Não sei quem patenteou o elástico, mas estou informado de que isso ocorreu por volta de 1845, impulsionando a moda feminina e áreas afins. O Século 20 trouxe o refinamento da invenção e o termo comum ao mundo dito civilizado, o Lastex. Sempre assim: entrelaços de borracha e fios da tecelagem para as lingeries, roupas de banho, saias e vestidos simples e de gala com suas pregas, franzidos e armações. Estas últimas vieram para substituir hastes de ossos, ou molas metálicas em anquinhas e espartilhos. Flexibilidade e conforto têm sido, desde então, a promessa explícita dos fabricantes e profissionais da costura feita, hoje em dia, para a maioria dos bolsos. A depender da peça, o elástico, por sua vez, aposentou zíperes, colchetes e botões, o que vale para a moda íntima e a esportiva.
Menino num tempo em que as mães compravam os tecidos das lojas, em volumes métricos, para as camisas e cuecas de maridos e filhos e, sobretudo, para as blusas, saias e vestidos delas próprias e de suas filhas, vi muito dessas confecções. E, com as liberdades dos meus dez anos de idade, vi que isso também se passava na casa vizinha, onde as meninas compunham o grosso da filharada de Seu Severino. Mais tarde, no Recife, para os estudos primários sob os cuidados de duas tias, observei a destreza da mais nova, mãe de quatro garotas, no manejo de uma velha Singer. Percebi aquele impressionante entra e sai de linhas, aqueles laços e nós que emendavam panos e modelavam roupas, à exceção das calças masculinas que os mais velhos preferiam encomendar aos alfaiates.
Falo dos anos de 1950 e das costureiras domésticas que encontrei no Pilar onde quase nasci e, posteriormente, na Capital pernambucana. Ali, botões e colchetes já tinham a substituição por elásticos nas cinturas de saias, cuecas e calcinhas. Mas naquele agreste da Paraíba predominavam os botões, ainda, nos coses e braguilhas. Também, nas saias de armação preparadas com goma de maizena. Endurecidas, elas poderiam suster-se em pé, sozinhas. Quando nos seus usos, davam aos vestidos – sem que aparecessem, pois mais curtas e encobertas – a marca da elegância e distinção.
O que tenho eu a ver com a costura, em qualquer dos seus níveis? Pois bem, tenho não muito mais do que a memória do tempo em que a Singer – a cantora, assim traduzida – quebrava o silêncio doméstico para a criação do vestuário corriqueiro e do exibido em dias de festa. Tenho a lembrança de um lar antigo cuja cena a velha máquina compunha com pai, mãe, filhos, fogo de lenha, ou carvão, cadeiras de palhinha na sala de visitas, uma petisqueira, uma penteadeira, uma mesa comprida com toalha xadrez. Isso, antes da expansão a todos os rincões do “prêt-à-porter”, invenção de um estilista francês para a má sorte das pequenas e médias lojas de tecidos.
O que ainda hoje me traz à memória as saias e vestidos de armação são vídeos difundidos por ateliês que hoje os fazem com metros e metros de filó e tule e que ensinam à sua audiência feminina, passo a passo, cada uma daquelas dobras e pregas. Tais saias já não têm os usos cotidianos dos passeios e bailes dos fins de semana em grandes e pequenas cidades. Não mais se apresentam na cintura de Doris Day em filmes de água com açúcar nem nas propagandas dos anos de 1950 e 60 para a difusão de carros, eletrodomésticos e, notadamente, do “american way of life”, o estilo de vida baseado em valores que vão do consumismo à crença na meritocracia.
Mas, felizmente, elas ainda se mantêm na cintura das prendas gaúchas, na daquelas que integram o conjunto das damas de honra em cortejos nupciais e na das debutantes. Como são graciosas! Quer ver um ser humano do gênero feminino, radiante, em estado de graça, tenham elas a idade que tiverem? Dê-lhes um vestido com saia de armação, a vestimenta das princesas. Os jovens da minha e outras seguidas gerações, todos na fase da ebulição dos hormônios, preferiram, por algum momento, namoradas com vestidos simples em bailes simples, fosse numa pista de clube, fosse nas salas de estar, ou nas garagens devidamente preparadas para os “assustados”. É preciso, agora, explicar a expressão aos mais novos. Pois bem, isso advém dos sustos tomados pelos casais quando da briga dos pais com filhas permissivas da dança apertada. Foi não foi, o som era desligado e a festa encerrada. As saias de armação, não. Estas, por si mesmas, impossibilitavam o grude dos mais afoitos. Funcionavam mais e melhor do que arenga de pai.
Nos bons dias de Doris Day e das moças que dela copiavam o modelo de barras à altura dos joelhos – no Ocidente inteiro, diga-se – a brisa leve dos outonos e primaveras não erguiam aqueles panos. Eram duros, pesados e firmes demais para mostrar além do que mostravam.
Melhor, então, as saias plissadas, aquelas dos usos das normalistas. Contudo, bom mesmo nos pareciam as leves e soltas, ao estilo Marilyn Monroe, no filme “O pecado mora ao lado”, produção icônica de 1955.
Ei, meninos e meninas! Ouçam o que agora diz o operário da notícia que me tornei desde os 20 anos de idade: “Em publicidade, pouco se cria e muito se copia”. Toda vez que vocês passarem diante de uma moça de papel e tinta, loura, louríssima, impressa num outdoor imenso com a saia erguida pelo vento, percebam que ela remete os mais antigos, como eu, a Marilyn Monroe e à cena imaginada pelo diretor Billy Wilder sobre o jato do respiradouro do metrô de Nova York. Eu soube que esse vestido foi leiloado, em junho de 2011, por 5,6 milhões de dólares. Pasmem.






