Rótulos são inevitavelmente limitantes. Qualquer um. Por vezes eivados de classificação preconceituosa, quando não equivocados, viraram moda. Hoje rotula-se, generaliza-se, classifica-se tudo, um festival de sectarismo.
A mania se estende a todas as áreas. Nas artes plásticas, literatura, poesia, música, comportamento, religião, sexualidade. De maneira mais agressiva, acentuou-se a nefasta rotulação ideológica, gerando hostilidade entre pessoas dantes queridas. Um horror.
VecEasy
Chamam Bach de barroco, mas esquecem de que ele compôs em praticamente todos os estilos da época. Do rígido contraponto alemão às suítes com influências italianas e francesas, há em algumas obras até um caráter que pode ser definido como emocionalmente romântico. É quando a essência da intenção ou resultado artístico extrapola o caráter formalístico da crítica, da estética e da teoria musical. O Arioso escrito por Bach originalmente para a Cantata BWV 156 ganhou centenas de novas formas e versões para diversos timbres e tonalidades justamente porque contagiou o mundo com seu indiscutível lirismo. Ainda que confinemos o romantismo à cronologia histórica e seus aspectos técnicos, conforme rotulado, é impossível controlar a emoção e o devaneio amoroso ouvindo este adagio.
Beethoven GDJ
Na literatura, a confusão é a mesma. Modernistas, regionalistas, humanistas, parnasianistas, simbolistas, cordelistas, são dísticos estilísticos que se digladiam na ânsia de ultrapassar os perímetros dos estereótipos, quiçá refletindo até mesmo um desejo de seus autores. Ou dos leitores.
Evidentemente inegável é a utilidade de tudo o que ajuda ao ensino da Arte, da Estética, das Letras. São ferramentas indispensáveis ao entendimento formal que classificam a história do mundo e configuram suas teorias reveladoras e recriadoras. Mas a dureza e o apego exagerado a tais definições sufocam e empobrecem o devaneio das reflexões filosóficas e o próprio imaginário do ser humano.
Ariano Suassuna Nova Fronteira
Na música erudita, desde Bach, passando por Chopin, Liszt, Villa-Lobos foram muitos os compositores que se utilizaram do folclore regional recriando-os e transcrevendo-os em novas formas de expressão, justamente para que a arte extrapolasse os limites de sua época e lugar numa linguagem universalista.
Classificá-los de “regionalistas”, assim como Ariano, Cervantes, Dante, Homero e outros, seria limitá-los às raias de uma compreensão restritiva acerca de seus preciosos legados.