Era um radinho pequeno, cabia na palma da mão. Compreio-o seminovo de um colega da quarta série do curso ginasial ministrado no Colégio Santa Júlia, bairro da Torre. Depois disso, nos viria o Liceu Paraibano. Aquele aparelhinho captava sinais em ondas médias e curtas antes que os de frequência modulada surgissem e se popularizassem. O meninote saudoso do interior, que então eu era, o teve por bom tempo na conta de um amigo inseparável. Um amigo com transistores e pilhas, posto que os de carne e osso ainda
Acabo de acessar pela Internet catálogo no qual o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o velho IBGE cansado de guerra, menciona as Capelas da Batalha e de Nossa Senhora do Socorro, em Cruz do Espírito Santo, a meio caminho de Santa Rita. Ali mesmo, não muito longe do ponto onde o Rio Paraíba começa a sofrer empurrões do mar e a inchar e murchar no ritmo das marés.
Não tenho por preguiçoso quem, rotineiramente, seja capaz de dar cinco voltas a pé em torno da Praça da Preguiça. Perdão, Praça Sílvio Porto, como indica a plaquinha instalada pela Prefeitura desde o ato da inauguração. Foi Oswaldo, meu amigo paulista, quem fez as contas: “As quatro calçadas externas somam seiscentos metros, o que dá três mil ao cabo da série de cinco giros”, disse-me quando já com as pernas bambas, eu me dissolvia em suor. Estávamos, para meu vexame, na metade do percurso.
Nunca é demais lembrar que a vida é feita de escolhas e premências. Obrigados ou não, desejosos ou não, eu e você sempre faremos as nossas, no transcurso da existência. E, isso, para o bem ou para o mal, o melhor ou o pior. Trocando em miúdos, somos seres mutantes o tempo todo. O que nos é prioritário tem a volatilidade do tempo e das circunstâncias.
Há gente com jeito de tudo, com modos, tamanho, ou forma das coisas e criaturas mais diversas. Margarida, uma amiga de infância, não tinha apenas nome de flor. Tinha, além disso, a essência. Podia, igualmente, simbolizar a juventude, a delicadeza e a inocência. Às vezes, nós, os colegas de escola, mexíamos nos seus cabelos como se neles buscássemos algo. Inicialmente intrigada ela, passado o tempo, já não nos perguntava o quê.
Fiz, exatamente, do modo como deve ser feito. Hidratei o fubá ao ponto em que se agrega em pequenas bolotas quando revirado com uma colher. Também esperei o tempo necessário ao transporte para a cuscuzeira nem muito seco nem muito úmido. Experimentei o sal: “Perfeito”.
Foi Millôr Fernandes, com seu Pif-Paf, quem me chamou a atenção para a existência do Haikai, lá pelos começos de 1960. Falo dessa forma poética com origem japonesa, de extrema concisão e objetividade. Ainda menino, eu corria para a coluna que ele mantinha na Revista O CRUZEIRO, a publicação mais importante do mercado editorial brasileiro, sempre que me chegava às mãos um exemplar novo.
Eu soube de Luís, um velho amigo. Velho mesmo, posto que eu o conheci por volta dos meus doze anos de idade. Na ocasião, ele tinha uns 18 e havia saído da zona rural com um dedo a menos: o indicador da mão direita então decepado por uma daquelas máquinas desfibradoras de sisal. Desembarcado do trem da Rede Ferroviária do Nordeste S/A, a Refesa da saborosa pronúncia do interior, entrei em casa e tomei a bênção materna. “Vá falar com seu pai antes de desfazer a mala. Ele está na Padaria”, recomendou dona Vininha.
Acendem-se, amanhã, as últimas fogueiras juninas, as de São Pedro. Mais do que em outras partes do Brasil elas iluminarão os terreiros do Nordeste. Pelo costume, já se sabe que não serão tantas nem tão grandes quanto as do dia 24, consagrado a São João. Ou seja, aquele que Jesus tomou como alicerce de pedra para sua Igreja não desfruta do mesmo prestígio nos arraiais do País. Nestes, São João tornou-se maior, fez-se o epicentro de folguedos iniciados no último dia 13, timidamente, com Santo Antonio, o casamenteiro.
Acho que acontece a todos nós. Temos, desde a infância, recantos preferidos das nossas casas e quintais e, em razão disso, lembranças que vão e voltam. Eu mesmo já quis muito uma goiabeira em detrimento de um pé de pinha. A primeira, de galhos mais fortes, permitiu-me a instalação horizontal de uma banda de porta, a dois metros do chão, para as brincadeiras infantis. Dali, ora eu montava guarda contra o bando de índios vistos
Leio que a semana começou com feriado, em Portugal, onde o 10 de Junho, data nacional, também conteve celebrações a Luís Vaz de Camões, o gênio da literatura saudado em todos os recantos como o maior poeta da língua portuguesa. A ele, sim, por sobras da festa pelos 500 anos do nascimento em 24 de janeiro e, ainda, pelo culto à data da sua morte, em 1580, há 444 anos completados segunda-feira passada.
Um gênio aquele meu colega de escola. Basta dizer que foi responsável pelo único desastre de avião ocorrido na cidadezinha onde morávamos. Era época de carnaval quando ele vestiu a bicicleta com armação de arame grosso o suficiente para suportar um corpo de lona, hélice e asas. Tudo bonitinho. Parecia um teco-teco em branco e preto, as cores do seu time, o Vasco. Mas uma manobra arriscada com os pedais em alta rotação ocasionou o arrasto de uma das asas no piso de pedras e, em seguida, as cambalhotas que despedaçaram aquilo tudo. Piloto sem capacete, meu amigo sofreu
Não ouso afirmar que as excursões internacionais hajam melhorado aquelas duas. Eu, não. Nem supor que tenham regressado daqueles périplos mais cultas, ilustradas e livres dos velhos preconceitos. Até porque a tolerância, a civilidade e o alcance das coisas não compõem a bagagem de ninguém. Ao invés disso, são substâncias do espírito e, portanto, é aquilo que se leva e se traz sejam quais forem o destino e a duração das viagens.
Lá pelos meus dez anos, um amigo ocasional, camaradinha um pouco mais velho chegado de Manaus para as férias com os avós, nossos vizinhos, perguntou-me onde poderia comprar alka-seltzer a fim de se livrar da azia. Não faria a menor diferença se a pergunta me fosse dirigida em grego. Sabia lá eu o que diabo significavam essas duas coisas... Minha mãe veio em meu socorro. Quis saber do garoto se era muito forte o queimor que ele sentia e,
“O que leva um contestador da Academia a nela ingressar?”, perguntava eu, nos idos de setembro de 1990, a Humberto Cavalcante de Melo. Resposta do homem: “O acréscimo dos anos não nos aumenta a sabedoria”. Na ocasião, eu o entrevistava para a Revista A CARTA, publicação semanal do editor Josélio Gondim.
Um vento forte, em lufada de segundos, sacudiu a rede que armei na varanda para o cochilo vespertino, costumeiro, justo e merecido. O susto que tive agravou-se com o baque de dois varões metálicos. Dias antes, quando ainda não haviam sido trocados por trilhos mais modernos, sustinham a cortina da sala. Mas, agora, esquecidos, verticalmente, num cantinho de parede, foram ao chão com um barulho dos diabos.
Ouvi essa história de um amigo e a reconto com as licenciosidades da crônica. Mal os negócios se recuperavam da crise decorrente da pandemia que tangera a clientela da sua e de tantas outras lojas, a mulher apareceu com a novidade: eles estavam para receber uma sobrinha, seu marido canadense e um casal de filhos adolescentes, estes últimos com bom domínio do Português. O aviso viera em cima da hora por telefonema da cunhada residente em São Paulo. Ela falava da filha, do genro e dos dois netos. Saídos de Toronto,
A velhice tem dessas coisas. Andamos com passos mais lentos por dias que correm em velocidade hipersônica. Espantosamente, maio nos chega sem que tenhamos a percepção exata do primeiro quadrimestre que agora se encerra. Vem-me, então, a lembrança de Joca, meu filósofo de botequim preferido e, infelizmente, também finado. “Quando a gente era menino um ano durava dez”, ouvi dele, certa vez.
Naquela noite de sábado, recusei o convite do meu neto para um passeio de quadriciclo desde o Busto do Almirante Tamandaré até o Mirante da Praia do Cabo Branco, um dos mais belos trechos da orla de João Pessoa, a cidade que mais cresce no Nordeste brasileiro, ao que nos assegura a propaganda oficial.
Samantha, a Feiticeira, quem não lembra dela? Por décadas, alegrou os dias de muita gente, em partes diversas do mundo, o que incluía este Brasil imenso. Com uma mexidinha no nariz a moça era capaz de resolver qualquer problema, fosse seu próprio, ou daqueles dos quais gostasse.