Fui visitar, junto a um grupo de amigas, a exposição do professor, poeta e artista plástico Amador Ribeiro. A entrada da antiga casa d...

Com Amador e Hermano José

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Fui visitar, junto a um grupo de amigas, a exposição do professor, poeta e artista plástico Amador Ribeiro. A entrada da antiga casa do artista plástico Hermano José (in memoriam) virou festa e encontros. Amador achou pouco a sua carreira de exímio professor de Literatura, poeta e crítico literário, e agora experimenta a pintura com maestria. Como bem disse Flávio Tavares em sua visita à exposição: “admirável, forte, louvável, uma obra marcante... sua obra entra em sintonia com os grandes mestres: o artista uruguaio construtivista Joaquín Torres García e o cubista francês Fernand Léger.”

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Amador Ribeiro Neto
Léo Barbosa
Sou admiradora do professor Amador há algumas décadas e o encontrava, de quando em vez, fosse nos corredores do CCHLA-UFPB, fosse brincando nas Muriçocas do Miramar, embaixo de um mosquiteiro ao som do frevo e dos abraços com amigos em comum. Com o seu sotaque paulista dos “rrrrrr” fortes, sempre foi uma pessoa admirada e cultivada pelas aulas, pelos poemas — seus e dos outros — e pela companhia gentil e amorosa. Quando fazia meu doutorado em Recife, estava sempre a cursar disciplinas como ouvinte aqui no campus, alargando os conhecimentos literários. Assim, cursei matérias com João Batista de Brito, Genilda Azeredo, Arthuro Gouveia e Amador Ribeiro — este último, sobre poesia. E me encantaram as suas aulas, lotadas, com um professor comprometido com o seu programa, textos críticos e literários, e nós, alunos, a mergulhar no mundo do texto poético — assunto que já tinha estudado com os professores também citados.

Ao ver as telas de Amador, não poderia imaginar algo diferente do seu comprometimento. Há algum tempo eu já via as suas postagens em cursos de gravura e experimentos, que agora desaguaram no Totem: pulso nos pés e dengo na cintura, onde ele mesmo descreve suas cores e formas como: “trabalhos que buscam inter-relacionar signos das culturas afro-indígenas com manifestações carnavalescas e LGBTQIAPN+.” Parabéns, querido professor e amigo, e vida longa às suas tintas e mergulhos.

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Obras de Amador Ribeiro Neto Acervo da autora
Chegar ao Museu Casa de Cultura Hermano José (já o visitei algumas vezes) é sempre um aceno ao passado — de Hermano e meu também. Conheci-o em 1970, eu, uma menina/adolescente, ao visitá-lo na casa da sua mãe, perto da Av. João Machado. Hermano morava no Rio de Janeiro, trabalhava no Banco do Brasil, junto com meu tio Abílio Balthar e, em paralelo, conhecia todo o mundo da pintura e da crítica das artes daquela cidade maravilhosa. Logo gostei de Hermano. Dava risadas com a sua fina ironia. E abria bem os olhos quando ele falava sobre arte e meio ambiente. Aprendia. E admirava aquele senhorzinho de camisa social de botão, tão irreverente e carismático.

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Hermano José MCHJ
Quando me casei com o artista plástico Flávio Tavares, ainda adolescente, passamos a lua de mel no apartamento de Hermano, na Rua Correia Dutra, no Flamengo. Depois vim a descobrir que o seu prédio era vizinho ao do meu primo Bilu (outro Abílio Balthar), que sincronicamente faleceu no dia do meu aniversário. Ou seja, vida toda entrelaçada. Passamos um mês nesse apartamento de cobertura, rodeado de quadros por todos os lados — quadros e móveis que depois vieram com Hermano, quando ele se aposentou e fez morada em João Pessoa.

Quando quis construir essa casa, hoje museu, foi por nosso intermédio que chegou ao arquiteto Amaral (do Recife, mas morando aqui na cidade), para juntar duas paixões da sua vida: a Igreja de São Francisco e a Ponta do Cabo Branco. Dizia isso bem sério ao arquiteto: “Quero uma casa com essas duas referências! Arcos e barreira e mares!” Claro que Amaral deve ter perdido o sono com essas linhas e gráficos. A casa demorou a ficar pronta. Mas, depois, o seu dono se entocou por entre as árvores do quintal imenso, e a beleza da sua casa branca lembrava o quintal da igreja dos seus amores.

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Museu Casa de Hermano José
Acervo da autora
Ontem, parei junto aos seus óculos e quase pude vê-lo, com o seu sarcasmo à toda prova. E o seu paletó pendurado? E as caixinhas? Lembrei-me de outra caixinha/porta-joias que ele me presenteou, em uma das minhas poucas visitas, quando ficávamos sentados na sua cama — recheada de livros por todos os lados, fazendo dos seus aposentos com vista para o mar do Bessa o seu escritório.

Recordei que, para Hermano, poeta era Cecília Meireles; beleza era Greta Garbo; escultora/gravadora era Maria Bonomi; gravura era Samico; e pintura, João Câmara — este pintou o seu retrato, também exposto na casa. Senti muito pouco acervo no museu, pois, se bem me lembro, Hermano tinha fileiras e mais fileiras de telas de artistas brasileiros empilhadas pela casa toda. Uma vida colecionando pinturas, desenhos e outros trabalhos das artes plásticas.

Ai, Hermano! Senti saudades de você ontem — e de mim. Estou numa fase das saudades do tempo. E trouxe na bolsa um poema seu, Registro de Nascimento. Que coisa linda! Quando diz que, “no inverno sonhas, e no outono apaga as sombras que obscurecem lembranças.” Assim como você, “quando de tudo canso, //acompanho a Lua// sumindo no manguezal.”

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