Pense num velório! Calma: antes de se escandalizar deixe-me tecer algumas considerações sobre o assunto. De saída, tia Anjinha era a m...


Pense num velório! Calma: antes de se escandalizar deixe-me tecer algumas considerações sobre o assunto. De saída, tia Anjinha era a minha tia predileta.

Era a irmã mais nova da minha avó. Conhecida pela sua formosura, desde criança, em sua juventude foi Miss Vale do Piancó, por ser uma das moças mais belas daquela região, berço da minha família.

Mãe de primos e primas que eu adoro, sempre foi uma mulher dinâmica, muito bem organizada, mãe de família determinada, mas possuidora de uma candura que cativava quem a conhecia. Não por coincidência, seu nome era exatamente Ângela.

Ela gostava muito de mim, ao ponto de ter me escolhido para seu médico-assistente. Pois esta é a minha homenagem à tia Anjinha, realmente um anjo de pessoa.

* * *

A minha concepção sobre a perda de alguém é a seguinte: quando o ente querido ainda é novo, ou de idade já provecta, porém ainda producente, a sua perda é muito lamentada, muito sentida. Seu velório e´...
... UM VELÓRIO!

Mas quando a pessoa já é bem “morrível”, a qualquer momento se espera a notícia, o velório passa a ser um reencontro. Toma ares de quase alegria por poder revermos parentes e pessoas que há muito não víamos.

O velório se torna um verdadeiro recenseamento: quem levou chifre, quem corneou, quem casou de novo, quantos netos tem. Quem desmunhecou!

No velório da tia Anjinha, tive a oportunidade de rever amigos de infância, velhos companheiros dos banhos de rio (escondido de mamãe, é claro!), das peladas, das vaquejadas, das primeiras experiências da juventude.

Fôramos habitués da sinuca de Ananias e dos assustados na sorveteria de Walter. E, às escondidas, frequentadores do rói-couro, que era como a minha avó chamava o cabaré da cidade.

Lá estavam também, animando o velório, os primos Edmilson Fonseca, o nosso querido Muriçoca, e Bernadete Gomes, a Detinha de Zú. Estava lá a prima Zezita, muito querida, prefeita de Santana dos Garrotes e que há muitos anos eu não via. Seus irmãos Dr. Jordan, Josmar e Judite. Depois do enterro, a prima Jovânea serviu a melhor galinha-de-capoeira que eu já comí!
Respeitando a tristeza pela perda de parente tão querida, não deixou de ter sido para mim uma oportunidade muito boa por saber que os primos estavam todos bem.

* * *

Tem velório que é memorável devido à personalidade do falecido. Foi o caso do excelente pediatra Dr. Paulo Soares. Tendo sido a grande figura que foi, a personalidade sempre engraçada e muito querida, no seu velório cada roda de presentes era uma gargalhada. Ninguém resistia às histórias do nosso Paulinho Soares, boa parte delas impublicável.

Só para exemplificar, numa delas alguém se lembrou da mãe aflita: “Dr. Paulo, passe um remédio para o meu filho crescer!” “Ora, minha senhora, se tivesse algum eu passaria pra mim!”, lembrando-se do seu tipo físico.

Tem outros velórios inesquecíveis de personagens memoráveis. Lembro-me com saudades dos velórios de Neno Rabello e do primo Fred Pitanga. Valeram bem a máxima acima: “Pense num velório!”

Ao longo dos enterros da minha vida tive a oportunidade de conhecer pessoas que animam velórios. O fazem sem nenhuma intenção de desrespeitar os mortos: é da sua natureza ser assim. Verdadeiros profissionais do anti-pranto, carpideiras às avessas, tornam mais suave a despedida de quem gostávamos tanto.

Alguns deles, infelizmente, já se foram. São os casos do primo Edmilson Muriçoca (era um mestre no metier!); da prima Detinha de Zú; do engraçadíssimo Cleanto Pinto; e do hilariante Fred Pitanga. Sinto muito a falta deles, mesmo longe dos velórios.

Mas tem um grande animador de velórios que continua aqui em baixo conosco: meu amigo de infância Flávio Tavares. As suas histórias nos enterros são inexcedíveis! Só o acervo de histórias de seus familiares já garantem um bom velório. Mas resisto a contratá-lo para animar o meu.

Vôte!

(José Mário Espínola, médico e escritor - jmespinola50@gmail.com)

Embora pertencesse à Geração 59, transitava com desenvoltura em todas as gerações, quer entre os que integravam as “Edições Caravelas...


Embora pertencesse à Geração 59, transitava com desenvoltura em todas as gerações, quer entre os que integravam as “Edições Caravelas”, quer entre os que compunham o “Grupo Sanhauá”. E tanto foi assim que, no “hall” do Teatro Santa Rosa, apresentou o meu livro de estreia: “Gestos lúcidos”. Título, aliás, contra o qual se insurgiu sob o argumento de que, depois de cinco ou seis talagadas de aguardente, a língua, entorpecida e trôpega, dificilmente o pronunciaria.

Naquele ano de 1967, Vanildo Brito não era o abstêmio que a enfermidade o obrigou a sê-lo, mas o boêmio de longas jornadas noite adentro, ora no “Bar do Chapéu”, ora no “Bar de Merêncio”, ou ainda em outras bibocas que ele descobria em suas andanças à margem da província.

Filósofo muitas vezes encharcado de questionamentos metafísicos, nem por isso deixou de se contagiar pela alma das ruazinhas boas e simples, distantes e esquecidas, da João Pessoa de três, quatro décadas atrás.

Quanto ao Vanildo poeta, diria que – na esteira dos versos de Carlos Drummond de Andrade – deixou de ser moderno para se tornar eterno. E o eterno, aqui, significa a sua opção por uma poesia de feitio clássico, apolíneo, imune a modismos ou outras coisas do gênero, pois, com efeito, à lírica do autor de “Selecta Carmina”, as vanguardas nada tinham a acrescentar. Vanguardas em termos do concretismo e seus desdobramentos, uma vez que, se abeberando em Jorge de Lima, sobretudo no de “Invenção de Orfeu”, a poesia de Vanildo possui algumas ressonâncias do Surrealismo, principalmente no seu livro de estreia, “A Construção dos mitos”.

Para mim, a melhor poesia de Vanildo Brito é aquela que se cumpre sem a necessidade de corroborar os sistemas filosóficos que ele postulava em salas de aula e através de ensaios veiculados no “Correio das Artes” ou outras publicações do gênero. E isso porque a poesia não precisa provar coisa alguma, do contrário seria um mero epifenômeno da história, das ciências, da filosofia, etc.

* * *

Diferentemente do que escreveu o amigo e poeta Marcos Tavares, Vanildo se candidatou, sim, a uma vaga na Academia Paraibana de Letras. Só que o seu jeito arredio, tímido, o indispunha a cabalar, a pedir o voto dos acadêmicos, como o fez o economista e político Aluísio Afonso Campos, vencedor da disputa. Quero crer, inclusive, que a sua candidatura decorreu muito mais da iniciativa de alguns amigos do que dele próprio, cujo temperamento anárquico, rebelde, sempre o situou num plano oposto ao de sua poesia, quase toda ela tributária da tradição.

* * *

Se, na juventude, foi o mentor e o artífice da Geração 59, mal ingressou na idade madura abdicou do sentimento grupal para se isolar cada vez mais da vida literária. Foi quando se entregou à tarefa de traduzir alguns poetas latinos e de reunir os poemas que integram o livro “Selecta Carmina” (Edições Linha D’Água, João Pessoa, 2007), lançado quando a “indesejada das gentes” já lhe movia o cerco. Tanto que, embora tenha composto “Moritura nave” por ocasião do falecimento de Archidy Picado, a quem, inclusive, dedicou esse poema no suplemento “Correio das Artes”, desta feita omite o oferecimento ao colega de geração para, quem sabe, travestir-se, ele mesmo, no navio que, “(...) De velas recolhidas, (...)/ está cansado e arqueja lento. / (...) não está naufragando. Nem sequer/ aderna. Morre apenas, carcomido/ lentamente, marcas de mar/ no seu corpo aderidas como/ fundos sinais de mortes e de vidas./ (...) Não há lamentos nem salgadas lágrimas/ sobre o seu corpo imenso e mudo.// Vive no sempre o onírico navio.

Não é de hoje ou por ser moderninho que faço serviços domésticos. Filho de uma família grande, somos nove irmãos, fomos educados por min...



Não é de hoje ou por ser moderninho que faço serviços domésticos. Filho de uma família grande, somos nove irmãos, fomos educados por minha mãe e por meu pai na responsabilidade. Minha mãe nos legava as tarefas domésticas e o cuidado com a profilaxia, palavra que, desde eu menino, como diria o poeta, aprendi com ela. Nosso pai nos impunha levar as encomendas de seu açougue aos  fregueses, bem como lavar o açougue no domingo pela manhã, para começar a semana limpo. De quebra, aprendemos a aritmética do troco, já devidamente calejados pelo aprendizado, literalmente doído, da taboada, com a nossa mãe…

Lavar louça, varrer casa, ajeitar o quarto, tirar o lixo, fazer comida, tudo isso se tornou um hábito para mim. Até hoje, faço comida para 20 pessoas, como feijoada ou cozido, e deixo a cozinha limpa como se ninguém tivesse passado por ali.

Digo estas coisas porque neste período de quarentena, as tarefas de casa se multiplicam, principalmente as de cozinha.

Há quem tenha comparado a tarefa de lidar com a cozinha com o suplício de Sísifo. Trata-se de má comparação. Sísifo, quando descia a encosta da montanha, tinha tempo de pensar em um modo de colocar a pedra no topo e, assim, livrar -se do suplício. Se era um trabalho sem fim, o de Sísifo, ao menos lhe dava, em algum momento, tempo para refletir sobre a sua situação.

Comparo o trabalho de cozinha com o suplício das Danaides, cuja continuidade, normalmente, não dá tempo para a reflexão. As 49 irmãs, filhas de Danaos, foram condenadas, pelo assassinato de seus maridos, na noite de núpcias, a encher, no Hades, um tonel sem fundo, carregando água numa peneira. O derramamento de sangue parental, pois os maridos eram seus primos, é que acarretou em suplício tão requintado.

Apesar de ser infindável o serviço de cozinha, além de pouco produtivo, não reclamo. Seja pelo hábito de fazê-lo, seja por fazer passar o tempo do confinamento, seja porque acabei descobrindo uma utilidade: refletir sobre a paciência e remoer algum texto na memória.

A vida nos ensina de diversas maneiras.

* Milton Marques Júnior, Professor de Literatura, escritor, critico e ensaísta paraibano

Há doze dias estou confinada no meu apartamento. Controlando o desejo de trabalhar, de estar com os familiares, de respirar ares da rua. O...



Há doze dias estou confinada no meu apartamento. Controlando o desejo de trabalhar, de estar com os familiares, de respirar ares da rua. O apartamento, que é grande, ficou pequeno. Do quarto para a sala, da sala para a cozinha, escritório, quarto, de novo. Dizem que a quarentena será de vários meses. Resisto, procurando o que fazer: limpeza da casa, leituras, reescrevo textos sobre as últimas notícias da pandemia, para o site. Mas há um vazio, como se nada fosse possível preencher. É a falta de liberdade.

Lembrei da mocinha de 13 anos que sonhava em ser escritora ou jornalista, e que ficou confinada, num sótão, escondida com a família, tentando fugir dos nazistas. A história de Anne Frank sempre me emocionou, desde que li seu diário, ainda adolescente. Depois, há poucos anos, estive na casa, em Amsterdã, onde foi seu esconderijo. É hoje um museu que recebe visitantes do mundo inteiro. É impactante passar pelos pequenos cômodos ainda com a mobília que ela usou, ver as fotos que ela colou na parede do quarto.

Eles foram para o esconderijo em julho de 1942 e Anne tinha 13 anos. Para não serem descobertos, não podiam fazer barulho, sussurravam para falar uns com os outros, comiam o que amigos deixavam, e só tomavam banho aos sábados, de tina. Imagino que todas essas provações não eram nada comparado ao medo que sentiam, o pavor de serem descobertos pelas tropas do governo alemão. “Fico aflita com a ideia de não poder sair daqui, e tenho medo que nos descubram e nos fuzilem”, escreveu Anne para a amiga imaginária Kitty, no seu diário. Depois ele se deu conta que era ainda pior: “A emissora inglesa fala de câmara de gás. De qualquer forma talvez seja a câmara de gás a maneira mais rápida de se morrer”. Os judeus estavam sendo levados para os campos de concentração.

No esconderijo não havia janelas. Para ver fora, Anne ia para o sótão, olhar por uma pequena abertura com vidros. Ela deixou escrito no seu diário: “ ...serei capaz de escrever algo grande, serei jornalista e escritora? Espero que sim. Eu espero muito que sim!". "Depois da guerra, eu gostaria de publicar um livro com o título 'O anexo secreto'".

Anne Frank e mais sete pessoas, de sua família e de outra, viveram pouco mais dois anos no anexo secreto. O esconderijo foi descoberto no dia 4 de agosto de 1944. Todos foram para Auschwitz e depois para outros campos de concentração. Num dia de fevereiro ou março de 1945, Anne Frank morre, de fome e tifo, no campo Bergen Belsen. Dos que estavam no anexo, apenas o pai, Otto, sobreviveu, e publicou o diário pela primeira vez, em 1947. Você conseguiu, Anne.


Rosa Aguiar é mestre em comunicação e jornalista

(Octávio Caumo Serrano) Em uma cidade do interior, havia um padre que ao receber as pessoas em confissão sempre suavizava suas culpas e dizi...


(Octávio Caumo Serrano)

Em uma cidade do interior, havia um padre que ao receber as pessoas em confissão sempre suavizava suas culpas e dizia: - Podia ser pior! Por maior que fosse o pecado ele sempre consolava o penitente dizendo que a falta não era tão grave; podia ser pior.

Um grupo de estudantes se reuniu para, numa artimanha, dar um susto no sacerdote. Um deles foi para a confissão e disse: - Padre, estou desesperado com o que eu fiz; matei meu pai e me amancebei com minha mãe!... – O padre, surpreso, lhe diz: - Meu Deus, filho, que horror. Como pode você fazer algo tão terrível? Mas não se preocupe; Deus há de perdoá-lo; podia ser pior.

- Padre! Matei meu pai e me amiguei com minha mãe! Como podia ser pior? – Você podia ter matado sua mãe e se amigado com seu pai...

Assim é a vida. Diz a sabedoria popular que mais escuro do que meia-noite não fica. Depois da longa noite raia sempre nova alvorada e o sol brilhará outra vez. A lição se ajusta perfeitamente ao momento que vivemos, quando relembramos a conhecida frase que Maria Santíssima pediu para que Chico Xavier escrevesse em lugar bem visível, onde pudesse enxergar para ler a toda hora: “Isto também vai passar.”

Quem sabe o vírus foi o freio que interrompeu as ações dos belicosos megalomaníacos que pensavam explodir o planeta com seus arsenais superdimensionados que podem destruir a Terra várias vezes. Quem sabe. Nada se pode afirmar como verdade.

Mas conhecendo as artimanhas de Deus, sempre em favor dos homens, é bastante possível que ele tenha jogado essa “pedra no caminho” para modificar as ideias dos revolucionários, pretensos donos do nosso planeta. E vejam como todos recuaram, assustados!

Diz o povo que após a tempestade vem a bonança. Esperemos que em curto prazo vençamos essa batalha contra o inimigo hostil, silencioso e contra o qual nossas armas são, por enquanto, inócuas. Mas esse malvado vírus há de morrer por si mesmo, de tédio, se o deixarmos abandonado em solidão... E nós reiniciaremos mais confiantes!

(Octávio Caumo, Jornalista e Poeta - ocaumo@gmail.com)

Andamos cansados. Das mulheres (dos homens) erradas (os), das noites vazias, das madrugadas caras e dos crepúsculos ébrios! Cansados ...


Andamos cansados. Das mulheres (dos homens) erradas (os), das noites vazias, das madrugadas caras e dos crepúsculos ébrios! Cansados das abordagens planejadas, da caça sem recompensa ou daquele sorriso no dia seguinte, do telefone sem rosto na tela do celular. Da intenção escancarada antes mesmo de sairmos de casa. Andamos cansados de falar da boca pra fora, de não querer fazer força ou de não ter alguém pra pedir pra ficar. Andamos esvaziados, de motivos pra passar a noite e acordarmos acompanhados de gente que vale a pena!

Andamos saudosos de sorriso no espelho, e de histórias que não tenham deixado algum tipo de decepção ou mágoa.

E quando debruçamos os olhos abatidos sobre a cidade, encontramos um reflexo cinza e triste. Somos nós voltando pra casa num carro qualquer, imerso em insulfilm e músicas que, ao final, não fazem sentido algum às nossas mentes confusas, mas ainda cheias de esperança. Silêncio na alma e um buraco assombrado no peito, com as luzes do painel refletindo nos nossos olhos.

E no lugar que ficava o coração, uma vontade imensa de amar e de nunca nos trair de novo. Não pensem que choramos. Só sofremos em silêncio.

Assim é a vida.

Quando olhamos ao redor e observamos tantos outros silenciosos vivendo o mesmo. Calados. Incrédulos. Calejados. Com suas aparências construídas à base de conceitos sociais que passam ao largo daquilo que realmente acreditamos, ou do que intimamente desejamos de nós.

E, muitas das vezes, das escolhas erradas que fazemos, colhemos frutos amargos, ou mesmo apenas sementes de um novo recomeço que insistimos em não plantar. E querem saber por que carregamos fardos tão penosos? Simplesmente porque optamos, na trilha da vida, amar com a intensidade de um cometa. Nem que, pra isso, amemos sozinhos.

Decidamos, hoje, com o emprego de todas as nossas energias, dar uma guinada na danada da vida. Mas sempre com o olhar de esperança e o coração voltado única e exclusivamente pro bem. A hora de todos vai chegar, notadamente pros sonhos que temos.

Que estejamos preparados e, sobretudo, em paz.

O vazio dos espaços urbanos parece um contrassenso num país em que se ama passear e estar com os amigos. Olho para a minha rua e não vejo ni...



O vazio dos espaços urbanos parece um contrassenso num país em que se ama passear e estar com os amigos. Olho para a minha rua e não vejo ninguém. Ou melhor, um retardatário volta apressado para casa. Temerá um assalto ou a contaminação? (A dúvida procede, pois os marginais não recuam nem em tempos como estes; são vírus sociais, e para eles os governos até agora não foram capazes de encontrar vacina).

As luzes dos apartamentos sinalizam a prisão das pessoas lá dentro. O mais estranho é a ausência de buzinadas, que destoa da trilha sonora comum nas cidades. Todo esse silêncio nos leva a refletir, humildes, sobre a precariedade da nossa aventura no planeta. A pandemia não enterra apenas os mortos; enterra também os vivos. Só que estes últimos, cessado o flagelo, terão a possibilidade de renascer.



O coronavírus vem estimulando a veia humorística do brasileiro. Há quem veja nisso uma demonstração de insensibilidade ao sofrimento das vítimas e de seus parentes. Não é por aí. Ninguém faz humor na atual situação para subestimar a gravidade da doença ou menosprezar o sacrifício dos infectados. Faz motivado por comportamentos exóticos, às vezes ridículos, a que os indivíduos são levados por medo da infecção (há que ter espírito para suportar o longo confinamento em espaços apertados, como se vê agora). O humor é um espelho que retrata excessos, carências, deformações - comuns em situações de crise. O riso é uma resposta racional ao sofrimento. Constitui uma forma superior de resignação, e rejeitá-lo é deixar a porta aberta ao desespero.



Quem determina que não se deve sair de casa não são as autoridades médicas ou governamentais; é uma senhora ponderada, discreta e aliada da razão chamada Prudência. O preço que se paga por desprezá-la pode ser muito alto. Com não rara frequência, é a morte. Se evidências mostram que deixar a casa e participar de aglomerações levou em outros países a que se multiplicasse o número de mortos, fazer isso ou induzir outros a fazê-lo é de uma imprudência homicida. Os arautos da sensatez devem chamar os responsáveis por essa leviandade à razão. Todos estamos esperançosos de que esse “tsunâmi” passe logo, mas, como lembra Baltasar Gracián, a esperança é a grande falsificadora da verdade e deve ser corrigida com inteligência e... prudência!

Essa quarentena vai deixar marcas profundas. Não tenho dúvidas. Até minhas mãos não são mais as mesmas. Minha casa já não é vista com os mes...



Essa quarentena vai deixar marcas profundas. Não tenho dúvidas. Até minhas mãos não são mais as mesmas. Minha casa já não é vista com os mesmos olhos. Percebo, por exemplo, que alguns livros lidos e lindos pediam uma nova leitura. Pacientes, esperaram anos a fio. As amizade distantes nunca estiveram tão perto. Esse hiato na vida de um escritor, entretanto, tem de tudo.

Descubro que as utopias estão transmutadas. Alegorias do cotidiano passeiam pela sala. Estamos com a vida minimalizada. Com medo do medo que sentimos. Mas na verdade eu só queria dizer que não aguento mais lavar panelas.



Fico pensando em Alana, minha companheira, meu maior amor do mundo. Médica e tanta coisa na vida. Sensibilidade à flor da pele. Tem duas filhas ainda crianças, país idosos, pai doente. Vai pra luta com garra, sabendo dos riscos, coração em chamas.

Estamos separados por uma pandemia, mas, mais perto que nunca um do outro. Assim estão vivendo milhares de profissionais da saúde neste momento. Se podemos ajudar? Claro que sim. Vamos ficar em casa. Vamos pensar que tudo isso vai passar. Vamos transmitir o vírus da alegria e do amor. A única certeza que tenho é do abraço gigante que tenho aqui guardado.



Trabalhei na área social da prefeitura, um tempo, e tive lições doídas e inesquecíveis. Certo dia, numa visita ao Timbó, uma comunidade muito pobre, perto de onde moro hoje, uma senhora me contava sobre aS suas dificuldades na vida.

Moravam onze pessoas num casebre de dois cômodos, com o esgoto correndo por trás do cômodo que era a cozinha. Em tempos de quarentena, a lembrança de uma frase dela me atingiu como uma facada:

- Meu filho, aqui quanto todos deitam para dormir, ninguém pode andar em casa.

(excertos da Web)

Aconteça o que lhe acontecer, disse Auden, a vida ... prossegue. Se você se espernear, alguém vai resmungar “Ao diabo que o carregue”. E, co...


Aconteça o que lhe acontecer,
disse Auden,
a vida ... prossegue.
Se você se espernear,
alguém vai resmungar “Ao diabo que o
carregue”.
E,
como exemplo disso,
... pícaro,
deu o quadro de Brueghel sobre a indiferença ... geral ... ante a queda de um distante,
por isso minúsculo
Ícaro,
que de um lavrador trabalhando na plantação
sequer desvia a atenção.



A mulher aguarda
presa à grade de seus ciclos.
O radar
atento
vasculha.
As telhas
calhas e
bueiros
permanecem na expectativa.
O dia
adia.

(A espera é o espírito
desta esfera).



Tudo – na verdade ( redescubro agora ) - tem seu tempo certo.
Pode-se até caminhar sobre as águas
se congeladas.
Nada
portanto
de Luis XIV com sapatos Luis XV.
Existirá – porém - coisa mais deslocada do que imaginar Demócrito falando em átomo há vinte e cinco séculos
enquanto Anaxágoras discorria sobre a tese de que o homem descende de animais inferiores?
Ah
o retrato de Gala Placídia
feito em vidro por Bounneri Kerami
em Bréscia
Itália
século V
um milênio antes da hora!

Por outro lado
“Nascimento de Uma Nação”
o filme de Griffith
de 1914 ou 15
me parece muitíssimo mais antigo que as naturezas mortas de Eckhout
do século XVII.
A Ponte de Alcântara
construída em Portugal pelo Império Romano
me parece bem anterior ao sempre jovem Tejo
que passa debaixo dela
e é claro que houve um equívoco
quando se produziu science-fiction
no Egito de Tutankâmon!

(os dois últimos poemas são do livro Trigal com Corvos. O primeiro, excertos da Web)


Um náufrago é alguém de quarentena, isolado no mar da vida, tocando numa direção incerta como esse timão governado por um macaco prego, o ma...



Um náufrago é alguém de quarentena, isolado no mar da vida, tocando numa direção incerta como esse timão governado por um macaco prego, o mais irrequieto de todos os símios…

Mas pode ser também um momento de grande criatividade. As grandes obras de Arte européias, tanto na Música quanto na Pintura, foram criadas em quarentenas decretadas pelo frio. Sem falar que, em consórcio on-line com Mauricio Carneiro, o Dr. Cachacinha, estou criando o protótipo embrionário de uma bebida chamada Xaropirinha, um blend de Volúpia com mel de italianas, e que, desdobrado em sumo de limão e gelo, fornecera uma nova caipirinha,.. Como vê, o confinamento pode servir para alguma coisa.

O confinamento nunca é verdadeiramente confinamento a menos que não saibamos o que fazer com ele. É claro que cientistas, artistas, escritores, filósofos, artesãos finos, etc, fazem da solidão a verdadeira estrada da vida. E eles devem ensinar às pessoas, ou tentar passar um pouco de esperança, e que é possível lidar com isso, sem entrar em desespero.

Os antigos eremitas, religiosos autênticos, os monges, tinham se apoderado dessas capacidades. Com o tempo a religiosidade decaiu muito porque aquele fervor de crença já não se fazia necessário em uma igreja vitoriosa e que estava entregue ao poder mundano.

Pablo Picasso disse uma vez: "Ninguém haverá de criar nada sem o favor da solidão. Sabendo disto, tratei de criar uma solidão para mim". O gênio e sua penetrante compreensão dos processos em que está envolvido.

Tenho um amigo pintor que agora mesmo está islado e às voltas com uma tela de dimensões maiores que as comumente usadas por ele. Me disse que não tinha outra coisa a fazer que não fosse pintar, e eu lhe disse que esse era o momento de avançar (ele é um sujeito culto e certamente sabe disso), que os momentos em que eu consegui dilatar minhas concepções, composições e execuções artísticas se deram em meio às piores dificuldades, tanto materiais quanto espirituais, e posso dizer mesmo que me encontrava bastante adoecido e fragilizado.

Mas consegui, naqueles momentos de sofrimento, dar uma resposta criativa à altura do que a cisma existencial exigia para que eu seguisse vivendo, e que tinha de ser em novo patamar. E foi isso que aconteceu. Era uma quarentena mil vezes pior do que essa que vivo agora.

As pessoas que passam dramas profundos e conseguem superar adquirem alguma imunidade, embora não devam se confiar na HYBRIS...

(retraços da Web)

No capítulo 5 do Evangelho de João, versículos 1-16, Jesus cura um paralítico que há 38 anos sofria com a sua doença. Ele se queixava de nin...



No capítulo 5 do Evangelho de João, versículos 1-16, Jesus cura um paralítico que há 38 anos sofria com a sua doença. Ele se queixava de ninguém o levar à piscina (kolumbétra, em grego) de Betesda, no momento propício para a cura, quando a água se agitava. Havia sempre algum que se antecipava a ele e descia nas águas curativas. Jesus pergunta-lhe se ele quer ser curado, o paralítico conta-lhe a sua história e Jesus diz: – “Levanta-te, toma o teu grabato e anda!” E assim se dá.

A frase ainda se repete mais duas vezes. Uma, pelo próprio paralítico; outra, pelos judeus que, por ser sábado, recriminam o homem por carregar o seu grabato, não observando as regras do Shabbat.

A palavra grabato, no grego krábatos (esta palavra origina também o francês grabat), apesar de significar um leito miserável, enxerga, catre, é de fundamental importância no episódio.

Quando Jesus entra em contato com o paralítico, apenas pergunta se ele quer tornar-se sadio (hugiés, em grego), diante da lamentação do paralítico por não alcançar a tempo as águas da piscina de Betesda. Jesus o cura, sem sequer tocá-lo, sem dizer-lhe quem é.

Duas coisas podemos afirmar: o homem é curado pela sua fé; não há qualquer milagre no fato, mas a força da energia do bem que emana do Cristo é que curou o enfermo, do mesmo modo que cura a hemorragia de anos da mulher que toca, com fé, a fímbria de sua túnica e ele sente sair de si um poder (dúnamim, em grego – Lucas, 8,46).

Por outro lado, por que Jesus dir-lhe-ia para se levantar, pegar o grabato e andar? Por que não se omitir a ação de pegar o grabato? Não seria apenas para que o paralítico deixasse ali a sua enxerga, ou porque viesse a precisar dela.

O propósito maior de Jesus pedir-lhe para, uma vez curado, pegar o seu grabato é para que ele, o paralítico pudesse se lembrar de seu sofrimento. O grabato é a lembrança viva dos 38 anos de sofrimento em cima de uma enxerga.

Cada um de nós devia se lembrar de nosso grabato e carregá-lo, não nas costas, mas na mente, como lembrança do que sofremos por nossas próprias ações.

Jesus nos ajuda a curar, mas precisamos querer e ter fé para que isto aconteça. Estamos sendo curados, lentamente, a cada encarnação e podemos apressar a nossa cura, desde que aprendamos a lição, que se encontra nas últimas palavras que Jesus dirige ao paralítico, quando o encontra no templo: – “Ficaste curado, não cometas mais erros, (mekéti hamartáne, em grego) para que não te suceda coisa ainda pior”.

Não sabemos o que aconteceu ao paralítico, mas sabemos que ele disse aos judeus quem o curou e eles perseguiram Jesus. Assim fazemos nós: esquecemos as bênçãos que recebemos, deixamos de lado o nosso grabato, olvidando as dores por que passamos, e ainda demonstramos a nossa ingratidão vituperando quem nos enche de graça.

É preciso não esquecermos a nossa enxerga!

Hoje, a realidade é outra. Na expansão e pluralidade das expressões estéticas; na projeção de artistas que conquistam espaços significativ...



Hoje, a realidade é outra. Na expansão e pluralidade das expressões estéticas; na projeção de artistas que conquistam espaços significativos além de nossas fronteiras e no interesse do público local que prestigia exposições e se realiza em adquirir telas ou objetos de sua admiração.

Essa constatação de aspectos tão positivos sobre as Artes Plásticas na realidade contemporânea, torna ainda mais estranha e censurável inexistência de um Museu onde se instale a riqueza dessa trajetória para o reconhecimento de nossos valores, para a fruição da coletividade, para a educação dos jovens e o despertar das vocações.

Não é o fato de sermos um Estado pobre que nos impõe essa desolação no cenário cultural. Todos identificamos na inversão das prioridades, fato recorrente nas agendas governamentais, o desvio que submete as necessidades vitais da nação às filas de espera do desengano.

Ninguém desconhece o pródigo esbanjamento dos três poderes da República nas suntuosas edificações que se erguem em acintoso paradoxo com as solicitações urgentes e essenciais da população. Os bilionários templos do futebol são apenas o exemplo mais recente, ratificando que a "página infeliz da nossa história" referida por Chico Buarque, na ironia de seu anti-samba-enredo, infelizmente, não tem ponto final. Nossa Pátria-mãe continua "subtraída em tenebrosas transações" e seus filhos "levando pedras como penitentes, erguendo estranhas catedrais".

Convivemos há quase um mês com o grito das ruas contra a corrupção. São milhares de vozes que se erguem proclamando a causa primordial da negação dos direitos fundamentais da coletividade. Não apenas os mensalões, julgados ou não. Mas a intricada rede de improbidade que se estende, desde os paraísos fiscais, até as disparidades salariais, somadas a privilégios de todos os gêneros, que transformam servidores públicos em castas, sem qualquer respeito ao preceito constitucional da igualdade de todos perante a lei. É uma professora que fala, e não poderia ser outro o tom.

Eis a democracia em que vivemos e que nos cabe aperfeiçoar, inscrevendo-se o intelectual sempre mais igualitariamente na frente comum da construção coletiva.

(excertos de discurso)

Os dias se arrastam com uma uma velocidade sem limites. No entanto, sabemos que nada saiu do lugar. As ruas estão plenas: caos e si...



Os dias se arrastam
com uma uma velocidade
sem limites. No entanto,
sabemos que nada saiu
do lugar.

As ruas estão plenas:
caos e silêncio na espera
de uma normalidade tão
mais louca que a memória
das noites sem estrelas,
sem nuvens, sem lua...

Aquelas que pesam. Perdem
altitude. As que escondem
nossos passos. Comem nossas
sombras e prometem não
amanhecer.

Um inimigo invisível corre
pelas calçadas com motivos
para destruir. Devastando
o silêncio que somos quando
nos tiram o ar.

A morte e a vida caminham
lado a lado. Trocam flores
e trocam tapas. Se escondem
no medo de nunca mais voltar.

(suspiro)

Hoje foi um dia sisudo.
Troquei sementes de cedro
e jacarandá. Não porque
sejam eternas, mas por
serem a própria resistência.

O ignóbil passeia nas redes.
A farsa grotesca da miséria
não esconde a tristeza ou
a tatuagem sangrada dos
que não temem a eternidade.

Mas quando amanhecer
ainda estaremos aqui.
Vamos comer o que sobra
da vida que pouco temos.

Outros serão metade, ou
quem sabe até bem menos.
Alguma coisa invisível
nos jogou contra a parede.

Tudo é mar e tudo é sede.

No alto de um prédio
tremula uma sentença.
Estamos seguros como
o suicida antes do salto.

É bárbaro o que não voa,
mas nos joga pelos ares.
Como se fôssemos
a dobra de toda leveza.

A vida é um susto.
E eu abri mais uma
cerveja.


Pelo amor de Deus, é hora de parar! De refletir e agir pelo bem. É hora de buscar o melhor que tenhamos dentro de nós. Conhece-se a verdadei...



Pelo amor de Deus, é hora de parar! De refletir e agir pelo bem. É hora de buscar o melhor que tenhamos dentro de nós. Conhece-se a verdadeira índole de uma pessoa quando a ela se concedem riqueza e poder. Mas é nas dificuldades que também se revela a natureza humana.

O Espiritismo ensina que vivemos em um planeta de expiações e provas, prestes a dar início a uma seletiva regeneração. Espíritos iluminados nos instruem para que entendamos as adversidades, ainda que dolorosas, como oportunidades para crescer, evoluir e neutralizar as marcas que o carma nos reserva. Seja individual ou coletivo.

Jesus Cristo, o filho de um carpinteiro judeu, mostrou que da simplicidade brotam ensinamentos capazes de transformar o mundo, apenas com Amor. Ensinou-nos a mais perfeita oração, que nos intui a fé incondicional para aceitar a vontade de Deus. Parece até que esquecemos disso quando oramos o Pai Nosso...

Mas se você não é cristão, ou não se afina com religião alguma, não importa. O que importa é o bem que se produz. A verdadeira religião é a da conduta, pois é na prática da solidariedade, da fraternidade, que a felicidade é possível. E não na crença.

Nós brotamos no seio deste planeta que tem bilhões de anos, junto com plantas, animais e todas as formas de vida. Inclusive vírus, fungos e bactérias. Sim! Os vírus também são filhos de Deus e bem mais antigos que nós. Há vírus inofensivos e são a forma de vida mais abundante nos rios, lagos e mares. Evoluíram e se proliferaram como todos os outros seres que habitaram a Terra.

O tipo que surgiu agora, amedrontando a humanidade com uma terrível pandemia, é mais um. Sua criação, mutação e reprodução aconteceram inteiramente dentro das leis naturais, das Leis de Deus. Nada acontece no Universo que não esteja abrigado nas leis que regem o fenômeno da Criação. Todas as catástrofes, tsunamis, terremotos, epidemias, guerras, pragas, furacões ocorrem sob as leis universais. As Leis de Deus.

Quando produzimos suas causas, colhemos os efeitos. É da Lei. O arbítrio para semear é livre, mas a colheita é inexorável. Provocamos duas insanas guerras mundiais em menos de 30 anos, mas faz três quartos de século que não mais as permitimos. Aos trancos e barrancos, sofrendo, amando e aprendendo, progredimos. Houve tempo em que comíamos uns aos outros, que sacrificávamos nossos bebês em rituais de inconcebível estupidez. Estamos, sim, evoluindo. Acreditemos.

Agora a humanidade enfrenta uma condição que clama por união. Uma pandemia que suplica atenção, e, sobretudo solidariedade. Não deve haver espaço para a discórdia e a insensatez.

Se há recomendação científica para se recolher, que se respeite. Mas também se respeitem as atividades que não podem parar. Hospitais, serviços de abastecimento de água, gás, luz, alimentos, coleta de lixo, farmácias, padarias, supermercados, transportes públicos essenciais, não! Vamos respeitar, apoiar e entender isso. Se a indústria alimentícia parar, se o supermercado fechar, se o gás não for fornecido, o que será de nós?

Se você é jovem, saudável e não está no grupo de risco, proteja-se e ajude a quem precisa. Vá em frente. Há gente idosa, vulnerável, carente, que nessa hora só conta com a solidadriedade alheia.

Se você tem condições de estar e trabalhar em casa, ótimo. Recolha-se! Interrompa a cadeia de contato físico e preste um bem à luta contra o contágio. Faça leituras e tarefas edificantes. Medite, reflita, ore. Assim estará contribuindo para uma atmosfera espiritual leve e propícia a filtrar os benefícios do Alto. Acredite que há uma população imensa, do “outro lado”, trabalhando pelo bem da humanidade. Mas não critique nem exija que uma família numerosa se confine em uma quartinho de 20 metros quadrados. Tudo tem limite.

Se você é político, afina-se com a política, faça de sua ideologia um caminho de união em benefício coletivo. Esqueça, pelo menos por enquanto, as divergências partidárias. Partidos são partes de um todo em função da comunidade. Partido não é para tirar partido, muito menos da miséria. Não torça contra quem está, no momento, com a responsabilidade de administrar um país que sofre com o medo, com a insegurança, com um futuro obscuro mediante a precariedade de um sistema de saúde pública que nunca foi levado a sério.

Gente, é hora de união, de cooperação, de participação solidária. Não disseminemos pânico, terrorismo, pessimismo. Só unidos é que venceremos mais uma batalha. Pelo amor de Deus!

"(...) tendo partido para as esferas espirituais, tenho certeza de que aqueles que se lembrarem de mim, o farão me chamando de professo...


"(...) tendo partido para as esferas espirituais, tenho certeza de que aqueles que se lembrarem de mim, o farão me chamando de professor, (...) não como “o eco particular do meu Destino”, mas com as obras plantadas pelos exemplos colhidos no curso vida e da profissão.



Discurso de Posse do Professor Milton Marques Júnior na APL

Os Professores e a Academia: Plantando as Sementes do Saber e da Criação

A Chegada

Chego a esta Casa. Aqui me encontro diante de todos vós. O desafio de chegar até aqui foi grande, mas não se resume a chegar. Chegar é só um passo dado diante do significado de ser acadêmico. A partir de agora, novos desafios acontecerão, pois cabe a todos os que fazemos esta entidade trabalhar em prol do conhecimento e revertê-lo à sociedade que a abriga. Assim, concebeu Platão a sua academia.

A Academia de Platão

A Academia de Platão foi fundada no século IV a. C., por volta do ano de 384, num bosque a noroeste de Atenas, e consistia numa associação exclusiva para aqueles que ali eram admitidos, ainda que não se pagasse nada para a sua admissão. O nome academia (a)kadh/meia) é proveniente do mitológico personagem, Academos ( )Aka/dhmoj), que teria indicado a Castor e Pólux, os Dióscuros, onde Helena se encontrava, depois de sequestrada por Teseu. Tendo resgatado a irmã, os dois irmãos e seus companheiros espartanos decidiram não incendiar o bosque, que passou a ser conhecido como “O Jardim de Academos”.

O objetivo da Academia de Platão era o ensinamento da ética e da justiça, segundo nos afirma Giovanni Reale, em sua História da Filosofia Antiga, volume III. Mais importante do que a sistematização de um saber científico, Platão vislumbrava a necessidade de se constatar a impossibilidade de a alma reconhecer a justiça sem ela mesma ser justa. Só com a alma constituída de bem, pela sua alta espiritualidade, é que se pode compartilhar esse conhecimento iluminado, diz Giovanni Reale, citando uma carta da velhice de Platão. Não é por outro motivo que, na República, a sua obra maior, Platão afirmar ser a justiça a virtude da alma (a)reth/n yuxh=j ei=nai dikaiosu/nhn, 353e).

Sim. A academia platônica era movida pela necessidade de saber, vez que o filósofo, como definia Sócrates, é aquele que ama saber, não aquele que ama o saber. Para Giovanni Reale, a academia platônica é o núcleo do que hoje se constituíram as universidades, local que deveria ser, por excelência, onde se realiza a busca do saber. As discussões na academia platônica variavam, abrangendo todos os temas: ética, política, astronomia, matemática, linguagem, literatura, natureza da alma, mas todos voltados para um único caminho – dikaiosu/nh, a prática da justiça –, sem a qual a sociedade tenderia a sucumbir. Como não ver por exemplo a discussão sobre o amor e a natureza da alma, no Fedro, ou a recusa de Sócrates de escapar da sentença de morte, por acreditar nos princípios éticos e no destemor da morte, sem os quais o filósofo não existiria, nem estaria no topo da reencarnação, como podemos ver no Críton e no Fédon? Como não entender a visão ética sobre a criação poética, que Platão definia como imitação, e que deveria ser cuidadosamente encarada quando levada às crianças, na República, cuidado que confundiu as pessoas, achando que Sócrates estava expulsando os poetas da cidade ideal que criava, quando na realidade estava salvaguardando a educação, paidei/a, sadia para as crianças, num Estado que deveria ser são? Como não considerar as discussões sobre inspiração e técnica, no fazer poético, que abrem espaço para as primeiras reflexões sobre a diferença entre doxa (do/ca), a opinião, e episteme (e)pisth/mh) o conhecimento, conforme se encontra no Íon?

Eis o espírito de uma Academia. Procurar amar saber, buscá-lo, investigá-lo, colocá-lo na ordem do dia e das discussões, para, a partir dele, pensar em uma sociedade justa. Esta é a ideia que encontramos embutida no brasão desta Casa – Decus et Opus, Honra e Obra. É através das obras que realizamos, que mostramos o que é a honra, virtude inseparável da justiça, que está na base da academia platônica, formalizada de modo inquestionável na Alegoria da Caverna: o saber afasta as sombras da aparência, ofuscando inicialmente quem vive nas trevas e exigindo um esforço de quem se propõe subir o íngreme caminho até a luz. Uma vez acostumado à luz, aquele que se coloca diante do saber tem a responsabilidade de fazer a descida para tentar resgatar os que ainda estão sob a opressão e as impressões das sombras. Esta nossa obra, esta nossa honra.

Meus Antecessores

Cabe-me, neste momento, dar uma palavra sobre os meus antecessores, nesta Cadeira de número 40, que logo passarei a ocupar.

O Patrono Cândido Firmino de Mello Leitão

Cândido Firmino de Mello Leitão é o patrono da Cadeira. Cientista, botânico e zoólogo, com ênfase na entomologia, mais especificamente nos aracnídeos, ordem da qual descobriu, nomeou e classificou perto de 70 espécies, como a Lasiodora Parahybana, tarântula descoberta em Campina Grande, em 1917. Professor e taxonomista, “um gigante que pode ser visto por diversos ângulos, como professor, conferencista, pesquisador, escritor de livros didáticos, historiador, biogeógrafo, escritor e quase poeta”. É o que diz Lauro Pires Xavier, no seu discurso de posse, ocasião em que se tornava fundador da Cadeira de número 40 (publicado em plaquete, em 1972, p. 20, acervo da APL). No mesmo discurso Lauro Pires Xavier o aponta como menino prodígio, tendo recebido o diploma de Doutor em Medicina, com a tese Da Polistease Visceral (p. 21).

Mello Leitão foi um dos criadores do Horto Botânico da Escola Normal de Niterói, por compreender que o ensino da História Natural deveria ser feito a partir de espécimes vivos (p. 23). Precursor da Ecologia, como um dos ramos da Botânica, em 1924, quando a palavra sequer havia sido dicionarizada, no Brasil – só o foi em 1928. (p. 24). Orgulho-me, portanto, de estar ocupando a mesma cadeira de Mello Leitão, professor do Museu Nacional, taxonomista respeitado no Brasil e no exterior, pelos seus estudos e descobertas.

O Fundador Lauro Xavier

Professor e ecologista “avant la lettre”, Lauro Xavier ocupou a Cadeira de número 40, de 1972 a 1991. Agrônomo, em 1933, pela Escola Superior de Agronomia e Medicina Veterinária do Ministério da Agricultura, na Praia Vermelha, Rio de Janeiro, ele foi um dos fundadores da APAN – Associação Paraibana dos Amigos da Natureza –, e um dos pioneiros na luta pela preservação da Mata do Buraquinho e das palmeiras imperiais da Lagoa.

Lauro Xavier não era só botânico, era sobretudo ambientalista, com vários títulos e artigos publicados. Desta Academia, pelo seu trabalho, ele recebeu a comenda “Ad Immortalitem”, em 1991.
Em seu discurso de posse nesta Casa, onde chega no ano de 1972, Lauro Xavier, a associa, de modo definitivo e inquestionável a si mesmo e Cândido Firmino de Mello Leitão, o patrono da cadeira que ora passava a ocupar, e seu professor na Escola Superior de Agricultura e Medicina Veterinária do Rio de Janeiro:

“Quero dizer que tudo nesta casa, desde o nome Academia, significa ou simboliza a vida vegetal, pois sua origem vem do Jardim de Akademus” (p. 47).

No discurso de saudação, Osias Nacre Gomes afirma ser Lauro Xavier “feroz amante das árvores, das quais, com aplauso geral, se improvisou em Perpétuo Defensor” (p. 58). Trata-se de uma afirmação que transcende a mera retórica habitual nesses momentos; trata-se de fato inquestionável, devidamente documentado pelo nosso querido Gonzaga Rodrigues, numa crônica intitulada “A Falta que Lauro Faz”. Ali, Gonzaga lembra que Lauro Pires Xavier era professor que “não se limitava à sala de aula, ou melhor, não limitava a sala de aula às paredes de Areia ou do campus central. Exercia o ofício através das colunas que o jornal lhe franqueava. Estava sempre atento.”

Foi assim que a CHESF, diante do combate sem trégua de Lauro Pires Xavier, teve que contornar a Mata do Buraquinho, no momento da ampliação de sua rede de energia, quando o intuito era cortar a mata, “devastá-la pelo meio”, como diz Gonzaga, “para não gastar muito”. Arremata Gonzaga:

“Só a autoridade de Lauro, respaldada de todos os respeitos, demoveria a Saelpa de um general a mudar seus planos. Ele transferiu sua cátedra, sua pregação missionária para os jornais e rádios de então, e quem subir o Rangel, roçando a mata a sua esquerda, ainda pode ver a curva que a rede da Chesf descreveu para não tocar nesse marco que ainda distingue a cidade no cenário urbano mundial”.

Antônio de Souza Sobrinho, o mais recente ocupante

Antônio de Souza Sobrinho, professor, sociólogo, reitor da UFPB, realizou um a um os sonhos de seu tio Antônio de Souza, o “Titonho”, de quem carrega o nome, acrescido do epíteto “Sobrinho”: foi padre, estudou em Roma – Colégio Pio Brasileiro e Universidade Gregoriana –, foi professor e reitor, escreveu livros e entrou para a Academia Paraibana de Letras, ocupando esta Cadeira de número 40, sendo empossado em 1992, onde permaneceu até o ano passado, quando de sua partida para as esferas espirituais.

Professor de casa cheia, Antônio de Souza Sobrinho encantava o seu alunado com os seus conhecimentos de Sociologia e das experiências vividas ao longo do tempo. Perspicaz, via sempre na frente. Para dar exemplo de sua acuidade crítica, citarei uma passagem retirada de seu discurso de posse. Antônio de Souza Sobrinho, de modo sutil, ironiza o ativismo da Igreja Católica, proveniente do próprio Brasil e ganhando eco no exterior, com relação às queimadas da Amazônia. Tendo morado na Itália, ele acompanhou de perto, pelos jornais locais, as queimadas que se faziam na península, chegando à conclusão de que, com relação a seu tamanho, a Itália queimava mais matas do que o Brasil:

“Se você fizer os cálculos, medir o tamanho da Itália e a imensidão da Amazônia, o que eles ainda têm (pouquíssimo) e o que a Amazônia tem de sobra, verá que a Itália acaba queimando mais do que nós. Espero que o Papa leia também o jornal deles; porque os nossos – com nossas dores, erros, desastres, pecados e lágrima – a CNBB sempre se encarregou de traduzir e mandar no primeiro telex (hoje, “fax, diz Sobrinho) matinal” (Revista da Academia Paraibana de Letras, ano XLVI, nº 11, 09/1994, p. 188).

Eu diria que hoje, as notícias são enviadas pelo primeiro twiter matinal...

Em outro momento, Sobrinho critica “a apropriação e manipulação” de nossos recursos naturais, por parte dos estrangeiros, “a título de ‘AJUDA DESINTERESSADA’ (em caixa alta e entre aspas), por países detentores de tecnologia moderna, que vêm ameaçando patentear e lucrar com o monopólio de tal conhecimento” (id., ib., p. 190).

É isto que faz o professor. É esta visão que complementa o homem no professor, não se deixando levar pela razão de uma suposta autoridade.

É óbvio que aqui estou chamando a atenção para a acuidade crítica do professor Antônio de Souza Sobrinho, cujo discurso está longe de autorizar o menoscabo, o desprezo ou a destruição de nosso patrimônio ambiental. Como bom sacerdote que foi e como administrador de uma instituição importante, como a UFPB, ele constatou que é mais fácil observar o argueiro no olho do outro do que a trava no seu próprio olho. Acuidade crítica, repito, que o faz atual, mesmo passados 28 anos. Que o diga, como bem lembrou nosso confrade José Octávio de Arruda Mello, no discurso póstumo ao meu antecessor, a criação do Forum Universitário, no reitorado de Sobrinho, permitindo a discussão de importantes temas brasileiros e mundiais, trazendo à UFPB expressões ilustres da política e da sociedade brasileira, oriundas de vários cantos do país. Um professor, ainda citando José Octávio, a quem ser professor era o único título que lhe bastava.

Ser Professor e a Semeadura do Conhecimento e da Criação

Caríssimas Confreiras, Caríssimos Confrades, Minha Senhoras, Meus Senhores,
Quem são, pois, aqueles com quem tenho a honra de partilhar esta Cadeira de número 40? Dois biólogos, ambientalistas e ecologistas, e um sociólogo, cuja preocupação com o meio-ambiente também era uma de suas missões. Cada um dos meus antecessores nesta Casa, pertenceram antes a uma academia. Academias de ensino regular, como o são as universidades. Todos eram professores e a eles me junto, orgulhoso de minha profissão. Profissão que me moldou para chegar até aqui.

O convite para a minha posse nesta Casa acentua a minha condição de escritor. Sinto-me lisonjeado com esta deferência. No entanto, e meu caríssimo Damião Ramos Cavalcanti, presidente desta entidade não tome como crítica, sinto-me mais à vontade com ser reconhecido como professor. É nesta condição que entro neste sagrado recinto, como professor que sou e que serei, ainda que me aposente. É esta a condição essencial da minha vida, tudo o mais é transitório. Ter escrito alguns livros faz parte dessa condição essencial.

Digamos que o escritor seja uma consequência do trabalho que desenvolvi nos últimos 43 anos e que me concedeu o lastro para ser aceito por aqueles que sufragaram o meu nome, quando da ocasião da eleição para a Cadeira de número 40. Cadeira que passarei a ocupar como muito orgulho e com muita responsabilidade, por vir de um professor que conheci pessoalmente, e de mais outros dois de cuja existência tomei conhecimento.

Entro nesta Casa, sob os auspícios também de dois outros grandes professores, Coriolano de Medeiros, e o seu maior integrante, sem demérito para ninguém, o poeta Augusto dos Anjos.

Foi criança, com 11 anos, em 1968, que, pela primeira vez, entrei em uma Casa fundada por Coriolano de Medeiros, a Escola Industrial Federal da Paraíba, antes Escola industrial Coriolano de Medeiros. Escola que foi uma segunda casa para mim. Hoje, aos 63 anos adentro em outra casa fundada por Coriolano de Medeiros, em 1941; esta veneranda Academia Paraibana de Letras, que, como lembrou a professora Ângela Bezerra de Castro, que há de fazer a minha saudação, abriga 4 egressos da antiga Escola Industrial: o seu fundador, o já citado Coriolano de Medeiros; o seu diretor, Itapuan Botto Targino; uma de suas mais dedicadas professoras, a própria Ângela Bezerra de Castro, e um de seus alunos, no caso eu. Como não me orgulhar de ser professor e de pertencer a esta Academia se, quando olho para trás, vejo o perfil altaneiro dos que aqui chegaram antes de mim? Não é à toa que o verbo respicio, em latim, significa olhar para trás ou olhar de novo. A palavra respeito, respectum, supino desse verbo, significa exatamente isto: olhar para trás e considerar o que lá existe e que há de nos servir de lição.

Quando, há dois meses, fui entrevistado pelo meu querido confrade Abelardo Jurema Filho, levei alguns livros de minha autoria para mostrar-lhe. Um deles era um livro de epigramas, poemas irônicos e satíricos, curtos e incisivos. Na ocasião, Abelardo me perguntou se eu também me considerava um poeta. Respondi-lhe que não. No máximo, era um versejador irônico. Poderia ter dito, se não estivesse premido pelo tempo: a única coisa que me define é ser professor e foi na Escola Industrial que tive a consciência de que não queria ser mais nada a não ser professor.

O segundo professor, sob cuja inspiração ligo-me definitivamente a esta Casa é, como já falei, o poeta Augusto dos Anjos. Augusto é, sem nenhum favor, o maior poeta brasileiro e um dos maiores do mundo, sem desdouro para os demais. Apenas precisa ser mais lido e menos maltratado. Esta casa, que se situa no entorno de onde o poeta morou – “Número centro e três. Rua Direita”, como diz o verso inicial de “Noite de um Visionário” –, deveria ser, por excelência, o lugar de sua veneração. Assim como na pequena cidade de Aix-en-Provence, no sul da França, os passos de Paul Cézanne estão eternizados no bronze fixado nas ruas e calçadas por onde passou, assim deveríamos fazer com o nosso poeta; assim como Cézanne pintou exaustivamente a montanha de Santa Vitória e a eternizou em quadros disputados a peso de ouro pelos marchands e museus, assim a obra do poeta deveria ser avidamente procurada e estudada. Infelizmente, para muitos seus passos estão apagados, ainda que ele tenha morado no entorno desta Academia; sua obra, por outro lado, não se encontra com facilidade nas livrarias. Que livraria francesa não disporá dos livros de Victor Hugo? De que livraria portuguesa Camões estará banido? Como não encontrar Cervantes, na Espanha ou Dante, na Itália?

Tenho, no entanto, a convicção de que poderei, juntamente com os minhas futuras confreiras e futuros confrades, trabalhar para a imortalidade do poeta, não a imortalidade fátua, mas a da sua lembrança perene e sempre renovada, através da leitura e do estudo de seus poemas. É este o sentido maior da Academia, de cuja cadeira número 1 o poeta Augusto dos Anjos é o patrono: lutar para que a Morte exerça um ódio vão contra a Arte, para que os sáxeos prédios não sejam tortos, para que não mais tenham o aspecto de edifícios mortos, para que, enfim, não se decomponham desde os seus alicerces, conforme antevê o poeta em “Os Doentes” (versos 415-418).

A Semente do Tamarindo de Augusto

Todos vós haveis de estar vos perguntando o que faz este vaso com uma singela planta na mesa de cerimônia desta posse. É um tamarindo. Ainda frágil, mas não é um tamarindo qualquer. É um tamarindo que brotou de uma semente de uma vagem colhida embaixo do tamarindo de Augusto dos Anjos, na casa em que o poeta nasceu e morou, e debaixo de cujos galhos, “como uma vela fúnebre de cera”, compôs a beleza jamais inigualada do Eu e os demais poemas. Que a “paleontologia dos carvalhos” aqui remoçada em novo broto cumpra a profecia do poeta. Quando o poeta junta o carvalho de seu sobrenome com o da planta de que o tamarindo é irmã, numa taxonomia cara a Cândido Firmino de Mello Leitão, não se trata de puro jogo de palavras como alguém poderia supor, mas de uma consciência ecológica, que certamente agradaria a Lauro Xavier, e, mais do que isso, a consciência da evolução das espécies. Somos todos – animais, vegetais, seres humanos, a química das rochas – parte de um uno, saídos da “evolução orgânica da argila” (“As Cismas do Destino”, verso 380), que só se divide para compor o mundo, mas que não pode ser ignorada em suas partes. Como pensava Lauro Xavier, agredir o meio ambiente é agredir a nós mesmos. O poeta pensava igual, no respeito que nutria pela natureza e pelos homens.

Trazer uma muda de tamarindo para ser plantada nesta Academia Paraibana de Letras é, para mim, de uma simbologia inefável. Não é só uma árvore a mais que se planta. É a reencarnação do poeta na sua germinação e floração, nos dizendo para como homens não sermos aquela “árvore sem fruto”, de que ele nos fala em “As Cismas do Destino”. Esta Casa tem a missão de plantar e disseminar a cultura, lembrando que o verbo colĕre, de que provém a palavra cultura é, no latim, de origem agrícola, passando logo a seguir a significar todo o tipo de cultivo: do campo, dos deuses, da amizade, do espírito, da intelectualidade. Assim, com este tamarindo, estamos plantando, simbolicamente, a cultura e a humanização, de cujas sementes sairão o nutriente das futuras gerações, que não deixarão morrer o poeta e o que ele representa para nós. A paleontologia dos carvalhos une, portanto, Augusto e o tamarindo, e nós a eles. Com a floração desse novo tamarindo, que deverá crescer nesta Casa, e as ações que deveremos fazer para a sua perpetuidade, cumprir-se-á a profecia do poeta: “Não morrerão, porém, tuas sementes, por que depois da morte ainda teremos filhos”.

Conclusão

Assim, Caríssimas Confreiras, Caríssimos Confrades, Minhas Senhoras, Meus Senhores, não foi a transitoriedade que me pôs aqui – sic tansit gloria mundi, dizia o poeta mantuano, autor da Eneida –, mas a minha condição definitiva, escolha ainda criança, dessa que considero a profissão mais importante de nossas vidas – ser professor. Vivo, sou chamado de professor; tendo partido para as esferas espirituais, tenho certeza de que aqueles que se lembrarem de mim, o farão me chamando de professor, não de escritor, fazendo-me permanente pela memória. Não como “o eco particular do meu Destino” (“As Cismas do Destino”, verso 248), mas com as obras plantadas pelos exemplos colhidos no curso vida e da profissão, “A minha sombra há de ficar aqui!” (“Debaixo do Tamarindo”).

Muito obrigado.


Estou me sentindo a própria tiazona que dá “pito” nos sobrinhos. Posso até estar errada, mas vocês acham certo que numa situação que se pr...



Estou me sentindo a própria tiazona que dá “pito” nos sobrinhos. Posso até estar errada, mas vocês acham certo que numa situação que se prevê ser caótica, causar mortes, ficarmos confinados em casa para não sermos alcançados pelo vírus, estarem preocupados com POLÍTICA?

O momento é de união, é de sermos solidários uns com os outros. E vocês discutindo POLÍTICA? Vocês ainda acreditam que algum daqueles políticos está pensando em nós? Em nosso pavor do que poderá vir? Sinto muito, não estão mesmo. Eles se comem publicamente, se ofendem, mas todos se aconchegam para trocarem favores, esconderem o que o outro fez de errado.

Sinto muito, mas pensem com racionalidade sobre a situação mundial. Pessoas morrendo por todo lado, médicos e diversos outros profissionais da área de saúde se extenuando para salvar vidas e vocês se digladiando por causa de políticos?

Não desejo que vocês vivam o pavor que ouvi de algumas pessoas que moram na Itália e viram seus entes queridos morrerem e não tiveram, ao menos, o consolo de os velarem ou enterrarem. E vocês ainda se preocupando em trocar desaforos, em trocar frases ofensivas pelas redes sociais?

O momento é de espalhar paz, tranquilidade, olhar as necessidades do seu vizinho, ter amor no coração. Lembro a vocês que a gente colhe o fruto das sementes que espalha.

Dê um tempo para o ódio abrandar sua alma. Isto irá, inclusive, beneficiar a sua saúde.

Estou cansada de ouvir tanta asneira.


Cristina Lugão Porcaro é bacharel em artes plásticas, psico-pedagoga e escritora

Essa pandemia é trágica, mas parece ser uma intervenção divina. Para nos olharmos mais de perto, nos vermos mais humanos, menos auto-suficie...


Essa pandemia é trágica, mas parece ser uma intervenção divina. Para nos olharmos mais de perto, nos vermos mais humanos, menos auto-suficientes, mais solidários.

Dessa vez ou aprendemos a dar valor aos nossos idosos ou de fato o brasileiro se mostrará como uma má espécie na sua essência.

Se cada um de nós tiver que passar, digamos, não 14, mas 10 dias em casa arrumando o seu quintal, as suas gavetas, suas ideias, vamos nos livrar de dengue, de novas dívidas, excessos, egocentrismo, pois a maldade disfarçada de civilidade que nos atinge faz mais de meio século, desde o fim da última grande guerra.

Olha o mundo soberano, multicultural, cosmopolita e cheio de charme voltando aos tempos feudais!

Admiro a vigilância epidemiológica americana. Foi capaz de cortar na carne: Puseram a United no chão, fecharam aa fronteiraa antes de todos, sabiam que iríamos ter um equinócio nada atraente. Pela primeira vez, o outono no polo norte não chorará apenas folhas amarelas...

Assisto a tudo como se estivéssemos nos compassos da Pastoral de Beethoven em plena tempestade. Depois virá a calmaria e em breve a Primavera, não a de Vivaldi, mas a verdadeira primavera com seu calor para pôr esse "coroado" no seu devido lugar.

Incentivemos todos a diminuir o ritmo, ao recolhimento. É a única via de contenção de um pico desastroso pela demanda ao serviço de saúde. Recolhimento, leitura, música e canja de galinha.

Se o que digo é para o bem de alguém, divulgar não precisa de autorização. O bem pertence a humanidade!

Excertos do Discurso de Saudação ao novo acadêmico, Professor Milton Marques Júnior, proferido pela Professora Ângela Bezerra de Castro, na ...


Excertos do Discurso de Saudação ao novo acadêmico, Professor Milton Marques Júnior, proferido pela Professora Ângela Bezerra de Castro, na APL

"A Academia não é uma associação qualquer. É, antes de tudo, um Templo. Templo erguido para o culto perene às realizações intelectuais marcantes, únicas em seu conteúdo e expressão, e que por isso acrescentam nova dimensão à realidade cultural da Paraíba."



"O espírito acadêmico integra esse mesmo universo de valores, por isso refratário a qualquer moeda de troca. Ele se afirma e se solidifica na essência da criação intelectual de qualidade dos que vão tecendo a história desta Casa.

Às vésperas de completar 80 anos, um considerável marco de existência, a APL já dispõe de perspectiva histórica para uma análise crítica de suas escolhas, que possa contribuir com o aperfeiçoamento dos critérios prevalentes em cada eleição. A essa altura, já é possível distinguir os sócios que integraram a APL, de forma paradoxal, apenas na ausência e no silêncio, daqueles que lhe deram vigor e continuidade. Os que trouxeram seus dons e depositaram como pedras para a construção do Templo."



"Meu querido amigo, sua história é mais que merecedora de reconhecimento. Ela é exemplar, é inspiradora. Não apenas pelos objetivos alcançados com inteligência e obstinação ou pela erudição acumulada no exercício permanente da aprendizagem e do ensino, sua profissão de fé. Mas pela coragem de buscar e de realizar o mais difícil, na contra mão de uma realidade histórica dominada pelo imediatismo da banalidade e da superficialidade."



"Você não se deixou contaminar pela acomodação dos que se anulam no silêncio. Mobilizou toda sua competência e energia para corrigir a distorção da velha reforma impensada, que eliminou de nossos currículos a cultura greco-latina. Precisou confrontar e neutralizar a realidade adversa. Sonhar e se fortalecer com sua capacidade de liderança, até que essa iniciativa visionária, esse pensar grande resultasse na criação do Curso de Letras Clássicas, licenciatura em Língua Latina, Língua Grega e suas respectivas literaturas.

Hoje, através dessa valiosa área de estudos, com o comprometimento de sua coordenação, nossa UFPB se interliga a outras instituições de ensino superior que também tiveram esse alcance de preencher o que sempre foi uma lacuna injustificável, em nosso sistema educacional.

Talvez a Paraíba ainda não se tenha dado conta da dimensão desse feito. Mas seu lugar na História será ao lado dos antecipadores do futuro, daqueles que edificam para a posteridade com materiais que o tempo não desgasta."



A seguir, a íntegra do Discurso:

Discurso de saudação ao acadêmico Milton Marques Júnior
(Profª Ângela Bezerra de Castro)


Cada vez que a Academia elege um novo sócio, expõe seu nível de comprometimento com os ideais que motivaram sua criação e a estruturaram como entidade de utilidade pública. Ideais concretizados em objetos que se destinam à preservação e à divulgação da memória cultural da Paraíba.

Será sempre pertinente indagar se a história de cada sócio garante a continuidade da Instituição, sem que se perca de vista a sua divisa: Estética e Trabalho. Pois a Academia não é uma associação qualquer. É, antes de tudo, um Templo. Templo erguido para o culto perene às realizações intelectuais marcantes, únicas em seu conteúdo e expressão, e que por isso acrescentam nova dimensão à realidade cultural da Paraíba. Templo do saber que constrói e liberta o homem, “para facilitar o discernimento dos fenômenos sociais, para não se andar no escuro, desconhecendo a própria sombra”. Esse o conceito de José Américo, na instalação de outra Academia, a UFPB.

Lembro de nosso confrade e querido amigo, Odilon Ribeiro Coutinho, repetir, com ênfase, que o melhor da Academia era a convivência. Mas a gratificação dessa convivência inexiste, se o saber não se estabelece como o valor maior desta Casa. Saber que equipara Ciências, Letras e Artes, numa comunhão que agrega os diferentes, aproxima os distantes e faz das múltiplas tendências um corpo místico, alimentado pela ânsia de crescimento e de realização intelectual. Metas que dão sentido ao existir, impelindo o homem a elevar-se para a transcendência a que se destina.

Penso a Academia, inspirada na perspectiva do humanismo cósmico de Exupéry, nessa lição insuperável: “O que torna bela uma casa não é que ela nos abrigue e que tenha paredes. Mas que deponha em nós certa provisão de doçura que faça brotar, como de uma nascente, os sonhos”.

Foi através desse mesmo olhar que Manuel Bandeira reergueu a casa do se u avô. Com materiais “imponderabilíssimos e impalpáveis”. E, só assim, pôde imortalizá-la “impregnada de eternidade”.

O espírito acadêmico integra esse mesmo universo de valores, por isso refratário a qualquer moeda de troca. Ele se afirma e se solidifica na essência da criação intelectual de qualidade dos que vão tecendo a história desta Casa.

Às vésperas de completar 80 anos, um considerável marco de existência, a APL já dispõe de perspectiva histórica para uma análise crítica de suas escolhas, que possa contribuir com o aperfeiçoamento dos critérios prevalentes em cada eleição. A essa altura, já é possível distinguir os sócios que integraram a APL, de forma paradoxal, apenas na ausência e no silêncio, daqueles que lhe deram vigor e continuidade. Os que trouxeram seus dons e depositaram como pedras para a construção do Templo.

Professor Milton Marques Júnior, esta é a Casa das Letras da qual você se torna, hoje, sócio efetivo. A distinção de recebê-lo nesta solenidade, em nome de todos os meus pares, é uma daquelas raras alegrias que devo reconhecer como presente do Destino. Não do acaso. Pois sabemos de quanto tempo e de quantas ternuras se constitui esse instante de duração infinita.

Em seu discurso poético, de memória e gratidão, você atualizou o espaço-tempo de uma imagem que guardo com absoluta nitidez. Daquele adolescente concentrado na busca pelo conhecimento. Para sua vontade de aprender, as aulas não bastavam. Abraçado aos livros e cadernos, era comum encontrá-lo pelos corredores, em diálogo com algum mestre, perguntando e ouvindo a explicação para sua dúvida ou curiosidade, em contrita devoção. Ali, em nossa Escola Técnica Federal da Paraíba, estava sendo gestado o professor de todos os méritos, o pesquisador incansável, o escritor de muitos talentos, o imortal cujo perfil projeta para a APL uma participação intensa e criadora, com o selo indispensável da qualidade intelectual.

Tem sido este o nível de suas publicações. Sempre de grande alcance pedagógico e com o propósito revisionista.

Destaque para sua tese de Doutoramento, editada pela UFPB. Nela você faz nova leitura da história e da crítica, sobre a obra de Aluísio Azevedo, para comprovar que o escritor “chegou a O Cortiço, em 1890, produzindo um romance essencialmente moderno, antecipador” porque foi capaz “de ler-se a si mesmo, de ler os contemporâneos brasileiros ou estrangeiros e de ler os sinais da rua” indicativos das transformações do mundo urbano.

Conclusões apoiadas em exaustiva análise dos elementos constitutivos da narrativa e ainda reforçadas pelas declarações do ficcionista, que não deixam dúvida sobre seu propósito de “encaminhar o leitor para o verdadeiro romance moderno”.

Também é obrigatório referir o trabalho contínuo que você vem realizando sobre nossa literatura chamada colonial. Primeiro, a reedição de Marília de Dirceu, com ensaio introdutório que enfrenta a dificuldade histórica do estabelecimento fidedigno do texto de Tomás Antonio Gonzaga, além das notas explicativas que tornam possível a leitura dos poemas, aos que não têm conhecimento para decifrar os elementos clássicos a eles incorporados.

Nesta sequência, vem a atualização da PROSOPOPÉIA, de Bento Teixeira. Um esforço coletivo de grande mérito, que corrige as injustiças da crítica e até o nome do autor. Enfim, proclama a face erudita do poeta, leitor da Eneida, das Geórgias, da Ilíada, das Metamorfoses e da Teogonia, como um valor suficiente para salvar sua obra.
Podemos concluir que existem dois importantes suportes para sua dedicação intelectual. A paixão pela cultura clássica e a certeza de que “Nada mais revolucionário do que buscar a melhor Educação, universal”.

Penso que a paixão pela mitologia foi seu primeiro alumbramento. Muito jovem, tornou-se tão íntimo dos deuses e heróis da Antiguidade Clássica, que o conhecimento não parecia adquirido através dos livros. Na ênfase e propriedade com que tratava cada detalhe da monumental realidade imaginária, dava a impressão de que convivera, muito de perto, com aquelas personagens e narrativas. Ainda hoje é assim. Se o tema emerge em uma conversa, é tratado com tal clareza, com tanta emoção, como se fosse a atualidade de uma experiência acumulada em recente viagem ao Olimpo.

Meu querido amigo, sua história é mais que merecedora de reconhecimento. Ela é exemplar, é inspiradora. Não apenas pelos objetivos alcançados com inteligência e obstinação ou pela erudição acumulada no exercício permanente da aprendizagem e do ensino, sua profissão de fé. Mas pela coragem de buscar e de realizar o mais difícil, na contra mão de uma realidade histórica dominada pelo imediatismo da banalidade e da superficialidade. Realidade que investe contra a memória de forma iconoclasta. Exemplo bem atual é o propósito de omitir nosso patrono Arruda Câmara, da denominação do parque que, com toda propriedade, leva seu nome de naturalista reconhecido por grandes estudiosos europeus.

Você não se deixou contaminar pela acomodação dos que se anulam no silêncio. Mobilizou toda sua competência e energia para corrigir a distorção da velha reforma impensada, que eliminou de nossos currículos a cultura greco-latina. Precisou confrontar e neutralizar a realidade adversa. Sonhar e se fortalecer com sua capacidade de liderança, até que essa iniciativa visionária, esse pensar grande resultasse na criação do Curso de Letras Clássicas, licenciatura em Língua Latina, Língua Grega e suas respectivas literaturas.

Hoje, através dessa valiosa área de estudos, com o comprometimento de sua coordenação, nossa UFPB se interliga a outras instituições de ensino superior que também tiveram esse alcance de preencher o que sempre foi uma lacuna injustificável, em nosso sistema educacional.

Talvez a Paraíba ainda não se tenha dado conta da dimensão desse feito. Mas seu lugar na História será ao lado dos antecipadores do futuro, daqueles que edificam para a posteridade com materiais que o tempo não desgasta.

Na premonição de José Américo de Almeida, você representa os que dão “asas e o selo da perpetuidade” ao mais ousado e ambicioso de seus projetos, a criação da UFPB.



Dominique vinha passar férias com gente. Eram dois abraços. Um na chegada, outro quando ia embora. Ela “botava macaco” na hora do abraço. Sa...


Dominique vinha passar férias com gente. Eram dois abraços. Um na chegada, outro quando ia embora. Ela “botava macaco” na hora do abraço. Sabe o que é isso? É empurrar a pessoa com as mãos e antebraços, para que não se aproxime muito, durante um abraço ou dança. No meu tempo de rapazinho, “menina direita” botava macaco para dançar nos assustados*.

Quando conheci Anna, lá em Barcelona, sabendo que europeu é mais reservado com essa coisa de contato físico, a cumprimentei com um aperto de mão.

- “E los dos besos”? Ela perguntou.

Depois disso tinha beijinhos e abraços. Um dia, levando-a para o aeroporto, ela me contou que gostava dos dois beijinhos, mas achava desconfortáveis os abraços.

- Nunca abracei nem minha mãe assim, encostando os peitos.

Seu Antonio Serafim nos proporcionou uma noite maravilhosa em Lisboa. Ao nos despedirmos, perguntei-lhe se poderia agradecer com um abraço. Ele consentiu. Juntei ele todinho no abraço mais apertado que pude dar. Ele recebeu, tenso que só uma corda de violão, coitado, mas disse com a voz embargada:

- Prometesh que nunca vaish esquecer-sh” de mim?

Como poderia? Cumpro a essa promessa até hoje, 20 anos depois, mesmo nunca mais tendo lhe visto. O abraço não é coisa exclusiva de brasileiro. Mas deveria ter uma categoria de abraços com essa denominação.

“Abraço a la brasileira”.

Esse é coisa nossa. A gente abraça se apertando, peito contra peito. Ou melhor dizendo, peito a favor de peito. A gente abraça se misturando com o outro. Quanto mais apertado o abraço, melhor a qualidade do abraçante. A gente abraça fazendo carinho nas costas do abraçado. Dois tapinhas, uma passadinha de mão (nas costas, viu? Desceu, é safadeza), cosquinhas, um balancinho pros lados. A gente abraça homem, mulher e criança. Cachorro também. A gente abraça amigo, amigo de amigo e desconhecido. Na hora do gol a gente abraça qualquer um que esteja do lado, mesmo sem nunca ter visto.

Abraço de brasileiro é igual a casa. Abrigo, acolhimento, amparo. Tem qualidades altamente terapêuticas. Reforça o sistema imunológico. Tem uso para qualquer ocasião. Tristeza: o abraço alivia. Medo: o medo passa. Raiva: a dor vai embora. Alegria: o abraço amplifica. E nesse caso a gente se abraça pulando. Em aeroporto, abraço de brasileiro é capaz de fazer perder o vôo, se for na ida. Na volta, quem chegou só aterrissa mesmo, na hora do abraço. Às vezes a gente abraça e quando sai do abraço, se olha e abraça de novo.

A gente abraça como forma de dizer “eu te amo”, “como é bom te ver”, “eu tô aqui e cuido de você”. O abraço dispensa as palavras.

Tive um amigo, também europeu, que quando chegava no Brasil, dizia:
- eu vim por causa dos abraços!

Jean Marc, um professor francês que eu adoro, achava abraço de brasileiro sufocante. Era engraçado abraçá-lo, enquanto ele tentava se desvencilhar. Ahh, Jean Marc! O abraço é entrega, confiança. É um mergulho no coração do outro e só funciona sem rede de segurança, por que o abraço é a própria rede de segurança.

Paulistano, aquele povo que a gente diz que é da selva de pedra, quando encontra amigo, dá um beijinho e um abracinho. É “bunitim” demais esse costume.

E minha sogra dizia que a gente precisa de pelo menos 8 abraços por dia, para ter saúde. Sempre botei muita fé na minha sogra.

Lembra de Dominique, de quem falei lá em cima? Ela costumava vir em janeiro, fugindo do frio. Passava o dia inteiro na praia, tomando sol, estocando calor. Mal sabia que, já no primeiro abraço, um daqueles onde “botava macaco”, ela poderia estocar calor para o resto da vida. Era só lembrar.

É isso. Hoje eu quero te mandar um abraço. E se a gente se encontrar por aí, quero mesmo é te dar um “abraçaço”.


Novo, você topa tudo. Velho, topa em tudo. **** Para estar bem consigo, depende-se um pouco dos outros. Para estar bem com os outro...

Novo, você topa tudo. Velho, topa em tudo.

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Para estar bem consigo, depende-se um pouco dos outros. Para estar bem com os outros, depende-se muito de si.

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O que nos condena é o que nos salva. 

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O cristianismo nos leva a chamar de “semelhante” quem às vezes não se parece em nada conosco.

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Envelhecer é ter o ontem por amanhã.

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Creio em Deus, mas não posso garantir que Ele existe.

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Noventa por cento do que se faz é por dinheiro. Os dez por cento restantes, é por amor (ao dinheiro).

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Envelhecer não é difícil. Difícil é se manter jovem.

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Qualquer advogado tem o direito de ser cúmplice, mas os que se comprometem com a justiça sabem que não têm esse dever.

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O vaidoso nunca se satisfaz consigo, pois está sempre na dependência do olhar do outro.

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O ocioso é uma alma penada. Quem não tem o que fazer já morreu em vida.

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Evite dizer tudo. Há textos que emudecem por falta de silêncio.

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É preciso haver quem diga o contrário para que o oposto se afirme.

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Tudo passa – diz o ditado. E quem o ditou já passou.

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Dizemos de quem faz diferente de nós que “faz errado”. Não é bem assim. Ele faz certo, mas à sua maneira – que não é a nossa.

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Não viva pensando que vai morrer. Morra sabendo que viveu.

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Grande é a variedade humana. Uns são atraídos pela busca do prazer; outros, pelo prazer da busca.

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Cultivar a vaidade é um meio de se engrandecer aos próprios olhos. Uma forma de se apequenar fingindo ser grande.

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Saudade a gente tem do que viveu. Melancolia, do que não foi vivido. É a tristeza pelo que ficou faltando. 

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A única vantagem das ditaduras é fazer a gente valorizar mais a democracia.

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Há quem ache que “genérico” é um remédio que combate todas as doenças.

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Não confie na minha franqueza. Minha vida é um livro aberto na página errada.

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Oportunidade é aquilo de que a gente só se dá conta quando deixa passar.

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Não há erro maior do que viver apontando os erros dos outros. Quem faz isso age mais por compensação do que por virtude. 

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A única vantagem das ditaduras é fazer a gente valorizar mais a democracia.

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Evite dizer tudo. Há textos que emudecem por falta de silêncio.

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Queira pouco para ter mais.

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Combater a escravidão é nadar contra as correntes.

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Todo governo tem o corvo que merece.

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Confie nos livros. Eles não lhe faltam com a palavra.