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“Bastou-me dar um passo para dentro das muralhas para vê-la em toda a sua grandiosidade sob a luz lilás das seis da tarde, e não pude...

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“Bastou-me dar um passo para dentro das muralhas para vê-la em toda a sua grandiosidade sob a luz lilás das seis da tarde, e não pude reprimir a sensação de ter renascido”.

Foi o que disse Gabriel Garcia Marquez, ao chegar pela primeira vez a Cartagena das Índias, em maio de 1948.

Aquele mesmo pesadelo veio na noite de ontem. Aquele que não tem coragem de enfrentar. Mas, está sempre lá. E ele sabe como o pior pes...

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Aquele mesmo pesadelo veio na noite de ontem. Aquele que não tem coragem de enfrentar. Mas, está sempre lá. E ele sabe como o pior pesadelo não é aquele que foi sonhado, mas aquele que foi lembrado. Sempre lembrado, à revelia de sua vontade. Uma corrupção de sua integridade mais íntima. E aquele era algo muito, muito doloroso. Como se, para ele, não tivesse passado o tempo. Todo o resto da vida seguiu em frente, mas aquele episódio, aquele episódio, não. Está como que congelado, em toda a sua crueldade. Então, levanta com dificuldade. Quem o visse, naquele momento, veria uma tristeza infinita no olhar, como uma supressão da vontade de seguir adiante.

Poderia ser, talvez, um feriado. Mas, mesmo nos feriados, havia sempre quem se aventurasse sair. Era mais que isso. Uma paralisação ger...

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Poderia ser, talvez, um feriado. Mas, mesmo nos feriados, havia sempre quem se aventurasse sair. Era mais que isso. Uma paralisação geral? Não ouvira qualquer convocação. Impossível não saber. O celular! Se as pessoas não estavam nas ruas, estavam com certeza no seu celular. Não é nele onde todo mundo se encontrava? Estava ali a hora, pelas oito da manhã. Mas, sem mensagens. Ninguém online. Que espantoso. As pessoas estão sempre disputando aparecer nas mídias digitais. Mas, afinal, onde estão todos?

Mãe, tu já notaste como as lojas e empórios estão cobertos de preços e promoções especiais?

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Mãe, tu já notaste como as lojas e empórios estão cobertos de preços e promoções especiais?

É nas profundezas onde o mar guarda seus segredos mais ocultos. Quem visse, percebia como estava agitado o sono de Cilgin. Era um ser e...

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É nas profundezas onde o mar guarda seus segredos mais ocultos. Quem visse, percebia como estava agitado o sono de Cilgin. Era um ser em sofrimento. Ele se contorcia, gemia, abria os braços e se encolhia. E quem fosse capaz de entrar em seu sonho, poderia testemunhar alguém penando com um pesadelo. O pesadelo de quem caía do alto de um prédio, e lutava em tormenta contra a força do vento e da gravidade, vendo o chão se aproximar como uma vertigem.

Cilgin ficou imaginando se não havia acontecido algo semelhante agora. E, naquela manhã, precisamente naquela manhã, que poderia ser u...

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Cilgin ficou imaginando se não havia acontecido algo semelhante agora. E, naquela manhã, precisamente naquela manhã, que poderia ser uma quarta-feira, chovia, enquanto os últimos dias tinham sido de sol. Quarta-feira? Ora, os dias já não eram mais os dias, desde que acordou domingo numa segunda-feira. Poderia ter acontecido uma catástrofe semelhante à do ano de 536. Afinal, o que poderia explicar a ausência de gente no mundo?

Ou poderia ter sido uma invasão alienígena. O cinema com seu mercado de catástrofes faz com que acreditemos na possibilidade. Uma invasão de seres,
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Renata Meneses
necessariamente, violentos, raivosos, famélicos, tipo o Alien, de Ridley Scott. Vieram só para exterminar a humanidade, por alguma razão. Sabe-se lá. Mas, porque teria restado apenas ele, o sujeito melancólico, dado a sonhos e pesadelos, igualmente, catastróficos? Ele, o escolhido. Pelo menos nas redondezas. Quem sabe, não haveria outros em locais distantes. Ou escondidos. Ou em outra dimensão, com a física do improvável, a quântica e suas possibilidades fantasmas, onde a lógica não conseguiu explicar.

E, pela primeira vez, pensou como tendo sido escolhido para sobreviver, era muito mais um castigo e um penar, do que tinha sido para os demais sacrificados pela fúria da carnificina alienígena. Morrer, afinal, só traz dor naqueles momentos derradeiros. Num instante, tudo acaba. Inclusive, qualquer possibilidade de sofrer. Sim, porque, para Cilgin, morrer era realmente o fim. Nada haveria além. Até entendia quem pensava na possibilidade de uma vida após a morte, mas ele, ele tinha imensa dificuldade de acreditar.

À tarde, cismou de ir até uma agência bancária. Se estava tudo tão disponível, então certamente haveria de encontrar dinheiro. E, realmente, a agência, como tudo ao redor,
Celyn Kang
estava deserta, e ele pode entrar sem problemas, dirigir-se aos caixas, onde encontrou maços de dinheiro, tão perfeitamente engomados. Montes deles. Pegou o quanto pôde e saiu exultante da agência. Até começar a sentir certo incômodo: aquilo era roubo!

Mas, roubar de quem, se não havia ninguém por ali? De quem é, afinal, o dinheiro que está nos bancos? Dos banqueiros ou das pessoas que depositam nos bancos? Haveria banqueiros sem pessoas para confiar seu dinheiro nos bancos? Caminhava digerindo esses pensamentos, quando se deu conta: pra que dinheiro, se tudo que preciso basta pegar e levar? Sim, de fato.

Mas, após algum tempo, decidiu levar o dinheiro assim mesmo, vai que de repente as pessoas voltam ao mundo, e ele terá feito uma poupança. Roubo? Sim, mas haverá roubo se não existe quem reclame o objeto do roubo? Roubo pressupõe um que rouba, outro que perde. Não parecia ser o caso.

* Excerto do livro de Hélder Moura, 'A insana lucidez do ser', publicado recentemente (Editora Ideia), disponível na 👉🏽 Livraria do Luiz.

"Gosto do modo como Hélder busca equilibrar o psicanalítico com o ontológico, associando a crise do ser (cuja defecção, segundo Kristeva, é uma marca do quadro depressivo) aos fantasmas a que o sentimento de culpa dá forma." (Chico Viana)

Então, acorda. Pelas três da madrugada. E o que vem, como uma imensa onda de alegria e alívio: era apenas um pesadelo em forma de son...

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Então, acorda. Pelas três da madrugada. E o que vem, como uma imensa onda de alegria e alívio: era apenas um pesadelo em forma de sonho, ou sonho em forma de pesadelo, que, felizmente, acabou. E, de novo, recrimina-se como pode ter tido um sonho assim. Retomar a dormir trazia o risco de voltar. Se era intensa a sua dor, também era imenso o seu alívio. Ele era normal, afinal.

Cilgin havia lido, não lembra bem se em Freud, que os sonhos são desejos não realizados. Mas, e os pesadelos? São também desejos não r...

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Cilgin havia lido, não lembra bem se em Freud, que os sonhos são desejos não realizados. Mas, e os pesadelos? São também desejos não realizados? Mesmo os mais tenebrosos? Que estranho pensar assim. Era como se as pequenas tragédias pessoais que ocorrem em sonhos também fossem desejos não realizados.

Meu caro Milton, para não ir muito além das estrelas, conforme sua releitura do anarquismo, em sua última e bela crônica “ Uma história...

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Meu caro Milton, para não ir muito além das estrelas, conforme sua releitura do anarquismo, em sua última e bela crônica “Uma história em dois atos” (Ambiente Carlos Romero), devo recordar, inicialmente, uma frase de Leon Tolstoi. Ele que se dizia um anarquista cristão.

Bolonha é uma cidade de múltiplos olhares, onde se perder é a melhor forma de descobrir seus versos em segredo. A cidade de Dante, Petr...

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Bolonha é uma cidade de múltiplos olhares, onde se perder é a melhor forma de descobrir seus versos em segredo. A cidade de Dante, Petrarca, Paracelso e Durer, e tantos outros. É também conhecida na Itália como la dotta, la grassa, la rossa, ou a culta, a gorda e a vermelha.

Algumas singularidades interlaçam a vida e a obra de Shakespeare e Cervantes, num mesmo tecido de genialidade. Apesar das biografias t...

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Algumas singularidades interlaçam a vida e a obra de Shakespeare e Cervantes, num mesmo tecido de genialidade. Apesar das biografias tão distintas, William e Miguel estabeleceram um marco importante para a constituição do pensamento ocidental, a partir de seus trabalhos. Um pela via da dramaturgia e outro, pelo romance. E impressiona como matizes tão diversos compuseram um mesmo corolário revolto de ideias e pensamentos capazes de influenciar tantos séculos depois.

      Quando toquei o fundo da noite Eu afundei os pés na noite, Tão profundo desci, Que pude sentir Os lodos formados no te...

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Quando toquei o fundo da noite
Eu afundei os pés na noite, Tão profundo desci, Que pude sentir Os lodos formados no tempo, O viscoso remorso do passado, Tão pegajoso e tão macabro, Que de arrepios me tomei. E quando toquei o fundo da noite, Senti a sufocação aquosa, O líquido de tantos pesadelos, Que me pus a subir em desespero, Entre braçadas de agonia, Num tormento crescente da asfixia Cercado de todas as bolhas De um mágico flagelo noturno De quem busca a vida em pânico.

O escritor João Guimarães Rosa é conhecido pelo caráter revolucionário e, obviamente, universal de sua obra, com características marca...

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O escritor João Guimarães Rosa é conhecido pelo caráter revolucionário e, obviamente, universal de sua obra, com características marcadas pelo chamado hiperregionalismo, e o exemplo mais marcante é, sem dúvida, “Grande Sertão: Veredas”. O detalhe é que alguns pesquisadores também encontraram em textos de sua vasta produção literária elementos que poderiam ser identificados como narrativas fantásticas, especialmente nos primeiros contos, dentre estes, com destaque para “A terceira margem do rio”, que integra as “Primeiras Estórias”.

Não há pôr do sol como ao pé de “O Beijo”, de Victor Delfín, na Miraflores de Mário Vargas Llosa. A poucos metros de uma tragédia em q...

Não há pôr do sol como ao pé de “O Beijo”, de Victor Delfín, na Miraflores de Mário Vargas Llosa. A poucos metros de uma tragédia em que 35 mulheres atiraram-se para o precipício do Pacífico… por amor. Há tragédia e poesia nesta Lima de céu quase sempre cinza.

Há coisas que só acontecem em viagens. Poucos dias, antes de viajar a Barcelona, encontrei, durante um evento na Academia Paraibana de...

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Há coisas que só acontecem em viagens. Poucos dias, antes de viajar a Barcelona, encontrei, durante um evento na Academia Paraibana de Letras, com o fotógrafo João Lobo, que me falou da intensa turnê que estava fazendo, nas últimas semanas, para participar de exposições e debates sobre sua obra. Lobo é o nosso fotógrafo celebridade, que mora em Lisboa e faz sucesso pelo mundo com sua obra genial.

Era um tempo (no auge do Plano Real) em que a moeda brasileira estava valendo praticamente o mesmo que o dólar. Foi quando empreendemos...

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Era um tempo (no auge do Plano Real) em que a moeda brasileira estava valendo praticamente o mesmo que o dólar. Foi quando empreendemos, Geraldo Magela, Franklin da Organtec e eu, a primeira cruzada aos Estados Unidos. Naquele período do ano, havia uma febre de consumo entre os brasileiros que desembarcavam em Miami.

Uma viagem ao Chile é sempre inesquecível. É um país de intensa poesia. Até no nome. Chile deriva de Chilli, uma palavra de povos andi...

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Uma viagem ao Chile é sempre inesquecível. É um país de intensa poesia. Até no nome. Chile deriva de Chilli, uma palavra de povos andinos, que significa onde a terra termina. Não é de estranhar que tenha produzido dois dos maiores poetas latino-americanos, Pablo Neruda e Gabriela Mistral. Ambos Laureados com o prêmio Nobel da Literatura.

Ir a Viña del Mar, Valparaiso, Atacama é marcante. E o que dizer de passear à noite pela rua Suécia, ou pelo BellaVista, acomodar-se no bar Como Água Para Chocolate? Puro deleite, incompleto, porém, se não for ao Mercado Central para degustar um côngrio com um vinho carmenere no restaurante El Galeon, sob a exibição estridente de suas centollas gigantes.

Todos os sentimentos do mundo proclamam a sua poética, sobremodo quando alguém se põe em frente à obra de Augusto dos Augusto. E, em po...

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Todos os sentimentos do mundo proclamam a sua poética, sobremodo quando alguém se põe em frente à obra de Augusto dos Augusto. E, em poucos lugares, essa sensação é mais presente do que Leopoldina, em Minas Gerais. Ali, há um Augusto imortal e, ao mesmo tempo, de uma intrigante ubiquidade.

augusto dos anjos helder moura leopoldina
Hélder Moura (Túmulo de Augusto dos Anjos em Leopoldina (MG)
Acervo do autor
Por isso, estar em Leopoldina, diante de seu túmulo e, especialmente, do tamarindo que hoje lhe dá uma sombra de conforto, foi como experimentar também as emoções desse sentimento de paraibaneidade, em torno da vida e obra de Augusto, numa irmandade com todos quantos adotaram o nosso poeta maior entre os seus.

Intriga que algumas pessoas tenham as habilitações vocacionadas para o processo de criação literária, ainda que eventualmente não exerç...

Intriga que algumas pessoas tenham as habilitações vocacionadas para o processo de criação literária, ainda que eventualmente não exerçam essa militância, enquanto tantas outras jamais conseguirão transitar no universo dessa concepção, por absoluta ausência de mecanismos criativos, ainda que eventualmente se apropriem e dominem as ferramentas necessárias à manufatura do texto literário.

O fato é que devem existir cerca de oito bilhões de pessoas no mundo, neste início da década de 2020. Somos bilhões de pessoas distrib...

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O fato é que devem existir cerca de oito bilhões de pessoas no mundo, neste início da década de 2020. Somos bilhões de pessoas distribuídas em cerca de 200 países (ONU, 2020), uma diversidade imensa de nações, considerando que, há cerca de um século, havia menos de 60 países legalmente constituídos.