Um texto bem escrito deve atender a requisitos não apenas gramaticais, lógicos, como também expressivos. A gramática determina a correção, que se obtém pela observância à norma culta. Ortografia, concordância (verbal e nominal), regência (também verbal e nominal), uso do sinal indicativo da crase são alguns dos tópicos nos quais incide a disciplina gramatical. Ela se firma em parte na tradição, em parte nas produções contemporâneas consideradas modelares do ponto de vista normativo.
Salomon Koninck
A busca pela expressividade não dispensa o redator de ser simples. A simplicidade está levando, por exemplo, à aposentadoria da mesóclise. Antigamente era sinal de distinção encher o texto de “far-lhe-ei”, “dir-te-ia”, “vê-lo-ás” e construções semelhantes. Jânio Quadros, que era professor de Português, notabilizou-se por empregar o pronome no meio do verbo até em bilhetinhos para os assessores.
Hoje se prefere dizer “Lhe farei uma visita” a “Far-lhe-ei uma visita”. A segunda construção soa pernóstica, pouco natural. A pronúncia retorcida das construções mesoclíticas não resistiu ao despojamento e ao dinamismo próprios da nossa época. Escrever bem é valorizar as formas breves e simples, que atingem com mais eficiência o leitor. Não foi apenas a mesóclise que se ausentou do cardápio. No plano semântico, passou-se a valorizar as palavras de uso comum. “Propósito”, em vez de “desiderato”; “destacado”, no lugar de “conspícuo”; “desprezível”, preferencialmente a “despiciendo”; e assim por diante.
Paul Harney
Não se pode falar em boa escrita sem atentar para dois conceitos fundamentais da linguística textual – a coesão e a coerência. A primeira promove a segunda. Um texto em que há coesão, ou seja, interligação formal das suas partes, é coerente e por conseguinte claro. Há uma coerência interna, efeito da não contradição, e uma coerência externa, decorrente da adequação do discurso à realidade (a chamada verossimilhança).
Montaigne CC0
Com base na lição de Montaigne, para bem escrever é preciso evitar tudo que possa obscurecer o sentido, tornando insuficiente a mensagem e ambígua a intenção do escritor. A experiência com o ensino de redação mostra que as falhas comprometedoras da clareza residem, em grande parte, na má ordenação dos componentes textuais, na imprecisão vocabular e na deficiente pontuação.
Se a prosa consiste em dispor as palavras “na sua melhor ordem”, quem quer ser claro tem que atentar para a exata colocação de vocábulos, períodos e parágrafos a fim de obter uma progressão ordenada das ideias. Isso não é fácil, pois exige sobretudo disciplina, mas o texto ganha em eficiência quando cada coisa está em seu lugar.
Jan Ekels II
No domínio semântico, a boa escrita se caracteriza pelo emprego de vocábulos precisos, ajustados ao contexto. Um dos fatores que comprometem a comunicação é o uso inadequado dos parônimos – vocábulos semelhantes quanto ao som. A semelhança entre eles pode levar a escolhas erradas, que produzem por vezes um efeito esdrúxulo e até cômico. Um aluno escreveu, por exemplo:
“A sociedade fica extasiada com o número de crimes que ocorrem atualmente” (queria dizer que a sociedade fica... estarrecida).
Quanto à pontuação, deve-se atentar sobretudo para o emprego da vírgula e do ponto. A primeira, que corresponde a uma pausa de pequena extensão, serve basicamente para separar termos da mesma função sintática. Já o ponto delimita o período, ou seja, a frase oracional. Separar períodos por vírgulas torna caótico o enunciado e impede que o leitor faça as pausas necessárias à delimitação das informações; abusar do ponto, empregando-o no lugar da vírgula, fragmenta o período. Cito esses dois procedimentos porque eles são os mais comuns nos textos que avalio em sala de aula.
Christian van Donck
“há algo suspeito – até mesmo desconcertante – numa pessoa que não lê e afirma querer escrever”.





