Em Rosamundo e os outros , Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto) conta que Álvaro Moreyra tinha contratado um pintor chamado Leônio Xa...

Ignorância cultuada

fabula ironia ignorancia vaidade
Em Rosamundo e os outros, Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto) conta que Álvaro Moreyra tinha contratado um pintor chamado Leônio Xanás para pintar o seu apartamento. Para provar que há falta de sinceridade nas pessoas e que ninguém gosta de confessar a própria ignorância, Álvaro Moreyra propôs
fabula ironia ignorancia vaidade
GD'Art
a Stanislaw Ponte Preta pedir Leônio Xanás nos estabelecimentos comerciais. Numa farmácia, o farmacêutico disse que “estamos em falta”; num prédio comercial, o ascensorista informou que “o Dr. Leônio Xanás atendia no 6º andar”; numa loja de roupas, a vendedora tinha roupa da marca Leônio Xanás, mas o estoque acabara e ela estava esperando nova remessa; no restaurante, o garçom, aconselhou a não beber o vinho Leônio Xanás, talvez por uma questão de safra. Até no ônibus, à pergunta sobre Leônio Xanás, o motorista respondeu: “Passa perto”, achando que era nome de rua.

A mesma fábula, no sentido formalista do termo, foi contada por León Gozlan no livro Balzac en pantoufles. Gozlan, no restaurante aonde foi almoçar com o autor de Le Père Goriot, pediu ao garçom uma garrafa de sphinx (esfinge), vinho que não existe. O garçom voltou com a resposta pronta: não havia mais sphinx. O estoque tinha acabado.

fabula ironia ignorancia vaidade
GD'Art
Algo semelhante aconteceu comigo num congresso de professores, no Rio de Janeiro, em que eu, ainda sem doutorado, representava o Espírito Santo. Eu estava praticamente começando minha carreira na universidade e ainda estava “verde” demais para a missão que me fora confiada. Ficava calado, ouvindo os outros citarem com desenvoltura e familiaridade nomes até então desconhecidos para mim, como Rosenbaum, Postal, Labov, Chomsky, Lyons, Benveniste, Pottier, Bloomfield, entre outros, hoje conhecidos de todos os que já estudaram pelo menos um semestre de Linguística em qualquer curso de graduação, mas, àquela época, pouco difundidos, porque a Linguística
fabula ironia ignorancia vaidade
GD'Art
ainda estava começando a impor-se nos cursos universitários.

Quando me pediam a opinião, eu balançava a cabeça ou apoiava as ideias que, recém-ouvidas, me pareciam mais ou menos sensatas. Mas não ousava discutir.

Num determinado momento, lembrei-me do sphinx da história de Gozlan com Balzac. Cansado de estar ali bancando o matuto ignorante e inexperiente, irritado com aquelas exibições de erudição, apresentei algumas ideias próprias que tinha a respeito de não sei qual assunto que viera à baila naquele momento e que eu havia estudado um ano antes, nas horas vagas. Assim que terminei meu arrazoado, decidi dar respaldo às minhas ideias, inventando na hora o nome de um linguista português – Figueira Diniz. E o artigo publicado numa revista da Universidade de Coimbra, cujo nome me escapara ali, naquele instante. Mas “lembrava-me” do título do artigo: “Do cartesianismo ao mentalismo em Linguística”, ou algo parecido com isso.

fabula ironia ignorancia vaidade
GD'Art
Todos silenciaram diante da minha competência. A ninguém ocorreu que o artigo e o autor do artigo não existiam e que as ideias que eu acabara de expor eram também ousadia da minha parte. Mas ninguém teve coragem de contestar-me ou de confessar a própria ignorância.

Foi a única vez que passei por sábio, com o imenso respeito dos meus pares!
LIVROS DE AUTORIA DE JOSÉ AUGUSTO CARVALHO
maria jose egito mae jesus
maria jose egito mae jesus
faroeste futebol gramatica lingua portuguesa
faroeste futebol gramatica lingua portuguesa

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também