NATUREZA As artimanhas dos grãos perseguindo a eternidade As vozes perdidas no bambuzal O ponteio disperso no ve...

As artimanhas dos grãos

poesia capixaba jorge elias neto

NATUREZA
As artimanhas dos grãos perseguindo a eternidade As vozes perdidas no bambuzal O ponteio disperso no verde profundo O despejar no Mundo de chumaços de Pólen O prisma orvalhado nascendo no tear das aranhas O revoar das lanternas noturnas A generosidade da Paz entrecortada de espantos
BELÉM, BELÉM
O fundo é um convite do poço, já a arte, é um eco do abismo, em parte só finjo que ouço o outro, este meu grande vício O visgo, arremedo do sim, é o mesmo não enrustido, percebo, faz parte de mim o engodo do eu aturdido As partes repartem este todo, do ontem que hoje aflora, do um que é de si um estranho E mente, no aqui, no agora, Desdiz, este ser enfadonho, pequeno, infeliz, sem memória.
ESTÁ FEITA TODA SURPRESA
(o sangue é água na boca do homem) O que resta, e se conta, é o reviver de histórias esquecidas, o mesmo estrondo, e seu filho o silêncio, gestado no medo E se ara a terra, se removem os corpos, para plantar o pão que sacia a breve vida (“O tempo de antes” é o repasto, a saúde da indigência)
DESENCONTROS
(O tempo é terra que recobre os desencontros.) Confesso a minha história de homem, o aprendizado que a paz recortada ainda é paz, quando cerzida pela experiência, e a vida, um murmúrio de santidade.
(poemas inéditos)


MANUAL PARA IGUALAR HORIZONTES
Cobrir com os olhos a distância do aviso. Manter tensa a ilusão no abismo. Rodopiar com os lençóis ̶ quarar o entardecer. Repicar no lago o tostão de prata. Enredar no traçado das mariposas. Estender a noite sobre a teia de intrigas. Encontrar um recanto para as malhas do desespero. Perder-se na interpretação dos instantes. Mordiscar momentos ̶ relutar conflitos. Renegar o sucesso às prateleiras das copas. Corromper a esfinge com o desejo de ócio.
MANUAL DE SE ENVEREDAR EM CAMINHOS
Os campos eram de um algo de desprezar estradas, percorrer vazios, recontar as sombras. Era um bastar-se despercebido. (Mesmo sem, era muito.) Preparar saltos, conter a fadiga. Era tumulto ̶ solidão na margem do construído sem rumo. Mote de traças, corte de foices. Mais do mais, se procura a paz das labaredas, do zumbido doido. Ofuscar o ínfimo de reconhecer-se o mínimo sopro no entardecer da manhã cuspida no tacho do Universo assombroso.
(Poemas do livro Manual para Estilhaçar Vidraças ■ Editora Cousa, 2021)


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