Para nossos poucos conhecimentos sobre técnica de composição e linguística, a arte de traduzir parece ser uma das atividades literárias mais complexas. Escrever bem, já o é. Ainda que prazeroso, quando conta com a ajuda da inspiração — ferramenta capaz de fazer com que a imaginação e o conhecimento fluam à linguagem de forma tão pura e cristalina quanto a sinceridade de quem a escreve.
Na tradução, entretanto, a mudança de idioma pode acarretar, vez por outra, algumas distorções, até mesmo na essência do conteúdo. Traduzir poesia é muito mais complexo. Pois como é difícil manter a estrutura métrica e a rima, com mínimo rigor, ao se traduzirem poemas para outra língua...
O professor Milton Marques Júnior, apesar de se dizer humildemente “amador” na poesia, o que não é verdade, demonstra possuir domínio extraordinário em suas traduções. Traduções que consistem em obras concebidas não apenas em outra língua, mas em nova estética formal, preservando-lhes o espírito poético, como alma que reencarna, sem perder as singulares características de sua individualidade. Tais como as admiráveis transcrições musicais que grandes compositores escrevem, transformando óperas e sinfonias em obras para piano ou vice-e-versa.
Todo este magnífico poema é uma ode à Primavera como estação sensual, prenhe de luz e vida, como está sintetizado neste parágrafo do livro de Milton Marques - “Peruigilium Veneris, uma sagração erótica à Primavera” (Tradução, Estudo e Glossário):
“A primavera como estação purpúrea está em sintonia com o nascimento de Vênus e o derramamento de sangue de Uranos, cuja morte é para que todos os não-nascidos, que se encontram no seio da mãe-terra, Gaia, possam vir à luz e viver. Assim é a metáfora da primavera, criada pelo autor do Peruigilium: a semente que se encontra no seio da terra e as plantas que se fecham, durante o inverno, para conservar sua seiva, germinam e renascem na primavera, em colorido exuberante, diferente do tom cinza da estação anterior."
Saudemos, portanto, a estação de cores que esta noite se inaugura. A primavera que nos traz de volta os abraços, dantes suspensos. A primavera que volta a sorrir nos rostos sem máscaras, na vida que segue, no aperto de mão, no embalo dos sonhos que se renovam.
Nature Uninterrupted
Que belas as margens do rio possante,
Que ao largo espumante campeia sem par!...
Ali das bromélias nas flores doiradas
Há silfos e fadas, que fazem seu lar…
E, em lindos cardumes,
Sutis vaga-lumes
Acendem os lumes
P'ra o baile na flor.
E então - nas arcadas
Das pet'las doiradas,
Os grilos em festa
Começam na orquestra
Febris a tocar...
E as breves
Falenas
Vão leves,
Serenas,
Em bando
Girando,
Valsando,
Voando
No ar!...




















