Há uma solidão que não é feita de quartos vazios ou de noites sem companhia. Ela é mais sorrateira, mais insidiosa. Mora no meio da m...

Um pedaço de nossa alma

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Há uma solidão que não é feita de quartos vazios ou de noites sem companhia. Ela é mais sorrateira, mais insidiosa. Mora no meio da multidão, no coração da cidade que nunca dorme, no grupo de amigos que ri alto no bar. É a solidão que nasce não da falta de pessoas, mas da falta de conexão. Da absoluta, e por vezes brutal, falta de empatia.

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Ela se manifesta nos pequenos gestos, ou na ausência deles. É o colega que fala sem parar de seus problemas, mas que, quando você tenta compartilhar um fragmento do seu cansaço, desvia o olhar para o celular, murmurando um “é complicado” mecânico, antes de mudar de assunto. É a sensação física de que suas palavras, ao saírem da boca, não ecoam em nenhum ouvido alheio; caem no chão como pedras e ficam lá, inertes.

É no casamento de anos, no qual dois mundos orbitam a mesma casa, mas em universos paralelos. Um fala da solidão do trabalho, o outro responde com a conta do supermercado. Dois monólogos disfarçados de diálogo. Ninguém erra, necessariamente. Ninguém é um vilão. Apenas se esqueceu de como se traduzir na língua do outro. A empatia, aquela ponte frágil e necessária, foi deixada para trás, corroída pela ferrugem do hábito e da indiferença.

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Essa solidão é um mal-estar moderno. Andamos com dispositivos que nos conectam a qualquer um, em qualquer lugar do globo, mas perdemos a capacidade de nos conectar com a alma que está ao nosso lado no ônibus, na fila do banco, no apartamento ao lado. Vemos a dor do mundo através de uma tela, nos comovemos com um story, mas não enxergamos o abatimento no rosto do vizinho que cruza no elevador. A empatia virou um sentimento de consumo, rápido e descartável.

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E assim, a pessoa vai se recolhendo. Vai aprendendo que é menos doloroso guardar para si as pequenas angústias, as alegrias modestas, os medos banais. Porque a experiência de dividi-los e receber de volta um olhar vazio, um conselho clichê ou pura ignorância é mais solitária do que o silêncio. A solidão por falta de empatia é um fechamento de portas. A pessoa não está triste por estar só; está só porque percebeu que, mesmo cercada, está fundamentalmente sozinha.

No fim, o que mais dói não é a crítica, nem a grosseria. É o vácuo. O nada. A paisagem árida de um mundo onde todos falam, mas ninguém escuta de verdade. Onde todos tocam, mas ninguém sente.

A verdadeira cura para essa solidão não está em encontrar mais pessoas, mas em encontrar mais humanidade. Em reaprender a arte simples de olhar nos olhos, de perguntar “como você está?” e esperar pela resposta verdadeira. De ouvir não para responder, mas para compreender. De oferecer, mesmo que por um instante, um pedaço de nossa alma como refúgio para a alma alheia.

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Pois a empatia é o antídoto mais silencioso e poderoso contra a solidão. Ela sussurra, no ouvido de quem sofre: “você não está sozinho. Eu estou aqui. E eu sinto com você”. E nesse “sentir com”, nesse compartilhar de um mesmo céu emocional, mesmo que por um momento, a solidão recua. E descobrimos, afinal, que a única coisa que pode habitar verdadeiramente o espaço entre dois seres humanos não é o silêncio, mas a ponte.

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