “A música fica, ou eu vou embora”, ameaçou. Ganhou a briga para sorte dos compositores Harold Arlen e Yip Harburg, o letrista. Quem diria que o número de assinatura da jovem atriz Judy Garland se tornaria, em 2021, “a música do Século 20”, assim escolhida em pesquisa conjunta do National Endowment for the Arts e da Recording Industry Association of America?
É como digo. Cada um pode escolher a forma de escape dos problemas diários. “O desejo infantil de escapar, ou fugir, é uma universalidade”, leio isso em texto assinado por Gary Shapiro para boletim da Universidade de Columbia. A sentença é por ele atribuída ao professor de música Walter Frisch, autor do livro “Arlen and Harburg’s Over the Rainbow”.
Burt Howard quis ir acima do ponto desejado pela pequena Dorothy. Johnny Mathis, em meio à profusão de intérpretes consagrados, também cantou seus versos. Frank Sinatra, em 1964, os associou (sem a menor graça, digo eu) às missões Apollo à Lua. Refiro-me a “Fly me to the moon”, outra peça icônica.
Desta vez, a mão da pessoa amada serviria à fuga para as estrelas e para ver como a Primavera se mostra aos apaixonados, em Jupiter e Marte. Prefere você ver um filme, ler um livro? Tudo bem, que assim seja. Quanto a mim, neste exato momento, valho-me de Johnny Mathis, há pouco reencontrado. Felizmente, ele ainda está vivo. E canta “Misty” em palcos que podemos reprisar quando voar for preciso.
Até Francisco ajudou. Ele mesmo, o saudoso Jorge Mario Bergoglio. A verdade é que sua Encíclica Laudato Si (Louvado Sejas) também inspirou a determinação jurisdicional no sentido de que a Superintendência de Administração do Meio Ambiente, a paraibana Sudema, inclua a proteção do patrimônio cultural em suas ações ordinárias de fiscalização.
O jovem Rubens Nóbrega pegou-me pela mão e conduziu este seu amigo mais velho pelas esquinas do tempo, com o perdão de Nelson Coelho, dono da expressão. Li o seu “Memórias do Batente” de um fôlego só e nele refiz percursos ao longo de anos e anos de vida profissional. Atuamos juntos sob o mesmo teto na fase mais curta da nossa convivência. Inicialmente, com o abrigo da velha A União, escola para a minha geração, a dele e a de nomes do jornalismo surgidos antes e depois daquilo que aprendemos e fizemos.
Não apenas me disseram onde eu encontraria aquele infeliz, mas, ainda, que mesa de bar ocupava. Éramos jovens quando, felicíssimo, com um riso de orelha a orelha, ele me fez conhecer a posterior razão do seu padecimento: uma morena bonita com olhos de onça. Ninguém, antes nem depois dela, causou-me tão má impressão no ato das apresentações.
Acho que aqueles dois começaram a se imprensar na janela de Seu Severino por volta de 1958, o ano da primeira conquista brasileira de uma Copa do Mundo. Compunham, então, o agrupamento de televizinhos para a audiência de jogos filmados, enlatados, despachados e exibidos, somente dias depois de ocorridos, num momento em que a tecnologia ainda não oferecia ao mundo os satélites de comunicação nem as redes de tevê para transmissões ao vivo.
Quando eu nasci, o Brasil fazia sua última declaração de guerra contra uma nação soberana, não por minha causa, é claro. Assim o fez por meio do Decreto Presidencial nº 18.811, de 6 de junho de 1945, dia do meu primeiro berro. Acho que o Japão, de quem hoje abrigamos a maior colônia nipônica fora da Ásia, não ligou muito para esse decreto então assinado por Getúlio e dez dos seus ministros. Tinha mais com que se preocupar.
Nas invasões de longa duração, invasores e invadidos acabam por adotar, uns dos outros, um tanto de seus costumes, suas línguas e suas almas. A história tem uma enormidade desses casos. Há quem garanta, por exemplo, que a Guerra dos Cem Anos levou a França a incorporar manifestações dos ingleses como a quadrilha, dança de salão assim denominada porque inicialmente composta por quatro casais. E em espaços quadrados, acrescem outros pesquisadores. Estamos a falar do Século 13 e de narrativas disseminadas, hoje em dia, desde os centros acadêmicos até as páginas de jornais e revistas.
O recente transcurso do 160º ano do nascimento de Epitácio Pessoa, ocorrido em 23 de maio, é o que me traz essa história. Pois bem, dez anos atrás, quando do sesquicentenário do homem, uma mensagem caía no meu celular. Nela, o procurador geral do Ministério Público de Contas da Paraíba Marcílio Franca (em viagem, então, à Europa) pedia-me para reservar um exemplar do Jornal da Paraíba contendo entrevista na qual eu tratava de uma pesquisa sua e do artigo que ele havia produzido, ainda em 2007,
Culpa de Flash Gordon, o herói dos quadrinhos criado em 1934, sem que eu sequer existisse, pelo escritor Don Moore e pelo ilustrador Alex Raymond para as edições impressas abastecidas pelo King Features Syndicate, o studio americano. A ideia era suplantar a popularidade das tiras de Buck Rogers. E a suplantaram.
Soledade, minha avó paterna, costumava anotar em caderninhos de capa dura acontecimentos de grande importância na vida da família. Carminha, a filha mais velha, saiu à mãe, de quem também guardou parte daquelas anotações. Em alguns casos, deu continuidade a episódios interrompidos pela morte dolorosa, inaceitável, da dona dos cadernos.
Pego o trem com Ascenso Ferreira. Um comboio com percursos e vagões sujeitos à baldeação. O dele no rumo de Catende. O meu, no da infância que um dia tive. Mas tudo com começo no mesmo trilho com as mesmas paisagens e com a mesma vontade de chegar.
O segundo filho me ligou com a informação: “Pai, estão calçando minha rua”. Mora no bairro do Aeroclube, encostado ao de Manaíra, onde eu e a mãe dele mantemos, há sete anos, a cama e as tralhas. São áreas que se desenvolvem e se verticalizam em rapidez espantosa. Em Manaíra, às margens do Retão – Avenida Flávio Ribeiro Coutinho, para os menos íntimos – erguem-se três Shopping Centers num trecho de um quilômetro. O maior e mais antigo deles está para ganhar mais cinco pavimentos e toma o nome do bairro que detém a maior vocação empresarial de João Pessoa.
“Já cortou cabelo com mulher?”, perguntou-me o amigo de quem não revelo o nome em respeito a seu estado de espírito. O segundo casamento lhe vai de mal a pior. Com cuidado, medindo as palavras, respondi “poucas vezes”. É que pressinto sua carência de toques femininos, mesmo os de forma honesta, decente, corretamente profissional.
Quanto durou o ministério de Cristo, ou seja, seu tempo de pregação, exorcismos, curas e outros milagres? Fiz a pergunta ao Google e ele me encaminhou para Lucas, o pagão convertido ao cristianismo pelo apóstolo Paulo.
Ambos se conheceram pela Internet, para espanto meu. Um espanto que eu não teria se antes soubesse o quanto são corriqueiros os relacionamentos amorosos por tal modo iniciados. Hoje em dia, assim me contam, os sites de namoro existem em número que, de tão grande, ocasionou a criação de consultorias destinadas a cada avaliação por peritos na matéria.
Não. Não falo da Laura cantada por Chico e Francis Hime. Aquela que será loura como as Claras. Será moura como as Mauras. Será ruiva como as Rosas, ou Cecílias, ao que prenunciam os avós Francis e Olívia, seus compositores. Nem falo da Lady a quem, em sua aflição, Roberto pediu: “Me leve para casa, me abrace forte, me cante outra vez”.
“Casalzinho lindo”, observava, costumeiramente, dona Tereza, a costureira. “Esses dois nasceram um para o outro”, profetizava dona Alta, viúva de grande intimidade com os santos e os ritos católicos pois fabricante das hóstias que iam à boca e ao espírito daquele povo. Eu e parte dos meus amigos, por volta dos 10 ou onze anos, comíamos aquelas sobras. Tinham gosto de farinha crua e não se prestavam à mínima comunhão enquanto não merecessem as bênçãos do vigário nem entronizadas fossem no nicho do
Tem o nome da mãe de Cristo e desta possui, ainda, um toque de brandura. Aos que por sorte estão na sua lista de relacionamentos, via Internet, nunca faltam suas expressões de carinho, suas palavras ternas. Não se furta ao comentário elogioso a quase tudo que lê neste e noutros espaços, mesmo quando isso não mereçamos.
Liguei para o conselheiro aposentado Luiz Nunes com o propósito de checar informação relacionada à origem do Tribunal de Contas da Paraíba, um dos três últimos organismos do gênero criados no País. Pediu-me ele, então, que fosse à sua casa para a conversa frente a frente. Entendo que, rumo aos bem vividos 91 anos de idade, faltem-lhe jeito e paciência para tratos mais longos ao telefone.