Há quem não acredite, mas podemos nos apaixonar por uma cidade. Podemos, sim; e com a mesma intensidade que devotamos este singular sen...

Mossoró, mon amour

mossoro rio grande norte
Há quem não acredite, mas podemos nos apaixonar por uma cidade. Podemos, sim; e com a mesma intensidade que devotamos este singular sentimento àquela que será a eleita, nossa outra metade, enquanto estivermos cumprindo nossa missão de vida por essas dimensões. Digo isto porque fui acometido dessa inusitada paixão. E qual rincão deste mundo de Deus teria colocado em entropia, em alvoroço, minhas combalidas coronárias? Pois vou contar: esse pedaço de chão está lá em terra potiguar, mais exatamente, Mossoró.

Nas linhas que se seguem, meus leitores, minhas leitoras, irei relatar a origem deste arrebatamento quase juvenil do qual fui tomado dias atrás
mossoro rio grande norte
Larissa Costa da Mata
e que teima em perdurar; mais que isso, parece que será para sempre. Vou contar.

Filha professora da UFERSA, está partindo nesta semana para trabalhar em uma pesquisa lá na capital da Catalunha; ou seja, em Barcelona. Pai coruja, fui passar uns dias com ela e o genro, para as protocolares despedidas. Então, não teve jeito, tive que ir a Mossoró. Viagem em ônibus-leito até que dá para encarar, e puxei sono pesado até que, lá pelas cinco da manhã, despertei e notei que havíamos chegado, eu e mais uns outros que encararam comigo aquele trajeto de pouco mais de 400 km.

Aí, minha primeira surpresa. Já para pegar as malas na plataforma da rodoviária, um frio de incomodar esquimó. Coloquei ligeiro o casaco, cachecol para proteger a garganta, troquei o sapato por botas de cano longo e fui ao aplicativo pescar uma condução até a residência de minha filha. Novamente, uma surpresa: a vegetação no entorno da estação e nas praças que estavam no percurso, cobertas pelo branco da geada. O motorista me esclareceu: “Fica assim até lá pelas 10 horas; derretem conforme o sol esquenta um pouquinho.”

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praticabr.com
Carinhosos, filha e genro receberam-me de lareira acesa e, à mesa, chocolate quente e pão de queijo que acabara de sair do forno, quentinho que só vendo. Feito o desjejum, fui à janela (estávamos no 20º andar), e minha rebenta, toda cheia de cuidados: “Pai, não abre o vidro para não pegar friagem, aqui venta muito, e é vento gelado, pode fazer mal para o senhor.” Recuei e fiquei vendo através daquele vidro a paisagem glacial que estava me encantando. “Tá vendo aquela torre lá longe, no alto da montanha?”, perguntou meu genro. “Tô”, respondi, e ele logo esclareceu: “Ali é a Serra de Mossoró, onde fica nossa estação de esqui; se quiser, podemos ir lá mais tarde.” Lembrei-me do que aconteceu com Michael Schumacher e declinei o convite.

Gastamos um tempinho colocando a conversa em dia, até que minha filha, sempre carinhosa e cheia das boas intenções comigo, me perguntou se eu preferia descansar ou esperar um pouco até o sol dar uma esquentada, e então poderíamos dar um passeio para conhecer a cidade. Concordei, e ela foi logo me animando: “Precisa ver só, pai. Do lado da Praça de Convivência inauguraram uma pista para patinação no gelo, que é agora o ‘point’ da cidade. É chique comprar patins lá no shopping e depois patinar na praça. Na verdade, são duas pistas: uma para crianças, a pista Capitão Virgulino, e a outra para os mais crescidinhos e adultos, a pista Capitão Jararaca.”

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Partage Shopping (Mossoró - RN)
Saímos na hora combinada, e achei que havia muita gente andando pelas ruas, algumas casas com cadeiras nas calçadas. E gente numa prosa danada. Perguntei se era feriado na cidade. “Não, pai, é que entre onze e uma da tarde o povo daqui costuma sair para tomar um sol, receber vitamina D.” Achei muito interessante esse hábito dos mossoroenses.

À noite, fomos a uma pizzaria e depois ao cinema, ambos locais com aquecimento central. Conforto de primeiro mundo. Ah, meus amigos, minhas amigas, como é bom dormir em Mossoró, puxar sono à noite sob um edredom de três camadas, usando pijamas de flanela. Não há o que pague.

Amei aqueles dois dias nos frios do nosso semiárido. Quem quiser quentura que vá à Serra Gaúcha, em São José dos Ausentes, ou em Gramado, ou ainda em Campos do Jordão, na Serra da Mantiqueira. Por lá, sim, um calor dos diabos, porque frio — mas frio mesmo, temperaturas abaixo de zero —, recomendo Mossoró, e estamos conversados.


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