Em 2023 completei 50 anos de magistério. É muito, mas não o suficiente para ter aprendido o que devia – sobre o que ensino e, mais ainda, sobre o ato de ensinar. Tudo começou por influência (e intimação) de meu pai, que era professor no Liceu Paraibano e em escolas particulares da capital. Certa vez um pequeno grupo o procurou para dar aulas para concurso público. Sem tempo, e sabendo do meu gosto pelas letras, ele transferiu a tarefa para mim.
Eu não me sentia “pronto” e, num primeiro momento, pensei em recusar. Gostava de ler, mas tinha pouco conhecimento sobre a língua portuguesa. Além disso, era excessivamente tímido para encarar uma plateia mesmo pequena como aquela.
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Além do que aprendia com eles, eu lia o que encontrava de literatura na estante. Meu pai gostava de Machado, Eça, Cyro dos Anjos, autores mais ligados à tradição lusitana e cujo uso da língua se distanciava do oralismo que marcava a modernidade. Mais de uma vez o ouvi falar em estilo castiço, adjetivo em que se misturavam o respeito à norma e o vínculo com a tradição. Eu temperava essas leituras com a de Jorge Amado, José Lins do Rego e dos cronistas modernos – Rubem Braga à frente.
Aceitei essa primeira turma, muitas vezes estudando na véspera a aula que daria no dia seguinte, e a partir daí não parei mais. Mesmo porque era precioso o dinheirinho que ganhava com as aulas particulares, que me permitiam bancar a cerveja do fim de semana com os amigos. O “Velho”, afinal, nunca fora pródigo nas mesadas. Vez por outra eu lhe passava “um pinto”, mas de uma quantia tão minguada quanto a ave que serve de metáfora ao surripiamento que os adolescentes costumam fazer na carteira dos pais. Se a quantia fosse grande, o infrator poderia ser descoberto e ter que aguentar, no mínimo, uma vergonhosa repreensão.
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Comecei então a vivenciar uma situação paradoxal. Como em 1971 eu passara no vestibular para Medicina, tive que conciliar as aulas do Ciclo Básico com as tarefas no 2001. Muitas vezes saía do Hospital Santa Isabel, onde pagava cadeiras como Semiologia e Técnica Cirúrgica, para dar aulas no cursinho. Era estranho aquela figura de jaleco branco entrar na classe e começar a falar em termos da oração, mas logo o pessoal se acostumava.
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