Há muito que não visitava o Olho d’Água. Ao observar sua paisagem, a mim chegaram recordações e imagens do tempo de garoto, quando percorria o espaço de uma légua entre os dois sítios e atravessava a pé enxuto o rio Araçagi-mirim.
Marccelo Cunha
No meu tempo de menino, olhava as elevações da terra que devido à distância pareciam sombras. Nos meses de março e junho, gostava de observar a água que descia das encostas para penetrar na terra e fazer germinar o milho, o feijão, a mandioca e o pasto que alimentava o gado. As galinhas poedeiras ciscavam debaixo dos jiraus onde mamãe cultivava coentro, cebolinha e hortelã da folha miúda, que dava gosto na comida.
Gostava de percorrer a distância de Tapuio a Olho d’Água, mesmo sem entender a mística desses lugares. Nem dava conta de que o Padre Ibiapina muitas vezes passou por ali, pois andava pela região de Areia, Pilões e Serraria, quando se deslocava para Arara.
José Nunes
Padre Ibiapina, quando despertou para a vocação missionária, primeiro se apaixonou pelas paisagens do Brejo, a partir do momento em que esteve em Areia para defender um homem levado a júri popular, acusado de assassinato. Tempos depois, revelando-se apóstolo, abraçou os necessitados da região, penetrou pelos Sertões da Paraíba, Ceará e outros estados que se tornaram íntimos dele, sem nunca, porém, esquecer a região brejeira, montanhosa e aprazível, que o acolheu com sua água doce e cristalina.
No caminho de Serraria a Arara, o missionário e seus seguidores passavam pelo Olho d’Água, onde, certamente, pousavam para o descanso,
Takeshi Kobayashi
Na manhã de domingo, no meu caminhar lento de pernas curtas, pude observar, com atenção de adulto, que as antigas residências de Olho d’Água, com eiras e beiras hoje cobertas de lodo. Recordava o tempo quando, naquela região, se plantava café e se criava gado em abundância, sem desmatamento como se verifica nos tempos atuais.
Ornado de ramagem nativa, pequenas flores cor de ouro e brancas que brotam em estação invernosa, e no período de estio com a vegetação moribunda e os rasteiros gravetos pontiagudos, o túmulo nu do irmão Inácio mostrava a marca da presença dos que por ali passam e depositam amuletos, ex-votos e fitas brancas, vermelhas e azuis junto ao resto de velas que foram acesas.
Capela N. S. da Conceição (Sítio Olho d'Água - Serraria/PB) José Nunes
Contam que, antigamente, em noite de lua, uma cobra voava sobre o túmulo do beato. Quem viu, dava testemunho. Se é verdade, não sei.
José Nunes