Talvez haja, de fato, heróis e super-heróis. Se eles existem, Shavarsh Karapetyan, atleta armênio e campeão mundial de natação subaquát...

O que é um herói?

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Talvez haja, de fato, heróis e super-heróis. Se eles existem, Shavarsh Karapetyan, atleta armênio e campeão mundial de natação subaquática, então com apenas 23 anos, foi um deles.

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Acidente do bonde nº 15 no lago de Ierevan, em 16.09.1976. Após a queda do veículo na água, o nadador Shavarsh Karapetyan mergulhou repetidas vezes e salvou dezenas de passageiros, em um dos mais notáveis atos de heroísmo civil do período soviético.
No dia 16 de setembro de 1976, um trólebus, um ônibus elétrico da era soviética, caiu no lago Yerevan. Sem hesitar, Shavarsh mergulhou repetidas vezes a cerca de cinco metros de profundidade, em uma água fria, turva e poluída; quebrou o vidro traseiro do veículo usando as próprias pernas e retirou trinta e sete pessoas. Vinte e nove sobreviveram graças ao seu ato.

O esforço extremo lhe causou uma pneumonia severa, que o manteve internado por três semanas. Ainda assim, no ano seguinte, conquistou uma medalha de ouro e quebrou seu décimo primeiro recorde mundial, encerrando, então, sua carreira esportiva. Na Antiguidade, os heróis eram celebrados por rapsodos e poetas; hoje, o são por escritores, quadrinistas e cineastas.

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Shavarsh Karapetyan em registro da década de 1970, durante uma competição oficial de natação com nadadeiras da União Soviética.
Para Joseph Campbell, o herói não é apenas um personagem: é uma necessidade humana. Ele surge quando o indivíduo é arrancado da rotina comum e convocado a enfrentar o desconhecido, num “chamado à aventura” que não promete recompensa, mas superação. O herói é aquele que aceita atravessar o limiar entre o mundo conhecido e o território do risco, do medo e da provação.

Segundo Mircea Eliade, o herói participa de uma dimensão sagrada do tempo. Seus atos não são apenas feitos históricos, mas gestos exemplares
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Shavarsh Karapetyan na década de 1970, em piscina de treino da natação com nadadeiras.
que se repetem simbolicamente. Ao lutar contra monstros, descer aos infernos ou enfrentar o caos, o herói reencena o drama primordial da humanidade: a tentativa de dar sentido ao mundo e restaurar uma ordem ameaçada. Por isso, os mitos heroicos nunca envelhecem; atualizam-se em cada época.

Outros mitólogos perceberam que o herói não é definido pela ausência de falhas, mas pela disposição de enfrentá-las. Hércules carrega sua força e sua culpa; Ulisses vence mais pela astúcia do que pela força; Enéias sacrifica desejos pessoais em nome de uma missão maior.

Campbell insistia que o verdadeiro sentido da jornada heroica não está na vitória final, mas no retorno. O herói volta transformado e traz consigo um “elixir”: uma cura, um conhecimento, uma nova visão capaz de renovar a comunidade. Sem esse retorno, o heroísmo se torna vaidade; com ele, converte-se em serviço.

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Shavarsh Karapetyan, em 2025. ▪ Fonte: Karapetyan Official
O herói é a imagem simbólica do ser humano quando decide não fugir do desafio e, mesmo ferido, escolhe voltar para partilhar o que aprendeu.

Há um texto que sempre me emocionou e que, ao menos para mim, responde à pergunta que dá título a este ensaio. É de autoria do poeta e jornalista Agnelo Rodrigues de Melo, que assinava sob o pseudônimo de “Judas Isgorogota”:

O Herói
⏤ Papai, o que é um herói? Eu pergunto porque tenho grande vontade De ser herói também... Será que posso ser herói sem entrar numa guerra? Será que posso ser herói sem odiar os homens E sem matar alguém? O homem que já sofrera as mais fundas angústias E as mais feias misérias Trabalhando a aridez de uma terra infecunda Para que não faltasse o pão no pequenino lar; O homem que as mais humildes ilusões perdera No seu cotidiano e ingrato labutar; Aquele homem, ao ouvir a pergunta do filho: ⏤ Papai, o que é um herói? Nada soube dizer, nada pôde explicar... Tomou de uma peneira E cantando saiu, outra vez, a semear!


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