Uma pequena homenagem a Inaldo Quintans
Os irmãos se viam pouco. Não porque não se gostassem, mas era hábito da família a reserva. Queriam-se bem, contentavam-se ao encontro, mas viam-se pouco. Quando juntos, riam alto, comiam com gosto, bebiam até ao exagero, alegravam-se!
Era um sábado, haviam há muito se encontrado, e a esposa de um deles decidiu promover a reunião – comemorariam a visita do irmão que morava longe, comemorariam a vida também. Sabendo dos gostos da linhagem, ela escolheu uma feijoada para o almoço; teria o sabor que era de agrado de todos, teria a simplicidade que não feria a espontânea conversação. Assim foi.
Era um sábado, haviam há muito se encontrado, e a esposa de um deles decidiu promover a reunião – comemorariam a visita do irmão que morava longe, comemorariam a vida também. Sabendo dos gostos da linhagem, ela escolheu uma feijoada para o almoço; teria o sabor que era de agrado de todos, teria a simplicidade que não feria a espontânea conversação. Assim foi.
Naquela tarde, houve o regozijo do encontro regado pela boa comida, pela bebida que agrega, pela conversa amiga. Falaram de muito, mas, especialmente, do falecido pai: por momentos, era como se ele ali estivesse, presente em sua ausência, na história e no peso deixado na existência de cada um deles; presente também na saudade. O mais velho, ocupando o seu lugar, tomou a voz: jeitos do pai, falas do pai, feitos que orgulhavam a família. Os mais novos sorviam o que era dito junto com os caroços de feijão com paio, pedaços de si que lhes antecediam a construção de suas identidades. Todos riam, arrumavam as suas lembranças, preenchiam lacunas esquecidas.
E a conversação assim caminhou solta até chegarem à recordação do dia em que se despediram do pai. Detalhes, talvez nunca revelados, foram ali confessados. Souberam do sapato de couro alemão com que o pai foi enterrado, “Eu deveria ter ficado com ele!”, de sua barba, aparada pelo primogênito, do terno escolhido, “ Foi o do meu casamento!”, lembrou o mais novo. E, entre risos e palavras, também choraram. O doce da rapadura e o sabor forte do café tornaram aquela parte ainda mais longa, ainda mais rica, como que prolongando, junto com o almoço, a vida de quem ficou menos do que se desejava.
A brisa suave da tarde e o afeto que brotou de tal encontro espalharam um sabor precioso de família, de reconhecimento. Os abraços foram espontâneos, os risos desatados, os agradecimentos mais intensos. Naquele instante, ninguém sabia que o mais velho ali se despedia; que era a sua última ceia. Três dias se passaram, e foi o caçula que vestiu, barbeou e embalou o último sono do seu pai/irmão.