“Ó, hieróglifos egípcios, adubas as Duas Terras, regas as margens do Nilo... criamos a escrita ao mundo!" Ode poética ao Antigo E...

Hieróglifos: as imagens sagradas do Antigo Egito

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“Ó, hieróglifos egípcios, adubas as Duas Terras, regas as margens do Nilo... criamos a escrita ao mundo!"
Ode poética ao Antigo Egito

No período pré-dinástico do Antigo Egito (cerca de 4000–3100 a.C.), já existiam formas de representação pictográfica e simbólica utilizadas para marcar propriedades, identificar chefes tribais e registar aspectos religiosos. Esses sinais, inicialmente gravados em peças de cerâmica e em artefatos,
HIERÓGLIFO Etimologicamente, o termo originou-se da junção de duas palavras gregas: hierós (sagrado) e glýphein (escrita); “escrita sagrada”.
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Paleta de Narmer: peça em xisto verde do período pré-dinástico (c.3100 a.C.), considerada um dos documentos mais antigos d a história da escrita. As gravuras celebram a unificação do Alto e do Baixo Egito sob o governo do rei Narmer. ▪ Museu do Cairo, via Wikimedia
não constituíam ainda um sistema de escrita plenamente desenvolvido, mas prepararam o caminho para a criação dos hieróglifos* egípcios, um dos sistemas de escrita mais antigos da humanidade.

Por volta de 3300 a.C., os hieróglifos surgiram como um complexo sistema gráfico que combinava símbolos pictográficos, fonéticos e ideográficos, capazes de representar sons, palavras, ideias e conceitos abstratos.

Os egípcios chamavam aos hieróglifos medju-netjer, que quer dizer “palavras dos deuses”. Conforme a mitologia egípcia, teria sido a deusa Seshat a criar os hieróglifos e o deus Thoth, patrono da sabedoria e da escrita, ensinado esta linguagem aos egípcios.

Diferente dos alfabetos modernos, que se baseiam num conjunto limitado de letras, os hieróglifos reuniam centenas de imagens (ideogramas), muitos derivados de elementos quotidianos, como representações de animais, plantas, ferramentas e partes do corpo humano, símbolos que representavam sons (fonogramas) e sinais que indicavam a categoria de uma palavra (determinativos). 

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Papiro hieroglífico do século II a.C., Período Tardio do Egito Antigo. Neues Museum, Berlim.
Mais do que simples comunicação, a escrita hieroglífica possuía um valor religioso e esotérico. A crença do povo egípcio de que os hieróglifos tinham poderes mágicos era muito forte. Acreditava-se, por exemplo, que, ao se escrever o hieróglifo do nome de alguém em túmulos ou em monumentos, isso incorporaria toda a energia e alma daquele Ser, garantindo a sua existência eterna.

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Hieróglifos talhados em madeira ▪ Imagem: G. Careddu / Museu Egípcio de Torino, Itália
Os hieróglifos eram utilizados em inscrições religiosas, monumentos, templos e túmulos, geralmente talhados em superfícies de pedra ou pintados em paredes, nomeadamente templos, obeliscos, tumbas e estelas, tarefa para a qual artesãos habilidosos usavam cinzéis para criar entalhes intrincados, garantindo que os textos resistissem ao tempo por séculos (muitas inscrições em pedra também eram pintadas com pigmentos vibrantes para melhorar a legibilidade e o impacto visual dos hieróglifos), painéis e tábuas de madeira também serviam como superfícies para escrita (frequentemente revestidos com uma camada de gesso ou argamassa para criar uma base lisa), vasos de cerâmica e tábuas, metais preciosos como ouro e prata (usados especialmente em decretos reais ou em textos sagrados e, por fim, em papiros, leves e portáteis, ideais para a criação de rolos. Os escribas usavam canetas de junco e tinta para escrever, tornando-os num meio prático para registar textos religiosos, literários e administrativos.

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O Escriba Sentado, escultura em calcário policromado (olhos feitos de cristal de rocha, quartzo e cobre) datada do Império Antigo (c. 2600–2350 a.C.). Proveniente de Saqqara, representa um escriba em posição de escrita, símbolo da importância da administração e do registro na sociedade egípcia. Acervo do Museu do Louvre, Paris. ▪ Imagem: C. Décamps, Louvre Grand Palais.
O seu caráter artístico era fundamental: os egípcios viam na escrita não apenas um código de comunicação, mas também uma forma de arte sagrada, atribuída ao deus Thoth. Com o tempo, o sistema tornou-se cada vez mais complexo, dando origem a dois derivados: o Hierático – uma forma cursiva usada em textos administrativos e religiosos em papiro, e o Demótico – forma mais simplificada, utilizada para registos do dia-a-dia, em documentos comerciais e legais.

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ESQ: Papiro Ebers, um dos tratados médicos mais antigos da História, escrito em Hierático, datado (aproximadamente) de 1550 a.C (Universidade de Leipzig, Alemanha) ▪ DIR: contrato de locação de terreno, escrito em Demótico, originário da região de Tebas, c.500 a.C (Museu do Louvre, Paris)
A linguagem hieroglífica é considerada enigmática e de difícil compreensão, devido a existirem aproximadamente sete mil tipos de sinais diferentes. Os hieróglifos não indicavam explicitamente vogais e podiam ser organizados em linhas horizontais ou por colunas verticais, escritos tanto da direita para a esquerda como da esquerda para a direita, dependendo da orientação das figuras. Não havia espaços ou pontuação. Incluíam sinais uniliterais (uma única consoante), biliterais (duas consoantes) e triliterais (três consoantes).
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Incrições hieroglíficas nas paredes tumba de Nefertari, esposa do faraó Ramsés II, Vale das Rainhas, Egito ▪ Fonte: The Yorck Project
A leitura era auxiliada por sinais determinativos, que indicavam o campo semântico da palavra.

Por ser considerada uma escrita sagrada, os hieróglifos eram utilizados apenas por sacerdotes, membros da realeza, mas sobretudo por escribas, mestres dessa arte sagrada, que podiam interpretar os símbolos e reproduzi-los e que detinham o conhecimento necessário para registar a vida, as crenças e os sonhos de um império que entendia as palavras como pontes para a eternidade. Cada hieróglifo gravado contava não apenas uma história, mas uma conexão entre os mundos visível e invisível.

Os hieróglifos do Livro dos Mortos eram cuidadosamente esculpidos ou pintados com o objetivo de garantir que o falecido tivesse sucesso nessa jornada. Além disso, outras inscrições nas tumbas incluíam representações detalhadas de oferendas aos deuses, listas de bens essenciais para a vida após a morte e cenas do quotidiano, como celebrações e banquetes. Essas imagens não eram apenas reflexos da vida terrena, mas também atos simbólicos que garantiam que o falecido continuasse a desfrutar desses prazeres no Além.
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Pedra de Roseta, estela de granodiorito datada de 196 a.C., descoberta em 1799 em Roseta (Rashid), Egito. O decreto inscrito em três sistemas de escrita — hieróglifos, demótico e grego — foi a chave para a decifração dos hieróglifos egípcios. Acervo do Museu Britânico, Londres."
Em algumas tumbas, os textos também faziam pedidos explícitos aos visitantes vivos, instruindo-os a realizar rituais ou orações em nome do falecido para garantir sua continuidade espiritual.

Com o fim do Egito faraónico e a adoção do alfabeto grego, os hieróglifos caíram em desuso, tornando-se num mistério por séculos. O marco da sua decifração foi a descoberta da Pedra de Roseta (em 1799), durante a invasão de Napoleão, contendo o mesmo texto em grego, demótico e hieroglífico. O inglês Thomas Young iniciou a análise dos sinais fonéticos, mas foi o egiptólogo e linguista francês Jean-François Champollion quem, entre os anos de 1822 e 1824, estabeleceu o sistema de correspondência e demonstrou definitivamente o funcionamento da escrita. Na sua obra Lettre à M. Dacier (1822), Champollion explicou que os hieróglifos representavam um sistema complexo, combinando elementos figurativos, simbólicos e fonéticos no mesmo texto e, às vezes, até na mesma palavra. Essa revelação marcou o fim de séculos de especulação e o início de um
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Saqqara, Egito: sítio arqueológico que concentra estruturas funerárias do período de 3000 a.C. a 950 d.C., com relevos e hieróglifos que celebram autoridades e deuses.
entendimento real sobre a escrita e a língua do Antigo Egito.

Presentes em lugares icónicos como o Templo de Karnak e nas tumbas do Vale dos Reis, essas inscrições narram histórias de faraós, deuses, conquistas militares e rituais religiosos que moldaram a cultura egípcia durante milénios. Esses símbolos não eram simples decorações. Quando os escribas esculpiam um faraó oferecendo tributos a Amon-Rá ou registavam uma vitória em batalha, acreditava-se que essas ações se tornavam eternas, ganhando vida e significado no mundo espiritual. Além disso, muitos hieróglifos eram acompanhados por cores vibrantes que, embora desbotadas pelo passar dos séculos, transmitiam camadas adicionais de simbolismo e significado espiritual.

Hoje, os hieróglifos permanecem como uma das maiores heranças do Antigo Egito, revelando crenças, rituais e aspectos da vida quotidiana. Mais do que símbolos, eles representam a união entre arte, religião e linguagem, sendo uma janela para a mentalidade de uma das civilizações mais magnificentes e influentes da Antiguidade.
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