Um engenheiro civil que atuou nas frentes de emergência do governo federal durante as estiagens da década de 1970 relatou o caso de um ...

Pra que complicar?

Um engenheiro civil que atuou nas frentes de emergência do governo federal durante as estiagens da década de 1970 relatou o caso de um colega que tentou ridicularizar um sertanejo.

A tarefa era simples: escolher a trilha menos acidentada para a construção de uma nova rota que viabilizaria o acesso mais rápido para o transporte de materiais e a passagem dos operários. Porém, para humilhar o trabalhador rural, o engenheiro dirigiu-se a ele assim:

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— Eu quero que você defina o alinhamento preliminar da estrada, avaliando a topografia e as condições do terreno, para subsidiar o levantamento planialtimétrico.

Coçando a cabeça, o “matuto” encarregado do serviço respondeu: — O doutor quer que eu faça o quê?

Com um sorriso irônico, o engenheiro disse:
— Quero que escolha o melhor caminho para abrirmos uma picada no matagal...

O homem simples, porém experiente no trato com a terra, respondeu com naturalidade:
— O jeito mais certo de encontrar esse caminho é soltar um jumento e seguir por onde ele for. Por instinto, ele vai descobrir a melhor passagem...

Tentando zombar da resposta, o engenheiro retrucou:
— E quando não temos um jumento para indicar o trajeto?

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Sem hesitar, o sertanejo devolveu:
— Aí a gente usa um engenheiro mesmo...

Sobre aqueles que, em vez de buscarem a clareza, a simplicidade e a verdade, preferem dificultar, obscurecer e confundir para dar uma aparência de sabedoria, Nietzsche disse: “Eles turvam as águas para que pareçam profundas.”

No soneto “A Uma Deusa”, o poeta maranhense Luiz Lisboa satiriza o formalismo excessivo de pretensos intelectuais adeptos do linguajar rebuscado, artificial e hermético.

Utilizando algumas palavras inventadas e uma métrica perfeita, os curiosos versos de Luiz Lisboa dizem assim:

Tu és o quelso do pental ganírio Saltando as rimpas do fermim calério Carpindo as taipas do furor salírio Nos rúbios calos do pijom sidério
És o bartólio do bocal empírio Que ruge e passa no festim sitério Em ticoteios de partano estírio Rompendo as gâmbias do hortomogenério Teus lindos olhos, que têm barlacantes, São camençúrias que carquejam lantes Nas duras pélias do pegal balônio São carmentórios de um carce metálio De lúrias peles em que pulsa obálio Em vertimbáceas do pental perônio.

O uso da obscuridade como artifício de prestígio é um expediente típico da mediocridade pomposa.

Quem realmente domina um assunto prefere a simplicidade, e só utiliza o jargão próprio de um ofício, de uma arte, indústria ou ciência como recurso de rigor.

Já os pseudoeruditos são adeptos da terminologia obscura para esconder sua falta de substância atrás de uma cortina de complicações.
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Inflar a própria importância e simular profundidade é fazer do estilo e da terminologia especializada um disfarce para a ausência de conteúdo.

A poesia, assim como a filosofia e a ciência, não se sustenta apenas de rima, ritmo e forma. O valor maior da palavra não está em sua aparência, mas no bem que ela pode produzir no coração das pessoas. Todo conhecimento que se perde em vaidade acaba por se tornar inútil, porque não consola, não ilumina e não edifica.

A sabedoria autêntica se mostra na humildade, na simplicidade e na capacidade de servir, comunicando-se através da clareza, da ternura e da verdade, e nunca pela confusão. O orgulho intelectual fecha portas; já a palavra sincera, ainda que simples, abre caminhos e constrói pontes.

Jesus ensinava por parábolas, de modo a ser compreendido por todos. A beleza maior de qualquer discurso ou poema não está na técnica impecável nem no rebuscamento do estilo, mas na centelha de amor e de luz que pode transformar quem a recebe.

James Tissot
Aquele que se prende de forma obsessiva à forma arrisca-se a perder de vista a verdade que dá sentido à obra. Quem se preocupa em demasia com a letra esquece-se do espírito; quem se atém demais à forma olvida a essência.

Certa vez, Emílio de Menezes, o poeta parnasiano paranaense, respondendo aos críticos dos versos de “pé quebrado”, disse que “os bons versos não têm pés... têm asas!”

É isso aí.

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