Relembro um poeminha que escrevi sobre o rio da minha aldeia:
Rio Seridó
riozinho da minha aldeia.
Caminhas para onde?
Em frente às residências foram plantadas mangueiras, mangas de várias cores e tipos (espada, rosa, maranhão, tommy). As mangas estavam maduras, era um convite para saboreá-las. Tive vontade de voltar a ser menina e furtar uma daquelas mangas, pareciam deliciosas. O sol forte do sertão dá beleza às cores das frutas e elas se tornam mais saborosas.
A viagem a Jardim do Seridó teve um motivo especial, fui para a comemoração dos 90 anos de uma prima e fiquei hospedada no Hostel Arco-íris, local que merece ser visitado. A casa de Iris, a dona do hostel, é um verdadeiro museu. Nas paredes, a decoração mistura o sagrado com o profano - santos, anjos, orações bordadas, duendes, iemanjá, tudo convive fraternalmente. Do outro lado da rua, em frente à casa, Iris fez um jardim com plantas da região: mandacarus, xique-xique, palmas para gado e esculturas de vários animais: vaca, cavalo, coelho, gato, coruja, garça, uma verdadeira arca de Noé. E na parede está pintada uma arca à moda do desenho antigo. Não falta a presença de uma bicicleta com flores no bagageiro e muitas frases pintadas de autoajuda espalhadas no meio das plantas e pregadas em algumas árvores de pequeno porte. Vale repetir a canção italiana: Casa de Irene:
A casa d'Irene si canta si ride
C'e gente che viene, c'e gente che va.
(...)
A casa de Iris é como a casa de Irene.
A cidade oferece outro local de visitação, é a Fábrica de Abelhas São Patrício, de Ezequiel Medeiros Macedo. Ezequiel é um dos maiores apicultores do Nordeste, cultiva abelhas sem ferrão e já esteve presente no Globo Rural diversas vezes para falar sobre essa sua atividade que exige muitos cuidados e dedicação. Quem quiser saber como criar abelhas mansinhas, sem ferrão, é só falar com este primo apicultor, elas podem ser criadas até em apartamentos. Se na cidade de Carnaúba dos Dantas existe o Castelo di Bivar, em Jardim do Seridó existe o santuário de Ezequiel. Turistas de todo Brasil vêm para conhecer este lugar sagrado, digo sagrado porque sem abelhas a humanidade não sobrevive e Ezequiel está fazendo uma ação digna de louvores – cultiva abelhas que buscam o néctar das flores e oferecem o elixir da vida.
A viagem a Jardim do Seridó representou um retorno à casa materna e à procura do tempo perdido. A casa onde nasci está modificada, já não é a casa da minha primeira infância. As inúmeras janelas antigas foram substituídas por outras mais modernas, certamente não mora agora nenhuma menina fujona.
O grupo escolar, onde meus irmãos e minha tia estudaram, continua com a mesma aparência, hoje é uma Escola Estadual. No frontispício está escrito o ano de 1928, a bandeira do Rio Grande do Norte em alto relevo e a inscrição: Governo do Rio Grande do Norte/ Sec. de Estado da Educ. da Cult, do Esporte e do Lazer/ Escola Estadual Antonio de Azevedo/ Escola de Ensino Fundamental. Ato de Criação Dec. 225 de 08 de julho de 1910. É uma escola centenária.
Percorrendo as ruas do centro e dos bairros, verifiquei algumas construções que guardam resquícios de uma arquitetura à moda antiga, casinhas coloridas com desenhos, triângulos e arabescos na parte frontal, tudo de forma harmoniosa. Tinha razão Mário de Andrade quando passou por lá em fins de 1920 e comparou essas casinhas com as pinturas feitas por Tarsila do Amaral das casas do interior paulista.
Todas as ruas são muito limpas, não se vê sujeira nas calçadas e transitam poucos “viventes”, para usar uma expressão cara a Graciliano Ramos. De dez horas da manhã até às quatro da tarde é hora de trabalhar na sombra ou dentro de casa, o calor é grande, mas à noite sopra uma brisa gostosa. Antigamente as pessoas colocavam cadeiras nas calçadas e o papo com os vizinhos se estendia até às 21 horas. Hoje a televisão, os filmes da Netflix ocupam o lugar dessas conversas.
É sempre bom voltar à cidade que nos viu nascer, rever os parentes, ouvir histórias de antigamente e aprender um pouco da sabedoria dos seridoenses.