O segundo filho me ligou com a informação: “Pai, estão calçando minha rua”. Mora no bairro do Aeroclube, encostado ao de Manaíra, onde eu e a mãe dele mantemos, há sete anos, a cama e as tralhas. São áreas que se desenvolvem e se verticalizam em rapidez espantosa. Em Manaíra, às margens do Retão – Avenida Flávio Ribeiro Coutinho, para os menos íntimos – erguem-se três Shopping Centers num trecho de um quilômetro. O maior e mais antigo deles está para ganhar mais cinco pavimentos e toma o nome do bairro que detém a maior vocação empresarial de João Pessoa.
Aqui, farmácias, padarias, clínicas médicas e odontológicas, escritórios de tudo e para tudo, imobiliárias, escolas, lojas, bares e restaurantes incontáveis atestam o que digo. À margem esquerda do Retão, no sentido do mar, os que escolheram o Aeroclube habitam núcleo mais calmo. Nessa área, em crescimento acelerado, também, há ruas aonde as casas chegaram antes da pavimentação.
Mas, ali e no Bessa, o bairro adjacente, a profusão de terrenos não ocupados tem permitido ao Poder Público a instalação de equipamentos invejados pelo restante da cidade. São os Parques Parahyba, hoje, em número de quatro.
Tais parques ampliam o conceito de “Cidade Verde” de que há muito desfruta uma João Pessoa orgulhosa de seus bosques e seus pedaços da Mata Atlântica. A do Buraquinho possui mais de 500 hectares e se inscreve entre as maiores matas nativas em perímetro urbano do País. Refúgio da vida silvestre, Buraquinho tem fontes capazes de abastecer bairros inteiros. O Parque Arruda Câmara, com seus quase 27 hectares, também, em área central, contém um Zoo, a parte menos interessante, e é uma festa para os olhos. Diz-se que só perde em visitação para as praias. Lembremos, ainda, que o Solon de Lucena, com sua lagoa e seu bosque posteriormente retocado por Burle Max, paisagista de fama universal, compõe um dos mais exibidos dos nossos cartões postais.
Ainda não dá para apostar no êxito do Parque Ecológico Sanhauá, em vista da judicialização do processo de retirada de moradores da área de mangue, no bairro do Varadouro, onde a cidade nasceu de costas para o mar. Além disso, o prefeito da ocasião não se reelegeu. Mas o que está no desenho é uma área de preservação permanente de quase 200 mil metros quadrados, praça, mirante, elevador panorâmico, passarela elevada sobre o manguezal, ciclovias, calçadas e estacionamento, tudo com iluminação em LED. O prefeito da época falava das bênçãos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a esse projeto.
Estivesse eu na assessoria do mandatário atual, a ele recomendaria a continuidade da obra (que não deve ter dono) e a conciliação dos conflitos, de modo a que os ribeirinhos tenham, com os bons traços da arquitetura, casas suspensas em zonas alagadas, saneamento básico e seus barcos de pesca no quintal, como precisam ter. Acho que a coisa, feita desse modo, se tornaria até mais interessante.
Como assim? Arquiteto para pobre? Isso mesmo, e garantido por lei federal existente há 37 anos. Recebe o número 11.888 e assegura às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita para projeto e construção de habitação de interesse social. Ah, se as favelas soubessem disso... Seriam, progressivamente, menos caóticas e insalubres.
Uma dica: ficará de melhor modo informado acerca do assunto quem procurar o conselheiro Arnóbio Viana, ou, via Google, o “Programa Decide”, do Tribunal de Contas da Paraíba. Trata-se de projeto indutor de calçadas livres e transitáveis, proteção ao meio ambiente e a bens culturais. Também, de casinhas bem desenhadas, iluminadas e arejadas, em cidades que se enfeiam nos roteiros como o do brejeiro Circuito do Frio, apesar de suas vocações para o turismo, com suas oportunidades de emprego e renda. A ideia é a do custeio dos projetos de arquitetura e urbanismo por consórcios regionais de Prefeituras, à base de R$ 1,5 mil mensais para cada uma, até quando eu acompanhava esses entendimentos.
Leitura do ano passado me trouxe o conhecimento da derrubada da liminar que até então impedia a retomada, pela Prefeitura Municipal, da construção do Parque da Cidade, na área desapropriada do Aeroclube de João Pessoa, aquele velho campo de decolagem e pouso que deu nome ao bairro. Se, na dança do Judiciário, a decisão estiver mantida, ali pode surgir uma obra orçada em mais de R$ 130 milhões contendo lagos, decks, espaços para eventos, piqueniques, pistas de skate e patinação, ciclovias, mirante elevado,
Fonte: GuiaGeo
Entretanto, com ou sem esses acréscimos, João Pessoa já integraria o ranking das cidades mais procuradas do mundo, ao que se conta de nota na Booking.com, publicação destinada a pesquisas anuais de previsão de viagens e que, a bem da verdade, não consultei. Falo disso, então, por haver lido informes na imprensa. De qualquer modo, entendi que “procurado” não é sinônimo de “visitado”. Está mais para “pesquisado”.
Mas é evidente que a cidade ganhou foros de “namoradinha do Brasil”. Está na moda, atrai resorts com capital nacional e estrangeiro para o Polo Turístico do Cabo Branco, onde também já se ergue um dos maiores parques aquáticos do País. Mas, atrai gente de fora por suas praias, sua qualidade média de vida e sua exuberância vegetal. No prédio onde eu moro há sotaques de recantos diversos. Há paulistas, mineiros, paranaenses e gaúchos em profusão. Os paulistas, notadamente estes, parecem entender que a praia mais próxima deles é Tambaú, após três horas de voo. Melhor do que as cinco
“Quem vem, se apaixona”, conta-me Oswaldo, um campineiro da gema. Estava de férias, em Natal, com a mulher e um filho e decidiu dar um pulinho até João Pessoa. Passou-se pouco tempo entre o regresso a Campinas, em São Paulo, a venda do apartamento e a compra deste onde atualmente mora, uns dez andares acima do meu. Sou um dos seus 42 alunos de musculação e com ele divido um trânsito mais complicado, lojas, bares e restaurantes mais cheios e com preços que sobem na razão direta do aumento do fluxo de turistas.
Evidentemente, recém-chegado, meu amigo não tem as saudades que eu tenho. Quanto a mim, ponho os olhos em alguns dos edifícios mais altos do País (a ver o caso do Planalto do Cabo Branco) e lastimo a perda de referências da minha juventude: a de trechos bucólicos e casario hoje inexistentes. Contudo, apesar dos pesares, como diz aquela velha marchinha de carnaval, “daqui não saio, daqui ninguém me tira”.
Bom saber que, agora, estão calçando a rua do meu filho. Não acho que ele me chame para ouvir discursos no ato da inauguração. Entende, por certo, que este velho e cansado repórter tem feito isso desde que tinha a metade da sua idade. Mas dividirei com ele, de muito bom grado, uma garrafa de vinho. Juntos, ergueremos o brinde a duas esperanças: à da extensão do bem-estar social até nossas periferias pobres e desamparadas e à da continuidade administrativa num País onde os gestores públicos quase nunca concluem a obra do antecessor, embora custosa aos interesses e aos bolsos da população. Trato feito?