Leopoldo R. T. F. formou-se em Medicina. Graduou-se em universidade pública, lá no Rio de Janeiro. Rapaz estudioso e dedicado, pagou seu tempo de residência, amargou plantões, fez tudo dentro do riscado e estava assim, apto para exercer o ofício de Hipócrates na especialidade de ginecologia, não fosse um contratempo que viria para tirá-lo dos eixos.
Estava noivo de Célia R. A. M. – a espevitada Celinha – já com a papelada pronta nos cartórios e data marcada para a cerimônia religiosa na icônica Igreja da Candelária. Além disso, “buffet” já devidamente pago e até um cerimonialista havia sido contratado, uma vez que fora recomendado pela redação da revista Caras, órgão da imprensa que iria fazer a cobertura do evento. Mas…
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Damasceno descobriu toda safadeza de Celinha, tirou fotos, filmou e entregou a Dona Vera, mais que um relatório, um dossiê completo. Daí às mãos de Leopoldo que quase enfartou ao se deparar com aquelas evidências tão sórdidas. E ainda teve de ouvir de Dona Vera:
— Sua noiva está traindo você com jogador do Vasco da Gama. Eu bem que avisei que ela não prestava. Olha só Leopoldo, com um jogador do Vasco!
Leopoldo, olhou bem as fotos, viu e reviu a fita cassete com as diabruras de Celinha e soltou seu desabafo.
— O pior é que esse fdp é reserva. Nem titular é.
Ser traído não é fácil; e ainda mais por um reserva do Vasco da Gama. Leopoldo não pensou duas vezes e deu um pé no traseiro de Celinha. Então, resolveu curtir suas dores e vergonha bem longe dali. Mas onde? Abriu um velho atlas do seu tempo de ginásio e logo apontou aleatoriamente o dedo para algum ponto incerto do mapa do Brasil. Estava li: Catolé do Rocha na Paraíba!
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Mas havia uma dificuldade, o doutorzinho não se dava bem com dialeto local, não entendia patavina: arrochado, canguero, cabimento, carrego, tamborete, torar, bigu, arretado, assustado, rirri, ruma, escarcela, pantim, mói, pitoco, muído, etc, etc, etc…
Nas dificuldades de tradução, à noitinha recorria a Manezinho Perna-torta que tinha um fiteiro perto do consultório. Mas, de certa vez, nem Manezinho o salvou. Foi quando Dona Jerusa chegou com a filha Do Carmo, esta de 17 anos. Doutor Leopoldo começou o inquérito e Do Carmo logo tomou a palavra:
— Mainha ficou de pantim quando me perguntou se o Chico tinha chegado e eu respondi a ela que não.
— Mas e daí? - quis saber o clínico.
— Já era para ele ter chegado a semana passada – disse Dona Jerusa – tô aperriada doutor, ele nunca se atrasou.
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— Mas, doutor, o Chico sempre veio no dia certinho – reclamou a mãe - Não sei o que vai ser dessa menina.
— Sinto muito, mas não posso ajudar. Mas pela minha experiência de vida, vou dizer uma coisa: Se em mais um cinco dias ele não vier, pode esquecer. Recomendo um chazinho.
— Chá do quê, doutor? Quis saber Dona Jerusa?
O nosso clínico pensou nas mezinhas de Dona Vera? O que sua mãe recomendaria para acalmar aquelas duas criaturas? Pensou, pensou e nada! Hortelã? Eva cidreira?
— Toma um chá de gengibre com orégano, Uma xícara pela manhã e outra a noite.
— E assim, o Chico vem?
— Não posso garantir, mas é que posso fazer por enquanto.
Elas agradeceram e antes da consulta seguinte, o doutor conjecturou: Poderiam ligar, passar um e-mail e me aparecem aqui achando que eu posso fazer esse sujeito, esse tal de Francisco aparecer. “Meu Deus, onde fui parar”, pensou ele.
Dois dias depois Do Carmo veio ao consultório.
— Vim agradecer, doutor. Chico chegou. Seu chá foi tiro e queda - Sem entender nada Doutor Leopoldo ainda disse:
— Manda meu abraço pra ele.