Vamos começar por Dona Cotinha. Era uma papa-hóstia juramentada, beata praticante. Confessava e comungava nem sei quantas vezes por s...

Dona Madalena, Dona Cotinha e o Motoboy

beata vizinha causo cronica paraibana
Vamos começar por Dona Cotinha. Era uma papa-hóstia juramentada, beata praticante. Confessava e comungava nem sei quantas vezes por semana. Fora esta suposta fé imensurável, era de fato a secretária de muitas tarefas na paróquia. Cuidava até dos paramentos do padre Chico. As batinas estavam sempre limpas e cheirosas. Tratava com esmero o solidel e o barrete com o que o padre Chico encapava o cocuruto quando precisava fazer uma visita de maior requinte ou mesmo receber uma de mesmo quilate. O religioso era conservador e bota conservador nisso.

beata vizinha causo cronica paraibana
GD'Art
Já ia me esquecendo que dar suporte a uma missa era com ela mesma. Para que o ofício fosse impecável, impecáveis também deviam estar todo o altar com o crucifixo, o missal, a patena abastecida de hóstias consagradas, a pala, o cálice e acho que de nada me esqueci. Além desses cuidados, Dona Cotinha não abria mão de, durante a missa, fazer as leituras, organizar o coro de dez vozes e puxar as rezas. “Nem sei o que seria de mim, não fosse essa santinha”, era como dizia o padre. Nunca casou (estou falando de Dona Cotinha e não do padre Chico).

beata vizinha causo cronica paraibana
GD'Art
Agora, Dona Madalena. Enviuvou na flor dos seus cinquenta e mais um pouquinho. Marido pecuarista de mais de cinco mil cabeças de nelore a pasto só na engorda esperando o abate. Plantel que renovava ano a ano para garantir a regularidade no fornecimento. Firmino, capataz de confiança, já gerenciava a fazenda e outros negócios da família, quando Zé Rodrigues, o marido de Dona Madalena, comprou seu lote de sete palmos. Firmino continuou na atividade, agora sob a tutela da mulher do falecido. Pode-se dizer que a viúva não ficou a ver navios, muito pelo contrário, sempre foi bem de vida e continuou sendo. Os filhos, um rapaz e uma moça, já estavam casados e por aí pelo mundo fazendo a vida.

Agora, vamos juntar essas duas criaturas: Cotinha e Madalena. Eram vizinhas uma da outra. A mansão de nove cômodos de Dona Madelena ficava de frente à morada de quarto, sala, cozinha e banheiro de Dona Cotinha. Desde a morte de Zé Rodrigues Dona Cotinha deu de vigiar, bisbilhotar a vida da viúva.

beata vizinha causo cronica paraibana
GD'Art
É bom que saibam, como se diz por aí, Dona Madalena não era de se jogar fora, mulher aprumada, bonitona e passados uns meses de viuvez, deu de se ajeitar. Foram aparecendo belezas escondidas quando soltou aquela cabeleira cacheada sobre os ombros, encurtou um pouquinho as saias, passou batom encarnado nos beiços e não deixava mais de jogar perfume no cangote. Certas vontades apareceram e começaram a colocar quentura na viúva. Enquanto isso, a vizinha da frente já se incomodava com aquela visível metamorfose.

beata vizinha causo cronica paraibana
GD'Art
⏤ Aí tem coisa... ⏤ comentava a beata.

Ficou mais invocada quando sua vigilância constatou que toda quinta-feira, fizesse sol, fizesse chuva, final de tarde, aparecia um motoboy para entregar um pacotinho na casa em frente.

⏤ Essa messalina deve estar se drogando.

Depois de um tempo, o motoboy, trazia o pacote e não só fazia a entrega como era de costume, mas passou a ser convidado a entrar e ficava um tempão na casa da viúva. Dona Cotinha começou a perder a paciência.

⏤ Já entendi. Além das safadezas estão juntando “as coisas” pra depois distribuir.

Não deu outra, aconselhada pelo padre Chico que não admitita bandalheira nas redondezas de sua paróquia, Dona Cotinha foi à delegacia e dedurou a vizinha. Dias depois, numa quinta-feira, os meganhas montaram campana para dar o flagrante. E deram. Foi só Dona Madalena aparecer para atender o rapaz e com toda aquela truculência colocaram os três na viatura: Dona Madalena, o rapaz e o pacote.

beata vizinha causo cronica paraibana
GD'Art
Examinado o embrulho, o delegado não escondeu o espanto e mandou chamar a denunciante. Assim que a velhota se fez presente nossa autoridade mostrou o conteúdo à delatora que ao ver o “produto” quase tem um piripaco.

⏤ Deus me proteja!
 Sabem do que se tratava? O pobre rapaz apenas fazia as entregas de um sex shop. Mas nem assim Dona Cotinha se deu por vencida.

⏤ E por que fica enfurnado na casa dessa criatura?

Então, o garotão se manifestou.

⏤ E a senhora sabe o que é um “test drive”?

Ela preferiu não saber.

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também