É o obvio. Em toda família ocorre o naturalíssimo fenômeno da morte. Daí as paredes ficarem cheias dos retratos dos que se foram. E o tempo...

A morte na família

É o obvio. Em toda família ocorre o naturalíssimo fenômeno da morte. Daí as paredes ficarem cheias dos retratos dos que se foram. E o tempo vai passando e a gente e a gente também. Diz o ditado que ninguém fica para semente... Uma grande verdade.

Qual a família em que não ocorreu a morte? Ora, em todas! A verdade é que, em geral, a gente esquece esta dolorosa realidade, como se o esquecimento resolvesse o problema. Fazemos igual à avestruz que esconde a cabeça no buraco diante de qualquer temor.

Lá na minha família, foi-se quase todo mundo. Mas, aqui, há um caso a anotar. Um caso raro. Minha mãe estava costurando e no chão estava meu irmão Alberto. E o que é que tem isso demais? Ora, era que o menino chorava, chorava muito. Olhava para a sua mãe costurando e os olhos cheios d'água. Quando a mãe percebeu, foi logo lhe perguntando, apreensiva? “O que foi que houve, meu filho? Algum bicho lhe mordeu, tá sentindo alguma dor? E ele, num choro convulso, respondeu soluçando: “Estou chorando porque, um dia, você morrerá”. Bobagem, meu filho, não vou morrer tão cedo”. E o menino: “De que adianta? Mas, um dia a senhora vai morrer”.

No entanto, poucos pensam que, um dia, deixarão este mundo, para onde vieram nus e sairão vestidos, não é engraçado?
Meu tio paterno, João, solteirão, quando uma pessoa lhe contava sobre alguém que se beneficiou com alguma vantagem na vida, se sucedeu bem em algum empreendimento, ele logo dizia, sorrindo: “Mas morre”... Ele era de um ceticismo impressionante. Morreu solteirão, de um câncer na boca.

Meu pai morreu com oitenta e sete anos. Já a minha mãe, com seu modo de viver, atravessou um século sorrindo. E qual o motivo dessa longevidade? O otimismo. Minha mãe vivia sorrindo para a vida. Alimentação sóbria. Divertia-se decifrando charadas e com as chamadas “Palavras Cruzadas”. E Lia muito livros. Certa vez, zangou-se com uma mosca que a importunava, e debochou: “Esta mosca besta pensa que já morri”.

Minha mãe foi um exemplo de coragem diante da vida. Encarou sua velhice com muito otimismo. Cuidava muito da aparência, estava sempre bem vestida e penteada. Costumava dizer: “Meu filho, velhice quer trato”.

E o que dizer do “mais morre” do tio João? Sim, todos, um dia, sairão deste mundo. Seja rico, seja pobre, seja feio, seja bonito, feliz ou infeliz. Esta é a grande verdade e a maior certeza das nossas vidas.

E de que morreram meus irmãos? Cito apenas Mário, o mais velho. Morreu de cigarro. Vi-o arquejando, no leito de hospital, com o pulmão cheio de pus, vítima de enfisema, e uma tristeza enorme no rosto.

Todos morrendo e Alberto pensando. Pensando e chorando, aos pés da mãe costurando. Será que ele tinha razão com esse comportamento?

E o suicídio? Eis aí a mais estúpida maneira de morrer. Gande é a decepção do espírito de um suicida quando desperta no plano espiritual, cheio de remorso.

Viver! Haverá coisa mais bela? Melhor do que viver é saber viver. Esta a nossa grande responsabilidade. Mas, será que meu irmão Alberto tinha razão nas suas reflexões sobre a certeza da morte? Bem, mesmo preocupado com o destino, ele foi o mais animado dos irmãos. Bom humor era com ele. Então, soube viver!

O que importa é estar consciente. Lembrando que minha mãe foi até os 109 anos, e morreu dormindo, quase sorrindo...

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