Mostrando postagens com marcador Milton Marques Júnior. Mostrar todas as postagens

A expressão é de Eça de Queirós, vinda da boca do Raposão, o personagem Teodorico Raposo, de A Relíquia . Ao sentir-se impelido ao óc...

revolucao bichos george orwell totalitarismo
A expressão é de Eça de Queirós, vinda da boca do Raposão, o personagem Teodorico Raposo, de A Relíquia. Ao sentir-se impelido ao ócio luxurioso, vinha-lhe a expressão que sintetizava as ações que se seguiriam – “Caramba, vou fartar o bandulho!”. Ela veio-me à cabeça, olhando os livros expostos na Livraria Bertrand, aqui em Coimbra. Os olhos bateram de relance em um dos títulos e depois retornaram para a certificação do que haviam captado: A quinta dos animais.

No Nono Bolsão do Oitavo Círculo do Inferno , da Commedia de Dante, estão os semeadores de discórdia, num desdobramento do Bolsão an...

No Nono Bolsão do Oitavo Círculo do Inferno, da Commedia de Dante, estão os semeadores de discórdia, num desdobramento do Bolsão anterior, onde se encontram os maus conselheiros, estabelecendo não só uma ligação entre os dois sítios, como uma completude do assunto, tendo em vista que os maus conselhos visam, na sua origem, a semeadura da cizânia.

“Como são perfeitas as pessoas que não conhecemos!” Esta frase de Millôr Fernandes é, em todos os sentidos, irretocável, a começar ...

idolos idolatria
“Como são perfeitas as pessoas que não conhecemos!” Esta frase de Millôr Fernandes é, em todos os sentidos, irretocável, a começar pela ironia que a reveste. Não consigo conceber como pessoas adultas se entregam à exaltação desmedida e à idolatria de políticos, artistas, jogadores de futebol, dos ditos influenciadores et caterva.

A frase parece contrariar o juízo crítico que afirma devermos nos distanciar do objeto para vê-lo melhor e, assim, procedermos a uma análise, o mais possível, isenta. Mas só parece, porque, na realidade,
idolos idolatria
a aproximação e a vivência diária com alguém é o que vai nos dar uma visão mais verossímil de quem ela é. Acredito que é nesse ponto que entra a alegoria platônica do Anel de Giges, que se encontra na República (359b-360d), expressando um problema mais moral do que filosófico: se você tivesse o dom de ficar invisível, o que você faria? Estando invisível, suas ações seriam condizentes com o que você prega, estando à vista de todos? Com relação ao elenco das pessoas idolatradas, no início deste texto, a convivência diuturna é absolutamente desnecessária, tal é o distanciamento entre palavra e ação.

Saí da Praça São Pedro, pela Via da Conciliação ( Via della Conciliazione ), para fazer o lungotevere , o caminho ao longo do rio Tib...

roma ara pacis augusto anjos
Saí da Praça São Pedro, pela Via da Conciliação (Via della Conciliazione), para fazer o lungotevere, o caminho ao longo do rio Tibre, em direção ao Mausoléu de Otávio Augusto César, no Campo de Marte. O percurso é longo, mas o passeio é agradável, por baixo da sombra aprazível dos plátanos, no calor de 38 graus do verão romano.

Meu querido Davi Lucena, saudações Conimbrigenses. Começo abrindo um parêntesis, para me referir a uma reclamação bem-humorada do n...

coimbra lingua gramatica
Meu querido Davi Lucena, saudações Conimbrigenses.

Começo abrindo um parêntesis, para me referir a uma reclamação bem-humorada do nosso amigo comum, o escritor Hélder Moura, que me disse eu ter abandonado o coimbrão, para abraçar o conimbrigense. Estou apenas sendo fiel a esta milenar cidade, de origem romana, Conímbriga, cujas ruínas se encontram em Condeixa-a-velha, a 18 km de onde nos encontramos.

Para a cura de doenças, principalmente das partes pudendas, deve-se aplicar “o sumo de consólida, milagrosa e já referida planta qu...

brasil brasilia democracia bobo corte
Para a cura de doenças, principalmente das partes pudendas, deve-se aplicar “o sumo de consólida, milagrosa e já referida planta que dá para tudo e não cura nada”. É o que diz Saramago, em Memorial do Convento, referindo-se aos fitoterápicos aplicados aos pobres, mas sem qualquer eficácia. Não vejo definição melhor para a democracia no Brasil. A democracia ainda não morreu, mas se encaminha ladeira abaixo para a hora final,

Aos amigos Astenio Cesar Fernandes e Manoel Jaime Xavier Filho, pelas fecundas conversas semanais sobre Dante e Literatura. É muito ...

dante divina comedia
Aos amigos Astenio Cesar Fernandes e Manoel Jaime Xavier Filho, pelas fecundas conversas semanais sobre Dante e Literatura.

É muito difícil destacar algo dentro da excepcional narrativa épica do Inferno, primeira parte da Commedia de Dante, dita Divina, a partir da classificação de um de seus mais fervorosos leitores e apreciadores, o escritor Giovanni Bocaccio. É difícil porque tudo é de suma importância e de grande beleza poética, a que se aliam os ensinamentos vários que ali se encontram e se sucedem. Gostaria, no entanto, de destacar três momentos, que são semelhantes, mas que guardam diferenças entre si, pelo contexto exterior à narrativa a que estão ligados.

Meu Bom Evandro, velho Druzz de guerra, Gostaria de valer-me de sua erudição e das valiosas informações que você tem guardadas e...

biblioteca livro antigo turba togata
Meu Bom Evandro, velho Druzz de guerra,

Gostaria de valer-me de sua erudição e das valiosas informações que você tem guardadas e acessíveis, seja na sua prodigiosa memória, seja na sua inimaginável e borgeana Biblioteca física.

Carta a José Nêumanne Pinto Meu amigo, José Nêumanne Pinto, muito bom dia! No dia do seu aniversário (18 de maio), dois motivos me ...

mafra portugal
Carta a José Nêumanne Pinto

Meu amigo, José Nêumanne Pinto, muito bom dia!

No dia do seu aniversário (18 de maio), dois motivos me impelem a não esquecer o amigo. O primeiro é parabenizá-lo por mais um dos muitos outros anos que você haverá de passar ao lado de sua muito amada família, Isabel e Arthur; o segundo é José Saramago, de que somos ambos leitores fiéis. Não se admire o amigo, pelo fato de o grande escritor ser um dos provocadores dessa minha efusiva lembrança. A razão é um tanto incidental, mas de grande importância, ao menos para mim,

“O padre triste perguntou-me o meu nome, que eu pronunciava Tedrico . O outro, amável, mostrando os dentes frescos, aconselhou-me q...

coimbra portugal
“O padre triste perguntou-me o meu nome, que eu pronunciava Tedrico. O outro, amável, mostrando os dentes frescos, aconselhou-me que separasse as sílabas e dissesse Te-o-do-ri-co.”

O parágrafo que abre este artigo foi retirado de A Relíquia (Edição crítica de Carlos Reis e Maria Eduarda Borges dos Santos, Lisboa, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2021, p. 84), uma das mais importantes obras de Eça de Queirós (1845-1900).

Carta a Tarcísio Pereira Meu caro Tarcísio Pereira, por indicação sua, fiz uma visita ao Panteão Nacional de Lisboa , instituição mon...

lisboa roma paris panteao
Carta a Tarcísio Pereira

Meu caro Tarcísio Pereira, por indicação sua, fiz uma visita ao Panteão Nacional de Lisboa, instituição monumental cuja existência, confesso, ignorava completamente. Conhecia o Pantheon romano, erigido por Marco Agripa, general de Augusto, e o Panthéon francês, em Paris, construído para ser o templo da República, cujo braço forte era a poderosa Convenção Nacional, consequência da Revolução Francesa.

Um grande jornal publica uma matéria de página inteira, com dois artigos, sobre a situação da educação. O título da matéria é “Formação...

macron politica caricatura
Um grande jornal publica uma matéria de página inteira, com dois artigos, sobre a situação da educação. O título da matéria é “Formação dos professores: imprecisões persistentes”, tendo como subtítulo “Uma remuneração mais baixa do que a anunciada pelo Presidente levanta novas críticas”. Além da matéria com chamadas críticas a uma situação não menos crítica, há uma charge ótima, mostrando dois personagens, deliberadamente desenhados pequenos, na amplidão do majestoso espaço dos gabinetes de palácio. Um homem e uma mulher. A mulher, que está com a palavra, dirige-se a um homem com as mãos para trás, em atitude desalentadora, para dizer o óbvio, que ninguém consegue ver: “O mais incrível em tudo isso é que ainda há universitários para crer que nossos anúncios serão seguidos por atos”, com ênfase no advérbio ainda.

Quanto mais lemos o Novo Testamento , particularmente os Evangelhos, mais nos convencemos de estar diante de uma excepcional alegor...

cristo evangelho
Quanto mais lemos o Novo Testamento, particularmente os Evangelhos, mais nos convencemos de estar diante de uma excepcional alegoria. Para explicar o que dizemos, partiremos de dois pressupostos que, aparentemente, se opõem. O primeiro é que tudo o que foi relatado pelos quatro evangelistas – Mateus, Marcos, Lucas e João – é a mais pura verdade, devendo ser entendido como ali se encontra.

Até o Canto XI, o inferno descrito por Dante é de estrutura simples, se comparado ao restante da narrativa, embora as condenações e pun...

dante divina comedia gustave dore
Até o Canto XI, o inferno descrito por Dante é de estrutura simples, se comparado ao restante da narrativa, embora as condenações e punições vão se agravando, do início até ali, testemunhadas pelos dois poetas-personagens, no seu percurso por seis círculos do Inferno. É no Canto XI, a caminho do Sétimo Círculo, que Virgílio explica a Dante, a complexa geografia do Inferno, a partir da qual os círculos restantes serão mais estreitos, tendo em vista a estrutura cônica do Inferno, mais apinhados de condenados e com condenações mais pesadas. O Sétimo Círculo, por exemplo, é dividido em fossas

Os leitores devem conhecer os personagens de Gil Vicente, no Auto da Lusitânia (1531-32), o rico mercador Todo o Mundo e o pobretã...

gil vicente poesia
Os leitores devem conhecer os personagens de Gil Vicente, no Auto da Lusitânia (1531-32), o rico mercador Todo o Mundo e o pobretão Ninguém, que se encontram e dialogam, sendo ouvidos por Dinato e Berzebu, dois demônios, encarregados de fazer a Lúcifer o relato do que as pessoas buscam. Seguindo a tradição, pois Drummond fez uma recriação da cena, eu também resolvi recriar alguns diálogos.

As pesquisas são catastróficas para o governo, pois nada parece dar certo para um governo que prometeu se reinventar, mas não consegu...

As pesquisas são catastróficas para o governo, pois nada parece dar certo para um governo que prometeu se reinventar, mas não consegue entregar o novo mundo anunciado. A razão? Ele se recusa a ver os fatos, que estão escancarados à sua frente:

O que Cristo escrevia? As pessoas em redor, em grande burburinho, agitadas, com pedras na mão, apontavam para uma pobre mulher, acusa...

mulher adultera jesus evangelho
O que Cristo escrevia? As pessoas em redor, em grande burburinho, agitadas, com pedras na mão, apontavam para uma pobre mulher, acusada de adultério, caída, coberta pelo opróbrio, e Jesus Cristo, demonstrando uma tranquilidade que não se coadunava com o momento, escrevia na areia. O que ele escrevia? Não se sabe. Ninguém sabe. Não restou uma frase, uma palavra. Não restou uma letra sequer. Por que em momento tão grave,

Estivemos em Braga, no final de semana passado (22-24/03), em casa de amigos brasileiros, que nos receberam muito bem. Conversa boa,...

braga portugal imperio romano
Estivemos em Braga, no final de semana passado (22-24/03), em casa de amigos brasileiros, que nos receberam muito bem. Conversa boa, regada a um bom vinho e bem apascentada com excelente comida e passeios por essa cidade aprazível e florida, apresentando em cada canto e recanto a sua herança histórica e cultural.

O poeta Marco Valério Marcial (42-102) é quase desconhecido do grande público atual, à exceção dos que são da área de estudos clás...

roma antiga marco valerio marcial
O poeta Marco Valério Marcial (42-102) é quase desconhecido do grande público atual, à exceção dos que são da área de estudos clássicos, mais especificamente, conhecedores da literatura latina. Marcial, no entanto, é um dos mais importantes poetas de todos os tempos, por uma série de singularidades. Tendo saído de sua terra natal, Bílbilis, no sudeste da Espanha, Marcial foi tentar a vida em Roma. Ali chegando no ano 65, foi abrigado pelo filósofo, tragediógrafo e epigramista Sêneca,

Sempre que me refiro à linguagem científica de Augusto dos Anjos, há pessoas que me perguntam sobre a possibilidade de desatualização ...

augusto anjos quimiotropismo ciencia reproducao humana
Sempre que me refiro à linguagem científica de Augusto dos Anjos, há pessoas que me perguntam sobre a possibilidade de desatualização dos termos, considerando a nomenclatura científica moderna e os avanços da ciência. Há, sim, esta possibilidade, mas a minha resposta segue um mantra, afirmando que devemos ver o poeta em sua época. É óbvio que a poesia de Augusto dos Anjos, como toda grande poesia, é universal. A dor do homem, o conflito com o mundo, a angústia diante da degradação moral e material são inquietações que afligem o ser humano em qualquer época e em qualquer lugar. A sua poesia, portanto, transcende os limites do espaço e do tempo. Neste aspecto, não há discussão.