A expressão “vida de cachorro” precisa ser atualizada. Antigamente, era sinônimo de desprezo e abandono. Viver como um cã...

Amor canino

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A expressão “vida de cachorro” precisa ser atualizada. Antigamente, era sinônimo de desprezo e abandono. Viver como um cão era dormir ao relento, comer sobras de refeições, levar vez por outra uns pontapés. Hoje, traduz um cuidado e uma abastança que muitos humanos não têm. O excesso de zelo com esses bichos tem chegado a preocupações sutis, como a de levá-los a terapeutas comportamentais.

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Roberto Nickson
O que explicaria essa mudança de status dos cachorros? A resposta não constitui surpresa para ninguém. A mudança se deve à solidão em que hoje vivem as pessoas, sobretudo nas grandes cidades. A cada dia fica mais difícil para os humanos dialogar, compreender, amar e fazer-se amar pelos semelhantes.

Então muitos optam pela estratégia do filósofo alemão Artur Schopenhauer. Recolhido à solidão e à misantropia, ele viveu grande parte da vida acompanhado de um cãozinho trêfego e terno, que o ajudava a meditar sobre o mundo e suas dores.

Por mais boa vontade que tenhamos com os humanos, devemos reconhecer que o filósofo não estava de todo errado. Entre gente e cão, a vantagem fica de longe com o segundo. Gente é inconstante, caprichosa, insaciável. Jamais se contenta com o amor possível que lhe podemos dar. Quer sempre mais.

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Alvan Nee
Cachorro, não. Basta um afago e um osso (às vezes um osso artificial) para o tornar contente e fazê-lo retribuir em proporção maior. Outra vantagem do cachorro é que ele não nos cobra nem policia, aceitando-nos como somos. O cão de um mendigo não tem menos amor pelo seu dono que o de um milionário. Que o diga Quincas Borba, o desamparado cãozinho de Rubião, que adere sem um mísero rosnado de protesto à miséria e à loucura do seu dono.

O cachorro recebe nossos silêncios sem confundi-los com desprezo, gosta de ficar em casa e aceita nossas oscilações de ânimo sem achar que está na hora de “discutir a relação”. Não cultiva o ressentimento. É sempre possível, a um estalar de dedos, despertar-lhe a euforia de um sentimento vivo e novo.

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  1. Texto atemporal mas oportuno, nestes nossos dias em que o cachorro Joca virou celebridade. Sem falar no fato, cada vez mais presente, de que atualmente quem leva vida de cão são os humanos. Parabéns, Chico. Francisco Gil Messias.

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    1. Grato pela leitura, Gil! E pela perspicaz observação.

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  2. 👏👏👏👏👏👏👏👏👏👏

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