Roberto Guedes, um dos fotógrafos deste jornal, arranca-me da preguiça, do cansaço de quem faz a mesma coisa há setenta anos, e tange-me com seu clique aos pináculos mais altos e agudos onde trepa e se deita a João Pessoa de hoje. Não dá para contar os andares. E não há mais a menor possibilidade de ser diferente. Fechou-se o horizonte para quem fica do lado de cá.
Piscina do Esporte Clube Cabo Branco (Paraíba) Roberto Guedes / A União
Ontem, tentando sair de uma telenovela do canal em que vinha ligado, dou com uma entrevista local, em que um casal saído aos brilhos de algum salão de beleza — o varão sob os mesmos cuidados estéticos da patroa — presidia a inauguração de uma dessas iluminadas pirâmides de luxo em que se instalam, hoje, as famílias dessa linha, os negócios e serviços. Numa ida ao médico, há poucos dias, fiquei sem saber como largar o piso e entrar no elevador. Felizmente veio um moço com farda do Vaticano a nos conduzir a um sensor ótico e daí ao elevador. Mas, pelo que vi e do pouco que consegui ouvir da entrevista, a obra que entregavam é coisa de fazer inveja aos Jardins paulistas.
Bairro do Altiplano (Paraíba) @pedrosoaresimoveis.com.br
Sou dos que sonharam e sonham com o progresso desta mimosa e saudável cidade. Uma cidade diferente, que ainda cheira a mato. E que, se não goza de uma primavera tão florida como a dos climas temperados, não nos deixa passar em branco com os seus paus-d’arco, suas cássias, seus flamboyants e jambeiros a atapetarem os parques e ruas em torno da Lagoa.
Paus d'arco do Parque Solon de Lucena (Paraíba) Hans Von Manteuffel
Tem sido uma luta manter a mata original que os seus rios e riachos sustentam por conta própria, sem auxílio do morador, que pouco tem se importado com o trato dessas águas. O Clube Cabo Branco pertence a esta cidade que as leis do patrimônio vêm conseguindo preservar. Ainda esta semana, o Ministério Público, sob mão forte da Constituição de 1988, que garante seus poderes, manteve o respeito ao gabarito consagrado no tempo de João Agripino. Tempo em que, da vista panorâmica do Esporte Clube Cabo Branco, tínhamos o mar-oceano em toda a sua largura como a panorâmica do clube.
Praia do Cabo Branco, onde há limite de altura de prédios, com o bairro do Altiplano acima, sem limite Thiago Japyassu
A foto de Roberto Guedes sintetiza espantosamente a mudança drástica não só da paisagem, mas da mentalidade, do lado de dentro do pessoense. Fisicamente, o Clube sumiu, não existe, não conta. Do ângulo em que foi tirada, de um dos lados da piscina com foco na barreira do Miramar, não há mais mira-mar. E, para não haver no espírito, é meio caminho andado.
Mas, antes que a barreira de arranha-céus roubasse a panorâmica do Clube, o Nordeste inteiro, a partir da Bahia, já se despedia dos quintais, das mangueiras, do caminho antigo das calçadas que as gestões municipais ornamentavam com ladrilhos do tipo Copacabana. Recife Novo fechava sua Boa Viagem aos olhos do Recife Velho, enquanto Damásio Franca, Higino Brito e Mário Faraco se empenhavam em dar à nossa cidade e à sua elite o mais belo mirante de sua vida social.