D e início, vou logo esclarecendo que a música a que me refiro é a música chamada clássica ou erudita. Ouvir a boa música é como respira...

De início, vou logo esclarecendo que a música a que me refiro é a música chamada clássica ou erudita.

Ouvir a boa música é como respirar. Faz bem ao organismo. Houve quem classificasse a música como a Divina Arte.

E começo dizendo que lá em minha casa não faltaram apreciadores da música clássica. Meu avô materno, comerciante, era exímio tocador de clarinete. Minha mãe chegou a me dizer que ele, certa vez, ouvindo uma banda de música passar na rua, foi logo dizendo: o clarinete daquela banda está desafinado.

E minha mãe? Tocava flauta. Só eu é que não toco nada, só assobio. E como eu gostaria de ser maestro, a profissão mais bonita que conheço! Depois dela, só a de comandante de avião. Como eu gostaria de viajar tropeçando pelas nuvens...

Minha irmã Ivone, por um tempo, tocou piano. Meu irmão Eudes, certa vez, aborreceu-se com os repetidos exercícios de piano e, como era poeta, fez os seguintes versos: “Oh, dona Ivone, este seu piano é impertinente. Eu só queria que ele se quebrasse um dia de repente”. Mas, Ivone deixou logo o piano. Já a minha irmã caçula, Iracema, também tocou piano por muito tempo. E tocava bem. Mas nunca quis dar concertos em público, apesar dos insistentes convites do maestro Carlos Veiga, que, ao ouvi-la, estimulava-a a tocar com a Orquestra Sinfônica da Paraíba, que regeu por alguns anos.

Dos meus irmãos, nenhum deles mostrou propensão para a chamada Divina Arte. Nem mesmo para o violão.

Voltando à minha mãe, era uma apaixonada pela chamada Música Clássica. Ela ouvia a “Sonata ao Luar”, de Beethoven, com os olhos cheios d'água. Minha mãe era o que se poderia chamar uma autêntica melômana.

Agora vejamos minha primeira esposa, Carmen. Tocava piano. Mas não se aventurou a dar um concerto, só alguns recitais, no Teatro Santa Rosa. E a atual esposa, minha querida Alaurinda? Violinista graduada. E foi num concerto da Sinfônica que a vi pela primeira vez.

Meu pai, de música só gostava da modinha “A Jardineira” e da serenata Rimpianto, de Toselli. E meus dois filhos: Carlos e Germano? Só Germano andou tocando piano, bacharelou-se em Música, pela UFPB, mas, hoje em dia, só se lembra de “A maré encheu”, de Villa Lobos. Suas mãos, hoje, são para os projetos de Arquitetura e as crônicas. Mas quando viaja para fora do país, não perde um concerto.

A verdade é que a vida sem música se tornaria num inferno. Aqui para nós, a educação só será completa com o estudo da Divina Arte.

E antes de encerra, que tal lembrar o grande Tarcísio Burity, erguendo um brinde em sua homenagem? Ninguém fez mais pela música clássica do que ele, com o Espaço Cultural e os festivais internacionais. Ainda bem que o governador Ricardo, restaurou aquele espaço e também está dando todo apoio à Sinfônica.

E como foi que nasceu a nossa Orquestra? Esta história fica para ser contada depois. Lembrar que um dos componentes da Sinfônica foi o desembargador Paulo Bezerril. Ele era flautista. Certa vez, cochichou aos meus ouvidos: “Três coisas embelezam a vida, e começam pela letra “M”: Mar, música e mulher”. O desembargador disse e está dito.

P ois é, acrescentei mais um ano à minha vida, aqui na Terra, e haja beijos, parabéns, votos de muitas felicidades e, por fim, mais esta con...

Pois é, acrescentei mais um ano à minha vida, aqui na Terra, e haja beijos, parabéns, votos de muitas felicidades e, por fim, mais esta conclusão animadora: muitos anos de vida! Mas o que significam muitos anos de vida? Ora, significam velhice. Mas as pessoas nem se dão conta do que estão desejando a todos os aniversariantes. E dizem isso, cantando alto o “Parabéns para você”, sempre com muitas palmas e bolo com velas.

Dizia o ator Charles Chaplin, que “deveríamos nascer adultos, ir rejuvenescendo, virar crianças, tornarmos-nos um bebezinho de colo, voltar para o útero da mãe, e passar os últimos nove meses de vida flutuando no silêncio do ventre materno. Não seria perfeito?"

Pensando bem, seria um horror. Já imaginou você envelhecendo e engatinhando? Mas, respeitemos a ideia do renomado artista, que tanta alegria trouxe ao cinema e à vida.

Voltando ao meu aniversário, como foi bom! Nem pensei na idade passando. Toda a família reunida. Família pequena, mas muito querida. E os gostosos beijos e os abraços não deixaram que eu me lembrasse de que estava ficando mais maduro...

E agora, voltando à modinha, vocês já atinaram para a sua letra? Todos cantando e desejando muitos anos de vida ao aniversariante? Aí eu fico pensando: quem tem muitos anos de vida é velho. Mas ninguém quer ficar velho. Mesmo assim, é o que todos desejam a todos. Comemora-se a velhice e a desejam ainda mais.

Continuando, aqui em casa fizeram uma festa muito bonita, com um gostoso almoço. Esposa, filhos e netos, todos eles sorrindo e batendo as mãos, embora o aniversariante estivesse envelhecendo, mas, que significa amadurecendo, que significa ter mais experiência, mais sabedoria, mais riqueza interior. Isso é o que importa. A verdade é que terminei comemorando mais um ano de vida rodeado dos queridos familiares, todos cantando. Que momento gostoso!

Quantos anos? Não direi, curioso. Minha mãe dizia que salário e idade não se pergunta. Só sei que vai longe aquele dia, na fria Alagoa Nova, quando dei o primeiro grito de vida. Grito ou choro, não me lembro. Mas sei que foi à boquinha da noite, que abri os olhos para o mundo. Curioso, sou um homem que detesta frio. Que me desculpe Alagoa Nova. E viva a vida!

A cruz, como se sabe, é o encontro de duas traves: uma que ascende, como a apontar algo lá em cima, e outra que se dirige para o lado. Conc...

A cruz, como se sabe, é o encontro de duas traves: uma que ascende, como a apontar algo lá em cima, e outra que se dirige para o lado. Conclusão: ambas expressam uma grande lição: a de que devemos não olhar apenas para cima, mas também para o lado.

Subir apenas, sem o outro, é puro egoísmo. Lembrar que nada somos sozinhos. Não se faz uma cruz com uma tábua apenas. Há necessidade de duas tábuas. Uma de ascensão vertical, e outra em direção à lateral.

Jesus ensinou que amássemos ao próximo como a nós mesmos. Os homens entenderam muito mal esta máxima. Ao invés de amor, ódio. Ódio até em nome de religião, ora vejam só...

E o Mestre procurou objetivar, para tornar ainda mais claro o ensinamento. Daí acrescentar “como a si mesmo”. Sim, porque gostamos muito de nós mesmos. Somos egoístas. O “eu” prevalece sobre o nós. E o que vem a ser amar? Amar é doar-se, entregar-se, colocar-se no lugar do outro. Compreendê-lo. Eu amo a Natureza. Eu me entrego a ela. O amor chega a ser uma servidão. Paulo de Tarso disse, em alto e bom som: “Não sou que vive, é o Cristo que vive em mim”. Disse tudo, em poucas palavras.

O amor é uma integração. Você ama o outro quando o outro deixa de ser o outro. Quando o outro passa a ser você. A lição do amor fraternal é impossível? Não, porque muitos já deram exemplo. Muitos missionários se sentiram como o iluminado de Damasco em relação a Deus: “Não sou eu que vivo, é o próximo que vive em mim”.

Muitos preferirão dizer: “Não sou eu que vivo, é o dinheiro que vive em mim. Ou senão, o sexo, ou senão o poder...

A verdade é que nunca houve, em tempo algum, uma lição como esta: “amar ao próximo como a si mesmo”. Sigamos o exemplo da cruz: a tábua vertical para o amor a Deus, a tábua horizontal para o amor ao próximo. Façamos aos outros o que nós gostaríamos que eles nos fizessem. Essa é a melhor receita.

O poeta Eudes Barros, no livro “Cânticos da Terra Jovem”, disse em um de seus poemas que, no Brasil, Jesus foi crucificado numa cruz de estrelas.

Deixemos as estrelas e voltemos à didática de suas duas tábuas, a da vertical e a da horizontal. A do amor a Deus e a do amor ao próximo. Esse é o verdadeiro significado da cruz.

Se você mora no litoral, em algum ponto deste sofrido e massacrado planeta, saiba que é hora de começar a se preocupar com os efeitos do aq...

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Se você mora no litoral, em algum ponto deste sofrido e massacrado planeta, saiba que é hora de começar a se preocupar com os efeitos do aquecimento global. Um estudo da National Geographic mostra o que acontecerá quando o todo o gelo acumulado nos polos Norte e Sul derreter, trazendo um quadro assustador para quem habita as zonas próximas aos oceanos.

V ivemos o século da propaganda. Propaganda em todos lugares, menos no fundo mar. Não duvido nada que, logo logo, a propaganda chegue até ao...

Vivemos o século da propaganda. Propaganda em todos lugares, menos no fundo mar. Não duvido nada que, logo logo, a propaganda chegue até ao papel higiênico.

Já disseram que a propaganda é a alma do negócio. E é. Pela TV, pelo rádio, pelos outdoors, pela Internet, por toda parte. Até em carro de som, perturbando impunemente o sossego alheio.

Longe de mim ser contra a propaganda comercial. A de carros, nem se fala. Propaganda de bebidas, de comidas, de vestidos, propaganda de tudo.

A propaganda, repetimos, é a alma do negócio. E cada vez mais ela se moderniza, torna-se sofisticada. Comerciante que não faz propaganda de seus produtos, não pode concorrer com os colegas. E me vem a pergunta: Será que há comerciante que não faz propaganda de seus negócios?

A propaganda é livre, a não ser que seja da maconha e outras drogas, é claro.

E agora, ponho-me a refletir. Há um comerciante que não pode fazer propaganda de seus negócios. Quais é, cronista? É a propaganda dos caixões de defunto. Ah, como o comerciante desse produto fúnebre gostaria de vê-los na TV, nos outdoors, nas revistas...

Ora, ora, leitor, nem te conto. Faz tempo, numa rua comercial de uma cidade da Alemanha, se não me engano, Wiesbaden, numa vitrine muito chique, havia vários caixões fúnebres. E, aqui para nós, eram esquifes muitos bonitos, de madeira boa, lustrando, cheios de ornamentos. Sem dúvida, caríssimos. Tal fato muito me impressionou.

De minha parte, confesso que não acho nada demais a propaganda do caixão mortuário. Acontece que o medo da morte é tão grande que todo mundo quer esquecer a grande fatalidade.

Outrora, ainda alcancei esse fato, o enterro das crianças era uma festa, ninguém chorando, todos sorrindo a caminho ao cemitério. Hoje acabou-se o cortejo fúnebre pelas ruas. Mas também, com esse trânsito...

Não me esqueço da cidade alemã, onde vi, numa vitrine, luxuosos caixões mortuários. E repito que não achei nada de mais o fato, mas que vi com certa surpresa. Penso que todo comerciante desse produto gostaria de vê-lo com o destaque da loja alemã.

E agora estou me lembrando de um amigo, cuja distração era frequentar velórios. Não perdia um. Fosse de parentes, amigos e estranhos. E orava pelo defunto...

É o obvio. Em toda família ocorre o naturalíssimo fenômeno da morte. Daí as paredes ficarem cheias dos retratos dos que se foram. E o tempo...

É o obvio. Em toda família ocorre o naturalíssimo fenômeno da morte. Daí as paredes ficarem cheias dos retratos dos que se foram. E o tempo vai passando e a gente e a gente também. Diz o ditado que ninguém fica para semente... Uma grande verdade.

Qual a família em que não ocorreu a morte? Ora, em todas! A verdade é que, em geral, a gente esquece esta dolorosa realidade, como se o esquecimento resolvesse o problema. Fazemos igual à avestruz que esconde a cabeça no buraco diante de qualquer temor.

Lá na minha família, foi-se quase todo mundo. Mas, aqui, há um caso a anotar. Um caso raro. Minha mãe estava costurando e no chão estava meu irmão Alberto. E o que é que tem isso demais? Ora, era que o menino chorava, chorava muito. Olhava para a sua mãe costurando e os olhos cheios d'água. Quando a mãe percebeu, foi logo lhe perguntando, apreensiva? “O que foi que houve, meu filho? Algum bicho lhe mordeu, tá sentindo alguma dor? E ele, num choro convulso, respondeu soluçando: “Estou chorando porque, um dia, você morrerá”. Bobagem, meu filho, não vou morrer tão cedo”. E o menino: “De que adianta? Mas, um dia a senhora vai morrer”.

No entanto, poucos pensam que, um dia, deixarão este mundo, para onde vieram nus e sairão vestidos, não é engraçado?
Meu tio paterno, João, solteirão, quando uma pessoa lhe contava sobre alguém que se beneficiou com alguma vantagem na vida, se sucedeu bem em algum empreendimento, ele logo dizia, sorrindo: “Mas morre”... Ele era de um ceticismo impressionante. Morreu solteirão, de um câncer na boca.

Meu pai morreu com oitenta e sete anos. Já a minha mãe, com seu modo de viver, atravessou um século sorrindo. E qual o motivo dessa longevidade? O otimismo. Minha mãe vivia sorrindo para a vida. Alimentação sóbria. Divertia-se decifrando charadas e com as chamadas “Palavras Cruzadas”. E Lia muito livros. Certa vez, zangou-se com uma mosca que a importunava, e debochou: “Esta mosca besta pensa que já morri”.

Minha mãe foi um exemplo de coragem diante da vida. Encarou sua velhice com muito otimismo. Cuidava muito da aparência, estava sempre bem vestida e penteada. Costumava dizer: “Meu filho, velhice quer trato”.

E o que dizer do “mais morre” do tio João? Sim, todos, um dia, sairão deste mundo. Seja rico, seja pobre, seja feio, seja bonito, feliz ou infeliz. Esta é a grande verdade e a maior certeza das nossas vidas.

E de que morreram meus irmãos? Cito apenas Mário, o mais velho. Morreu de cigarro. Vi-o arquejando, no leito de hospital, com o pulmão cheio de pus, vítima de enfisema, e uma tristeza enorme no rosto.

Todos morrendo e Alberto pensando. Pensando e chorando, aos pés da mãe costurando. Será que ele tinha razão com esse comportamento?

E o suicídio? Eis aí a mais estúpida maneira de morrer. Gande é a decepção do espírito de um suicida quando desperta no plano espiritual, cheio de remorso.

Viver! Haverá coisa mais bela? Melhor do que viver é saber viver. Esta a nossa grande responsabilidade. Mas, será que meu irmão Alberto tinha razão nas suas reflexões sobre a certeza da morte? Bem, mesmo preocupado com o destino, ele foi o mais animado dos irmãos. Bom humor era com ele. Então, soube viver!

O que importa é estar consciente. Lembrando que minha mãe foi até os 109 anos, e morreu dormindo, quase sorrindo...

E is aí uma das coisas mais importantes da vida: o nosso nome. Pena que não é a gente que escolhe o seu nome. É o pai da gente. Eis aí uma p...

Eis aí uma das coisas mais importantes da vida: o nosso nome. Pena que não é a gente que escolhe o seu nome. É o pai da gente. Eis aí uma prerrogativa que respeitamos.

Meu nome é Carlos. Gosto dele. Mas, se não estou enganado o gosto foi de minha mãe, que me disse que o nome é nobre. Vá lá.
Os nomes dos meus irmãos? Eis aí: Mário, Alfredo, Eudes, Alberto, Orlando, Iracema e Ivone. Este último foi dado pelo poeta Eudes Barros, inspirado no romance de José de Alencar.

Há nome moderno e belo, como Iasmim e não menos bonito como Genoveva. Estabeleçam um paralelo entre os nomes antigos e modernos. Quando menino, conheci uma senhora que se chamava Eudócia. Ela era gorda e tinha um sinal no seio. Foi quem costurou minha primeira calça comprida, que serviu de mangação para muitas meninas, com quem eu gostaria de namorar. A calça era horrorosa.

Querubina. Bonito ou feio? Já foi nome muito usado, assim como Filomena. Minha mãe se chamava Pia, adocicado com o diminutivo Piinha. Ela me dizia que seu nome era muito usado pelas rainhas. E que o adorava.

Botei o nome de meus dois filhos: Carlos, meu nome, e Germano, que o adorou. Nunca vi um nome parecer tanto com a pessoa.

A verdade é que os nomes mudaram muito. Minha primeira esposa Carmen dizia que foi seu pai, o arquiteto Clodoaldo, quem escolheu seu nome, depois que assistiu a ópera Carmen, em Madrid, música que ela adorava.

O nome é muito importante, seja Filomena, seja Vaneska. Não esquecer minha Alaurinda, que rima com linda. Outros nomes, muito em moda hoje, são Maria Eduarda, Ana Clara, Sofia, Isabella, Isadora, Beatriz, Lorena, Joyce, Maitê, Rebeca, Viviane, Cecília, Ingrid, Marina, Luana, Cássia, Camila, Adriana, Aline, Taísia.

A geração passada jamais imaginaria nomes assim... Minhas tias maternas tinham nomes bonitos, conquanto antigos: Alzira, Auta, Ninália, Anília, Nautília...

Mas é isso. Isabel, Josefina, Sebastiana, Etelvina, Zulmira, Filomena, tudo passa, tudo muda, os nomes não poderiam ser exceções.

Voltando à minha inesquecível mãe, ela realmente se envaidecia com o seu nome: Pia. E um dia disse ao meu vivo: Pia já foi nome de rainha, de princesa...

O nome é muitíssimo importante. Não me esqueço daquela linda garota, lá num banco, em Recife. que foi me atendendo e perguntando, dizendo: “Como é o seu nominho?” E chegou a alisar minha mão. Minha primeira esposa, no momento noiva, não gostou.

Nome de pessoas, nome de cidades... O nome de cidade mais bonito, sem esquecer sua historicidade, é Olinda. Eu fico com Itaporanga, no interior paraibano. Se não estou equivocado significa Pedra que canta.

Mas, há nomes bonitos que são trocados por apelidos. Muito cuidado com o apelido. O apelido estraga tudo. O grande tribuno Alcides Carneiro tinha horror a apelido.

E no casamento, a mulher muda o nome de solteira. Eis aí mais um machismo ainda em vigor.

E eis que o nosso pintor admirável, Hermano José, acaba de nos deixar, com muita saudade. Hermano José era, além de artista admirável, uma ...

E eis que o nosso pintor admirável, Hermano José, acaba de nos deixar, com muita saudade. Hermano José era, além de artista admirável, uma pessoa meiga, incapaz, como se costuma dizer, de matar uma mosca.

De poucos músculos e carne, mas de muito humor, o sorriso dele era todo pra dentro. Um sorriso de muita sabedoria. E era assim que ele ia levando a vida.

Seu grande amor era o Bessa, onde tinha uma residência, toda virada para o mar, e que para ele era uma espécie de santuário, onde se benzia em comunhão com a Natureza, que tanto defendeu.

Outra sua paixão: o Planalto do Cabo Branco. Paixão mesclada de muito ciúme. Tenho a impressão que ele desejava que ninguém passasse, por ali. E ficou danado quando soube que a prefeitura mandou construir a Estação Ciência, obra do grande Niemeyer. Bom de zanga e de amuo, Hermano explodiu em protestos.

Como pintor, que muito admirei e respeitei, ele era genial. E adorava criticar. Uma das coisas mais gostosas da vida era conversar com o poeta. Uma conversa molhada de humor. Grande era sua versatilidade. Hermano nunca deu uma gargalhada. Seu humor era contido.

À noite, costumava ler os livros da Saraiva, lá no Manaíra Shopping, e pescar amigos para uma boa conversa. Estava informado de tudo. E foi lá no Manaíra que levou uma queda ao tropeçar com uns garotos que corriam, fazendo do Shopping uma perigosa pista.

Outra coisa sobre Hermano. Ele foi o primeiro artista plástico a figurar na edição inaugural de O Correio das Artes, vitorioso suplemento do jornal A União.

E, há pouco tempo, consciente do próximo partir, escreveu um livro de reflexões - “Anotações no tempo” - endereçado a alguns amigos. Seu livro é mais uma oportunidade de continuar a conversar com ele, sorrir com ele, pensar com ele. Hermano, não somente o pintor, o artista plástico, o homem que soube dignificar a vida, mas também um filósofo, que ele sempre foi.

Concluo a crônica com esta anotação de seu livro: “Foram tantos e tantos os que se foram, que chego a pensar, que é a morte quem alimenta vida”. O filósofo estava sempre presente no artista. São geniais essas “Anotações no Tempo”, que ele deixou para que lembrássemos sempre dele, vale a pena lê-las.

V ai chegar um dia em que ele será destruído. Mas, enquanto isso não ocorre, deleitemo-nos com esse oásis que a Natureza nos deu: um quintal...

Vai chegar um dia em que ele será destruído. Mas, enquanto isso não ocorre, deleitemo-nos com esse oásis que a Natureza nos deu: um quintal à antiga, com galinhas, papagaio, cajazeira, mangueiras e coqueiros, pombos, passarinhos e até um pau-brasil. E que dizer dos canteiros e das hortas? E que dizer do seu silêncio ecológico? E que dizer dessa paz, longe das máquinas, longe das TVs e telefones, dos iPads e iPods, longe de tudo que o homem inventou. Aqui, tudo o que existe é obra de Deus.

O homem, que foi à Lua, que inventou tanta tecnologia, jamais fará este pau-brasil, cujas folhas o vento agita neste momento. Jamais fará este bem-te-vi que canta, chamando o outro. Jamais construirá essas enormes mangueiras, a frondosa castanhola, os coqueiros e muito menos os seus frutos.

O homem fabrica o cimento. O cimento dos enormes edifícios que cercam o quintal, e que, ao invés de cimento tem terra. Terra para plantar árvores.

Fico olhando o meu oásis com uma saudade antecipada. Sim, chegará o dia em que ele será soterrado, afundado, destruído, Em seu lugar se erguerá uma enorme construção com centenas de apartamentos, verdadeiras gaiolas humanas, lá no alto, longe da terra. Apartamentos, cujos moradores ficam contentes quando deles saem para passear. E aí se explica porque os restaurantes estão cada vez mais cheios. É que quase todo mundo está faminto de espaço. Todo habitante de apartamento é um prisioneiro.

Acabou-se o tempo em que se dizia: “vou para minha casa”. A casa está se acabando, está se tornando uma intrusa. E como toda prisão, os apartamentos são protegidos pela segurança. Ninguém entra nele sem o consentimento do vigilante, do porteiro, que olha para você meio desconfiado, pedindo identificação e imediatamente tentando se comunicar com a pessoa procurada pelo intruso. Só depois, permite a sua entrada.

Casa com quintal virou coisa fora de moda. Casa com cachorro, com a placa “cuidado com o cão com árvore no jardim, está se acabando. Os apartamentos são o que está na moda. Tão na moda como a calça jeans, o bermudão no meio das pernas, o Facebook, os celulares, que hoje são chamados de smartphones...

Voltando ao quintal, como está ele cercado de imensos edifícios! Cercado ou imprensado? Diria melhor cercado. Sim, está havendo um verdadeiro cerco em torno desse oásis. Um cerco asfixiante. A cidade precisa crescer. Os construtores precisam ganhar dinheiro.

A população está crescendo. Portanto, destruamos essas mangueiras, esses coqueiros, esse enorme e ornamental pau-brasil. Isso não se usa mais.

Ao invés de galos saudando as madrugadas, liguemos as TVs, acessemos os tablets, com as últimas notícias sobre a corrupção nacional. Galo cantando é hoje uma obsolescência. Assim se diz, assim se comenta.

E para onde irão os passarinhos, os bem-te-vis e pardais? Não sei. Só sei que sinto, neste momento, uma saudade antecipada.

Q ual é a dor maior do mundo? Eu diria, sem pestanejar: a dor da ausência. Conheci um homem que adorava seu filho, um bonito e inteligente j...

Qual é a dor maior do mundo? Eu diria, sem pestanejar: a dor da ausência. Conheci um homem que adorava seu filho, um bonito e inteligente jovem com quem convivia muito bem. De repente, o menino fora atropelado por um carro. Quando o visitei para lhe dar os pêsames, observei que ele apenas andava de um lugar para outro. Não botou uma lágrima. Não disse uma palavra. Andar, em silêncio profundo, talvez lhe atenuasse a dor.

Horrível, de repente, se ver sozinho no mundo. Mas a vida é feita de presenças e ausências. De sorriso e de choro. Ninguém se livra da lei. O homem que perdeu o filho não deu uma palavra. No rosto não escorria nenhuma lágrima. Mas tudo passa. A vida não deixa o choro por muito tempo. Depois vem a conformação. Depois, quase ninguém mais se lembra do choro, que é substituído pelo sorriso.

Mas há aqueles que sabem transformar sua saudade numa constante presença. E assim, sofrem menos. E agora estou me lembrando, como grande exemplo, dw Clemilde, viúva do nosso querido Afonso Pereira. Como ela soube ela transformar a sua saudade numa presença. Organizou um arquivo com um precioso acervo e o encheu de livros, documentos e lembranças do marido. Entra naquele recanto como se o amado ali estivesse. Lembro de que há muitos exemplos de heróicas viúvas que souberam conservar a memória do marido com muita resignação, com muita fé. Viúvos e viúvas.

Mas, aqui para nós, voltando à saudade, não há maior dor do que a dor de uma ausência.

Agora estou me lembrando de José Américo de Almeida, viúvo. Como sofreu com a morte de dona Alice, sua esposa. Sua solidão aumentou, a ponto de, certa vez, ele bradar: “Minha casa não tem mais diálogo”. Haverá maior desespero do que este?

O diálogo é tudo em nossa vida. Conquanto o monólogo também seja, o diálogo é vida intensa. Precisamos da companhia do outro. Precisamos desabafar as nossas mágoas.

A dor de uma ausência tem cheiro de morte. Ele disse, com uma enorme tristeza, num desabafo dramático, digno do grande homem que foi. “Na minha casa não há mais diálogo”. O diálogo é vida.

Eu já sofri a dor da ausência. Mas me comportei muito bem. Quem leu o meu primeiro livro A Dança do Tempo, verá que ele foi feito de lágrimas.