Na quinta-feira 5 de agosto de 1830, um jovem paraibano de 22 anos desembarcava do paquete Níger no porto do Rio de Janeiro. Poucos meses depois da sua chegada à capital do Império, aquele jovem paraibano seria um dos personagens mais importantes no movimento oposicionista que levou o imperador Pedro I, na madrugada de 7 de abril de 1831, a abdicar do trono em favor do seu filho de cinco anos.
Largo do Paço (atual Praça XV), Rio de Janeiro, no início do século XIX ▪ Aquarelas de William Smyth, 1834.
Embora fosse a sua primeira viagem ao Rio, o nome do paraibano, segundo o historiador Nelson Werneck Sodré, já era conhecido no país pelas suas façanhas, “de tal sorte que os seus companheiros de ideias políticas pediram sua presença na Corte”.
Em meados de 1828, fora criada no Rio a sociedade secreta “Jardineira” para combater outra, a “Colunas do Trono”, que defendia o restabelecimento do absolutismo no Brasil e ele foi escolhido para criar a “Jardineira” na Paraíba. Nas suas próprias palavras: “fui lembrado em 1828 para um dos que deviam organizar a Sociedade Jardineira na Paraíba”. Por essa mesma época, com vinte anos de idade, ele fundou a Gazeta da Paraíba, o segundo jornal que foi publicado na Província.
“Estabeleci na Paraíba a Gazeta Paraibana e guerra de morte declarada ao partido português. Em consequência fui processado e preso [...] e só em março de 1829 obtive a liberdade por decisão de um conselho de jurados, que não achou matéria para acusação”
Forçado a pedir demissão do cargo de professor de primeiras letras que exercia na Cidade da Paraíba, se mudou para o Recife, onde fundou um novo jornal, Abelha Pernambucana, conforme seu relato:
“Publiquei em 1829, nesta cidade (Recife), a Abelha Pernambucana. Novas perseguições, tentativas de assassinato, por parte dos ‘colunas’ contra a minha pessoa, e afinal processo por abuso de liberdade de comunicar os pensamentos pela imprensa, prisão e absolvição pelo júri”
Panorama do Recife no século XIX ▪ Arte:
Friedrich Hagedorn, 1855 ▪ Museu do Estado de Pernambuco, via Wikimedia.
Mas, afinal, quem era o jovem paraibano que ao chegar ao Rio, com tão pouca idade, já fundara dois jornais, fora condenado duas vezes por crimes de imprensa, sofrera tentativas de assassinato e, oito meses depois, seria um dos responsáveis para que o imperador Pedro I abdicasse do trono e deixasse o Brasil para aqui não mais voltar? Chamava-se Antônio Borges da Fonseca. Descendia de um militar homônimo, fidalgo da Casa Real portuguesa, que chegara ao Brasil, em 1713, para comandar uma tropa de infantaria em Olinda e, de 1745 a 1753, governara a Província da Paraíba.
Antônio Borges da Fonseca, em gravura de autor desconhecido.
Um filho desse primeiro Antônio Borges da Fonseca governou o Ceará por 17 anos e escreveu a importante obra genealógica Nobiliarquia Pernambucana, e, segundo o escritor Luís Pinto, uma filha casou na Paraíba com o senhor do engenho Morgado originando o ramo familiar paraibano.
Pouco se sabe sobre a ascendência direta de Antônio Borges da Fonseca. Há uma versão de que ele era filho bastardo (como então se dizia) de um Borges da Fonseca e que a sua mãe seria uma índia. Foi educado entre a Paraíba e o Recife. Adolescente presenciou o envolvimento dos seus parentes com o movimento revolucionário de 1817, e, conforme deu a entender em um manifesto autobiográfico, teria participado, em 1824, com dezesseis anos de idade, da revolta da Confederação do Equador.
Ao tempo que Borges da Fonseca desembarcava no Rio, o imperador Pedro I sofria acirrada oposição na imprensa e, segundo a historiadora Isabel Lustoza, “já se formara na Câmara dos Deputados uma bancada capaz de fazer frente aos abusos de poder cometidos por d. Pedro”. Da unanimidade entre os brasileiros, em 1822, como o herói da libertação nacional, pouco a pouco Pedro I foi perdendo a sua popularidade. Contribuíram para isso a dissolução da Assembleia Constituinte em 1823, a dura repressão à Confederação do Equador no ano seguinte, a derrota na guerra
Pedro I, em retrato atribuído a John Simpson, c. 1834 ▪
Pinacoteca de São Paulo, via Wikimedia.
que ocasionou a perda da Província Cisplatina e a sua tumultuada vida pessoal. Mas, talvez o fator mais importante para o desgaste do prestígio do imperador tenha sido o seu crescente envolvimento com os assuntos de Portugal após o falecimento, em 1826, do seu pai, o rei D. João VI. Embora tivesse abdicado do trono lusitano, para muitos Pedro I continuava sendo mais português do que brasileiro.
Para Octavio Tarquinio de Sousa, um dos principais historiadores do nosso Primeiro Reinado, ao chegar ao Rio de Janeiro em agosto de 1830, Antônio Borges da Fonseca, “empenhou-se para logo em cheio no combate ao governo e ao próprio imperador. Como nas províncias do Norte, serviu-se da mesma arma – a imprensa”. Dois meses depois da sua chegada ao Rio, saía O Repúblico, o mais famoso dos 25 jornais que ele viria a publicar e que lhe valeu o apelido de “Repúblico” que ele carregaria, a partir daí, por toda a sua vida. Segundo Octavio Tarquinio, o jornal tinha um “tom jacobino, nativista, mas particularmente lusófobo”:
“O Repúblico, do jovem Antônio Borges da Fonseca, que tão grande participação iria ter nos meses crepusculares do reinado de D. Pedro e trouxera do Nordeste a prevenção e o ódio contra o antigo colonizador,
O Republico, Rio de Janeiro, capa da edição de 28 de junho de 1832. ▪ Fonte: Biblioteca Nacional.
ali porventura, mais vivos do que em qualquer outro ponto do país”.
Essa posição de intransigente oposição do jornal O Repúblico levou Borges da Fonseca a ser acusado pelo procurador da Coroa de fazer pregação contra o governo e a favor da federação. Levado a júri, em janeiro de 1831, o jornalista foi, mais uma vez, absolvido por falta de provas na acusação. Para Octavio Tarquinio, Antônio Borges da Fonseca se tornou “um dos mais audaciosos líderes populares do momento. Porque o então jovem paraibano não se limitava aos artigos de jornal; ia para a rua chefiar grupos e penetrava nas casernas para angariar adesões”. O general pernambucano Mello Rego, adversário e contemporâneo de Borges da Fonseca, traçou um perfil do paraibano, por ele considerado “homem sem escrupulos e de uma audacia fóra do commum”:
“Figura antiphatica, magro, escaveirado, physionomia simiesca, óculos fixos, ardente até a ferocidade, timbre de voz agudo e áspero, tinha, entretanto, palavra facil, animada e persuasiva, sobretudo dirigindo-se ás classes menos illustradas. Sabia incutir-lhes no animo o que sentia ou apparentava sentir, pois a sua linguagem amoldava-se ás circumstancias da occasião”.
A presença de Borges da Fonseca como líder popular nas ruas do Rio de Janeiro começou a se destacar no episódio que passou para a história com o nome de A Noite das Garrafadas. No final de 1830, Pedro I resolveu visitar Minas Gerais.
GD'Art
A viagem durou mais de dois meses e a acolhida dos mineiros ao imperador foi fria. Em meados de março, quando da sua volta ao Rio, os portugueses da cidade, que eram em grande número, resolveram fazer manifestações em desagravo ao monarca e que acabaram se transformando em graves confrontos de rua com os brasileiros.
Poucos dias depois das desordens que ocorreram nas ruas do Rio, Borges da Fonseca fez um relato dos fatos no seu jornal com a ortografia que ele usava (entre outras coisas desprezava a cedilha) que se aproximava do linguajar comum. Para o historiador Hélio Vianna, Borges da Fonseca “pode ser considerado um dos mais arrojados precursores de ortografias confusionistas às vezes propostas entre nós”. Mas, passemos a sua narrativa dos acontecimentos:
“Com a xegada do Imperador [...] a marotagem da ruas da Qitanda, Direita, Pescadores e Rozario axaram que também era xegada a ora de acabarem com todos os Brazileiros, a qem ão apelidado cabras [...] e os marinheiros (portugueses), na quinta e sexta feira (10 e 11) deram principio a revolução atacando as cazas dos sidadãos brasileiros, e, n’esses dias, gritaram viva o Imperador dos Portuguezes absoluto! Os Brazileiros, sientes d’esses atentados, andaram, no sábado (12), em grupos pelas ruas, dando vivas a Constituissão, a Soberania da Nassão
[...] mas os marinheiros, toda a noite, e no dia seguinte (13), se aprontaram de armas e fundos de garrafas, e, quando passamos dezapersebidos pela rua da Qitanda [...] uma patrulha de policia, a nossa vista brada, viva o Imperador absoluto! O pôvo se exacerba; investe contra a patrulha; obriga a que se dê vivas ao Imperador em quanto constitucional”
O Republico, 21.03.1830
Borges da Fonseca passou a ser o oposicionista mais visado e procurado pelos portugueses. Nas ruas, conforme matéria publicada no seu jornal, “só se ouvia o grito de morte ao redator do Republico [...] aparessa o Republico qe o queremos assar n’essa fogueira”. Nos dias seguintes
Recortes do jornal O Republico, edições dos dias 25 e 30 de março e 2 de abril de 1831. ▪ Fonte: Biblioteca Nacional
aos distúrbios, ainda no registro do periódico, “o Republico não tem sido esquecido, e patrulhas d’esses vandalos o buscam para tirar-lhe a vida”.
A partir da Noite das Garrafadas a insurreição contra o governo tomou vulto. No seu jornal, Borges da Fonseca subia o tom contra o imperador e os portugueses. Em 25 de março, escreveu: “Brazileiros! Té quando sofrereis a opressão dos portuguezes? [...] Oje todos os meios são bons para vos vingardes. Rezolvei”. No dia 30: “O Brazil é dos Brazileiros, e não de um punhado de ambiciozos qe só tem em vista arranjarem a sua jente”. No dia 2 de abril: “A Rezistencia ao tirano, ou aqela qe se faz ao xefe d’um estado qe se tem tornado tal, é ordinariamente operada pela grande massa do pôvo, e toma então o nome de revolussão”.
Além disso, Borges da Fonseca, segundo Octavio Tarquinio “poderia jactar-se de ações numerosas e verídicas ligadas aos sucessos do fim do reinado de D. Pedro. Uma delas seria por exemplo a conquista do apoio de alguns corpos do Exército”. E o aliciamento de militares para a revolta era divulgado pelo próprio Borges da Fonseca nas páginas do seu jornal:
“Eu e alguns amigos nos recolhemos aos quarteis da artilheria [...] Não tenho expressões para agradecer aos obzequios que recebi então de todos os bons artilheiros cordiaes amigos de todos os amigos da liberdade do Brazil [...] e até as duas oras da noite aí estivemos juntos [...] O Brigadeiro e toda a Oficialidade fez-no o obzequio de trazer-nos a caza para nos livrar de algum encontro que pudéssemos ter com os malvados marinheiros (portugueses)”.
Ainda segundo Octavio Tarquinio, “a audácia dos agitadores crescia sempre e já haviam principiado a organizar os seus adeptos em centúrias, capitaneadas por Borges da Fonseca” e outros. No dia 6 de abril, a situação se agravou.
GD'Art
Incentivados por algumas lideranças, dentre elas a do jornalista paraibano, grupos se dirigiram para o Campo de Santana (atual Praça da República) e, por volta das cinco horas da tarde, a aglomeração já era de cerca de três a quatro mil pessoas e contando com a participação de militares. Uma assembleia popular que fora formada no local encaminhou uma representação ao imperador exortando-o a substituir o Ministério. Sem mais contar com sustentação militar e na perspectiva da multidão atacar o Paço onde ele se encontrava, com consequências imprevisíveis, restou a Pedro I abdicar do trono. Com a chegada da notícia ao Campo de Santana, a multidão inicialmente ficou perplexa, mas depois aplaudiu efusivamente o grito de “Viva Pedro II”. O historiador José Murilo de Carvalho descreveu aquele momento:
“Após a aclamação em praça pública, a multidão foi buscar o menino imperador no palácio da Quinta da Boa Vista para trazê-lo para o palácio da cidade. Segundo Jean-Baptiste Debret, pintor francês que morava no Brasil desde 1816, testemunha ocular da cena, a criança chorava muito, apavorada com o atropelo da multidão e o barulho dos tiros de canhão”
Pedro I entrega a carta de abdicação. ▪ Arte: Aurélio Figueiredo, c. 1890, Revista de História da Biblioteca Nacional, via Wikimedia.
Destronado o imperador Pedro I, a liderança incendiária e popular de Borges da Fonseca passou a não ser mais bem aceita pelos liberais moderados que participaram da insurreição e lhe foi oferecida a secretaria do governo da Paraíba. Para Hélio Vianna:
Hélio Vianna
“Era muito moço, tinha apenas vinte e três anos, escreveu êle, para justificar a aceitação do posto, realmente muito humilde para quem se julgava um grande chefe. Tudo indica, entretanto, que foi para se desfazerem de um aliado incômodo que os moderados lhe proporcionaram essa oportunidade de deixar a Côrte e interromper a publicação de seu jornal, muito útil antes da revolução, desnecessário depois dela”
Mas, quem pensou que o “Repúblico” iria se aquietar na Paraíba, se enganou. Começaria naquele momento a parte mais audaciosa da vida aventurosa de Borges da Fonseca. Na opinião de um seu opositor, o general Mello Rego:
“Em sua vida publica, que talvez nenhum outro Brazileiro a tenha tido mais movimentada, acham-se actos de verdadeira abnegação, e como que dictados unicamente por patriotismo, bem ou mal orientado. De par com os seus grandes defeitos, com um quid subversivo, destruidor, perverso, que em momento dado irrompia do seu animo ardente, como uma lava inflammada, que faltavam-lhes forças para conter, tinha qualidades apreciáveis pouco communs”
No seu retorno à Paraíba, Borges da Fonseca se incompatibilizou com governadores da Província, publicou dois jornais, foi eleito o vereador mais votado para a Câmara e, mais uma vez, se envolveu em um processo judicial. Em 1834, já se encontrava no Rio atuando na imprensa da cidade. Em 1841, estava de volta à Paraíba. No acervo do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano encontrei, em um Livro de Notas da Cidade da Paraíba, o registro de uma venda de uma casa por Borges da Fonseca, localizada na rua Direita (atual Duque de Caxias), provavelmente o imóvel em que ele residia. Em 1842, se mudou para Pernambuco onde publicou O Nazareno, o mais duradouro dos seus jornais. Cinco anos depois, foi condenado a oito anos de prisão por ter injuriado o imperador no seu jornal.
Alguns do jornais publicados por Borges da Fonseca: Abelha Pernambucana, O Tribuno e O Nazareno. ▪ Fonte: Biblioteca Nacional.
Borges da Fonseca encontrava-se preso no Recife quando se deram as primeiras tramas da Revolução Praieira, mas, conforme notícia publicada no Diário de Pernambuco, “de quando em quando chegava às varandas da sala livre da cadeia e concitava o povo”. Em um duvidoso relato do general Mello Rego “todos os pernambucanos o viram de uma janela da Cadeia do Recife aconselhar ao povo que lançasse fogo às casas dos portugueses, como meio de ser solto, e proclamar-se depois a Constituinte de seus costumados sonhos”.
GD'Art
Submetido a um novo julgamento, Borges da Fonseca foi absolvido. Ao sair da prisão, foi contrário ao início do movimento revolucionário naquele momento, que em seguida participaria, por razões que ele, anos depois, apresentaria em um depoimento autobiográfico:
“Quando se quis tratar a revolução que rompeu no dia 7 de novembro de 1848, consultado por meus colegas, disse-lhes: - é prematura porque nem temos munição de guerra, e nem ao menos o acordo da Paraíba e Alagoas; façamos munição e escrevamos aos amigos das duas províncias. Não foi o meu conselho ouvido.
Assim estava aberta a luta entre o Poder corruptor do Brasil e o povo; e eu entendi dever abandonar minha família, meus cômodos, as vantagens de um advogado, que gozava já de créditos seguros, para tomar parte na luta contra o Poder, e em favor do povo, e minha consciência me acusaria se não procedesse assim, se sem meu comprometimento fosse o povo vencido”
Naquele momento, Borges da Fonseca defendia os postulados da república igualitária pregada pelos revolucionários franceses de 1848, o que fez com que Vamireh Chacon lhe dedicasse um capítulo do seu livro História das Ideias Socialistas no Brasil.
Para Hélio Vianna, na revolta praieira, “atingiu Borges da Fonseca o ponto culminante de sua carreira de agitador popular. Entrou no bairro de Santo Antônio à frente de 400 homens em pé de guerra”.
Com o fracasso da rebelião no Recife, Borges da Fonseca e os revoltosos dirigiram-se para a cidade de Areia, na Paraíba, local onde havia um grande núcleo liberal e que, pelas condições topográficas, seria propício à resistência, mas foram derrotados pelas forças do governo. Para o historiador Horácio de Almeida, a revolta “nasceu no Recife e morreu em Areia”. Derrotado na Paraíba, Borges da Fonseca tentou, com um diminuto grupo, prosseguir a luta no interior de Pernambuco onde foi aprisionado. Conduzido para o Recife com uma escolta de 80 homens, Borges da Fonseca, segundo a narrativa de Mello Rego, entrou na cidade sob a admiração da população “calmo e de cabeça erguida, mirando serenamente a um e outro lado, não parecia um prisioneiro”.
GD'Art
Condenado à prisão perpétua, cumpriu parte da pena em Fernando de Noronha e na ilha da Rata até 1852, quando foi anistiado. Logo voltou a publicar jornais, no Recife e, depois, no Rio de Janeiro. No final de 1855, retornou à Paraíba, onde lançou o jornal O Prometeu e tentou, sem sucesso, uma eleição para deputado geral (o atual federal). Embora atuasse há muitos anos como advogado, Borges da Fonseca era um rábula. Em uma viagem para a Europa, onde ficou por quinze meses, de 1857 a 1859, principalmente na França, conseguiu obter um certificado de doutor em Direito pela Universidade de Rostock na Alemanha.
GD'Art
Com a saúde comprometida em decorrência dos ambientes insalubres das várias prisões que sofreu, “doente, e quase a morrer todos os dias”, conforme seu relato, passou a residir, de 1861 a 1862, em uma fazenda em Campina Grande de propriedade de um genro. O jornalista paraibano continuou até os últimos anos da sua vida um aguerrido defensor das causas populares, como registrou Félix Cavalcanti de Albuquerque Mello (que, segundo Gilberto Freyre, nem foi Cavalcanti, nem cavalgado) no seu livro Memórias de um Cavalcanti descrevendo um episódio envolvendo Borges da Fonseca no Recife, que foi por ele presenciado: “no dia 30 de setembro de 1866, acompanhado de grande onda de povo, dirigiu-se á Matriz de S. José, subio á calçada e principiou a falar, quando alguns soldados de policia romperam por entre a multidão e junto com alguns paisanos o espaldeiraram”.
No início da década de 1870, em uma viagem a Campina Grande, ainda debilitado pela agressão que sofrera da polícia no Recife, Borges da Fonseca adoeceu e resolveu ir para a casa de outra filha, em Nazaré da Mata, onde sua mulher se encontrava. Foi lá que, em abril de 1872, o jornalista e revolucionário paraibano faleceu. Tinha 64 anos de idade. Em um artigo publicado em O Jornal do Rio de Janeiro o escritor paraibano Ademar Vidal escreveu:
Ademar Vidal
“Quando Antonio Borges da Fonseca morreu os amigos vestiram-no como ele costumava andar – calças brancas e croasê – com a mão direita no bolso e a outra estendida, e, coisa curiosa, colocaram-no de pé na porta de sua residência [...] ali estava a figura morta de quem soubera ser na vida o espírito cheio de intransigência e fidelidade aos postulados daquilo que julgava ser a ventura de sua gente que ainda não conheceu espinha dobrada à tirania dos poderosos”
O historiador Otavio Tarquinio de Sousa considerava que Borges da Fonseca “foi talvez o mais obstinado panfletário que o Brasil conheceu no primeiro meio século de vida independente”. Para Joaquim Nabuco, “na galeria dos nossos tribunos republicanos, Borges da Fonseca figura, porém, como o que mais distintamente possuiu a envergadura revolucionária”,
GD'Art
que, segundo Otavio Tarquinio, ele “guardou intata já sexagenário”. Personagem presente nas páginas da História do Brasil na primeira metade do século 19, Borges da Fonseca foi um dos dois paraibanos (o outro foi o bispo D. Vital) a merecer um verbete na obra Dicionário do Brasil Imperial, organizada pelo historiador Ronaldo Vainfas.
Borges da Fonseca, em seus escritos, sempre ressaltou a sua origem paraibana, em frases como: “e quanto a ser paraibano, muito nos orgulhamos”, “sou paraibano, que amo demasiadamente minha terra e meus patrícios” e “a mim que sou paraibano e me desvaneço de ser”. Apesar do seu orgulho pela sua terra, o “Repúblico” é pouco conhecido e muito menos reverenciado pelos seus conterrâneos. A única biografia de Borges da Fonseca foi escrita por um pernambucano, o já falecido professor e escritor Mário Márcio dos Santos, da Academia Pernambucana de Letras. Antônio Borges da Fonseca deixou destacada descendência na Paraíba, dentre outros o jornalista e político Aristides Lobo, ministro do primeiro governo da República, o ex-deputado federal Otacílio de Albuquerque, e é o bisavô materno do ex-senador e governador paraibano Argemiro de Figueiredo.