Um jesuíta com jeito de franciscano. Cardeal em Buenos Aires, andava nas ruas, nos ônibus e no metrô como um padrezinho de aldeia: batina surrada, gastos sapatos pretos, uma pasta de couro igualmente marcada pelo uso. Papa, substituiu o anel de ouro por um de prata, manteve os velhos sapatos pretos, recusou o apartamento papal e foi morar coletivamente na hospedaria do Vaticano, optou pelas vestes brancas, as mais simples que havia. Um figurino que expressava verdadeiramente sua persona humilde, não uma fantasia demagógica para aparentar uma simplicidade inexistente. Um pobre no meio de tesouros, um pobre em recursos materiais e principalmente um pobre em espírito, apto, portanto, a herdar o Reino do Céu, como disse Jesus nas bem-aventuranças.
Surpreende-me a notícia, nesta manhã do dia 14 de abril de 2025, da morte do escritor peruano Mario Vargas Llosa, aos 89 anos. Não o sabia doente. Pelo contrário. Admirava-me de sua boa forma física e mental, de sua elegância e de seu ar cosmopolita de cidadão do mundo, a se deslocar, lépido, entre cidades e países. Até sua ainda jovem e bela esposa atestava seu vigor e sua saúde. Não sei a causa de sua partida. Pode ter sido um mal repentino, e aí não há o que fazer. De qualquer modo, pode-se afirmar que viveu bastante – e bem. Uma vida plena, rica de experiências exitosas, mas também de alguns fracassos retumbantes.
Ouve-se falar mais em bloqueio de escritor, aqueles períodos de total esterilidade criativa que vez em quando atormentam os profissionais da escrita. Para os autores, um verdadeiro inferno, pois sempre desconfiam de que nunca mais voltarão a escrever. Geralmente, passa, mas às vezes, não. E aí não há o que fazer. Não há mais o que se dizer ou não se sabe mais como fazê-lo.
O jornalista Sérgio Botelho vem se dedicando há algum tempo a escrever sobre a cidade de João Pessoa: seus monumentos, arquitetura, ruas e história. Agora chegou a vez das pessoas que têm marcado a vida da aldeia ao longo do tempo, personagens antigos e mais recentes. Com isso, parece completa sua “trilogia pessoense”, composta dos livros Memórias da Cidade de João Pessoa, João Pessoa, Uma Viagem Sentimental e João Pessoa, Personagens no Tempo, todos com o selo da Editora Ideia, sinônimo de qualidade editorial.
Escrevo em 25 de março de 2025, uma terça-feira, exatamente oitenta anos depois do nascimento de Leila Diniz, a eterna musa nacional, falecida aos 27 anos, em acidente aéreo em Nova Delhi. Quem diria? Nem sei se consigo imaginar Leila octogenária. O que sei é que ela seria tão sapequinha aos oitenta quanto foi aos vinte. Pois essa era sua natureza, seu temperamento, dos quais não poderia fugir.
A colunista Ruth de Aquino, de O Globo, já escreveu tudo sobre o assunto, na edição de 14/3/2025. Não há, definitivamente, o que se acrescentar. Mas há matérias, o leitor sabe, que não se esgotam e sempre podem render uma palavrinha a mais, nem que seja para reforçar, mesmo que não seja preciso, o que já foi dito. É o caso.
A travessia do jornal ao livro geralmente demora e não são todos os jornalistas que a fazem – ou conseguem. A maioria permanece restrita para sempre aos diários (impressos ou digitais), sem que isso, claro, signifique demérito para os profissionais do batente. Afinal, estão em seu habitat natural e isso lhes basta. Mas um ou outro, geralmente os cronistas, aqueles que transitam entre o jornalismo e a literatura, atravessa a fronteira e se converte em livro, numa forma de alcançar uma perenidade que o jornal, com sua intrínseca vocação para se tornar papel de embrulhar peixe, não consegue ofertar. No caso, ressalte-se, a precariedade é do veículo e não necessariamente do texto nele impresso.
Essa era uma morte anunciada. Afinal, o poeta de 87 anos estava enfermo desde 2017. Só não se imaginou que seria numa terça-feira de carnaval e a uma distância de pouco mais de um mês da partida de sua mulher, a também escritora Marina Colassanti. Duas perdas imensas para a cultura brasileira, cuja cena vem se esvaziando a olhos vistos dos grandes nomes que a preencheram a partir da segunda metade do século passado. Agora sem Affonso Romano de Sant’Anna, pode-se perguntar quem é o maior poeta brasileiro vivo.
O jornalista Sérgio Botelho é pessoense da gema, nascido na Maternidade Cândida Vargas, esquina de João Machado com Coremas, coração da cidade. Conhece a velha aldeia de 440 anos como poucos, e sua ciência vai além da história, da arquitetura e da paisagem, pois que é feita de incondicional amor à urbe que o viu nascer. Daí o seu projeto de divulgar a sua e a nossa João Pessoa, através dos meios eletrônicos e de livros, o mais recente dos quais foi publicado na quinta-feira passada, dia 20 de fevereiro, em cordial encontro de seus amigos e admiradores no Bistrô 17, próximo à Catedral de Nossa Senhora das Neves, lugar mais do que adequado para o evento. Refiro-me a João Pessoa – Uma Viagem Sentimental, Editora Ideia, 2025.
O velho Eudes chega às setenta primaveras com a disposição de sempre. O espírito é leve e muita é a disposição para correr o mundo atrás do belo em suas múltiplas formas. Ainda há pouco fez sua tradicional peregrinação à Europa, região de sua particular devoção, desde a juventude. O que faz todo sentido, pois ali ele encontra tudo que ama: a história, a cultura ocidental, a arte, os museus, as galerias e os antiquários,
A frase acima não é minha. Vi-a outro dia estampada numa camiseta e gostei. Fiquei refletindo: taí uma coisa para se pensar, uma coisa aparentemente simples mas plena de implicações, uma coisa que pode até ser um programa de vida, já pensou? Pois é. Ir embora mais cedo. Não da vida, claro, que a vida é tudo, condição de tudo o mais, mas do resto – ou, pelo menos, de boa parte. De eventos, por exemplo,
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sejam eles quais forem. E a nossa vida atualmente é toda ocupada por eventos mil, de manhã à noite, numa sucessão de acontecimentos geralmente dispensáveis – ou pouco importantes. Miudezas. Mundanidades. Vaidades. Imagine-se, pois, o tempo ganho para outras coisas mais úteis ou prazerosas com o simples fato de ir embora mais cedo.
Quem nas novas gerações se lembra de Milton Campos? Quem na minha geração de setentões se lembra de Milton Campos, o honrado mineiro que, ao lado de Afonso Arinos de Melo Franco, representou um dos melhores espécimes do liberalismo brasileiro? Praticamente ninguém, infelizmente. O próprio Arinos jaz no esquecimento dos compatriotas, o que diz muito sobre a nossa gente e o nosso país.
A palavra quase traz em si uma frustração. Como advérbio, significa algo que chegou muito próximo do alvo ou do destino, mas de fato não chegou lá. Quase! Muitas vezes a usamos com a exclamação, para acentuar o quanto se esteve perto do acontecimento feliz ou infeliz, conforme o caso. É essa mera possibilidade, eventualmente tão cheia de promessas,
Manuel Bandeira conta em uma crônica que Dona Santinha, sua mãe, possuía um pequeno caderno onde anotava as despesas domésticas cotidianas. Para o poeta, esse era o volume mais precioso de sua biblioteca: “um velho caderninho de folhas pautadas e capa vermelha,
A experiência de muitos tem mostrado que às vezes desobedecer ao médico é a salvação do doente (ou do hipotético doente). É uma atitude temerária que não recomendo, pois em geral os profissionais da medicina costumam acertar em seus diagnósticos, se não plenamente, pelo menos em parte, o que não é pouco. Por prudência, em determinadas situações, é sempre bom ouvir outras opiniões, pois as coisas, não raro, não são o que parecem à primeira vista. Enfim.
Definitivamente, esse negócio de colocar no filho o nome do pai é muito arriscado. Raramente dá certo. Ou seja, raramente o filho está à altura do pai, principalmente quando este se destacou positivamente por alguma razão. Caráter, talento e genialidade não são transmissíveis geneticamente. E aí geralmente se frustram as expectativas de continuidade do pai no filho. A história está cheia de exemplos.
Fechando o ano de 2024, a Editora Record deu a público A Intensa Palavra, coletânea de crônicas de Carlos Drummond de Andrade, publicadas no jornal carioca Correio da Manhã, no período de 1954 a 1969. A compilação foi organizada pelo escritor paranaense Luís Henrique Pellanda, que também assina o prefácio. Não preciso dizer que, como tudo do itabirano,
Quem a pede é meu amigo Cleanto Gomes Pereira e, com ele, muitos outros paraibanos zelosos para com a memória de Augusto dos Anjos, poeta nosso e do Brasil. E não é uma ponte qualquer, mas uma que ainda será feita, e que se anuncia festivamente – esperançosamente -, como solução definitiva para a ligação entre os municípios de Cabedelo, Santa Rita e Lucena. Chamam-na atualmente, à falta de outro nome, de Ponte do Futuro, o que, na melhor das hipóteses, é uma obviedade, já que ela ainda não existe no presente. Quando de fato existir – e torcemos para que exista, um dia – deixará de ser “do futuro” e então essa denominação perderá a razão de ser. E para que isso
Projeto da 'Ponte do Fututo' pb.gov.br
não ocorra é que Cleanto e tantos outros pedem que a tal ponte se chame desde já Augusto dos Anjos, um nome para a eternidade, ou seja, para além do simples futuro.
A ideia é de Manoel Jaime, o médico e intelectual que os pessoenses aprenderam a admirar, respeitar e estimar. O cronista como psicanalista da cidade. Uma grande sacada. Pois se o cronista, qualquer cronista, não o é, deveria sê-lo. E para isso o escriba não precisa de diploma universitário, de pós-graduações nem de formação específica. Basta ter e usar a sensibilidade de um observador, atento o suficiente para detectar os humores da urbe, suas neuroses e até seus traumas. Por exemplo, no caso de nossa capital, auscultar se ela vivencia ou não alguma crise de identidade, tipo quem sou eu?, quanto ao seu nome, já que persiste, por insistência de uns poucos, a discussão quanto ao mesmo. Uma discussão que, diga-se, não mobiliza a população, mais interessada em serviços eficientes que em polêmicas obsoletas.
Se faltasse outra palavra para defini-lo, gentleman serviria, pois, de fato, ele o foi, na plena expressão da palavra. Um cavalheiro de província, sim, mas que poderia sê-lo em qualquer lugar do mundo, tamanha era sua distinção de verdadeiro lorde inglês. Um lorde dos trópicos e nos trópicos. E, sendo assim, inevitavelmente um pouco (talvez muito) deslocado entre os aborígenes, em sua maior parte uma gente rude e inculta, que costumava — e costuma — ver com tacanha desconfiança