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"Celso Furtado é um dos paraibanos mais notáveis do mundo e que mais se destacaram fora do país. Seria o que alguns europeus são para ...

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"Celso Furtado é um dos paraibanos mais notáveis do mundo e que mais se destacaram fora do país. Seria o que alguns europeus são para muitos de nós...”, esse foi o início de uma conversa na Livraria do Luiz, um bate papo liderado pelo grande cronista Gonzaga Rodrigues, que nos emprestava um pouco de sua sabedoria e experiência em mais um encontro sabático de quando podíamos nos encontrar.

Com o mês de junho, toda aquela força revigorante que toca sensivelmente nossos corações, a singela centelha das tradições, traz novos e gr...

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Com o mês de junho, toda aquela força revigorante que toca sensivelmente nossos corações, a singela centelha das tradições, traz novos e grandes significados no romper dessa página de calendário. O mês da colheita, que dois mil e vinte já prometera fartura a partir de março (no dia de São José), vinha sendo esperado desde as chuvas que garantiram o bom desenvolvimento das culturas agrícolas; milho e feijão abundam nos tabuleiros e várzeas, planuras que se viram enfeitadas com o abonecar das plantações.
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Açudes sangram; no sertão, Coremas e São Gonçalo recebem o líquido precioso desde janeiro; Camalaú e Cordeiro, no Cariri, também se enchem de água e vigor e o Epitácio Pessoa, nosso Boqueirão, se destaca: saiu de 15% em janeiro para 70% em primeiro de junho. Porém, não entramos o mês da maneira que sonhávamos.

Foi numa chuvosa quarta-feira de Cinzas. Tragado por toda sorte de sentimentos reflexivos, fui com meu pai (seu Paulo Roberto) para uma mis...

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Foi numa chuvosa quarta-feira de Cinzas. Tragado por toda sorte de sentimentos reflexivos, fui com meu pai (seu Paulo Roberto) para uma missa às 19h30min na Igreja de Nossa Senhora da Guia, em Lucena. Um motivo muito forte que suscitou a ida àquele santuário foi o de encomendar missa de sétimo dia para minha tia Nevinha (tia de meu pai, mas tão presente como se tia primeira fosse), pessoa extraordinária que morava no Recife (PE) de onde partiu, na quinta-feira anterior, aos 71 anos.

igreja da guia
Igreja da Guia (PB)
A Igreja está localizada estrategicamente sobre um platô próximo ao distrito de Costinha com uma visão privilegiada de toda a foz do Rio Paraíba (e da Fortaleza lá no Cabedelo). Construída em 1591, sendo uma das primeiras construções destas terras coloniais, fazia parte do aporte de segurança da Capitania da Parahyba. É uma belíssima construção em pedra e cal. E sua arquitetura em estilo ‘Barroco tropical’ resiste ao tempo com toda sua riqueza e imponência.

A missa começou alguns minutos após o combinado, acompanhada de fina garoa que cedeu lugar para chuva torrencial. Postado na nave, ao lado de uma porta lateral, daquele ponto avistava ao longe as luzes de Cabedelo e os pingos de chuva não me incomodavam, pois faziam parte daquele momento reflexivo, um elo com o sobrenatural. Observava atento as colunas, coroas, anjos, folhagens, capitéis, o arco do altar-mor, o próprio altar... tudo muito bem talhado, todos os detalhes. Olhei para o arco e vi a pedra angular balanceando as forças ali concorrentes, de imediato vi Jesus, na cruz, a pedra fundamental da Igreja em sofrimento. De imediato me veio à mente a Semana Santa que se iniciaria e todos aqueles santos cobertos de roxo simbolizando a tristeza, dor e a penitência da Quaresma.

uma rainha que desconhecia rancor, ódio e também ingratidão
Chega o Padre, inicia-se a missa, a chuva aumenta e as luzes se apagam. A partir de então, só havia luz em alguns postes fora da igreja. Pela porta principal entrava um pouco de claridade que flertava com a sinuosidade dos detalhes entalhados, o altar iluminado por três velas e a celebração continuou ainda mais bela. O lume dos círios ia alcançando as porções mais altas do altar, teto e janelas, devagar, em gradual cadência. Mais acima, os últimos frisos só podiam ser imaginados (não vistos!), ao mesmo tempo que a voz do Padre (sem microfone) e os cânticos eram entoados majestosamente, em coro, sem instrumentos, a sensação era de estar mergulhado no período colonial, séculos atrás, com tantos detalhes aludindo ao passado, aguçando ainda mais a minha reflexão e homenagem. E comecei a pensar nela.

Pelo carinho e elo de sangue, é bastante comum elogiar parentes. Os nossos são sempre bons, mas essa minha tia, Maria das Neves Oliveira, saiu da Mumbuca, da Serra do Maracajá, zona rural de Campina Grande, e foi para Recife lutar por um sustento para a família, isso nos idos da década de 1960. Abraçou e encaminhou todos os seus irmãos em profissões; de representante comercial se tornou uma grande empresária em Recife, foi premiada na China e na Coréia do Sul; deu casa, emprego e "vara para pescar" a todos os familiares, dos mais próximos aos mais distantes, um manto que cobria do frio todos os Oliveira.

De uma generosidade e amor sem limites foi esteio de nossa família e sempre contagiava todo mundo com uma energia e alegria de viver realmente grandiosa, uma rainha que desconhecia rancor, ódio e também ingratidão. Em 2006 quando soube que eu estava escrevendo um livro, procurou-me para saber dos detalhes e fez questão de "bancar" a publicação. Um exemplo de ser humano que soube se superar pelo amor. A dor de sua ausência é grande, não tem tamanho. Seu processo de doença (agravado pelo diabetes) não durou muito, é como aquele adágio popular que diz que as pessoas muito boas não devem sofrer... E como diz a música "Dona Cila", que a cantora Maria Gadú fez para sua avó: "Ó meu pai do céu, limpe tudo aí / Vai chegar a rainha / Precisando dormir/ Quando ela chegar / Tu me faça um favor / Dê um manto a ela, que ela me benze aonde eu for"... Nevinha, se buscamos a todo o tempo sermos boas pessoas, pessoas melhores, é porque tínhamos um grande exemplo a seguir; o seu. Desde muito pequeno que seus atos são sempre exemplos pedagógicos de Papai, sinônimos do bem, daquilo que é melhor.

Foi fazendo essa reflexão que eu entendi o porquê daquela missa estar sendo tão mística, diferente, especial. No fim ainda recebi, na testa, as cinzas que foram ofertadas a quem não pode estar no dia anterior pela forte chuva que banhou Lucena. Que Deus dê o céu a tia Nevinha, exemplo de cristandade e amor ao próximo.


Thomas Bruno Oliveira é mestre em história e jornalista

Meu Mundo-Sertão é repleto de mistérios, de belezas ocultas que se descortinam devagar, apenas para aqueles mais sensíveis, que não têm pr...



Meu Mundo-Sertão é repleto de mistérios, de belezas ocultas que se descortinam devagar, apenas para aqueles mais sensíveis, que não têm pressa, que se deixam levar. Fui para o Mundo-Sertão, desci a boca do Cariri, através da PB 138 (por Catolé de Boa Vista). Não tive a sensação tão esperada de após passar pelo distrito de São José da Mata e na entrada do sítio Tambor, a 704 metros de altitude, descer aquele corredor margeado pelas serras do Maracajá e do Engenho até a Praça do Meio do Mundo. É a partir dali que me sinto adentrar neste mundo mágico, repleto de sortilégios, mas não tive aquela costumeira e a esperada sensação.

Não fui pelo caminho habitual através da rodovia transamazônica porque desejava trilhar pela estrada que nos conduz a Catolé de Boa Vista, e em seguida ao município de Boa Vista, já na BR 412. Esse caminho já fiz algumas vezes, mas totalmente no asfalto ainda não. Segui. Estava na companhia dos amigos historiadores Erik de Brito (Neto) e Josemir Camilo que atenderam prontamente ao meu convite de participar da Reunião Ordinária do Instituto Histórico e Geográfico de Serra Branca em comemoração ao aniversário de 59 anos da cidade.

Partimos ao entardecer. Na boquinha da noite passávamos pelo tranquilo distrito de Catolé de Boa Vista; mais à frente, após passarmos por Boa Vista, já a caminho de São João do Cariri, vimos, como um sinal, um clarão, um relâmpago que parecia ser lá pelas nascentes do Rio Paraíba, em Monteiro. Minutos após sentimos um forte cheiro do mato, marmeleiros e juremas pretas parece que haviam entrado pelos dutos do ar condicionado nos inebriando, como é possível? Neto e eu nos olhamos, eu sorri. Aquilo era só mais um sinal da natureza chamando a contemplá-la. Desliguei o ar, desci os vidros, diminui a velocidade. Noite de lua cheia! Mata, serrotes, rodovia, tudo iluminado. Aproveitando a soledade de nosso carro, desliguei o farol. Nada de artificial em genuínas sensações e sentimentos. À margem direita da estrada, na famosa muralha do meio do mundo cacheada de blocos rochosos, o alumiar da lua beijava o contorno das serras, dava forma aquele horizonte, um sol de prata “prateando a solidão”, cenário mágico, luar do Mundo-Sertão.

Neto e eu nos deslumbrávamos a cada momento, contemplávamos as estrelas, vi a ursa maior, um êxtase difícil de quantificar. Naquele momento acho que o Prof. Josemir Camilo, que só observava o nosso movimento, pensava que aqueles garotos tinham endoidecido, talvez seu habitué metropolitano não permitira tal desfrute. Ora, já dizia Pedro Nunes, quando se aprende a amar o Mundo-Sertão, chega dá gosto pisar em cima dele, sentir o chão estremecer, mergulhar em seus mistérios, e assim fazemos quando a vida nos leva pr’aqueles rincões.

Em São João do Cariri, paramos em Roque Santeiro para comer uma fatia de bolo de mandioca com queijo coalho (dali mesmo!) bem assado, acompanhado de café puro e forte. Sentei na primeira mesa e, vez em quando, fitava ao longe as curvas do rio Taperoá, refletindo a lua e nos provendo uma brisa úmida e fria, vinda do sul.
Cheiro de terra molhada anunciava chuva próxima…
Chegando a Serra Branca, a lua faceira cintilava na Serra do Jatobá - a Serra Branca. Um espetáculo, aquela cena. Já na cidade, chegamos ao destino, a Escola Vasconcelos Brandão. Professor Zé Pequeno, na calçada a nos esperar, nos chama: – Thomas, vamos entrar, tá chuviscando!

Um fino chuvisco, sem a densidade de uma neblina, não incomodava, ao contrário: – Zé, vamos prosear por aqui, contemplar o luar, esse chuvisquinho p’ra banhar nossa alma, e ali conversamos um pouco... ao mesmo tempo que via o movimento ao longe, nos arredores da praça, afinal era um sábado e, além do mais, festivo para Serra Branca.

“Não há, oh gente, oh não, luar como esse” do Mundo-Sertão...


Thomas Bruno Oliveira é historiador e jornalista / e-mail.