No que pese a importância dos estruturalismos, houve quem utilizasse os gráficos, os esquemas, as chaves, os colchetes etc., como se foss...

O visgo das coisas

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No que pese a importância dos estruturalismos, houve quem utilizasse os gráficos, os esquemas, as chaves, os colchetes etc., como se fossem bisturis nas mãos de um médico legista que dissecasse o texto (o cadáver) à semelhança de um redivivo Jack, o Estripador. Ou seja, dividiam-no mecanicamente em partes, reduzindo-o a um monte de roldanas, porcas, parafusos, molas, prontos para serem vendidos no ferro velho da esquina.

O Expedito crítico compreende o texto como um corpo vivo, insurrecto, inabordável e inacessível aos que tentam aprisioná-lo nas camisas de força das fórmulas previamente estabelecidas. Assim também o Expedito poeta, que mais se abebera das fontes perenes da poesia do que da teoria literária em suas fontes.

Na verdade, o domínio puro e simples das teorias literárias não possui o dom de converter o crítico ou o professor em poeta, pois este já nasce pronto e feito, se não na linguagem, que somente será conquistada a duras penas, fruto do esforço, da pertinácia, da abnegação, pelo menos no modo fronteiriço, estranho, a contrapelo, de quem experimenta a sensação de “não estar de todo” no contexto que lhe foi reservado viver. E Expedito é poeta desde sempre, desde tempos imemoriais, mas só passou a sê-lo efetivamente, em toda a sua inteireza e plenitude, a partir do instante em que encontrou a linguagem com que expôs os seus sentimentos mais profundos, inclusive na contramão das vanguardas, apesar de ser tributário das reais conquistas do concretismo, principalmente.

Aqui, porém, vale a advertência: “Não são as poéticas, mas os poetas que fazem a poesia”. E como que se utilizando desse quase axioma, Expedito rejeita o discurso impessoal do concretismo e seus desdobramentos para lançar mão de uma espécie de “lirismo com siso”*, conforme podemos observar nos poemas de “O Visgo das coisas”** (Editora Penalux, Guaratinguetá, São Paulo, 2017).

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E o que seria esse “lirismo com siso”? Diria que um lirismo na medida certa, sem liberar a sangria desatada dos sentimentos e sem incorrer no equívoco de preservar a versão original do poema a partir da falsa premissa de que retocá-lo, elaborá-lo, significaria conspurcar aquilo que os poetas possuem de mais puro e visceral: a espontaneidade.

Disso tudo se infere que os poemas de Expedito Ferraz Jr. “mostram como a força poética verdadeira (...) transforma as tendências do tempo em coisa própria do poeta”. Ou seja, que os poemas de “O Visgo das coisas”, a exemplo de “O Som não se”, “O Labirinto”, “A Cantiga do Velho do Saco”, “Vista aérea”, “Galope sem freio”, “Lâmina”, “Chiste”, “Mariazinha”, “Jogos frutais”, “Litoral”, “Lírica de passarinho”, entre outros, “são coisa (s) própria (s)” do poeta Expedito Ferraz Jr.

*Refiro-me, aqui, ao excelente título do livro de Amador Ribeiro Neto: “Lirismo com siso – notas sobre a poesia brasileira contemporânea”, Ideia Editora, João Pessoa, 2015.

“O Visgo das coisas” ainda inclui poemas selecionados de “Poheresia” (2014), livro com o qual Expedito estreou.


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