Nos carnavais da minha juventude o “lança-perfume” já era uma droga proibida. Em 1961, por recomendações do jornalista Flávio Cavalcante, o...

Carnavais de outrora

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Nos carnavais da minha juventude o “lança-perfume” já era uma droga proibida. Em 1961, por recomendações do jornalista Flávio Cavalcante, o presidente Jânio Quadros, que havia sido eleito com um discurso que prometia “moralizar o Brasil”, editou o decreto de número 51.211, sete dias antes da sua renúncia, impedindo a fabricação, a distribuição e o consumo da substância em todo o território nacional. Proibição que perdura até hoje. Seu uso passou a ser feito de forma contrabandeada. Como tudo que é proibido desperta curiosidade, ficávamos interessados em conhecê-lo. Sua comercialização passou a ser clandestina. Tornou-se, então, não só um caso que merecia o olhar atento da saúde pública, mas também da polícia.

No decreto dois “considerandos” se destacavam: “nada justifica a tolerância do Poder Público para com o emprego da substância nociva à saúde, como instrumento de folguedo carnavalesco, acessível à generalidade da população” e “a prática de aspiração do lança perfume como meio de embriaguez, vem se generalizando de maneira alarmante”.
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A proibição fez parte, então, de uma série de medidas do presidente Jânio Quadros num movimento de moralização da sociedade brasileira.

O “lança perfume” chegou ao Brasil no início do século passado, se tornando muito comum seu uso nas folias carnavalescas, compartilhado e sociabilizado livremente. Seu consumo se fazia através das vias respiratórias, causando sensações de euforia e desinibição. Colocado em tubos de metal, pressurizados, era composto à base de clorofórmio e cloreto de etila, normalmente com éter e algum aroma. Tinha efeito rápido, durando em torno de cinco a quinze minutos. No entanto, fazia com que o usuário perdesse o controle corpóreo.

A verdade que não pode ser contestada era de que punha em risco a vida de seus consumidores. Potencializava a possibilidade de danos como parada cardíaca, perda de memória e de tato. Um alucinógeno que provocava como consequências, após os efeitos de euforia: dores de cabeça, náuseas e mal estar. Quando inalada, a substância causava alteração no sentido nervoso, acelerando batimentos cardíacos que poderiam, inclusive, matar.

Então nos salões onde se realizavam os bailes carnavalescos do início do século passado, além das serpentinas e confetes, os foliões portavam um spray aromático que esguichavam no lenço para serem aspirados. Eram anunciados sem censura nos principais jornais e revistas do país. Transformou-se em símbolo do carnaval da época. O seu fim, estabelecido pelo presidente Jânio Quadros, de qualquer forma, deixou marcas na memória, um clima de saudosismo. Tanto que Edu Lobo, numa de suas composições, “No Cordão da Saideira”, lamenta: “Hoje não tem dança, não tem mais menina de trança, nem cheiro de lança no ar...” Para alguns era um brinquedo romântico e inofensivo.


Rui Leitão é jornalista e escritor

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