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A princípio, o cenário nos remonta a algumas cidades históricas do interior do Brasil. Não as do tempo atual, mas de um passado distante....

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A princípio, o cenário nos remonta a algumas cidades históricas do interior do Brasil. Não as do tempo atual, mas de um passado distante. O traçado urbano, o lirismo das fachadas, a tranquilidade de outrora, a sensação de paz e segurança, todas as emoções que convergem em busca de um tempo perdido.

Abro a janela e por ela o horizonte me invade os pulmões. Sinto-o na pele, na íris, na brisa, com perfume de alva. No fim do que é visto, ...

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Abro a janela e por ela o horizonte me invade os pulmões. Sinto-o na pele, na íris, na brisa, com perfume de alva. No fim do que é visto, a linha separa com gume afiado, preciso e certeiro, o céu do que é mar. Fitando seu traço oposto e difuso percebo os meandros que no firmamento tudo contornam. Aí se reforça o afã sinuoso, sempre presente na obra divina, em que a bola se ostenta voluta, do firmamento à trama do Cosmo.

O olhar tem a velocidade da luz. Instantâneo, fulminante, radiográfico. Por ele flui o pensamento, ainda mais veloz. Quisera o olhar pud...

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O olhar tem a velocidade da luz. Instantâneo, fulminante, radiográfico. Por ele flui o pensamento, ainda mais veloz. Quisera o olhar pudesse se acostar ao pensar e ser mais rápido que a luz.

Dos sentidos, o mais misterioso. O olhar fita, filtra, traduz em cores o que capta a íris. E pelo espectro mágico se faz pensamento, impressão, emoção. Tudo é bom quando é bom o olhar, já dizia Jesus.

Mendelssohn escreveu canções sem usar palavra alguma. Foram mais de 40, descritas apenas com o piano e o alfabeto das colcheias. Assim tamb...

Mendelssohn escreveu canções sem usar palavra alguma. Foram mais de 40, descritas apenas com o piano e o alfabeto das colcheias. Assim também fez em alguns poemas sinfônicos, entre eles “Sonhos de uma noite de Verão” e “A Gruta de Fingal”.

Há três anos ele partia, em merecida viagem, na hora certa, para então se transformar no ausente mais presente… Como somos gratos a este ...

Há três anos ele partia, em merecida viagem, na hora certa, para então se transformar no ausente mais presente…

Como somos gratos a este homem iluminado - Carlos Romero! Iluminado com simplicidade, humildade, dignidade. Puro, sem ser inocente, soube divinamente usar o talento, a poesia e a criatividade literária para propagar o amor, enaltecer as belezas da vida, da natureza, das coisas simples, cujo significado passam tão despercebidos pela maioria. Ele entendia a vida como Leonardo da Vinci: “É na simplicidade que reside o mais alto grau da sofisticação”.

'Alô, aqui é da UTI do Hospital Santa Isabel. Estamos ligando para informar que a paciente Carmen Coeli Gouveia Romero acabou de falec...

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'Alô, aqui é da UTI do Hospital Santa Isabel. Estamos ligando para informar que a paciente Carmen Coeli Gouveia Romero acabou de falecer'.

Não houve surpresa nossa, pois fazia 7 dias que a visitávamos na UTI, inconsciente, respirando por aparelhos, e, naquele estado, a notícia era a melhor possível para quem ama de verdade.

Eita, Jesus. Hoje é Natal! Espiando o céu, ontem à noite, vieram-me lembranças das bordas do Mar da Galileia, de Cafarnaum, da sinagoga e ...

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Eita, Jesus. Hoje é Natal! Espiando o céu, ontem à noite, vieram-me lembranças das bordas do Mar da Galileia, de Cafarnaum, da sinagoga e da casa de Pedro, por onde Teus pés passearam, Teu Espírito derramou luz e nossos olhos, um dia, por lá andaram… E sempre nos vem a indagação sobre como um personagem de um lugar simples e humilde, nascido sob perseguição e fuga, acolhido de maneira extremamente rústica, adquire força tão poderosa que se espalha pelo planeta e se mantém presente em praticamente tudo?

A poda foi criminosa por dois motivos: a violência do fato em si e a grave consequência. O ninho que abrigava o filhote de bem-te-vi veio ...

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A poda foi criminosa por dois motivos: a violência do fato em si e a grave consequência. O ninho que abrigava o filhote de bem-te-vi veio ao chão com galhas e lágrimas da cajazeira depenada. Uma pena...

Eis que sai do morno aconchego uma coisinha de asa e cauda, com mancha amarela no papo, assustada, olhinhos brilhando sem entender nada. Os pais aflitos piavam de um lado pro outro numa algazarra sonora, em sinais de alerta e protesto. E agora?

Índice Leningrado ▪ O cerco A composição ▪ A partitura ▪ Os músicos Os ensaios ▪ O concerto ▪ A repercussão A m...

Índice LeningradoO cerco
A composiçãoA partituraOs músicos
Os ensaiosO concertoA repercussão
A música



Os russos são admiráveis no reconhecido empenho à arte e à cultura. Tornaram-se produtores notáveis de literatura, música, dança, filosofia, ciência, dramaturgia, pintura.

As duras vicissitudes que o destino os obrigou a enfrentar, fizeram-nos protagonistas de uma história marcada por imperiosos desafios, a começar pelo rigor de invernos tempestuosos, e por consequências da ambição, exploração, injustiças sociais, revoluções, guerras civis e militares, tragédias, fome, tudo enfrentado sem arrefecimento da coragem e da criatividade.

      Como dói essa saudade… Bem sabia que era assim. Mas a falta de costume ou da plena consciência faz a gente indiferente ao raia...

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Como dói essa saudade… Bem sabia que era assim. Mas a falta de costume ou da plena consciência faz a gente indiferente ao raiar do novo dia. Como dói essa saudade… A vontade de apertar, de beijar e de cheirar. Como dói essa saudade que eu tinha esquecido de sentir, de vez em quando,

'Eu dei tudo o que pude dar. O que eu consegui aqui, nunca mais alcançarei'. Assim Camille Saint-Saëns falou sobre a última Sinfon...

'Eu dei tudo o que pude dar. O que eu consegui aqui, nunca mais alcançarei'. Assim Camille Saint-Saëns falou sobre a última Sinfonia, uma das glórias de sua prodigiosa vida na música. A “Sinfonia do Órgão”, a terceira, é tida como uma das obras orquestrais mais significativas e tecnicamente sofisticadas do final do século XIX. Nela desfruta-se de uma notável concatenação de melodias, cores e invenção temática caleidoscópica que a tornaram tão apreciada, desde sua estréia em 1886.

Há muito que via e ouvia o cronista Carlos Romero elogiar e assistir com certa frequência à oitava sinfonia de Bruckner, uma de suas músi...

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Há muito que via e ouvia o cronista Carlos Romero elogiar e assistir com certa frequência à oitava sinfonia de Bruckner, uma de suas músicas favoritas. Sem ter ainda a necessária familiaridade com a obra, cuja dimensão e complexidade mereciam uma atenção mais dedicada, sempre me punha curioso. E pensei: se ele, que tão bem conhece música, é fascinado por esta sinfonia, decerto, é porque ela deve ter algo muito especial.

Desde a infância que o tinha como um deus, como os gregos. Mas esse era genuinamente brasileiro, mineiro de Boa Esperança, que nome bonito...

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Desde a infância que o tinha como um deus, como os gregos. Mas esse era genuinamente brasileiro, mineiro de Boa Esperança, que nome bonito de cidade...

O piano sempre me exerceu mágico fascínio. Quando brincava de esconde-esconde, lá pela dezena de anos, eu sumia da vista dos primos ao escutar, de longe, minha tia Iracema tocar. Um esconderijo óbvio, do qual todos já suspeitavam. E ali me punha em transe, mudo, estático, observando os dedos a deslizar pelas teclas daquela enorme e sinuosa caixa preta de onde saía sonoridade tão sublime.

Depois inventei de estudar Música, matriculei-me no Conservatório Paraibano onde vivi doces anos da pré-adolescência. Desta época trago na boa memória professores como Maurício e Sirena Gurgel, Iraci Menezes, Ísis Marinho, Catarina Abreu, Julinha Nóbrega, Gerardo Parente, Elza Cunha, Isabel Burity, e dos tantos colegas irmanados pela energia musical. Em especial, João Bosco Padilha, de quem me tornei amigo.

Para todos estes e quem mais apreciava música à época na Paraíba, Nelson Freire era um deus. Mesmo considerando pianistas igualmente talentosos como Antônio Guedes Barbosa, Jacques Klein, João Carlos Martins, Cristina Ortiz, Arthur Moreira Lima,
o prodigioso mineiro que encantou o Brasil e o mundo, era especial em tudo.

Para minha tia e madrinha, Iracema Romero de Andrade, nem se fala. Admirava Nelson como quem contempla uma estrela no céu. Tinha todos os discos dele, escutava-os frequentemente e em sua singularíssima interpretação se inspirava. A partir de então, passei a conhecer melhor Nelson, admirando-o cada vez mais, à medida que o descobria na música concebida como poucos.

Não lembro qual foi a primeira vez que o vi, mas foi aqui em João Pessoa, cidade que sempre o cativou pela beleza histórica, praias bonitas e sobretudo pelo seleto e diferenciado público de música erudita. Assim, Nelson nos dava ocasionalmente o prazer de memoráveis recitais e concertos.

Na gestão do governador Tarcísio Burity, pontuada pelo tratamento ímpar dado à cultura, Nelson se fez mais presente. Foi a época dos Festivais Internacionais de Música, em que a Orquestra Sinfônica da Paraíba se destacou entre as melhores do país, senão a melhor, como confessou pessoalmente o maestro Eleazar de Carvalho em entrevista a Jô Soares, na TV Globo. E chegamos a ter o grande regente como titular de nossa Sinfônica. Tempos áureos!


Até masterclasses de piano com Nelson Freire a Paraíba teve, patrocinadas pela administração de Tarcísio Burity, um grande apaixonado por Música. Foi exatamente numa dessas aulas que conheci Nelson mais de perto, junto com João Bosco Padilha e Hermano Assis. A empatia foi instantânea. Parece que ele havia captado em nós aquela admiração dos tempos de infância.

Certa vez, após um dos concertos no cine-teatro Banguê, o convidamos para um jantar, com o maestro Eleazar de Carvalho, a cantora lírica Maria Lúcia Godoy, e o crítico de música do jornal Le Monde, Alain Lompech, em nossa casa. Foi uma noite encantadora, inclusive por ter convidado Alaurinda Padilha,
irmã de João Bosco, ocasião em que ela e meu pai, Carlos Romero, se enamoraram.

Como foi bom perceber que Nelson se sentiu em casa lá em casa. O que se comprovou posteriormente em outras vezes, menos formais, quando ele passou a vir estudar no nosso piano, preparando-se para os concertos seguintes.

Foi aí que descobrimos o seu lado mais humano, da simplicidade, da espontaneidade, da sensibilidade para as coisas da natureza, as flores, animais e outras poesias. E ele fez de nossa casa local de assídua e prazerosa convivência, fortalecendo a amizade e a admiração. Surpreendia-nos vê-lo preferir ensaiar em nosso piano, um Essenfelder de ¼ de cauda, tendo à disposição todo o aparato do Espaço Cultural, com seus dois novíssimos pianos austríacos de cauda inteira Bösendorfers, recentemente adquiridos pelo governo de Burity. Uma vez, ele nos contou que o governador lhe perguntou por que não estava indo ensaiar nos Bösendorfers? Ao que respondeu: “É porque na casa de Germano eu me esparramo pelo chão, pelo sofá…” E era assim mesmo. Descalço, de bermudas, passeava no jardim, entre uma música e outra, tomava um cafezinho, e se mostrava a pessoa naturalmente simples e amável que sempre foi.

A essa altura sua amizade com meu futuro “tio”, irmão da boadrasta Alaurinda intensificou-se e João Bosco foi convidado para assessorá-lo, indo morar com ele, no Rio de Janeiro. E de lá, acompanhando-o pelo mundo, a cumprir extensa e concorrida agenda de performances e festivais.

Na residência do Alto do Joá, no Rio, tive o prazer de me hospedar e conhecê-lo na intimidade. Ver como ele tratava bem os partícipes de seu mundo, amigos, funcionários, animais. Tímido e reservado, podia até parecer sisudo, mas apenas na suposição, pois era amor em tudo o que fazia, dizia, tocava. Como era bom acordar e escutá-lo ao piano… Aproximava-me calado, sentava-me atrás, magnetizado por sua arte e pela maneira de dizer o que sentia na ponta dos dedos. Numa ocasião ele estava preparando o Concerto nº 2 de Brahms para abrir um Congresso Mundial de Cardiologia no Teatro Municipal. No início do primeiro movimento, após a exposição do tema, ele parou, olhou para mim e indagou:
“há algo mais crepuscular do que este começo ?”. Era o mundo que ele via na Música...

Dada a simplicidade de Nelson, ousamos em levá-lo para Baía Formosa (RN), onde dormiu em colchonete de cama de cimento e comeu sardinha frita de Dona Raimunda, trazido por Dona Regina. Assim como para a Ribeira, às margens do rio Sanhauá, do outro lado da Praia de Jacaré, onde cochilou em rede, foi picado pelos mosquitos do mangue, e se deliciou com caranguejo no coco. A casa era de tia Iracema, rústica, simples, e, quando lhe dissemos que o convidaríamos, ela se espantou: “Vocês terão coragem de levar Nelson para a Ribeira?” — “Sim, titia, ele é encantadoramente simples”. E como foi bom!

Posteriormente nos encontramos em oportunidades de viagem, no seu apartamento do Marais, nos teatros que sempre o requisitavam. No Concertgebown de Amsterdam, na Sala Pleyel, na Phillarmonie de Paris, eram sempre noites glorificadas pelo regozijo com sua arte sem limites. Acompanhadas do orgulhoso prazer em ver o brilho de um brasileiro ser comprovado invariavelmente pela calorosa aclamação de entusiasmadas plateias internacionais. Não raro, jornais como o New York Times o apontavam entre os maiores pianistas da atualidade.


Contudo, havíamos de convir que Nelson não mais pertencia apenas ao Brasil. De mãos dadas com os grandes compositores, ele se espargiu pelo planeta levando a divina arte diretamente aos corações emocionados, sem nunca esquecer de incluir, sempre que possível, nossos preciosos autores brasileiros, nas gravações, recitais e concertos em público.

Sob a capacidade de dosar e superpor com maestria os planos sonoros, destacar as vozes e melodias na mais absoluta clareza e com a expressão máxima da Música, o piano de Nelson faz inveja a qualquer orquestra. Tudo o que o compositor pretendeu dizer na partitura, ele consegue captar além, redescobrindo, e, principalmente recriando de maneira ainda mais sublime a essência musical em nova tessitura, burilada com extraordinária sensibilidade. Sabia soar estrondosamente os acordes como uma catedral, tanto quanto fazer cintilar trinados e pingos de luz na sonoridade límpida como a superfície de um lago ao luar. Certamente Debussy gostaria de ter escutado por ele o seu Clair de Lune...


As paisagens sensoriais que Nelson consegue fazer brotar no imaginário do ouvinte, inebriadas da delicadeza com que ele reveste e invoca as melodias são fruto de percepção que só as almas iluminadas possuem. Ao sentir, talvez, que não pudesse mais ser o médium capaz de nos transmiti-las, ele se desencantou do mundo terreno.

Nem sempre há forças que façam do artista um herói maior do que sua arte, do que si próprio. Nem sempre ele encontra outra forma de superar e de se expressar em idioma não mais acessível. É então que a fatalidade se sobrepõe às razões imponderáveis do existir e do não existir. Mesmo porque artistas que se doam de forma tão dedicada e altruísta como Nelson Freire sempre estarão a colher o bem que fizeram, a beleza que semearam, a felicidade que distribuíram, sobretudo nos momentos em que a vida e o mundo nos afligem.


Em sua música, eterna e vibrante, estará imortalizada toda uma vida dedicada à arte, tesouro que o acompanhará para sempre nas esferas espirituais em que ele ouvirá música ainda mais divina do que a melodia que Gluck imaginou Orfeu escutar, ao reencontrar sua amada Eurídice no Hades, e que Nelson transpõe ao piano como ninguém.


A luz que emerge da “Sonata quasi una fantasia”, de Beethoven, estará a brilhar em todas as luas que iluminarem mares e lagos, deste e de outros mundos, onde a música mais doce é a do bem que se deixa no rastro dos caminhos trilhados.

Nelson é luz que se desloca a brilhar em outros céus. Um espírito que colherá o bem que plantou, as emoções que refinou em nós, tornando-nos melhores, elevando-nos os sentimentos, e pelo legado diante do qual a humanidade lhe será eternamente grata.

Obrigado, Nelson!

O movimento romântico nas artes com frequência nos inclina a apuradas reflexões, principalmente no mundo da Música. Não que a delicadeza b...

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O movimento romântico nas artes com frequência nos inclina a apuradas reflexões, principalmente no mundo da Música. Não que a delicadeza bem comportada das obras barrocas, ou ainda mais antigas, não sugira devaneios à emoção, mas os românticos como Scriabin, Mahler, Bruckner, Sibelius, Strauss, Wagner, Saint-Saëns, Shostakovich, extrapolaram os limites da imaginação ao quebrar as barreiras da estética clássica de maneira arrebatadora.

Tal ruptura de formas e padrões da estrutura harmônica dominante nos períodos anteriores também ocorreu na literatura, poesia e artes plásticas, quase concomitantemente. A efervescência dos sentidos exacerbou-se rumo à liberdade de expressão, a desatar tudo o que havia preso nos recônditos do consciente e do inconsciente emocional. O sensitivo irmanava-se
Jean Delville
à intuição artística moldando o grito entusiasmado das ideias em linguagem livre e cristalina.

Os dramas épicos e nacionalistas aliavam-se à impetuosidade da paixão, trágica ou lírica. Uma tendência de total flexibilidade das formas pré-estabelecidas potencializava arroubos poéticos comuns a afeições inerentes à saudade, à alegria, ao amor, à angústia, à tristeza e à desilusão. A protagonização romanesca traduzia e relatava, enfim, tudo o que ocorria no âmago do ser.

A revolução francesa contribuiu para que a reconfiguração da arte eclodisse contagiada com o espírito de independência transformadora de tudo convencionado até então. Embora outras rebeldias, íntimas ou não, próprias da evolução e da história da humanidade tenham contribuído para a epopeia da fantasia. E tal influência foi assim estendida às demais manifestações artístico-culturais.

Altas doses de egocentrismo temperaram textos, poemas, sinfonias, pinturas e até mesmo a filosofia, destacando impulsos individuais acima de tudo, por vezes sob exagerado subjetivismo. E o esplendor da estrondosa e instigante beleza da Natureza e seus fenômenos atemorizantes fez o homem interagir com o eu lírico, exprimindo com toda força o que vivenciava no momento narrado. A criação divina influenciava e se retratava no estado de espírito do artista, do qual emergiam inspirações que advinham do grotesco ao medievalismo, do bélico ao pacífico, do trágico ao suavemente poético.

Jean Delville ▪ 1885
Houve, no entanto, românticos autênticos ou tardios que captaram intuitiva e espiritualmente a quintessência mística, transcrevendo para as suas composições a ousada e grandiosa imagem da Divindade.

O compositor russo Alexander Scriabin (1872-1915) é autor de uma obra profundamente romântica, na qual a dramaticidade não se restringe aos aspectos voluptuosos da paixão ou da tragédia. Há nos seus poemas sinfônicos e sinfonias um contexto de densidade transcendental arrebatador. Pois ele próprio dizia ser o artista “fruto de uma designação divina”.

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Alexander Scriabin

Um exemplo “clássico não clássico” dos rompantes modernistas é o seu “Poema do Êxtase” (opus 64), original e intencionalmente literário para se transformar posteriormente em música sinfônica. Sua mensagem em busca do nirvana já se revela em um dos 369 versos, do próprio Scriabin, também poeta, que serviria de base para a obra:

Chamo-vos à vida, forças misteriosas, Afogadas nas profundezas obscuras do espírito criador, Tímidos esboços da vida. A vós trago a audácia.

Tão entusiasmado estava com o novo trabalho que disse, em carta, à sua (segunda) esposa, Tatiana de Schlözer:

“Acabo de escrever um monólogo com as cores mais divinas. Novamente sou arrastado por uma enorme onda de criatividade. Mal consigo respirar. Oh!, que benção! Estou a criar divinamente em um novo estilo, e que alegria é vê-lo tomar forma tão bem! (...) Por vezes, o efeito do poema é tão potente que não é necessário conteúdo algum. Estou a exprimir – neste poema – o que virá a ser o mesmo como música.”

Passaram-se 3 anos, de 1904 a 1907, para que o Poema do Êxtase fosse concluído, após várias transformações, todas livres de quaisquer limites formais, estreando em dezembro de 1908, em Nova York. O desejo do autor era realmente esse, transcender, extrapolar, descrever a jornada da alma às esferas superiores, no ondulado ritmo da evolução humana. A música assim cresce, indo e vindo se robustece, para atingir um auge de sonoridade de extasiante luminescência.

Jean Delville ▪ 1932
Logo após a estreia em seu país, na capital São Petersburgo, a crítica convergiu quase unânime ao classificar o Poema do Êxtase como “a obra mais ousada em toda a música contemporânea”. Enfim, a liberdade musical fora alcançada com excelsa sublimação das reações íntimas diante da arte, em busca da iluminação, confessada pelo próprio autor:

“Ama a vida com todo o teu ser e serás feliz como nunca. Não temas ser o que queres ser. Não tenhas medo de teus desejos. Não temas nem a vida nem o sofrimento. Não há nada maior do que a vitória sobre o desespero. Não tenhas medo, jamais, de desejar e de fazer o que tu bem quiseres”.

Imbuído de total desprendimento, sempre associado à plenitude, Scriabin consegue, em pouco mais de vinte minutos, condensar a nítida imagem da ascensão à espiritualidade. No início a música sugere o tatear da pureza, da ignorância, da simplicidade, e, aos poucos, ao longo do poema, faz a alma expandir a consciência, iluminar-se.

O início é suave como um despertar e se consolida aos poucos à vigília. O tema composto por três intervalos ascendentes e consecutivos de duas notas, inúmeras vezes tocados pelos trompetes, estão presentes em toda a partitura. Os metais têm uma participação enfática ao executá-lo conferindo o caráter solene de anunciação de uma meta, de um objetivo: o êxtase místico, a grandiosa ponte que Scriabin edificou entre o humano e o divino.

Jean Delville
O adensamento sinfônico enriquece-se passo a passo com a diversidade de timbres e espectros melódicos que se contrapõem em complexidade perfeitamente unificada na harmonia de conjunto. Na incisiva jornada ao auge epifânico, a música oscila entre forte e piano, entusiasmo e suavidade, e assim evolui para o glorioso clímax . Toda orquestra ruge, com tímpanos, gongo, sinos e colaneri a explodir no portentoso frenesi que tão bem singulariza o universo sonoro de Scriabin.

Ao final, descortina-se então a visão panorâmica contagiante capaz de nos conduzir às cintilantes órbitas celestiais. É quando os ouvidos transmitem intensa comoção aos olhos que, mesmo cerrados, lançam-se na exuberância do cosmo irradiando-se em direções antagônicas, do infinito imaginário à realização do ser interior.

Jean Delville
Logo após a explosão sinfônica que finaliza o poema, o espírito agora reconfortado respira pela última vez, e consagra seu renascimento no glorioso clímax do pungente epílogo , tal como Richard Strauss magistralmente alcançou na conclusão de seu célebre trabalho “Morte e Transfiguração" (Tod und Verklärung, 1891 - Eisenach).

Ao ouvir o Poema do Êxtase, conclui-se que os efeitos da arte que extrapola, que ousa, que se desgarra do que é óbvio, das convenções contextuais, invariavelmente fortalece a convicção de que a liberdade é extasiante. Aprendamos então com os românticos. Vivamos nossos sonhos. Inovemos, criemos o incomum, abracemos aquilo que nos compraz, deixando explodir aos céus tudo o que é intimamente belo, sem medo de ser livres. Completamente livres.

Tudo, ou quase tudo, é possível na poesia. Do hermetismo ao prosaísmo. Da metafísica ao pragmatismo. Liberdade é o que não falta, desde qu...

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Tudo, ou quase tudo, é possível na poesia. Do hermetismo ao prosaísmo. Da metafísica ao pragmatismo. Liberdade é o que não falta, desde que não se dilua a essência do poema.

Macro e microscopicamente imensurável, a poesia atinge nas Letras a amplitude e diversidade criativa semelhante ao que se consegue na Música. Mesmo sem discordar da professora Ângela Bezerra de Castro, para quem “só a música supera a poesia”, hei de considerar a dificuldade em estimar os limites da beleza em ambas. Ou até de separar uma da outra.

Toda manifestação homofóbica se resume na falta de amor, de respeito para com o próximo, com a comunidade e com a vida íntima alheia. Resp...

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Toda manifestação homofóbica se resume na falta de amor, de respeito para com o próximo, com a comunidade e com a vida íntima alheia. Respeito que não deve se limitar às relações entre homens e mulheres, mas entre quaisquer indivíduos que desfrutem comunhão afetiva. A harmonia de um relacionamento, de um ambiente familiar transcende a questão de gênero, pois é uma virtude de caráter e de nobreza. Há muitas relações homoafetivas em que existem muito mais dignidade, amor e respeito do que entre casais de sexo oposto.

Muito nos impressionaram as notícias recentemente divulgadas sobre a maneira discriminatória com que o empresário depoente na CPI da Covid se referiu ao senador Fabiano Contarato,
bem casado há mais de uma década com o fisioterapeuta Rodrigo Groberio, com quem tem dois filhos. Infelizmente isso ainda acontece, conquanto vivamos uma época em que o preconceito e a discriminação, sob qualquer forma, têm sido rejeitados pela sociedade pensante, com ênfase na mídia nacional e internacional, inclusive no Jornal A União, que dedica amplos espaços de abordagem correta acerca da diversidade humana, com séria rejeição a manifestações de comportamento homofóbico.

A ciência da psique já atestou que não há possibilidade alguma de redirecionamento de perfil sexual através de nenhuma terapia. A tendência para comunhão afetiva entre iguais é visceralmente pessoal, espontânea, e pode variar com as condições, o meio, as emoções e todo um contexto que envolve cada individualidade. Além de ser uma questão puramente pessoal e que não diz respeito a ninguém, as modernas pesquisas científicas apontam para que a tendência à comunhão afetiva entre pessoas do mesmo sexo pode até vir na genética, com a própria vida, ou na formação biológica. Por isso que a OMS a retirou de sua lista de doenças, desvios ou perturbações psíquicas, há algum tempo.

Há meia dúzia de anos, foi espantosa a repercussão positiva em cidades do mundo inteiro por conta da decisão da Corte Suprema dos Estados Unidos reconhecendo o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. Curiosamente, a mesma decisão de nosso Supremo Tribunal Federal, há alguns anos, não teve igual acolhimento da opinião pública, ainda que o nosso país haja se antecipado, estendendo os direitos matrimoniais por unanimidade.

Chico Xavier, eleito em votação nacional como o “Maior brasileiro de todos os séculos”, aborda o assunto de forma sensata e educativa, no livro Vida e Sexo, ditado pelo espírito Emmanuel:

“A homossexualidade, definida no conjunto de suas características por tendência da criatura para a comunhão afetiva com uma outra criatura do mesmo sexo, não encontra explicação fundamental nos estudos psicológicos que tratam do assunto em bases materialistas. Observada a ocorrência, mais com os preconceitos da sociedade, constituída na Terra pela maioria heterossexual, do que com as verdades simples da vida, essa mesma ocorrência vai crescendo de intensidade e de extensão, com o próprio desenvolvimento da Humanidade, e o mundo vê, na atualidade, em todos os países, extensas comunidades de irmãos em experiência dessa espécie, somando milhões de homens e mulheres, solicitando atenção e respeito, em pé de igualdade ao respeito e à atenção devidos às criaturas heterossexuais”.

Como símbolo de uma vida dedicada ao amor fraterno com uma produção de centenas de livros, dos quais nunca se disse autor e não quis receber nem um centavo, tendo doando às causas sociais todos os lucros obtidos, Chico coloca o amor muito acima da identidade de gênero. Afinal, espírito não possui sexo e o sentimento entre eles, que é o que perdura além da vida material, está em outro nível. Jamais deveria incomodar a quem quer que seja.

E prossegue:

“Em minhas noções de dignidade do espírito, não consigo entender porque razão esse ou aquele preconceito social impedirá certo número de pessoas de trabalhar e de serem úteis a vida comunitária, unicamente pelo fato de haverem trazido do berço características psicológicas e fisiológicas diferentes da maioria. “Acreditamos que o tempo e a compreensão humana traçarão normas sociais susceptíveis de tranquilizar quantos se vinculam a semelhante segmento da comunidade, assegurando-se-lhes a benção do trabalho com o respeito devido a todos os filhos de Deus. Até que isso se concretize, não vejo qualquer motivo para críticas destrutivas e sarcasmos incompreensíveis para com os nossos irmãos e irmãs portadores de tendências homossexuais, a nosso ver claramente iguais às tendências heterossexuais que assinalam a maioria das criaturas humanas”.

Chico Xavier conclui brilhantemente, com a dignidade que pautou seu exemplo de amor:

“Dia virá em que a coletividade humana aprenderá, gradativamente, a compreender que os conceitos de normalidade e de anormalidade deixam a desejar quando se trate simplesmente de sinais morfológicos, para se erguerem como agentes mais elevados de definição da dignidade humana, de vez que a individualidade, em si, exalta a vida comunitária pelo próprio comportamento na sustentação do bem de todos”.

Isso é amor!

A figura da madrasta comumente faz lembrar personagens desprovidas de afeto, inclusive estereotipadas negativamente pela sonoridade (“má”)...

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A figura da madrasta comumente faz lembrar personagens desprovidas de afeto, inclusive estereotipadas negativamente pela sonoridade (“má”) da palavra portuguesa. Diferente da versão francesa: “belle mère” (bela mãe) ou do inglês “stepmother” (um grau de mãe) — que poesia... Nos filmes, romances e fábulas infantis são tenebrosas as referências de crueldade.

A magia do silêncio muita gente já esqueceu. Nem se lembra quanta coisa ele tem a nos dizer. Certa vez, andava eu pelas tril...

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A magia do silêncio muita gente já esqueceu. Nem se lembra quanta coisa ele tem a nos dizer. Certa vez, andava eu pelas trilhas da falésia, rodeado de beleza e um verdume encantador. Ao passar num arvoredo, meu amigo acenou pra que eu ali voltasse. Sem saber o que seria, fui lá perto indagar. Ao que ele respondeu: “Ouça só essa magia. Que beleza de silêncio”. É claro que escutei muito mais do que ouvi.

A noite caiu há pouco, e o mar ali sussurra seus milenares mistérios... Já começam as saudades do inverno, enriquecidas com as lembranças ...

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A noite caiu há pouco, e o mar ali sussurra seus milenares mistérios... Já começam as saudades do inverno, enriquecidas com as lembranças da performance da orquestra de sapos, no brejo atrás da rua. Mas, contento-me com os exaltados marulhos desta preamar de lua nova. Tudo quieto, menos o vento que jorra em brisa impetuosa, com leve aroma de um verão já instalado. A paz faz eco na memória, acaricia as mais doces lembranças do existir. Ao fundo, somente os grilinhos do sereno mordiscam a penumbra deste saboroso silêncio.

Olhando os guajirus que despontam em floração na manhã umedecida, sentei-me a contemplar com imensa gratidão o raiar do novo ...

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Olhando os guajirus que despontam em floração na manhã umedecida, sentei-me a contemplar com imensa gratidão o raiar do novo dia. Ao lembrar da maciez levemente adocicada dessa fruta tão praiana, bons eflúvios de outro tempo temperaram-me o sabor com distante nostalgia.