Meu Mundo-Sertão é repleto de mistérios, de belezas ocultas que se descortinam devagar, apenas para aqueles mais sensíveis, que não têm pr...

Luar do mundo-sertão



Meu Mundo-Sertão é repleto de mistérios, de belezas ocultas que se descortinam devagar, apenas para aqueles mais sensíveis, que não têm pressa, que se deixam levar. Fui para o Mundo-Sertão, desci a boca do Cariri, através da PB 138 (por Catolé de Boa Vista). Não tive a sensação tão esperada de após passar pelo distrito de São José da Mata e na entrada do sítio Tambor, a 704 metros de altitude, descer aquele corredor margeado pelas serras do Maracajá e do Engenho até a Praça do Meio do Mundo. É a partir dali que me sinto adentrar neste mundo mágico, repleto de sortilégios, mas não tive aquela costumeira e a esperada sensação.

Não fui pelo caminho habitual através da rodovia transamazônica porque desejava trilhar pela estrada que nos conduz a Catolé de Boa Vista, e em seguida ao município de Boa Vista, já na BR 412. Esse caminho já fiz algumas vezes, mas totalmente no asfalto ainda não. Segui. Estava na companhia dos amigos historiadores Erik de Brito (Neto) e Josemir Camilo que atenderam prontamente ao meu convite de participar da Reunião Ordinária do Instituto Histórico e Geográfico de Serra Branca em comemoração ao aniversário de 59 anos da cidade.

Partimos ao entardecer. Na boquinha da noite passávamos pelo tranquilo distrito de Catolé de Boa Vista; mais à frente, após passarmos por Boa Vista, já a caminho de São João do Cariri, vimos, como um sinal, um clarão, um relâmpago que parecia ser lá pelas nascentes do Rio Paraíba, em Monteiro. Minutos após sentimos um forte cheiro do mato, marmeleiros e juremas pretas parece que haviam entrado pelos dutos do ar condicionado nos inebriando, como é possível? Neto e eu nos olhamos, eu sorri. Aquilo era só mais um sinal da natureza chamando a contemplá-la. Desliguei o ar, desci os vidros, diminui a velocidade. Noite de lua cheia! Mata, serrotes, rodovia, tudo iluminado. Aproveitando a soledade de nosso carro, desliguei o farol. Nada de artificial em genuínas sensações e sentimentos. À margem direita da estrada, na famosa muralha do meio do mundo cacheada de blocos rochosos, o alumiar da lua beijava o contorno das serras, dava forma aquele horizonte, um sol de prata “prateando a solidão”, cenário mágico, luar do Mundo-Sertão.

Neto e eu nos deslumbrávamos a cada momento, contemplávamos as estrelas, vi a ursa maior, um êxtase difícil de quantificar. Naquele momento acho que o Prof. Josemir Camilo, que só observava o nosso movimento, pensava que aqueles garotos tinham endoidecido, talvez seu habitué metropolitano não permitira tal desfrute. Ora, já dizia Pedro Nunes, quando se aprende a amar o Mundo-Sertão, chega dá gosto pisar em cima dele, sentir o chão estremecer, mergulhar em seus mistérios, e assim fazemos quando a vida nos leva pr’aqueles rincões.

Em São João do Cariri, paramos em Roque Santeiro para comer uma fatia de bolo de mandioca com queijo coalho (dali mesmo!) bem assado, acompanhado de café puro e forte. Sentei na primeira mesa e, vez em quando, fitava ao longe as curvas do rio Taperoá, refletindo a lua e nos provendo uma brisa úmida e fria, vinda do sul.
Cheiro de terra molhada anunciava chuva próxima…
Chegando a Serra Branca, a lua faceira cintilava na Serra do Jatobá - a Serra Branca. Um espetáculo, aquela cena. Já na cidade, chegamos ao destino, a Escola Vasconcelos Brandão. Professor Zé Pequeno, na calçada a nos esperar, nos chama: – Thomas, vamos entrar, tá chuviscando!

Um fino chuvisco, sem a densidade de uma neblina, não incomodava, ao contrário: – Zé, vamos prosear por aqui, contemplar o luar, esse chuvisquinho p’ra banhar nossa alma, e ali conversamos um pouco... ao mesmo tempo que via o movimento ao longe, nos arredores da praça, afinal era um sábado e, além do mais, festivo para Serra Branca.

“Não há, oh gente, oh não, luar como esse” do Mundo-Sertão...


Thomas Bruno Oliveira é historiador e jornalista / e-mail.

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