Quando criança, morei ao lado de uma área de preservação ambiental, para onde eu costumava ir com frequência. No parque, havia inúmeras espécies vivendo em liberdade, entre elas, a cutia, um pequeno roedor que mede cerca de meio metro e se alimenta de frutas, sementes, grãos, hortaliças e tubérculos.
Eu gostava de observar o comportamento desses bichinhos, tentando extrair dali alguma lição. Eu ficava curioso com as suas preferências e hábitos. Por exemplo, eles adoravam as carambolas e ignoravam os jambos.
Brian Gratwicke
O que me chamava mais atenção, porém, era o seu comportamento quando a refeição era concluída. Depois de consumir a polpa da fruta, a cutia cavava um pequeno buraco com as patas dianteiras, colocava a semente ali e, em seguida, a cobria novamente com terra, geralmente empurrando-a com o focinho ou as próprias patas.
Esse comportamento faz parte de seu instinto de estocar alimentos, mas também contribui para a regeneração das florestas, pois ela nem sempre se lembra de onde enterrou todas as sementes. Por isso, ela acaba sendo uma importante dispersora de sementes, especialmente de espécies como a castanha-do-pará.
Via de regra, os animais não-humanos, agindo espontaneamente, não costumam ultrapassar o necessário para a sua sobrevivência e preservação de suas funções vitais. Eles comem, caçam, defendem-se e se reproduzem
Abhijit Sinha
A criação divina revela, em sua harmonia e funcionalidade, uma sabedoria que se manifesta desde os seres mais simples até os mais complexos. Os animais, guiados pelo instinto, cumprem sua função com fidelidade à natureza que os criou. Não há desperdício, ganância ou destruição gratuita em suas ações. É a vida em sua expressão pura e ajustada ao bem comum.
O ser humano, no entanto, dotado de inteligência e livre-arbítrio, carrega em si a responsabilidade de escolher como viver. E é justamente nessa liberdade que reside o seu maior desafio.
Ao contrário dos demais seres, o homem tem a capacidade de desejar além do necessário, de acumular, de dominar e de agir por interesses egoístas. Quando esse desejo ultrapassa os limites da real necessidade, instala-se o sofrimento, tanto para si quanto para o mundo ao seu redor. A natureza é violentada, os semelhantes são explorados, e a própria alma humana se extravia.
Henry ThoreauBenjamin Maxham
Thoreau dizia que pessoa mais rica é aquela que menos precisa de coisas. O pensador norte-americano construiu uma cabana às margens do lago Walden Pond, nos arredores da cidade de Concord, no estado de Massachusetts, e ali viveu dois anos, como parte de uma experiência de vida simples, em contato direto com a natureza, buscando autossuficiência, reflexão filosófica e afastamento da sociedade industrial e materialista de seu tempo.
Numa era de recursos naturais cada vez mais escassos, onde o contato com ambientes naturais virou luxo, a experiência de Thoreau não é acessível a todos, mas serve de inspiração para um estilo de vida menos pretensioso.
Chalé de Henry Thoreau em Walden Pond (Massachusetts) AMC
São Francisco de Assis Luca Giordano (1642)
O despojamento é uma forma de libertação; quiçá uma das maiores. Na medida em que formos capazes de trocar o egoísmo pelo amor, o desperdício pela solidariedade, e a posse pela partilha, substituindo o individualismo pelo altruísmo, responderemos de modo construtivo ao que a vida espera de nós.