Primeiramente quero agradecer o convite do poeta Leo Barbosa para que eu fizesse a apresentação do seu livro, ou melhor, do novo lança...

(A) Temporal

poesia paraibana leo barbosa (a)temporal
Primeiramente quero agradecer o convite do poeta Leo Barbosa para que eu fizesse a apresentação do seu livro, ou melhor, do novo lançamento de (A)TEMPORAL, editado pela IDEIA, agora em 2023, contendo 43 poemas que tematizam o amor.

O meu olhar sobre o livro em questão vem pelo do professor e poeta Rony Santos. Não sou crítico literário, por isso não enveredei por nenhuma análise, mas uma leitura como professor e poeta, que também é leitor.

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Para tanto, pontuarei duas abordagens que confeccionam a tessitura do amor apresentado nos poemas a partir de um eu lírico que se dilui e se reconstitui na dor.

1. O amor sob três perspectivas de sentimentos:

Começa com a AUSÊNCIA como fundante de uma dor – enunciada a partir do poema Ressuscitar e vai até o poema Eterno. Eis nessa parte a clarividência de um Romantismo às avessas. Depois o refazer-se diante da DOR, marcado do poema Autenticamente nu até Paisagem de nós – Aqui evidencia-se a força do transitório como aprendizagem. E, por fim, o NOVO, findado do poema Regresso até o poema Conjugados – É quando o Eu se propõe a ultrapassar fronteiras entre a dor e o amor a partir do tempo.

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MS
2. A linguagem como expressividade da lírica de Leo Barbosa, com destaque para os campos lexical e semântico.

Quando falamos de AMOR, pensamos, de imediato, numa referência romântica, em particular, lembra-me a escola Romântica, cujo tema percorre as dimensões de nacionalismo, idealização da mulher, dor e morte e, por último, apreço social. Porém, faz-se necessário pontuar que o amor é universal na literatura, está no tempo. Refuta-se aqui o papel das musas para tal tema.

Ao ler (A)TEMPORAL, encontrei um amor que não cabe apenas à reverência de uma musa como inspiração para o poeta, mas do sentimento na dimensão de um relacionamento que perpassa pelas dores, melancolia, solidão e prazeres que é capaz de proporcionar. E este proporcionar vem pelo/através do tempo. Assim, prendo-me ao título (A)TEMPORAL destacado pelo uso de parênteses no prefixo (a).

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Léo Barbosa@leo.barbosa
Temporal é um adjetivo da língua portuguesa utilizado no sentido de " transitório". Por vez, no livro, o uso do prefixo (a) não reverbera apenas uma negação. Ao juntar o prefixo (a) com a palavra temporal, forma-se uma nova significação que ganha sentidos em cada poema construído, assim, a ação do tempo frente ao sentimento amor.

Na poesia de Leo Barbosa, o amor não tem tempo, ele é o tempo nas suas mais diferentes realizações. Seja numa intensidade de entrega; seja numa dimensão de ausência, mas sempre um sentimento que fecunda a alma e, principalmente, o corpo, uma vez que o amor é corporificado nos poemas.

Segundo Noemi Jaffe, o amor acompanha a dor, o que dá a combustão da paixão que deve ser consumida. E a voz do eu lírico de (A)TEMPORAL consome o outro; consome-se e consome o leitor. E esse consumo vem pela erotização que não é, em si, pornográfica, mas o desejo corporificado.

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A musa que norteia os versos de Leo Barbosa é prazer sentido, compartilhado, mesmo quando habitado na consciência do eu lírico. Para os românticos a mulher era idealizada e, mesmo quando desejada em sonhos, não era consumado o fato. Daí a melancolia que alimentava a dor não sentida. Nos versos de (A)TEMPORAL, a dor é resultado de um coexistir de corpos ao subterrâneo do desejo.

Ademais, constata-se um amor simbiótico, que sob o olhar da psicologia é o desejo de fundir-se ao objeto amado. Encontramos essa reminiscência nos poemas. É um entrelaçar-se de palavras, de sentimentos, de desejos de carnes. E é Eros que possibilita isso. Pois, para o amor realizar-se, é preciso que ocorram partidas e, até descontrole, pois só assim ele alcança a concretude dos encontros.

Nesse ínterim, a AUSÊNCIA é o mote do escalonamento dos afetos que emergem dores. O eu lírico já começa recortando o tempo: ressuscitar depois de uma morte. Mas qual morte? O amor. Leiamos Ressuscitar, pág. 15:

Nota-se que o eu lírico defronta-se com essa morte pela AUSÊNCIA do ser amado. A partir de então, nos são contadas/mostradas todas as sensações ressaltadas nos textos que geram a dor. Os versos que se apresentam desde o poema RESSUSCITAR até ETERNO mostram um amor que se deu pela posse, por uma voz singular que gerou uma atitude singular como se o amor se constituísse apenas de uma parte. Apenas de um lado: o dele. É o que encontramos em Temporal, pág. 16.

Ninguém me ofertará voz enquanto eu oscilar entre o desejo e a vontade.

Mas do outro lado está uma musa já distante, mas não intocável, como propunha os românticos do Mal do século. Na poesia de Leo Barbosa ela é carnal, tocada, desejada, como se revela nos versos de Ninfa, pág. 22.

Ressalta-se, portanto, que foi na AUSÊNCIA que o eu lírico enfrentou a dor ao imprimi-la numa conexão amor X razão, pois há um Eros que o toma na plenitude do desejo, do corpóreo, mas que transita na busca da razão, a psiquê, cuja paixão estaria no SER e não no TER. E é isso que origina a DOR no amor. É quando se inicia a segunda abordagem a partir de AUTENTICAMENTE NU até PAISAGEM DE NÓS. Nesse contexto, o eu lírico se propõe a descobrir-se e exorcizar aquilo que nos foi dado culturalmente do amor uno e puro que se solidifica na razão, daí o grito. Entenda-se em Exorcismo, pág. 42.

Eis o descobrir-se na DOR. A partir dela é preciso se repartir para juntar. Porém, partir no sentido de gerar, fazer nascer, o que realça a certeza de mudança, de renascimento do amor que potencialize os fragmentos, pois assim as afeições vão se encaixando onde é necessário. Diz-se em Reparto, pág. 44.

Somos afetos mutilados de multi-lados como quebra-cabeças incompletos, insolucionáveis.

Logo, o eu lírico dá-se ao NOVO ao sair de uma “tempestade de afetos, tramas e dramas do amor”, o que vai REGRESSO até CONJUGADOS. É entender o perder, o fim de um sentimento; o recomeçar e estar preparado para perder, para o fim e novamente reiniciar um ciclo que o tempo se encarrega de comandar. Pois, para regressar, é preciso ir. Ir ao encontro da perda, do fim, da dor, do ciúme, da posse para poder se (re)descobrir numa plenitude: sem amarras e comandos. Ser NOVO. Leia-se em Andarilho, pág. 53.

E toda essa profundidade do eu é imersa nele mesmo, vem pela linguagem, agente transformador do sentimento, do ser, das ações e dos amantes, e ela se potencializa na poesia, elemento que supera o tempo. Em A quem só posso dedicar o presente, pág. 71, diz:

Meu sexo se desfolha feliz Na noite em que até o Tempo de si se esquece.

E foi com a tempestade que a voz poética descobre no amor a calmaria longe da razão, respeitando o desejo; longe da regra, permitindo a liberdade desse desejo. Em Conjugados, pág. 76, tem:

Na segunda parte por mim recortada, é salutar pontuar o poeta como professor de Língua portuguesa, pois tem o conhecimento sobre ela e usa sua norma a favor da expressividade lírica. Tal fato dá-se pelo uso dos parênteses que percorrem todo o livro desde o título.

Segundo Bechara, os parênteses assinalam um isolamento sintático e semântico do enunciado, além de estabelecerem uma intimidade entre o autor e o leitor, o que confere a Leo Barbosa um traço estilístico manifestado na emoção. Vê-se no poema Já serei no que sou, pág. 18:

Mas nos maximizar Para daí sentirmos uma (im)pulsão da vida.

O im não é apenas uma negação. Entre parênteses ele indica paralisação, porém, na junção com pulsar já ativa a ideia de impulsionar algo, de ir para frente, de copular.

Depois em Nossa reserva, pág. 31, tem-se:

(re), enquanto elemento entre parênteses, indica aprisionamento, mas ao juntar-se com encontro formando uma só entonação, constrói o sentido de permitir. Ou melhor, de libertar-se. E ainda, em Farol, pág. 75:

Depois do abraço, Meu coração, antes de aço, Se desfaz de (ran)cor.

Há uma permissividade poética quando recorta, separa ran de cor. Elimina-se o rancor e o amor ganha espaço através da cor. Logo, vem o sentido de beleza que só esse sentimento é capaz de proporcionar.

Outra expressividade lírica vem pelo uso de prefixos, cuja ideia perpassa por todo o livro que é separar-se para se encontrar. Essa necessidade de sentimento que o eu lírico precisa viver para se transformar reforça-se materialmente na escrita com o uso dos prefixos. Vê-se em Imoldurável, pág. 30:

O prefixo (in) indica negação, mas pelo contexto, ele dá o sentido de afirmação quando diz que só não há corpo no silêncio. De igual forma, o prefixo i, enquanto negativo, ao juntar-se com moldurável sustenta que o amor é um sentimento que não se prende.

O trabalho feito com os prefixos sendo reforçados pelos parênteses tem uma intencionalidade estilística que é buscar/despertar a emoção que a leitura proporciona. E Leo Barbosa faz isso muito bem quando trabalha com o campo lexical. E, por fim, no campo semântico, a partir do momento que o escritor faz uso de signos que ultrapassam seu sentido original quando inseridos num contexto tornam-se metafóricos, o que enriquece a escrita do poeta.

Leia-se em Regresso, pág. 49:

O poeta nos diz que o amor é como um mar, e essa definição se agrega a palavras que se inserem num mesmo contexto de sentido: mar, engarrafado, deriva, ondeia, navegassem e naufrágio. Isso mostra todo o enfrentamento do eu lírico nessa volta para a-mar.

Em A porta, Pág. 74, tem-se:

O amor é olho por olho ente por ente Ou entre ou saia.

entre - no sentido de ficar e saia – no sentido de decidir, o que é reforçado pela conjunção ou, que indica escolha. E, ao mesmo tempo, quando se toma o contexto, o entrar e o sair constroem o sentido de uma relação, já que se trata de entes, de seres.

E, por fim, em Conjugados, pág. 76:

Novamente o poeta recorre a elementos ligados à água como peixe, corrente e cachoeiras para descrever uma relação pautada no desejo. Nota-se também, pelo contexto, que o verbo cair adquire o sentido de entrar e cachoeiras a ideia de gozo, já que há um estímulo corpóreo através dos substantivos peixes e dedos como instrumentos conscienciosos do prazer.

Portanto, (A)TEMPORAL é uma escrita que tem identidade estética e uma linguagem que é bem contada, flui com destreza num campo temático aparentemente cansativo. Mas não é. Quando se lê (A)TEMPORAL, permite-se com ele navegar.

O texto acima foi apresentado durante o 87º Pôr do Sol Literário, promovido pela Confraria das Letras, na Academia Paraibana de Letras.

O texto acima foi apresentado durante o 87º Pôr do Sol Literário, promovido pela Confraria Sol das Letras, na Academia Paraibana de Letras.  

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