E nos restou A União! O célebre e centenário matutino, cujas “remingtons” tilintavam no varar das madrugadas ao sabor e aroma do café e do ...

O adeus do Correio

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E nos restou A União! O célebre e centenário matutino, cujas “remingtons” tilintavam no varar das madrugadas ao sabor e aroma do café e do pãozinho quente trazido à redação.
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Jornal A União
Este cenário, tendo a praça João Pessoa vista das janelas de então, na fachada neoclássica do lindo prédio demolido, tenuemente iluminada, foi escrito e descrito várias vezes por Carlos Romero. Em memória emocionada, nos contava com prazer sobre a convivência salutar e proveitosa que desfrutou n’A União, desde quando lá chegou para redigir telegramas. E depois como repórter, já na redação, a prazerosa e privilegiada amizade com seu chefe, o dramaturgo e cronista pernambucano, Silvino Lopes, com quem muito aprendeu. Aliás, “foi n’A União que aprendi a escrever” - ele dizia com honroso reconhecimento.

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Germano e Carlos Romero
Há poucos anos [creio que já contei por aqui], tivemos a oportunidade, eu e meu pai, Carlos Romero, de folhear os velhos compêndios da coleção antiga, com o prazer de ver e reler colunas, textos, reportagens, crônicas e contos de sua autoria. Como foi bom vê-lo curioso, passando devagar, quase apalpando, delicadamente, as grandes páginas, frágeis e desgastadas, com máscara e luvas [e nem tinha coronavírus…] aquelas edições históricas! Já no carro, ele se virou e me disse: “meu filho, eu desafio a quem aponte uma pessoa que escreveu mais n’A União do que eu”. E é verdade…

E nos restou A União! Foram-se O Norte, o Contraponto, o Jornal da Paraíba, e agora o Correio. Que pena… Mas os impressos não sossobram apenas por aqui. Assim também partiram as edições de papel do Jornal do Brasil, Diário do Comércio, da Gazeta, New York Times, Washington Post, The Guardian, e tantos outros.
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É o mundo digital engolindo o real, o palpável, o crível. Um mundo que tem suas comodidades, não restam dúvidas, mas que extingue o cheirinho gostoso de papel. E aos poucos - tomara que não -, o cheiro bom das livrarias…

O Correio foi o último dos independentes, da iniciativa privada. Atravessou décadas, fez história, passarela de cronistas, repórteres, articulistas, colunistas dos melhores. Abrigou a coluna cidadã de Abelardo, uma vitrine de informações e atualidades imprescindível ao cotidiano. Crispim, Pereira Nóbrega, Gonzaga Rodrigues, Carlos Romero, Natanael Alves, Virginius da Gama e Melo, Juarez da Gama Batista, João Manoel de Carvalho, Biu Ramos, gente que fez a boa literatura ser diária como o café da manhã, que fazia do Correio seu bom dia à notícia. E foram quase 70 anos de compromisso com a informação!

Agora, nos restou A União. E que União! Ainda bem que, segundo nos informa Naná Garcez, é um jornal superavitário, não dá prejuízo e não precisa dos cofres do governo para nada. Tem renda própria, tem gráfica, propaganda. E cá entre nós, nesse quase século e meio, já é um patrimônio imaterial e intangível, cada vez melhor. E mesmo se um dia for extinto, ocupará lugar de honra na história do jornalismo brasileiro como escola superior da arte de escrever.

Como bradou em crônica um de seus mais ilustres colaboradores: “Que este matutino continue na sua missão. Que nenhum governador se meta a extingui-lo. Que sempre se homenageiem os grandes personagens que transitaram pelos caminhos deste jornal”! (Carlos Romero).



Germano Romero é arquiteto e bacharel em música
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