“Preparai os ouvidos e também os olhos e o espírito, se quereis ter valor para saber coisas que excedem tudo o que a imaginação pode c...

Mil Noites e Uma Noite

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“Preparai os ouvidos e também os olhos e o espírito, se quereis ter valor para saber coisas que excedem tudo o que a imaginação pode criar de mais extraordinário.”
Excerto de O Rei das Ilhas Negras ao Sultão, em As Mil e Uma Noites.

Certa vez, num reino distante, um rei, de nome Shahryiar, descobriu que a mulher lhe era infiel e, enfurecido, mandou executá-la juntamente com o seu amante. Depois, acreditando que não podia confiar em mais mulher nenhuma, tomou a terrível decisão de todas as noites desposar uma virgem, entregando-a seguidamente ao seu vizir, para ser executada ao nascer do dia.

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Durante três anos, Shahryiar instituiu um reinado de terror até que, um dia, Sheherazade (nome feminino persa que significa “filha do rei” ou “nascida de nobre linhagem”), a filha do vizir, uma mulher sábia e instruída, rogou a seu pai que a entregasse ao rei. Na noite de núpcias, com a sua voz doce, começou a contar-lhe histórias cativantes, de aventuras, de magia, de viagens fantásticas e de mistérios, que ela suspendia, na aurora, num episódio provocante, deixando o Sultão maravilhado e ansioso.

Quando chegava o alvorecer, a estória ainda não tinha acabado e o rei, curioso do seu desenrolar, adiava a execução para a noite seguinte. Sheherazade continuava, desta forma, a contar histórias, sem que, ao nascer do dia, nenhuma delas estivesse acabada. A curiosidade narrativa do rei manteve Sheherazade viva, dia após dia. Dessa forma, passaram semanas, meses e anos, facultando-lhe uma suspensão de pena, um adiamento, durante o qual concebeu três filhos.

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Certo dia, ao nascer do sol, a bela Sheherazade terminou uma história e declarou: “Não tenho mais histórias para vos contar, meu rei. Percebestes que estamos casados há exatamente mil e uma noites?”. Só então Shahryiar compreendeu que o tempo tinha passado e levado com ele a amargura. Olhou para a sua bela Sheherazade e percebeu que não conseguiria viver sem ela. E, no final, anulou a sentença de morte e fez de Sheherazade a sua rainha definitiva. Viveram, então, felizes para sempre.

“Falar em mil noites é falar em infinitas noites. E dizer mil e uma noites é acrescentar uma além do infinito.”
Jorge Luis Borges
E assim surgiram as grandes colecções de contos d'As Mil e Uma Noites (Alf laylah wa laylah, no seu título original, em árabe). Basicamente uma literatura de tradição oral que faz parte do folclore de uma região e, mais ainda, na sua produção cultural erudita, numa genial herança global. As Mil e Uma Noites constituem um livro que representa toda uma mentalidade e um comportamento, uma realidade e um sonho, um universo mítico e uma religião, dos quais surgem génios de lâmpadas, demónios que mantêm mulheres em arcas de vidro, anéis amaldiçoados, camas voadoras, lâmpadas mágicas e palavras secretas que abrem cavernas, ensinamentos para a vida, fábulas, parábolas, ideologias, utopias, simbologia, alegorias, rituais, mitos, anedotas, aventuras exóticas e personagens que ainda hoje nos encantam, como Aladdin, Sindbad ou Ali Baba...

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Cada história desfiada desperta a curiosidade do leitor que tem, no plano da imaginação, dois eixos que correm paralelos: um, que corresponde às “estórias” contadas por Sheherezade, ou por quaisquer das personagens narradoras que vão surgindo, formando ciclos que despertam no leitor todo um encantamento e curiosidades acerca dos mistérios relativos ao mundo oriental e, outro, relativo à própria “meta-narrativa”, ligada à sugerida interação amorosa do rei Shahryiar com a sultana narradora.

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O livro é formado por ciclos de histórias que foram surgindo aos poucos, através dos séculos e que variaram de um país para outro. A origem de As Mil e Uma Noites é controversa. Pensa-se que a origem da coletânea terá vindo de um grupo de histórias traduzidas do Pahlavi — língua persa média (às vezes chamada de iraniana média), o que significa que foi usada principalmente do final da dinastia Aqueménida (559–330 a.C.) até ao advento do Islamismo no século VII d.C. — para o Árabe, nos primeiros séculos islâmicos. Há algumas referências a ela no século X, de um fragmento de um dos primeiros manuscritos, conquanto o ciclo de histórias parece ter-se formado em Baghdad, entre os séculos X e XII. Expandiu-se posteriormente no Cairo (durante o período mameluco), onde as histórias ali concebidas ou acrescentadas terão sido atribuídas ao quinto califa abássida Harun al-Rashid (786-809).

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Curiosamente, em 987, o notável bibliógrafo muçulmano de Baghdad, Ibn al-Nadīm, autor da enciclopédia Kitab al-Fihrist (“O Catálogo de Livros”) refere que AbūʿAbdallāh Muḥammad ibnʿAbdūs al-Jahshiyārī, proeminente estudioso abássida, natural de Kufa (no sul do Iraque, um dos maiores centros de estudos no mundo islâmico), escritor do Kitab al-wuzara wa’l-kuttab (“Livro dos Vizires e Escribas”) terá iniciado uma coleção de 1.000 contos populares árabes, iranianos, gregos e outros, mas viria a falecer em 942, com “apenas” 480 escritos.

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Al-Masʿūdī, historiador e viajante, conhecido como o “Heródoto dos árabes”, que viveu no século XI e foi um dos escritores mais viajados do seu tempo, afirmou que os contos de As Mil e Uma Noites foram retirados do livro persa Hazār afsāna (“Mil Histórias”). Esta última obra, segundo se afere de uma referência a que a ela faz Ferdowsi, no prefácio de Schanameh (“Livro dos Reis”), é atribuída a um poeta persa, Rasti, que terá vivido na segunda metade do século X. E, assim sendo, o erudito Al-Masʿūdī parece estar com razão, pois as duas heroínas principais de As Mil e Uma Noites, Sheherezade e sua irmã Dunyazad, estão com os seus nomes persas nas páginas famosas de Hazār afsāna.

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Os persas, de acordo com a opinião do orientalista francês Clément Huart (16 de fevereiro 1854 - 30 de dezembro 1926), foram colher, na Índia, o enredo dos principais contos que figuram no Hazār afsāna. O orientalista e historiador alemão Gustav Weil (25 de abril 1808 – 29 de agosto 1889), professor de Línguas Orientais em Heidelberg, afirmou que os contos árabes de As Mil e Uma Noites diferem totalmente das primitivas formas indiana e persa.

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Antoine Galland (1646—1715), escritor e orientalista francês, primeiro tradutor dos contos de As Mil e Uma Noites, publicados no idioma francês em 12 volumes, entre 1704 e 1717. ▪ Fonte: Gallica.
As Mil e Uma Noites apareceram na Europa, pela primeira vez, numa tradução francesa do orientalista e estudioso francês Antoine Galland (4 de abril 1646 - 17 de fevereiro 1715), entre 1704 e 1717. Galland terá utilizado um texto sírio do século XIV, adaptando-o um pouco ao estilo francês. Nesta sua tradução, ele suprimiu os poemas que figuram em outras traduções, como a de Sir Richard Burton e a do médico, orientalista, poeta e tradutor francês Joseph Charles Mardrus, por exemplo. Nestas últimas, é o caso, são preservados os entremeios poéticos contidos nos manuscritos, além de todo um conteúdo erótico, muitas vezes dotado até de certa obscenidade, também excluídos da tradução de Galland.

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Edição ilustrada dos contos árabes (Les Mille et Une Nuits), em francês, com a tradução de Antoine Galland e gravuras de A. Robida. ▪ ed. Maurice Bauche, Paris, 1909. ▪ Fonte: Gallica.
Uma das características de As Mil e Uma Noites é o particular condão de nos consolar dos fins, com infinitos recomeços. Termina-se o relato do tema central, utilizando o remate dos contos de fadas europeus: “e viveram felizes para sempre!”, o que é uma reconfortante falsa eternidade – porque ninguém a vive, a não ser nas infindáveis repetições dos contos. Está na natureza dos grandes contos, e das grandes colecções de contos, mudar de forma. Os contos mantêm uma parte de nós vivos, depois do fim da nossa história, e há algo de muito tocante no facto de Sheherezade ter entrado na felicidade para sempre, não na sua noite de núpcias, mas depois de mil e um contos e de três filhos.
UM CERTO ORIENTE
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O autor convida os leitores a acompanhar seu programa semanal Um Certo Oriente, transmitido nas seguintes emissoras e horários (de Portugal), via internet: Segunda-feira 15h—16h Rádio Portimão 106.5 FM 16h—17h Rádio Vila Nova RVN Cucujães 19h—20h Rádio Alta Tensão 20h—21h Rádio Azores High (horário dos Açores) 21h—22h JB Nostalgia ON Terça-feira 22h—23h Rádio Metropolitana Porto 23h—24h Rádio Clube Penafiel 91.8 FM Quarta-feira 03h—04h Rádio Castrense 93.0 FM 20h—21h Rádio Vila Nova RVN Cucujães 21h—22h Rádio Via Aberta 22h—23h Rádio Marmeleira Quinta-feira 02h—03h Rádio Tejo 102.9 FM 10h—11h KajiFM (horário de Angola) 11h—12h Rádio Alcobaça 23h—24h Rádio Cantinho da Madeira Sexta-feira 01h—02h Rádio Tejo 102.9 FM 04h—05h Rádio Vila Nova RVN Cucujães 19h—20h Rádio Nova Paixão FM 19h—20h TDS Telefonia do Sul 93.9 FM Évora 20h—21h Rádio Tejo 102.9 FM 23h—24h Rádio Onda Certa Sábado 03h—04h Rádio Castrense 93.0 FM 08h—09h Rádio Surpresa 16h—17h Rádio Antena Mais (horário de Luxemburgo) 18h—19h Antena Web (Canal 1) 20h—21h Rádio Portimão 106.5 FM 21h—22h Rádio Horizonte Atlântico 21h—22h Rádio Clube Penafiel 91.8 FM Domingo 01h—02h Rádio Marmeleira 03h—04h Rádio Via Aberta 06h—07h Rádio Tejo 102.9 FM 10h—11h Rádio Coração do Alentejo 13h—14h Rádio 100Margens 17h—18h Rádio Portugal Star 19h—20h TDS Telefonia do Sul 93.9 FM Évora 19h—20h Rádio Dueça 94.5 FM 20h—21h Rádio Voz Online na Cossoul 21h—22h Canal Viana 21h—22h Rádio Marmeleira 22h—23h Rádio Cultural da Filarmónica Pampilhosense
OBS.: No Brasil, a emissão ocorre quatro a horas a menos em relação ao horário de Portugal.

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