Fala-se muito do Machado dos romances e dos contos, e pouco se comenta o Machado de Assis cronista. Mas o velho Bruxo também foi bom nesse gênero. Uma boa oportunidade de constatar isso é ler “Fuga do hospício”.
Em relação ao romance, ao conto e à poesia, a crônica é considerada um gênero menor. Geralmente ela se atrela ao jornal, o que tende a lhe conferir um caráter efêmero. O cronista escreve para o hoje,
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A crônica mescla seriedade e frivolidade, é uma forma de associar o útil ao fútil – caracterização, por sinal, que o próprio Machado criou. O cronista não tempo nem espaço para esmiuçar a alma humana, como faz o autor de ficção. Seu território são as emoções de superfície, produzidas pelo impacto dos acontecimentos. Ao mesmo tempo, ele usa essa aparente trivialidade como ponto de partida para tecer comentários sobre a natureza humana, a sociedade e a política da sua época. Em Machado, por exemplo, uma simples fofoca de sociedade pode ensejar uma reflexão sobre a vaidade ou a hipocrisia. Não raro ele responde aos fatos com ironia e humor, domínios em que é reconhecidamente mestre.
A fuga dos habitantes de um hospício, por exemplo, lhe serve de pretexto para a reflexão sobre a frágil fronteira entre sanidade e loucura, tema que enfocou genialmente na novela “O alienista”. “Uma vez que se
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Um dos temas recorrentes no livro é o impacto dos bonds elétricos na vida das pessoas. Eles vieram aposentar as carruagens puxadas a burros mas, como tudo que representa progresso, criaram novos contratempos. Isso leva o cronista a elaborar um decálogo que disciplina o comportamento dos usuários no novo veículo.
O Artigo I, por exemplo, dispõe sobre os encatarroados; eles podem entrar nos bonds “com a condição de não tossirem mais de três vezes em uma hora, e no caso de pigarro, quatro”. O Artigo VI trata da leitura dos jornais: “Cada vez que um passageiro abrir a folha que estiver lendo, terá o cuidado de não roçar as ventas dos vizinhos, nem levar-lhes os chapéus.”
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