Joaquim e Das Dores, devidamente casados de cartório e altar, geraram quatro descendentes: três maricotas e um machinho. Esses rebentos vieram ao mundo nesta ordem: primeiro chegou Laudiceia, seguida de Deoclécia; em terceiro apareceu Valdenora e, puxando a fila, o Joaquim.
A chegada de um cabritinho deixou o pai numa alegria que só vendo. Tão feliz que deu ao filhote seu próprio nome: Joaquim, com direito às certidões de pia e tabelião.
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Joaquim, o filho, por óbvias razões, desde muito cedo virou o Quinzinho. Tornou-se a alegria daquela casa: do primeiro dentinho aos primeiros passos, sempre eram festejadas as novidades que esse processo de crescimento da garotada proporciona. A cada dia, mais parecido com o pai, sem tirar nem pôr. Cara de um, focinho do outro, como dizem.
O tempo foi passando, Quinzinho já na escola, e foi então que começou o calvário desse nosso ilustre personagem. As irmãs perceberam que havia algo que tirava o menino do prumo. Bastava que pusessem em dúvida a consanguinidade dele.
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— Sua mãe verdadeira, depois de ter você, fugiu do hospital e largou você lá. Foi uma enfermeira que trouxe você aqui pra casa — era a troça de Deoclécia.
— Papai comprou você de uns ciganos que apareceram por aqui vendendo crianças — contava Valdenora.
Bastava uma oportunidade, e lá vinham as meninas atormentar o garoto com essas lorotas. Claro que, com o passar dos anos, as meninas pararam com essas aporrinhações, mas as minhocas já estavam inoculadas na cabeça de Quinzinho, que nunca questionou os pais quanto a essas sinistras possibilidades.
Joaquim, o pai, sempre ria com os chistes, mas nunca retrucava ou desmentia, apenas não levava a sério as chacotas das meninas. Nem havia por quê: a semelhança entre pai e filho era notória.
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— Sabe de uma coisa, Dalvinha?
— O que é, Quinzinho?
— Acho que sou adotado. Não sou filho legítimo dos meus pais.
Dalvinha não pôde deixar de rir e argumentou:
— Impossível, Quinzinho! Você é a cara do seu pai.
— Mas duas pessoas que são sósias são muito parecidas, quase iguais, e não têm o mesmo sangue. Pode ser assim comigo e com meu pai. Não pode?
— Duvido, Quinzinho. Mas faz o seguinte: pergunte ao seu pai. Só que, do jeito que ele é cheio das gozações, você pode não gostar da resposta. Mas pergunte.
Um dia depois, Quinzinho se encheu de coragem e foi ter com o pai.
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— O que é, meu filho?
— O senhor vai ser sincero comigo?
— Claro que vou. Desembucha logo o que tem pra perguntar.
— Pai, eu fui adotado?
O pai olhou bem para o filho, sem acreditar no propósito da indagação, e respondeu:
— Meu filho, eu nunca lhe contei, mas você foi adotado, sim! Levei você logo que nasceu para um casal adotar. Eles adotaram você, mas devolveram porque acharam que você ia ficar muito feio quando crescesse. Está vendo? Você foi adotado.
E ainda acrescentou:
— Que pergunta mais idiota, Quinzinho.
Bem que Dalvinha avisou.