Em 1957, Virginius da Gama e Melo publicou no Jornal do Commercio, Recife, quatro artigos sobre José Américo de Almeida. Os três p...

'A Bagaceira' na visão de Virginius da Gama e Melo

jose americo almeida virginius gama melo
Em 1957, Virginius da Gama e Melo publicou no Jornal do Commercio, Recife, quatro artigos sobre José Américo de Almeida. Os três primeiros trazem a data de 26/05/57, 07/07/57 e 14/07/57. O quarto é de 25/11/62. Esses artigos foram reunidos e publicados no livro Estudos Críticos (João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 1980). Uma nota explicativa de Paulo Melo e um breve comentário de Gonzaga Rodrigues antecedem os textos que englobam, além de José Américo, Freyre, Zé Lins e Graciliano, todos escritores nordestinos.

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Virginius da Gama e Melo A União
Nos dois primeiros artigos, com o título O Equívoco José Américo I e O Equívoco José Américo II, Virginius discute a modernidade de A Bagaceira e afirma que não é um romance moderno na forma, no estilo, nem na caracterização dos personagens. Considera que houve a revelação de um romancista, mas não de um romance marco na literatura brasileira como afirmavam alguns críticos.

Embora o livro tenha tido uma “edição infame de província”, a crítica de Tristão de Athayde deu notoriedade ao romance. Nas suas palavras, a crítica favorável foi um passaporte de maior relevância para o autor e para o livro. Depois de 30 anos de sua publicação, lamenta que não se tenha feito uma análise precisa, independente desse romance. Essa observação é de 1957, depois surgiram muitos estudos, dissertações, teses sobre A Bagaceira e dois excelentes livros das professoras Elizabeth Marinheiro e Ângela Bezerra de Castro, merecedores de prêmios nacionais. O tempo se encarregou de modificar a opinião de Virginius.

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José Américo de Almeida A União
O terceiro texto, publicado em 14/07/57, com o título Pensamento de José Américo é uma reflexão sobre o fazer político do autor de A Bagaceira. É bom lembrar que o crítico paraibano também se debruçou sobre a crônica de caráter político e este artigo é uma análise sucinta da fase política do escritor. Ele considera que dos homens que conquistaram o poder em 1930 José Américo era o mais categorizado. Oswaldo Aranha era dono de um brilhantismo romântico, mas José Américo era o “pensamento profundo, a lucidez devassando as águas abismais”.

Era um revolucionário no poder em regime discricionário, e teve a oportunidade para expandir as ideias políticas que já germinavam desde a época em que escreveu A Paraíba e seus problemas, “uma obra de vulto, um dos estudos mais completos da geografia humana”.

No último artigo, com a data de 1962, o olhar do crítico sobre A Bagaceira é diferente. O título já é significativo – Primeiro romance nacional. Vislumbra no livro uma
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essencialidade telúrica e a presença das personagens ultrapassava os limites clássicos do nosso romance, fixando-se num “rebate de consciência nacional”.

Louva a linguagem original, uma linguagem estruturalmente nacional sem os excessos modernistas e sem servilismo à matriz portuguesa. A frase de José Américo é afirmativa, linear. O vocabulário do livro está intrinsecamente preso à fala do povo, uma voz popular autêntica, sem solecismos.

Virginius relembra que vários anos depois aparece outro escritor, Guimarães Rosa, renovador da língua e que busca na linguagem popular novos elementos de enriquecimento. Há afinidades estilísticas entre os dois escritores, um paraibano e outro mineiro, ambos são renovadores da língua e valorizam a linguagem popular.

O crítico português Adolfo Casais Monteiro, citado por Virginius, concorda que o livro de Guimarães Rosa – Grande Sertão: Veredas encerra o ciclo do romance nordestino, um ciclo fecundo das letras brasileiras e que teve início com o romance A Bagaceira.

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Acompanhando o pensamento do autor desses artigos sobre A Bagaceira e A Paraíba e seus problemas, observa-se que houve o reconhecimento da literariedade das obras americanistas. Assinalava o crítico que A Bagaceira não era apenas um romance que “contava”, era um romance que protestava com uma linguagem original, uma linguagem nacional. Quanto a A Paraíba e seus problemas, considera que, além de ser uma obra de vulto, garantia-lhe, “pelos subsídios, uma técnica e uma visão brasileira”.

Em 2025, completa 50 anos da morte de Virginius da Gama e Melo e a leitura dos artigos críticos de A Bagaceira, escritos nos meados dos anos 1950, demonstra o valor literário de quem deixou o legado da verdadeira crítica – “compreender a obra criticada”.

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  1. Anônimo4/7/25 08:12

    Um texto lapidar, professora Neide, na forma e no conteúdo. É uma pequena e grande aula sobre Virgínius e sobre José Américo. Virgínius anda esquecido, mas o seu texto o resgata, com justiça. Parabéns. Francisco Gil Messias.

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  2. Anônimo4/7/25 08:29

    Receba meus parabéns por seu lúcido texto, resgatando a memória de valorosos escritores paraibano. Cordial abraço de Eitel Santiago de Brito Pereira.

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  3. Anônimo4/7/25 10:19

    Excelente, Neide! As releituras podem mudar a nossa percepção sobre o lido. Daí, ser mais importante reler do que ler.

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