Parado em uma das janelas do Grande Hotel, um caixeiro viajante observa o movimento da cidade em um dia de feira. Ele começa a escrever suas impressões para enviar a seu pai, que anseia conhecer aquela afamada praça comercial, mas nunca teve oportunidade. A reputação do lugar era de um eldorado, tanto para ricos comerciantes como para pobres e flagelados da seca.

Os recursos municipais são parcos, disso sabemos, ainda mais no interior, mesmo assim o senhor pode me perguntar se não há algo a fazer. Pois respondo-lhe que há, há sim, acredito! Esse lugarejo tem como destino o sucesso. Soube que um alcaide foi até a Veneza Brasileira de trem e tomou um navio para a capital da república, a fim de mostrar os vultosos números comerciais de sua cidade para angariar um volume mais generoso de impostos. Sequer conseguiu falar com o Presidente do país e voltou no mesmo navio no dia seguinte. Disse-me que na próxima vez tentará uma carta de recomendação do presidente da província, mesmo sabendo que é difícil, pois qualquer empenho de recursos para o interior iria desfavorecer a capital que está no litoral e onde é seu gabinete, logo recusaria. O indaguei se poderia conseguir essa carta com o presidente da província vizinha, já que a cidade tem uma ótima relação comercial com a capital das pontes. Me olhou com ar de contentamento. Mas isso foi na última vez que aqui estive e já tem alguns meses.

A cidade tem um clima agradável; de dia é quente, mas não é insuportável e basta estar em uma sombra que o vento fresco nos beija o rosto. Ao cair da tarde e à noite, é um gostoso clima serrano, convidativo a tomar um conhaque e caminhar pela cidade. Aqui estou bem hospedado, esse prédio da foto que mando é o Grande Hotel, acho que uma das construções mais belas da paróquia (depois da matriz de N. Sra. da Conceição). Sua entrada tem apenas duas colunas segurando o gigante e seu primeiro ambiente, a recepção, é um salão circular que rasga todos os andares dando para ver o teto. Bem no centro da roda a gente fala e a voz reverbera em altura impressionante. É dali que a recepcionista chama as camareiras e demais funcionários, espetáculo à parte. Sua arquitetura é um tal de Art-Deco, coisas do estrangeiro. Quarto confortável e uma bela banheira que disseram ser última moda na Inglaterra. O ruim é que tem horário para usá-la, duas vezes ao dia, pela insuficiência d’água na cidade. Ter e não poder usar a hora que quiser foi o que me chateou.

Antes de ir ao carteado, fumo um cigarro e espio do último andar do hotel o bailar de luzinhas que mais parecem vagalumes. Uma teia de pirilampos que vagueiam pela noite da cidade, justamente as pessoas portando seus flash-light, alumiando seus caminhos. Satisfeito com os negócios, penso em alugar um sobrado desses novos e passar uns tempos por aqui. Benção? Beijo em mãe. Espero resposta.
Campina Grande, Parahyba, Outono de 1942.
Thomas Bruno Oliveira é mestre em história e jornalista