Talvez os leitores lembrem de uma história que contei sobre um americano que chega numa pequena cidade, procura a pensão xexelenta e adianta mil reais por um mês de aluguel pelo único quarto existente. Na sequência o dono da pensão vai até o supermercado e quita sua dívida de exatos mil reais. Por sua vez, o dono do supermercado vai até o açougue e paga o que deve, no mesmíssimo valor. Segue-se uma sequência de devedores pagando aos seus fornecedores até que a dona do cabaré recebe dos donos da farmácia os mil reais que eles deviam à custa de frequentarem suas moças. Ela vai à pensão onde periodicamente alugava aquele mesmo quarto do americano para exercer seu mister e quita sua dívida no valor de mil reais. Logo em seguida o americano procura o dono da pensão, diz que não pode ficar ali, pega seus mil reais que dera para pagar antecipadamente o aluguel do quarto e vai embora.
Imaginem, queridos leitores, que vocês receberam sementes de uma árvore raríssima, cujos frutos são dinheiro vivo. Vocês contratam um jardineiro para plantar essa árvore e cuidar do seu desenvolvimento. Em troca esse jardineiro ficará com 10% dos frutos que nascerem. A partir daí a natureza segue seu ciclo normal. Um belo dia, entretanto, um sabido que nem jardineiro é, passa embaixo da árvore e constata que os frutos estão quase maduros. Vai até vocês e diz que se ele receber 30% ou até 50% dos frutos que nascerão, dará um jeito de apressar o processo natural. Claro que é golpe, mas muita gente vai concordar porque realmente precisa dos frutos, está cansada de esperar e antes de morrer queria aproveitar a safra.
Claro que os queridos leitores sabem que privilégio vem do latim Privilegium, ou seja, "lei privada". Ocorre quando legisladores (sempre eles, os políticos) produzem uma lei ou bem brasileiramente enxertem em qualquer projeto de lei um dispositivo que privilegie um determinado grupo ou alguém. É o jaboti, porque esses animais não sobem em árvores, principalmente a árvore legal. Vou citar dois exemplos para mostrar o que são os privilégios no Brasil.
O primeiro deles é recente e está totalmente documentado. Em 2017 o governo de Minas Gerais lançou um Refis (patranha legal que beneficia periodicamente os sonegadores) para facilitar a quitação de impostos devidos. Segundo a
Lei 22.549/ 2017, os devedores poderiam também dar obras de arte para pagar seus débitos com a fazenda estadual. Era um jaboti cultural e com toca certa.
Antigamente existiam dois tipos de produtos; os verdadeiros e os falsos. Relógios, equipamentos eletrônicos, comida e bebida...o que estava à venda podia ser encontrado por dois preços diferentes, sendo que o caro era sinônimo de boa origem e o barato sugeria fortemente algum grau de falsificação.
Os que como eu tiveram a honra e o privilégio de estudar no IPEP daqueles anos onde reinava por merecimento Dona Maria Bronzeado haverão de lembrar o carinho com o qual ela preparava os alunos para o desfile em homenagem à nossa independência.
Na minha solitária mesa da padaria Bonfim ele identificou-se e pediu licença para sentar. Por que não? “- Eu sei que você não gosta de políticos. Vários deputados já me disseram isso”.
Semana passada comecei a contar a história de Valmir Azevedo, o maior estelionatário do país, que muito jovem chegou a gerente do Banco do Brasil e desviou milhões das mais polpudas contas correntes que administrava. Foi descoberto pela vida de ostentação que levava e teve que cumprir pena na Casa de Detenção de São Paulo. Na prisão fez amizade com o supra sumo da bandidagem. Foi solto graças ao Advogado Arnault (guardem esse nome e aguardem). E voltou ao crime.
Vou tratar de Valmir Vieira de Azevedo, até hoje considerado o maior estelionatário do país, porém antes preciso agradecer a um amigo de infância recentemente adquirido que está me abastecendo dessa e de outras histórias fantásticas, todas verdadeiras e documentadas, mas que prefere permanecer no anonimato.
Lembrem; na última semana comecei a contar a história de Josias, que de policial em São Paulo passou a ladrão de automóveis, foi preso, fugiu da cadeia, falsificou um diploma de bacharel em Direito, foi aprovado num concurso para Juiz no Acre, encheu o saco, deixou a toga, fez concurso para Delegado de polícia em Santa Catarina e na cidade de Tubarão onde foi lotado esquentava carros roubados em São Paulo. Ufa; que resumo, hem?
Josias Cavalcanti Sena chegou rapidamente a terceiro sargento da Força Pública de São Paulo. Nas horas vagas furtava automóveis juntamente com o irmão. Descoberto, foi encaminhado ao presídio Romão Gomes, onde permaneceu mesmo depois de desligado do corpo policial, algo estranho porque se tratava de um presidio que abrigava somente policiais. Talvez porque sempre foi envolvente, muito inteligente e frequentando a biblioteca do presídio, dedicou-se ao estudo do Direito, prestava esclarecimentos e serviços aos demais detentos e aos funcionários do Romão Gomes. Seu prestígio junto à direção do presídio fazia com que permitissem suas saídas em busca de livrarias para a compra de livros de Direito. Numa dessas saídas não voltou.
Poderia começar explorando a imagem de uma senhora hoje casada com um dos mais importantes e poderosos políticos brasileiros que anteriormente fora esposa do bandido objeto deste escrito. Não o farei mesmo porque ela em nada contribuiu para os fatos narrados a seguir. Vamos lá.
Fui procurado por alguns amigos que estão montando um grupo para empinar uma campanha que visa a demolição dos escombros do hotel Tambaú e a posterior devolução daquele belíssimo pedaço de praia ao povo. Queriam que eu participasse dando minha contribuição como Advogado e trouxeram documentos para examinar. Entre os documentos está a ata da assembleia realizada pela CINEP datada de 15 de dezembro de 1972 que tratou da transição da propriedade do hotel Tambaú desde o Estado da Paraíba até a Companhia Tropical.
A conversa girava em torno de erros médicos. Comentávamos sobre uma cirurgia que havia sido feita na perna direita de uma moça com problemas na perna esquerda. Ao redor da mesa cada um queria contar um caso parecido, porém, o dono da padaria tinha preferência. “- Rapaz, eu caí da bicicleta e um táxi me levou ao hospital. Vocês acreditam que ao invés de engessarem meu braço direito engessaram o braço do taxista?”.
É comum ouvir por aí que somente no Brasil existem precatórios e jaboticabas. Quanto aos precatórios sou testemunha da sua crueldade, assistindo os governos humilharem os servidores públicos com atrasos de até 30 anos nos pagamentos do que lhes é devido.
"Vi ontem um bicho na imundície do pátio catando comida entre os detritos. Quando achava alguma coisa não examinava nem cheirava: engolia com voracidade. O bicho não era um cão, não era um gato, não era um rato. O bicho, meu Deus, era um homem".
Já lá se vão mais de 70 anos desde que Manuel Bandeira produziu essa obra prima sobre a miséria humana e a situação só piorou.
Eu estava saindo do supermercado e no estacionamento um quase cadáver ambulante aproximou-se. Segurava um papelão rasgado ao meio onde só apareciam as palavras "com fome". Desnecessário. Aliás, até o cartaz era desnecessário porque a face encovada do ainda ser humano já gritava sua agonia.
Recordei do poema de Manuel Bandeira e naquele momento decidi que não seria por minha omissão que ele iria disputar com animais o lixo que nossa abundância produz. Contrariando uma prática que nem sabia existir em mim (mas que naquele momento mostrou toda a sua crueldade) não virei o rosto nem me escondi na tela do celular para não ver o que todos precisamos ver. Desci, comprei uma refeição no self-service da loja e dei ao mendigo. Ele afastou-se e eu procurei segui-lo para ver se ia jogar fora, porque na minha crença “essa cambada só quer dinheiro para encher a cara de cana”. Nada disso. Por trás da mureta estavam uma mulher e duas crianças a quem ele entregou a comida. Nem provou, voltou ao estacionamento para pedir mais ajuda.
Dei partida no carro e logo à frente encontrei uma venezuelana com seu vestido colorido esmolando no sinal luminoso.
Na calçada 4 crianças esperavam por ela. Tive coragem suficiente para olhar aqueles pares de olhos esbugalhados. Eram os olhos da fome.
Envergonhado segui em frente, atordoado pela incapacidade humana de resolver algo tão básico. É emocionante ouvir as pessoas dizerem que a fome não pode esperar. E é verdade. Mas o que poderemos fazer sobre isso para além de esperarmos soluções dos poderes que por mais bem intencionados sejam, não estancam o crescimento da fome ao redor do mundo? As ONGs que cuidam do “problema” não me mostram resultados perceptíveis a não ser belos comerciais e a única iniciativa que me emocionava porque visível, voou nas ASAS da corrupção.
Hoje é inimaginável uma cirurgia sem a aplicação de anestesia. Mas era assim. Um exemplo incrível foi o dito cirurgião mais rápido do mundo. Robert Liston amputava a perna de um paciente em incríveis dois minutos e meio. E se o procedimento fosse do joelho para baixo o escocês só precisava de 30 segundos para a amputação. Não era exibicionismo; à falta de anestesia a velocidade era muito importante, mais ainda para evitar grandes sangramentos. Liston tinha 1.90 de altura e era muito forte. Mas não era médico.
Moro escoteiro há muitos anos e tenho sentimentos bem peculiares. Sempre pensei que era único nessa forma de viver o dia a dia. Qual o que!
Da mesa na padaria Bonfim de onde observo a vida, vez por outra engreno conversa com outros solitários que também sofrem demais à falta de mais pessoas em suas casas ou apartamentos para compartilharem o dia a dia.
Periodicamente os sucessivos governos que assolam o Brasil tem ofertado aos Advogados algumas oportunidades impares de ganharem o que um amigo meu, ainda antes de ser Excelência (porém sempre um excelente Advogado) chamava de bom metal.
Em 1864 o General Melgarejo derrubou o Presidente da Bolívia, José Maria de Achá. Pouco tempo depois o ex-Presidente Belzú, que por sua vez havia sido derrubado por Achá e estava exilado na Europa decidiu voltar ao país.