A República de Platão fundamenta-se na Paideia (παιδεία), cujo objetivo é a busca da Justiça em cada um de nós, o que permitirá a sua materialização exterior, com a dikaiosyne (δικαιοσύνη), a prática da Justiça, tornando-se ela própria, dike (δίκη). Para tanto, é necessário ter a responsabilidade como embasamento para o despertar dessa prática. Sem a essência da responsabilidade, não há Paideia; sem Paideia, não há Justiça e, sem Justiça, o Estado soçobra, jamais se erige.
A. Lorenzetti, 1339
A primeira cidade que vem à mente de Sócrates é a de poucos recursos, mas sóbria, que atenderia às necessidades de seus habitantes, distribuídos de acordo com as habilidades de cada um, fazendo surgir de uma consciência do trabalho individual a coletividade de uma pólis autossuficiente. A cidade nesses moldes, no entanto, não é do agrado de Glauco, que a chama de “cidade de porcos”. Platão retruca que, na realidade, se trata de uma “cidade sadia”. Se Glauco quiser uma cidade maior e mais complexa, incluindo os prazeres vários, trará consigo a necessidade de expandir o número de profissionais, os limites da cidade e da sua produção, o que só seria possível com a instituição da guerra. Para que a expansão não saia do controle é que Sócrates idealiza a construção da Pólis, tendo como base a Paideia. Uma para a criança, outra para o guardião, destino da criança mais capacitada para este labor.
A. Lorenzetti, 1339
A. Lorenzetti, 1339
É assim que, mesmo reconhecendo o valor de Homero para a Paideia grega, é necessário expurgar certas passagens que mostram os deuses agindo de maneira vil e mudando de forma, para, enganando os humanos, alcançar os seus intentos nada virtuosos. Do mesmo modo, não serão admitidas as passagens que mostram os heróis temendo o Hades, chorando ou se lamentando, como Aquiles, porque isto incutirá, no espírito da criança a ser educada, valores distorcidos que a fariam preferir a escravidão à morte, quando na defesa de sua cidade. Como se trata de uma cidade guerreira, a lamúria e o choro devem ser deixados para as mulheres e os homens fracos, diz Sócrates. Os valores a ser incutidos nos jovens educandos são os da timé (τιμή), a honra, e da areté (ἀρετή), a virtude guerreira, cujo estímulo vem do ímpeto, o thumós (θυμός).
A. Lorenzetti, 1339
Em suma, os deuses são bons por essência e causa apenas do bem; já os heróis são aguerridos e preparados para, sabiamente, enfrentar a guerra, preferindo a morte à escravidão. Surgem daí, duas das virtudes da alma: a Coragem (andreia, ἀνδρεία) e a Sabedoria (sofia, σοφία).
A. Lorenzetti, 1339
A. Lorenzetti, 1339
As boas fábulas (Música) ajudarão na modelação da criança, acrescentando ao caráter da criança a Temperança (sofrosyne, σωφροςύνη). A imitação (mímese, μίμησις), como criação poética, deve seguir esse perfil, desde a infância, porque é nesse momento que se constrói a personalidade do futuro homem/guardião.
A. Lorenzetti, 1339
A Paideia, que deve estar ao alcance de todos, na concepção platônica, estimulava as quatro virtudes cardinais da Psiquê (Alma, ψυχή), aqui já referidas: Sofia, Andreia, Sofrosyne e Dike. Essenciais para um estado aristocrático. Entenda-se, no entanto, que a Aristocracia defendida por Platão não deve ser confundida com a aristocracia de nobreza (Monarquia) ou de dinheiro (Plutocracia), cujo modelo pífio é a francesa dos Luíses. A Aristocracia era o governo dos melhores, porque todos foram submetidos à mesma educação e às mesmas provações, tendo como objetivo educar para a Justiça, o que significa a prática incessante e diuturna de ações justas, com a finalidade do bem comum.
Portanto, dando oportunidades iguais a todos, sob o encargo do Estado, o melhor (áristos, ἄριστος) deverá ser o que deve governar (kratéō, κρατέω) com Sabedoria, para o discernimento; Coragem, para agir contra os inimigos de fora e os amigos de dentro; Temperança, para saber a medida do que é justo e não passar de seus limites, assegurando a boa Justiça para todos.
A. Lorenzetti, 1339
Em outras palavras: A Educação equilibrada, corajosa e sábia gera a Justiça.