Remontam à era medieval criativas soluções para janelas de fachadas, geralmente desenhadas com três faces, que passaram a ser chamad...

Janelas e Cúpulas

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Remontam à era medieval criativas soluções para janelas de fachadas, geralmente desenhadas com três faces, que passaram a ser chamadas, muito apropriadamente, de “Bay Windows”.

A ideia faz jus ao nome, uma vez que a palavra bay, em arquitetura, significa “recanto”, exatamente o espaço guarnecido por esquadrias que o design chanfrado em vértices cria, em sacadas biseladas, a possibilitar maior
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Charleston, EUAProfReader
aproveitamento do interior, amplo usufruto visual da paisagem, com abundante entrada de luz e ventilação.

Inicialmente concebidas apenas nos pisos térreos, como em castelos medievais, por exemplo, as “Bay Windows” foram se difundindo e subiram para os demais pavimentos, enriquecendo o movimento volumétrico das fachadas em diversos edifícios pelo mundo.

Pode-se dizer que foram os britânicos que mais aproveitaram este tipo de janela, sobretudo nos séculos XVIII e XIX, na era georgiana e vitoriana. E é em todo o Reino Unido, assim como em suas ex-colônias, que podemos explorar e nos deleitar com o romantismo conferido às características das Bay Windows em célebres exemplos de arquitetura.

Com o tempo e a difusão de seu uso, o gracioso tipo de esquadria foi se ornando com complementos de diversos tipos, cores, aplicações, detalhes, texturas e soluções de coberta, explorando múltiplas possibilidades em versões encantadoras que marcaram e ainda marcam fachadas de edifícios, às vezes em ruas e bairros inteiros, da França ao Canadá, dos Estados Unidos à Nova Zelândia.

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Projetos arquitetônicos concebidos com Bay Windows: ESQ: Bucareste, Romênia e La Paz, Bolívia ▪ DIR: Lengerich, Alemanha ▪ Imagem: Wikimedia.
Desde a importação do estilo vitoriano para a América do Norte, durante o século XIX, as Bay Windows se destacaram em cidades como San Francisco (as famosas “Painted Ladies”), Boston, Nova York, Toronto, Vancouver e Montreal. E até fugiram um pouco do estilo biselado, clássico e abundante nas townhouses, sobrados e outros edifícios urbanos do Reino Unido, combinadas com cores e ornamentos variados, até mais decorativos do que funcionais.

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Painted Ladies, Alamo Square, San Francisco, EUA ▪ Fonte: Wikimedia
Evidentemente também se expandiram para a Índia, principalmente durante o período colonial britânico, incorporadas na feição arquitetônica residencial e nos edifícios públicos de Mumbai, Chennai e Kolkata.

Agora, falemos das cúpulas.

Além de exercer a função básica de cobrir espaços de significação especial, as cúpulas cumprem o magnífico papel de marcar horizontes urbanísticos, com singular e proeminente beleza, nos centros históricos, planícies ou montanhas,
em notáveis perspectivas. Talvez nem tenha sido mesmo os humanos que as inventaram, pois no minúsculo e discreto mundo das vespas solitárias, há pequeninos exemplos bem moldados em argila, numa técnica tão impressionante quanto comovente.

Este conhecido elemento arquitetônico, cujas formas podem ser encontradas em vários períodos da história, foi usado por povos e culturas diversificadas em todos os aspectos, e assim continuará sendo, porquanto se constitui em volumes de grandes efeitos estéticos e funcionais. Desde um simples iglu, construído nos recônditos dos extremos polares, até as translúcidas cobertas da Cidade das Artes e da Ciência, em Valência, a cúpula está presente em toda a história da arquitetura. E são nas edificações religiosas que elas exibem o maior vigor de sua beleza e representatividade, ao cobrir naves de igrejas, torres de catedrais, mesquitas e outros templos monumentais.

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Cidade das Artes e da Ciência, Valência, Espanha ▪ Imagem: T. Huxham
A cúpula data da pré-história, milênios antes de Cristo, destruídas pelo sortilégios do tempo e das catástrofes, como as mesopotâmicas, na Babilônia e Suméria. Usada em construções domésticas e templos, eram feitas de palha entrançada, barro cozido, jamais sobreviveriam imunes às intempéries, exceto em registros de escavações arqueológicas. Sua forma redonda, apropriada à função de cobertura, precederam as cúpulas de pedra da Núbia e do Egito, em 2.500 a.C.

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Mardin, Turquia ▪ Imagem: C. Fred
Na antiga Grécia, começaram a ser construídas em espaços funerais subterrâneos, com função simbólica, para depois emergirem em meias esferas de bloco de alvenaria e pedra, logo adotadas pelos romanos, persas e o mundo islâmico. Chegaram aos polos, onde os povos inuit e outros indígenas do Ártico, do Alasca e Groenlândia, utilizaram-nas como proteção temporária em caçadas e viagens de inverno, rápida e facilmente erguidas com blocos de gelo compactado.

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Aldeia Inuit na baía de Baffin, Canadá, no século XIX. ▪ Ilustração do livro Arctic Researches and Life Among the Esquimaux: Being the Narrative of an Expedition in Search of Sir John Franklin, Charles Francis Hall (1865), via Wikimedia
Depois de Cristo, a perfeita e encantadora forma arquitetônica foi se expandindo e consolidando seu uso para ganhar esplêndida notoriedade no Renascimento como uma das fortes características do estilo barroco clássico.

Das grandes cúpulas que remanescem erguidas, tem-se como mais antiga do mundo a do Panteão de Roma, edificada no reinado de Adriano, imperador entre 118 e 128 d.C, na qual já foram utilizadas novas
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Panteão, Roma: frente e cúpula (vista interna) ▪ Fonte: Wikimedia
técnicas com “alvenaria de concreto romano”, uma argamassa bem resistente composta de cal e cinza vulcânica. Com quase 50 metros de diâmetro, ainda hoje guarda o título de maior cúpula de concreto não armado do mundo.

O Panteão dividiu águas na história do domo, passando a inspirar muitos outros projetos subsequentes. Além de inovar na extensão do vão livre, sem estrutura armada, foi dotada de abertura circular (óculo) no centro do ápice, com 9 metros de diâmetro, com função de iluminar seu interior e estabelecer um elo com o divino.

O ineditismo técnico e sua monumental dimensão arquitetônica influenciaram com evidência tudo o que se sucedeu em construções similares barrocas e renascentistas de cúpulas que ganharam fama como objetos de deleite visual, turístico e ainda de pesquisas históricas, a exemplo da mais alta de todas – a da Basílica de São Pedro, também em Roma – e das ornamentadas e coloridas cúpulas retorcidas da Catedral de São Basílio, em Moscou.

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Basílica de São Pedro, Vaticano ▪ Fonte: O. Vallejo
Projetada por Michelangelo, a basílica vaticana perpetua-se como símbolo universal do catolicismo, e recebeu como elemento inovador um sofisticado lanternim, estrutura ornamental acima do cume, dotada de aberturas externas para exaustão, ventilação e iluminação. Outras construções famosas como a Catedral de Les Invalides (Paris), a Catedral de Sant’Andrea della Valle, o teatro Colón em Buenos Aires, também receberam belos lanternins, sendo um dos exemplos notáveis aquele com que Filippo Brunelleschi coroou o Duomo de Florença, extraordinário marco renascentista.

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ESQ: Catedral Saint-Louis des Invalides, Paris ▪ DIR: cúpula do Teatro Cólon, Buenos Aires e cúpula do Duomo de Florença ▪ Imagens: Wikimedia.
A seguir vêm muitos outros magníficos exemplos, como o eminente símbolo da arquitetura bizantina — a mesquita Hagia Sophia —, em Istambul, com sua cúpula a repousar levemente em quatro pendentivos; o movimentado conjunto de coloridas cúpulas espiraladas, que coroam a Catedral de São Basílio, em Moscou, ícone da arquitetura russa; e o da Catedral de Saint Paul, em Londres, majestosamente desenhada por Christopher Wren.

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SUP: Catedral de Saint Paul, Londres; Igreja de São Basílio, Moscou ▪ INF: Hagia Sofia, Istambul ▪ Imagens: Wikimedia.
Imprescindível é o registro do emblemático Domo da Rocha, na Esplanada das Mesquitas, em Jerusalém, monumental templo cujo simbolismo extrapola o viés religioso e se estende aos aspectos históricos, filosóficos, ideológicos, políticos, e, claro, arquitetônicos, que há mais de 1.300 anos consolida o Islamismo na cidade sacralizada pelas três maiores religiões monoteístas: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.

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Cúpula das Rochas (ou Domo da Rocha), santuário islâmico no centro do complexo da Mesquita de Al-Aqsa, no Monte do Templo, na Cidade Antiga de Jerusalém. ▪ Fonte: Wikimedia
O Domo da Rocha evidencia a evolução primorosa da cúpula em uma concepção que mesclou a arquitetura islâmica com traços persas e bizantinos, enriqueceu o interior com ornamentais mosaicos, citações do Alcorão e para completar foi revestido externamente com ouro, fazendo-o reluzir imponentemente acima da Cidade Sagrada, sobre a rocha de onde o profeta Maomé ascendeu aos céus. Não à toa compõe com Meca e Medina o trio dos locais sagrados do Islã.


Esta eminente forma milenar eternizou-se como elemento arquitetônico ao continuar a se inserir na criatividade dos projetos contemporâneos, com diversidade e elegância, como se viu na cúpula do Capitólio, em Washington, emblema da democracia americana, com clara referência à arquitetura romana, e na já mencionada futurista versão da Cidade das Artes e das Ciências, em Valência, na Espanha, projetada por Santiago Calatrava.

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Capitólio, Washington ▪ Fonte: Wikimedia
Entre janelas e cúpulas, a arquitetura conserva o condão de unir a história dos modos de vida, do vai-e-vem das gerações, que encarnam e desencarnam desenhando as épocas com seus costumes, aperfeiçoando técnicas, moldando o mundo, evoluindo e aprendendo a ser eternos enquanto durem.

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  1. Uma aula de arquitetura no excelente texto do cronista. Parabéns, Germano. Francisco Gil Messias.

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    1. Grato, Gil! Sua leitura é privilégio disputado

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